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4.3 ANÁLISE DE TRANSIENTE DE CÁLCIO EM CARDIOMIÓCITOS ISOLADOS

4.2.2 Tempo para remoção de metade do [Ca 2+ ]

Os cardiomiócitos tratados com ADO, ESP ou EPL não mostraram diferença no

tempo para remoção de [Ca2+] quando comparado ao controle. Quando os

receptores A1 ou A3 de adenosina foram antagonizados, a remoção de cálcio foi mais rápida 23% e 20%, respectivamente, em comparação com o grupo controle (Fig. 20A). Quando ESP ou EPL foram associadas aos antagonistas dos receptores de adenosina, a remoção de cálcio foi normalizada em comparação com os grupos que receberam DPCPX (aumento de 40% e 40,1% para ESP e EPL, respectivamente) ou MRS1523 (aumento de 20% e 24,6% para ESP e EPL, respectivamente) (Fig. 20A e 20B).

Resultados Hermidorff. M. M. 62 p < 0 .0 0 0 1 C AD O ES P DP CP X MR S1 5 2 3 DP CP X+ E SP MR S1 5 2 3+ E SP 0 1 0 0 2 0 0 3 0 0 4 0 0 T e m p o p a ra r e m o ç ã o d e ½ [C a 2 + ] i (m s ) * * = D ife re n te d o c o n tro le , p < 0 .0 0 0 1 * A p < 0 .0 5 p < 0 .0 5 C AD O EPL DP CP X MR S1 5 2 3 DP CP X+ E PL MR S1 5 2 3+ E PL 0 1 0 0 2 0 0 3 0 0 4 0 0 * * T e m p o p a ra r e m o ç ã o d e ½ [C a 2 + ]i (m s ) B * = D ife re n te d o c o n tro le , p < 0 .0 1 p < 0 .0 0 1

Figura 20 - Tempo para remoção de metade (1/2) de [Ca2+]i por tratamento. C: Controle; ADO: 1 µM; ESP: 0.01 µM; EPL: 0.001 µM; DPCPX: 0.1µM; MRS 1523: 1µM. Boxplots mostram a mediana, quartis, valores máximos e mínimos de cada grupo. N = 6 por tratamento.

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63 DISCUSSÃO

Nossos dados demonstram que tanto espironolactona como eplerenona são capazes de aumentar a concentração de adenosina no plasma de animais tratados com esses fármacos (Fig. 12). Outros estudos demonstraram que a adenosina, além de produzir efeitos sobre o sistema cardiovascular (Safran et al., 2001) também é capaz de exercer efeitos cardioprotetores diretos sobre os miócitos (Ely et al., 1985; Chanyshev et al., 2012; Lerman, 2015). A adenosina também pode ser usada clinicamente (como um produto genérico injetável), para o tratamento da taquicardia supraventricular (Geldenhuys et al., 2017).

Estudos anteriores também demonstraram que a ADO exerce múltiplos efeitos sobre o sistema cardiovascular, além de possuir efeitos benéficos na frequência cardíaca, contratilidade e fluxo coronário pela ativação de seus receptores de membrana acoplados a proteína G: A1 e A3, que atuam via Gαi e A2a, A2b, que atuam via Gαs (Braganca et al., 2016). Todos estes receptores vêm sendo demonstrados como cardioprotetores e encontram-se expressos nos vários tipos de células cardíacas, como fibroblastos, células endoteliais, células musculares lisas e cardiomiócitos. (Headrick e Lasley, 2009).

Os resultados apresentados na fig. 12 sugerem que um dos mecanismos protetores desencadeados pela ESP e pela EPL pode envolver o aumento da concentração da ADO no organismo, esses dados também serviriam para explicar, parcialmente, os resultados encontrados por Schmidt e colaboradores, em 2010, que demonstraram que em coração isolado de ratos os efeitos protetores tanto da ESP como da EPL são bloqueados por um antagonista não-seletivo de receptores de

adenosina e que o efeito cardioprotetor do carenoato de potássio (metabólito ativo

da espironolactona) foi bloqueado em camundongos nocautes para a enzima ecto- 5’-nucleotidase (NT5E - enzima envolvida na síntese de adenosina) (Schmidt et al., 2010).

Para tentar entender se o mecanismo que promove o aumento da concentração de adenosina pela ESP e pela EPL, está relacionado com o aumento de sua síntese e/ou diminuição de sua degradação, prosseguimos nossos estudos

com análises de concentração e atividades das enzimas ecto-5’-nucleotidase (NT5E)

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64 Dessa forma, demonstramos que ESP e EPL são capazes de aumentar a concentração e atividade de NT5E (Fig. 13A e 13 B). Além disso, a atividade dessa enzima é maior em animais tratados com EPL, quando comparado com animais tratados com ESP (Fig. 13B), o que explicaria, parcialmente, as concentrações maiores de adenosina encontradas em plasma de ratos tratados com EPL (Fig. 2).

No miocárdio, a adenosina pode ser produzida, principalmente, pela ecto-5'- nucleotidase, localizada na membrana celular, através da desfosforilação do AMP extracelular (Sommerschild e Kirkeboen, 2000). O principal papel fisiológico atribuído a 5-ecto-nucleotidase, é a formação de ADO a partir do AMP extracelular e a subsequente ativação dos receptores purinérgicos tipo 1 (P1), A1 e A3, A2a e A2b (Brundege et al., 1997; Rucker et al., 2007; Desai et al., 2017).

Sabe-se que os processos de expressão e síntese de proteínas envolvem mecanismos complexos e demorados, e que além disso, a maioria dos estudos relacionados com a cardioproteção desses fármacos baseiam-se em efeitos crônicos, tornando pouco frequente estudos sobre o efeito agudo dos mesmos. Dessa forma, como nosso trabalho baseia-se no tratamento agudo e a curto prazo com ESP e EPL (30 minutos) sugerimos que o aumento de concentração de NT5E encontrado no plasma dos animais tratados com esses fármacos seja devido, também, à liberação dessas enzimas que antes estavam compartimentalizadas.

Estudos recentes vêm demonstrando a possibilidade da existência de

canalização de um substrato ou intermediário metabólico descrevendo a distribuição de enzimas, como ocorre em enzimas multifuncionais ou complexos de multi- enzimas, e também em complexos enzimáticos reversíveis mais dinâmicos ou por colocalização em partículas subcelulares ou membranas biológicas. A canalização pode ser considerada um mecanismo geral para aumentar a eficiência das reações sequenciais em uma via metabólica ou como uma forma de compartimentação metabólica dentro da célula (Zala et al., 2017).

Corroborando com nossos achados, Rucker e colaboradores, em 2007, demonstraram que a NT5E é uma das enzimas presentes nas vesículas

sinaptossomais cardíacas. Desta forma, as ectonucleotidases podem estar

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65

níveis de nucleotídeos/nucleosídeos e consequentemente a modulação dos

receptores purinérgicos (Rucker et al., 2008).

Demonstrado a importância da ESP e da EPL na síntese de ADO, também realizamos análises de dosagem e atividade de adenosina deaminase e encontramos que a concentração de ADA não é alterada pelo tratamento com esses fármacos (Fig. 14A). A degradação de adenosina, regula os níveis de agonismo sobre seus receptores (Peart et al., 2003). Ausência ou redução da ADA podem gerar ações benéficas (aumento de proteção via agonismo de receptores de adenosina; reduzida geração de radicais livres) e/ou prejudiciais (acúmulo de desoxi- ATP e SAH; apoptose) (Hong et al., 2015)

Além disso, ADA tem sido implicada na regulação não-enzimática da funcionalidade dos receptores de adenosina A1 e é capaz de regular respostas de AMPc mediadas por esse receptor (Franco et al., 1997; Hashikawa et al., 2004). Estudos em tecidos não cardíacos indicam que na superfície da célula, ADA interage com o receptor de adenosina, facilitando a alta afinidade de ligação do ligante (Torvinen et al., 2002) e internalização do receptor para sua dessensibilização (Saura et al., 1998; Gracia et al., 2013).

Neste ponto, com a atividade de ADA é reduzida somente pelo tratamento com ESP (Fig. 14B), sugerimos que sua ação sobre o aumento de ADO, envolve tanto o aumento de sua síntese/liberação como a diminuição de sua degradação, enquanto a EPL age somente sobre aumento de síntese/liberação. Dessa forma, sugerimos também que a ADO possa fazer parte da via rápida de sinalização da ESP e da EPL. A via rápida (não genômica) desses fármacos foi reconhecida a pouco tempo pelo nosso grupo e ainda continua pouco compreendia (Hermidorff et al., 2015).

O fato de somente a ESP ser capaz de reduzir a atividade de ADA reforça o papel cardioprotetor desse fármaco, visto que estudos anteriores demonstraram que a inibição de ADA aprisiona adenosina do miocárdio e leva a uma recuperação completa da função cardíaca durante a reperfusão (Abd-Elfattah et al., 2012).

Estudos anteriores já demonstraram que a espironolactona perde seu efeito cardioprotetor em animais nocautes para o receptor A2b (Methner et al., 2010; Schmidt et al., 2010), porém ainda não existem dados sobre a relação dos

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66 receptores A1 e A3 com os AMRs, dessa forma decidimos reforçar nossa hipótese testando esses receptores de adenosina, uma vez que ambos são fundamentais na cardioproteção antes da isquemia, ou seja, antes da instalação do quadro patológico (Kilpatrick et al., 2001; Safran et al., 2001; Greene et al., 2016).

Para encontrar a melhor dose dos AMRs que seria capaz de reverter o quadro de arritmia cardíaca, utilizamos como controle positivo cloreto de lítio, visto que o lítio é amplamente associado a distúrbios cardíacos que levam a importantes alterações eletrofisiológicas (Riccioni et al., 1983; Moltedo et al., 2002). Demonstramos que cardiomiócitos tratados com baixa concentração de ESP e EPL apresentaram parâmetros contráteis semelhantes aos encontrados nos controles não tratados; no entanto, em maior concentração, a contratilidade celular aumenta, exibindo níveis semelhantes aos cardiomiócitos tratados com lítio. Curiosamente, demonstramos que a amplitude e a velocidade da contração prejudicada pelo lítio são restabelecidas por baixos níveis de ESP ou EPL (Fig. 15). A ESP já foi descrita por apresentar efeitos inotrópicos negativos (Chai et al., 2005; Chai et al., 2006) ou positivos (Barbato, 2002; Diviani et al., 2018).

Os AMRs espironolactona e eplerenona, são amplamente utilizados no cenário clínico para tratar a insuficiência cardíaca e a disfunção ventricular esquerda após o infarto do miocárdio (Pitt et al., 1999; Pitt et al., 2003). Estes efeitos cardioprotetores estão associados principalmente ao bloqueio de MR a longo prazo. Os efeitos cardioprotetores agudos (<3 dias) dos AMRs também são interessantes clinicamente. Sabe-se que a aldosterona apresenta efeitos rápidos e a maioria destes efeitos são independentes de MR (Hermidorff, 2015; Hermidorff et al., 2017; Ruhs et al., 2017). Porém o conhecimento do receptor responsável pelos efeitos rápidos da aldosterona ainda é uma questão de debate intenso (Dooley et al., 2012; Barton e Meyer, 2015; Hermidorff et al., 2017; Wehling, 2018). Pouco se sabe se os efeitos rápidos da aldosterona desempenham um papel importante nos efeitos deletérios deste hormônio no coração e outros órgãos (Ashton et al., 2015; Hermidorff et al., 2017). Curiosamente, nosso grupo foi o primeiro a mostrar que os AMRs também exibem efeitos rápidos e cardioprotetores in vitro (Hermidorff et al., 2015; Araujo et al., 2016).

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67 Nossos dados mostram que, ESP e EPL não tiveram efeitos per se nos parâmetros contráteis analisados, exceto em relação ao tempo para o pico de contração onde células tratadas com EPL apresentaram diminuição nesse parâmetro (Fig. 17B). O que colabora com estudos que demonstraram que ESP e EPL são benéficas para o tratamento e prevenção de arritmias cardíacas, pois previnem a fibrilação atrial e distúrbios eletrofisiológicos (Gravez et al., 2013).

Em relação ao papel da ADO na função contrátil, nossos dados mostram que os cardiomiócitos tratados com esse autacóide exibiram perfil contrátil semelhante aos cardiomiócitos tratados com ESP e EPL (Fig. 16 e 18), colaborando com o estudo de Lerman (2015) que também demonstrou que a ADO tem pouco ou nenhum efeito direto na amplitude ou duração do potencial de ação da membrana ventricular (Lerman, 2015). No entanto, demonstrou-se anteriormente que a adenosina em maior concentração (30 μM) leva a uma redução na contração cardíaca (Gergs et al., 2008).

A adenosina também está associada à cardioproteção principalmente por meio da ativação de seus receptores (Urmaliya et al., 2010; Chanyshev et al., 2012). Estudos demonstraram que, alguns efeitos eletrofisiológicos cardíacos mediados pela adenosina ocorrem principalmente através da ativação direta do seu receptor A1 (Sousa e Diniz, 2017), como por exemplo: produção de óxido nítrico (NO) e, consequentemente, vasodilatação mediada por NO, inibição de morte celular cardíaca e manutenção da contratilidade cardíaca (Safran et al., 2001; Jensen et al., 2011; Lerman, 2015). Neste contexto, o uso do agonista de receptor de adenosina A1 vem se mostrando promissor como uma terapia potencial para insuficiência cardíaca que poderia melhorar a homeostase de cálcio, estrutura e função cardíaca (Greene et al., 2016). Além disso, o receptor A3 também é responsável pelo relaxamento/vasodilatação de vasos sanguíneos (Ho et al., 2016).

Nós, portanto, hipotetizamos que a ESP e a EPL aumentam a disponibilidade

de ADO que atua diretamente nos seus receptores A1 e A3, que estão ligados aos

efeitos benéficos desses fármacos no coração. Dessa forma, mostramos que a atividade contrátil de cardiomiócitos isolados é dependente dos receptores A1 e A3 de adenosina, uma vez que, sob o antagonismo farmacológico, a amplitude de contração (Fig. 16) e a velocidade máxima de relaxamento (Fig. 18) são

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68 significativamente maiores em comparação aos cardiomiócitos do grupo controle, fato associado ao aumento do transiente de cálcio intracelular (Fig. 19). O que pode ser explicado pelo fato dos receptores A1 e A3 serem ligados à proteína Gi e quando ativados inibem AC, promovendo diminuição da produção de AMPc e diminuição da ativação de PKA e CCTL o que impede o aumento das concentrações de Ca2+, resultando em respostas cronotrópicas e inotrópicas negativas (Lindegger e Niggli, 2005). Por outro lado, já foi demonstrado que agonista seletivo de receptor A3 de adenosina é capaz de promover efeito inotrópico positivo em átrios hipertrofiados (Yuan, 2008 ). No entanto, nosso estudo usou cardiomiócitos ventriculares isolados sem cardiopatias.

Do ponto de vista clínico, o ATP é usado para tratar arritmias supraventriculares, especialmente em crianças. Curiosamente, a ATP é rapidamente degradado em adenosina na corrente sanguínea, o que ativa o receptor A1 de adenosina levando à estimulação vagal (Gergs et al., 2009). De fato, na ativação cardíaca, o receptor A1 de adenosina é responsável pela mediação de efeitos inotrópicos negativos através da inibição da adenilato ciclase (Gupta, 1993; Diviani et al., 2018).

Quando combinamos ESP ou EPL com antagonistas dos receptores A1 e A3 de

adenosina, foram encontrados resultados interessantes. A ESP não conseguiu reverter os efeitos crescentes e deletérios dos antagonistas de receptores A1 e A3 de adenosina na amplitude da contração (Fig. 16A), enquanto a EPL reverteu completamente esse parâmetro (Fig.16B). Além disso, quando ambos os receptores de adenosina são individualmente antagonizados, a velocidade máxima de relaxamento aumenta (Fig. 18). Este perfil foi parcialmente e totalmente revertido pela ESP (Fig. 18A) uma vez que ela consegue diminuir a velocidade de relaxamento em relação aos antagonistas de adenosina mas sem chegar aos níveis normais (controle) e EPL (Fig. 18B), respectivamente. Portanto, nossos dados demonstram um perfil diferente de contratilidade de cardiomiócitos quando ESP ou EPL estão associados aos receptores A1 e A3 de adenosina.

É interessante especular a relevância desses achados. Essa diferença no perfil de resposta farmacológica pode ajudar a explicar algumas diferenças quanto aos efeitos rápidos da ESP e EPL encontrados pelo nosso grupo em estudos anteriores

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69 (Hermidorff et al., 2015; Araujo et al., 2016). Esse perfil distinto de resposta também pode ser explicado por diferenças estruturais entre ESP e EPL, que também é responsável por conferir EPL mais especificidade à MR em comparação à ESP (Kolkhof, 2016; Hermidorff et al., 2017). Além disso, o antagonismo de receptores A1

e A3 de adenosina promove aumento da amplitude de contração - assim como o lítio

(Fig. 15A) - e somente EPL é capaz de reduzir completamente a amplitude de contração quando os receptores são bloqueados (Fig. 16B).

O aumento da amplitude do transiente de [Ca2+]i (Fig. 19) apresentado por cardiomiócitos tratados com antagonista dos receptores de adenosina está relacionado ao aumento da amplitude de contração celular (Fig. 16). Adicionalmente, somente a EPL reverteu o aumento do transiente [Ca2+]i. Uma possível explicação para o aumento da amplitude do transiente de [Ca2+]i quando os receptores de adenosina são antagonizados seria que a ativação do receptor A1 pode levar à hiperpolarização da membrana de cardiomiócitos pela abertura dos canais GIRK / KIR3 (Lüscher, 2010; Wang, 2013; Braganca et al., 2016).

Nossos dados também mostram que ESP e EPL não afetam a amplitude do transiente de [Ca2+]i (Fig. 19) e o tempo para remoção de metade de [Ca2+]i (Fig. 21). No entanto, ESP reverte o aumento do transiente de cálcio apenas quando o receptor A3 de adenosina é antagonizado (Fig. 19A), enquanto a EPL reverte o aumento desse parâmetro quando ambos os receptores são antagonizados (Fig. 19B). O papel dos receptores A1 e A3 de adenosina no transiente de cálcio em cardiomiócitos já foi investigado (Shneyvays et al., 2004), mostrando que o receptor A3, quando ativado, leva a uma redução na amplitude de [Ca2+]i (Shneyvays et al., 2005).

A atividade reguladora de cálcio da ESP e da EPL já foi previamente demonstrada, de forma que a ESP é capaz de prevenir a expressão de canais de cálcio tipo L, o que reforça nossos achados sobre contração cardíaca e transientes de cálcio (Di Biase et al., 2005). A expressão dos canais de cálcio do tipo L parece participar diretamente no remodelamento elétrico que ocorre antes do início da hipertrofia cardíaca, o que leva ao aumento da duração do potencial de ação (Perrier et al., 2004). Em miócitos cardíacos, os canais do tipo-L são o principal caminho para o influxo de Ca2+ proveniente do espaço extracelular para o citoplasma; a

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70 corrente de Ca2+ (ICa), induz a contração do músculo cardíaco e regula sua força contrátil (Bers, 2002; Richard et al., 2006).

Deve-se destacar que, devido à ação rápida desses efeitos (menos de 30 minutos), é improvável que a via clássica (genômica envolvendo antagonismos de MR) esteja envolvida nessa resposta. Dessa forma, esse estudo corrobora com nossos dados anteriores sobre os efeitos rápidos e cardioprotetores da ESP e EPL (Hermidorff, 2015; Hermidorff et al., 2015; Araujo et al., 2016; Hermidorff et al., 2017).

Já foi demonstrado que a adenosina é produzida em cardiomiócitos (Headrick e Lasley, 2009), inclusive em cardiomiócitos isolados de ratos e humanos (Smolenski et al., 1992; Smolenski et al., 1998; Smolenski et al., 2014) e que ela atua diretamente sobre as células cardíacas desencadeando vias cardioprotetoras (Ely e Berne, 1992; Shin et al., 2018). Esses dados, portanto, suportam nossos achados em que espironolactona e eplerenona são capazes de aumentar a disponibilidade de adenosina no plasma (obtido de sangue coletado por punção cardíaca) e promover efeitos cardioprotetores através da ação da adenosina sobre seus receptores A1 e A3.

A tabela a seguir fornece um panorama simplificado dos aspectos mecânicos (contratilidade celular) e de transientes de Ca2+ encontrados em cardiomiócitos isolados tratados com ESP e EPL, demonstrando que esses AMRs apresentam efeitos sobre os receptores de adenosina devido ao aumento da disponibilidade desse autacóide.

Tabela 12 - Receptores ativados pela ação de espironolactona e eplerenona em cardiomiócitos isolados e ratos

Parâmetros Espironolactona Eplerenona

Amplitude de contração ________ A1 e A3

Tempo para o pico de

contração A3 A3

Velocidade máxima de

relaxamento A1 e A3 A1 e A3

Amplitude de [Ca+2] _______ A1 e A3

Tempo para remoção de ½ [Ca+2] A

Discussão

Hermidorff. M. M.

71 Considerando-se todos nossos dados e o embasamento bibliográfico, nós conseguimos construir um esquema que pode representar a possível participação da adenosina no mecanismo cardioprotetor promovido pela espironolactona e pela eplerenona (Fig. 21).

Figura 21 – Esquema ilustrativo da possível participação da adenosina no mecanismo cardioprotetor promovido pela espironolactona e pela eplerenona. Espironolactona e eplerenona aumentam a disponibilidade de adenosina, no plasma, que ativa os receptores A1 e A3 (acoplados a proteína Gi) e

Conclusão

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72 CONCLUSÃO

Com esse estudo podemos concluir que parte dos efeitos cardioprotetores da espironolactona e eplerenona podem ser mediados pela adenosina, uma vez que:

a) Aumentam a concentração de ADO no plasma de animais tratados;

b) Aumentam a concentração e a atividade da enzima de síntese de adenosina;

c) ESP diminui a atividade da enzima de degradação;

Em linhas gerais, sugerimos que a ação tanto da espironolactona como da eplerenona sobre o coração pode ser mediada tanto pelo aumento da disponibilidade de adenosina promovida por esses fármacos, como pela ativação de seus receptores de membrana devido ao aumento de adenosina disponível (Fig. 21).

Investigando o efeito cardioprotetor da espironolactona e eplerenona sobre células cardíacas demonstramos que, em relação a atividade mecânica, os efeitos cardioprotetores promovidos pela espironolactona e pela eplerenona, na prevenção de arritmias, são efeitos rápidos (não envolvem vias genômicas),

Nossos dados suportam o papel cardioprotetor da ESP e EPL em cardiomiócitos isolados de ratos adultos. Porém, a relevância desses fármacos e sua interação com os receptores da adenosina in vivo precisa ser melhor investigada.

Referências Bibliográficas

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73 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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