• Nenhum resultado encontrado

A teoria da imputação aristotélica encontra em Tomás de Aquino70 e em Samuel Pufendorf71 um desenvolvimento e aprofundamento de suas estruturas materiais.

Defensor do Direito natural de base racional, Pufendor trata do direito penal

dentro de sua doutrina do Estado, exposta no primeiro dos dois livros de sua obra

fundamental, De jure naturae et gentium. Nela, discute importantes conceitos,

desenvolvendo a teoria da imputação, que excedia o jurídico e alcançava inclusive

as ações imputáveis do ponto de vista moral72, a legítima defesa, o estado de necessidade, o erro, a participação e a pena.

Segundo nos informa Welzel, Pufendorf entendia por ação o movimento

dirigido às capacidades humanas: o intelecto e a vontade; somente os efeitos

produzidos por estes atos de direção poderiam ser imputados ao autor como obra

sua73. Assim é que a “vontade” e o “domínio do fato” passam a se constituir no

VI, 1 e ss. apud WELZEL, Hans. Introducción a la filosofia del derecho. Derecho natural e justicia material. Montevideo/Buenos Aires: B de f, 2005, p. 43.

70 “Pressuposión de la imputación es para él, como para Aristóteles, el caráter de la „voluntariedad‟.

Siempre que el error anula la voluntariedad de la acción, exime también de culpa. El error insuperable (error invicilibis), por eso, exime totalmente de culpa, mientras que el error superable (error vincilibis) exime en la medida de su involuntariedad. Evitable es, sobre todo, la ignorancia provocada intencionadamente o ignorancia affectata, y la ignorância debida a grave negligencia o ignorantia crassa.” WELZEL, Hans, op. cit., p. 81.

71

WELZEL, Hans. La dottrina giusnaturalistica di Samuel Pufendorf. Un contributo alla storia delle idee dei secoli XVII e XVIII. Torino: G. Giappichelli Editore, 1993, p. 119. Notória é a ligação entre a teoria da imputação de Aristóteles e de Pufendorf, pois ambas descrevem as estruturas de natureza ontológica pelas quais um resultado (meritório ou não) pode ser imputado ao seu autor através de sua vontade e do domínio do fato.

72

HARDWIG apud RUEDA MARTIN, Maria Ángeles. La teoría de la imputación objetiva del

resultado en el delito doloso de acción (Una investigación, a la vez, sobre los límites ontológicos

de las valoraciones jurídico-penales en el ámbito de lo injusto). Barcelona: Bosch, 2001. (Biblioteca de Derecho penal), p. 68, nota 92.

73

centro da teoria da imputação, excluindo das ações o caso fortuito, o acaso, a

casualidade74.

Pufendorf manejava duas expressões para explicar a sua teoria da

imputação. A primeira delas, imputativitas, corresponde aos pressupostos materiais (que determinavam a relação de pertença da ação “livre” ao seu autor, isto é, a ação

comandada pela consciência e pela vontade) da imputabilidade e de sua exclusão. A

segunda, imputatio, refere-se a uma apreciação ex post, à comprovação dos

elementos da imputativitas, e a sua conseqüente valoração. Essa valoração era feita

tomando por base a distinção entre os entia moralia (formas do ser moral), que

dotam os entia physica (totalidade dos objetos da natureza física), valorativamente

neutros, de diferenças axiológicas. Assim é que a imputatio compreende a

imputativitas, os pressupostos materiais, bem como as valorações que sobre ele

recaem75.

Sobre a base do entia moralia, Pufendorf difereciava na ação moral um lado

físico e um lado moral, e no físico, distinguia em momento material e um momento

formal76.

A matéria é a totalidade dos acontecimentos físicos da ação; a ela pertencem

não somente os movimentos corporais e os resultados causais seguintes

produzidos, senão também todos os atos de vontade e entendimento sempre que

sejam considerados abstratamente em seu sentido natural77.

A forma consiste na imputabilidade da ação (imputativitas), com a qual o

efeito de um comportamento livre só pode ser imputado ao agente como obra deste,

74

RUEDA MARTIN, Maria Ángeles. La teoría de la imputación objetiva del resultado en el delito

doloso de acción (Una investigación, a la vez, sobre los límites ontológicos de las valoraciones

jurídico-penales en el ámbito de lo injusto). Barcelona: Bosch, 2001. (Biblioteca de Derecho penal), pp. 68-69.

75

WELZEL, Hans. La dottrina giusnaturalistica di Samuel Pufendorf. Un contributo alla storia delle idee dei secoli XVII e XVIII. Torino: G. Giappichelli Editore, 1993, pp. 119-121.

76

Id, ibid, p. 52.

77

sendo completamente indiferente do ponto de valorativo, pois não pretende afirmar

nada acerca da culpa deste, pretende indicar apenas a conclusão lógica da pertença

da determinação através da liberdade humana (entendida como cooperação entre

consciência e vontade), que não é nenhuma abstração, estando ligada a uma lei de

forma determinada que sobre ela (a liberdade) deve influir78.

Assim é que a imputativitas (relação de pertença da ação livre ao seu autor)

serve de princípio norteador da imputatio. Ela descreve e define a lei de relação

estrutural entre os entia physica, isto é, como se relacionam os diversos elementos

de um acontecimento, mas não implica nenhum juízo valorativo, devendo ser

apreciada, a posteriori, pelo juiz. Presente a imputativitas através dos entia physica

recai, então, a valoração do objeto pelos entia moralia. A ação livre (composta pelos

componentes físicos, entre os quais estão também os psíquicos) em si não é nem

boa nem má, sendo um indiferente axiológico. É na adequação desta, na sua contradição com a norma, que a ação recebe uma nova condição “moral”, através da

qual é diferente no aspecto ético. É este componente ético que distingue os entia

physica dos entia moralia, que dotam de sentido a ação. Estes não podem existir

sem aqueles. Somente após constatados os elementos físicos e o princípio de

relação ontológica entre os mesmos através da imputativitas, é possível efetuar a

imputatio, ou seja, a valoração dos entia physica e da imputativitas mediante os entia moralia79.

A imputativitas corresponde à ação, substrato material e objeto de toda a

valoração, conceito este posteriormente introduzido na dogmática penal por J. S. Fr.

78

WELZEL, Hans. La dottrina giusnaturalistica di Samuel Pufendorf. Un contributo alla storia delle idee dei secoli XVII e XVIII. Torino: G. Giappichelli Editore, 1993, p. 49.

79

RUEDA MARTIN, Maria Ángeles. La teoría de la imputación objetiva del resultado en el delito

doloso de acción (Una investigación, a la vez, sobre los límites ontológicos de las valoraciones

jurídico-penales en el ámbito de lo injusto). Barcelona: Bosch, 2001. (Biblioteca de Derecho penal), p. 71.

von Böhmer80. A categoria da imputatio foi mais tarde acolhida por Kant81. Interessa ressaltar que essa bipartição pufendorfiana se converte na imputatio physica e na

imputatio moralis, conduzindo o desenvolvimento histórico desta última a divisão

entre imputatio facti e imputatio iuris. O conceito de ação perde, porém, sua

importância nas doutrinas de Grolman e em Feuerbach, voltando, na primeira

metade do séc. XIX, a ser o fundamento objetivo da imputação, tendo como centro

G. W. F. Hegel.