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PARTE I: (RE)CONHECENDO AS PEÇAS DO MOSAICO

CAPÍTULO 2. CONCEITOS DA PESQUISA

3. C OOPERAÇÃO E C ONFLITO : EM BUSCA DE ENTENDER AS RELAÇÕES SOCIAIS DAS MICRO E PEQUENAS

3.3. Perspectivas teóricas sobre relações sociais de cooperação e conflito

3.3.6. Teoria da Aglomeração: relações sociais entre empresas e desenvolvimento local

Uma intersecção entre visões de mercado e de relações sociais, especialmente de cooperação, entre empresas se dá na abordagem da Teoria da Aglomeração. Tal teoria busca explicar a localização concentrada de empresas em um dado território, sejam elas de pequeno ou grande portes. No âmbito de MPE, ela fundamenta estudos não somente de competitividade empresarial e estima resultados positivos para o desenvolvimento da localidade em que se encontram. As pressões por redução de custos e o aumento de produtividade impulsionaram a formação de novos arranjos empresariais voltados, principalmente, para maior cooperação dentro de um ambiente concorrencial acirrado (OLAVE e AMATO NETO, 2001). Ou seja, a cooperação surgida na aglomeração tem o nascedouro em relações de competição, e portanto de conflito comercial, com outras empresas, mostrando a interface entre as relações.

Embora tenha fundo territorial, pensar no espectro da aglomeração contempla relações entre empresas e busca explicar os resultados alcançados a partir da proximidade geográfica e da proximidade social que impulsionam. Afinal, contextos de aglomeração territorial de empresas pressupõem laços sociais e econômicos entre os participantes (PYKE e SENGENBERGER, 1993; 2002).

As raízes das concepções da aglomeração empresarial estão nos trabalhos de Alfred Marshall sobre aglomeração geográfica como fator que favorece a troca de conhecimentos e o fortalecimento da cooperação entre os atores locais (MARSHALL, 1982). Assim, dos relacionamentos de cooperação entre pequenas empresas, passou-se a esperar vantagens como economias de escala e escopo, redução dos custos de transação, promoção de desenvolvimento local e crescimento econômico.34 De modo agregado, são esses os pilares

que suportam a visão de clusters, distritos industriais, redes e APL (Arranjos Produtivos Locais) e as estratégias de desenvolvimento derivadas de cada uma dessas abordagens.

34 Sobre o assunto ver Costa (1996); Orssatto e Hoffmann (1998); Casarotto Filho e Pires (1999); Galvão (2000);

As aglomerações territoriais de pequenas empresas passaram a ser valorizadas pelo entendimento compartilhado com outras áreas de pesquisa de que a proximidade geográfica estimula a proximidade social (TRAVERS e MILGRAN, 1969), catalisando os relacionamentos (CASSIOLATO e LASTRES, 2002; PYKE e SENGENBERGER, 2002). Os protagonistas desses sistemas são as empresas de micro, pequeno e médio portes, que mantêm relações de cooperação em torno de uma cadeia produtiva com a finalidade de construir vantagens competitivas para o local, a região e as próprias empresas.35 Explica-se

que as empresas de pequeno porte tendem a cooperar para obter vantagens de sinergia coletiva, como produtividade, inovação, redução dos custos das transações, melhorando o desempenho, angariando maiores lucros e aumentando a capacidade para ações coletivas. Aumentam, ainda, a participação no mercado e criam mais valor para o cliente.

Como externalidade da cooperação, adeptos da abordagem da aglomeração territorial entendem que ela pode produzir efeitos positivos na economia local.36 Situações ilustrativas

são encontradas no distrito industrial37 de tecidos de Biella, na Itália; de algodão, em

Tiruppur na Índia; têxteis, de Herning-Ikast, e de movelaria, de Salling, ambos na Dinamarca; de bens de capital, em Baden-Württemberg, na Alemanha; os clusters florestais, na Finlândia, entre outros. Eles são exemplos de reversão de situações de baixa competitividade empresarial e empobrecimento local para uma realidade de articulação e revalorização de empresas pequenas, dinamismo da região, seguidos por melhoria nas condições de remuneração e de trabalho, sofisticação do processo produtivo, com consequente acesso a mercados (GALVÃO, 2000).

Apesar de grande parte da literatura sobre o assunto ter sido originada em países desenvolvidos, os sistemas produtivos locais inspiram, recentemente, um melhor entendimento de seu papel nos países em desenvolvimento (CASSIOLATO e LASTRES, 2002; 2004). No Brasil, tem sido enfatizado o crescimento econômico e a redução das desigualdades por meio do potencial multiplicador das iniciativas de cooperação (HASTENREITER FILHO e SOUZA, 2004). Os órgãos relacionados a APL, não raro, trazem no discurso esse modelo organizacional como uma maneira de promover crescimento econômico, gerar novos empregos e, por conseguinte, produzir bem-estar social aos seus participantes e à comunidade local (BNDES, 2004; SEBRAE, 2005a; MDIC, 2006).

Algumas abordagens esclarecem a importância que os APL vêm adquirindo na geração de empregos e bem-estar social, crescimento econômico, exportações e

35 Este argumento está presente em Casarotto Filho e Pires, (1999); Meyer-Stamer, (1999); Amato Neto (2000);

Becattini (2002); Pyke e Sengenberger, (1993); Molina-Morales e Hoffmann (2002), Suzigan, Garcia e Furtado (2002); Andion (2003) e Pavlovich (2003); Cassiolato e Lastres (2002; 2004).

36 (PORTER, 1998; AMATO NETO, 2000; FARAH JÚNIOR, 2001; BECATTINI, 2002; CÂNDIDO, 2002; MOLINA-

MORALES, 2002; NORDIN, 2003; GULATI et al., 2004).

37 "Distritos industriais são redes locais de pequenas e médias empresas cuja competitividade está enraizada em

desenvolvimento tecnológico, fazendo uma relação nítida entre eles e o seu potencial de gerar desenvolvimento local (SUZIGAN et al., 2003). Em outras palavras, a literatura concentra-se em explicar a principal motivação para a constituição de relacionamentos cooperativos entre as empresas, como a busca pela competitividade, e em entender das políticas públicas industriais que os promovem.

A crítica à abordagem das aglomerações aponta que existe uma preocupação marginal com questões de sustentabilidade no padrão de desenvolvimento possibilitado pelos arranjos, ainda que atores que os promovam, como o Sebrae (2005a), justifiquem sua ação em APL por ser uma política de promoção de desenvolvimento sustentável.

Por fim, a explicação que a abordagem fornece para as relações entre as MPE – normalmente entendida apenas como a cooperação – deixa de lado os aspectos simbólicos, emocionais e de cognição que vão além de esferas estritamente econômicas ou políticas (NUNES e MARTINS, 2001). Ou seja, a teoria carrega a noção de que as MPE cooperariam desde que percebessem os resultados que podem ser alcançados, e abandona considerações de relações de conflito em que elas possam estar envolvidas, o que representa uma simplificação do mundo real. É difícil pontuar se essa vertente de literatura compreende que a cooperação surge e extermina quaisquer conflitos preexistentes ou se entende que é preciso exterminar os conflitos para que a cooperação nasça. Todavia, a articulação entre as relações tende a ser deixada de lado.