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A revisão bibliográfica da Teoria da Complexidade realizada a seguir tomará como base o artigo de Daniel Silva (2005), intitulado “O Complexo como uma Episteme Transdisciplinar” e dedicado à construção da episteme do complexo gerador da atitude transdisciplinar. O estudo é dividido em três momentos essenciais: o estado da arte da Teoria da Complexidade, a leitura sobre o comportamento complexo sob diferentes categorias científicas e a discussão sobre o raciocínio complexo. Além do artigo, utilizou-se do capítulo referente à Teoria da Complexidade da tese de Roseane Palavizini (2006).

A Teoria da Complexidade possui três visões históricas principais que contribuem para a construção do pensamento complexo, envolvendo cientistas de toda parte. São os três complexos: o Quântico, o Cibernético e o Humanista. Silva (2002) descreveu cada uma dessas visões.

a) O complexo quântico

Esse complexo é baseado no sistema atômico e surgiu no início do século XX, pela necessidade de se explicar matematicamente o que ocorria no interior do mundo do átomo.

O complexo quântico pode ser caracterizado por três palavras: estrutura, indeterminação e conectividade. A primeira fornece a idéia de descontinuidade da estrutura atômica, fruto de seus acoplamentos e interrelações e que resultam em sua finalidade. A indeterminação define a impossibilidade da definição isolada dos elementos do sistema, trazendo a incerteza permanente ao comportamento complexo.

A terceira idéia do complexo quântico, indica a conectividade entre todos os elementos do sistema e que todos os fenômenos são produtos das pertinências físicas em sincronicidade. O complexo quântico rompe com a mecânica clássica à medida que coloca o sistema atômico como independente da continuidade física, temporal e espacial.

Em meados do século XX a ciência da cibernética trouxe o segundo avanço para a teoria da complexidade, quando um grupo de cientistas pesquisava a chamada inteligência artificial visando criar uma máquina que se comportasse como o cérebro humano.

O complexo cibernético será caracterizado por três palavras: organização, informação e retroalimentação. Segundo Palavizini (2006), a organização é definida como um sistema que possui uma estrutura processadora de informação com finalidade específica. A informação é definida como um sinal simples de conectividade na linha da estrutura. A retroalimentação é a capacidade de voltar atrás, redefinindo seu trajeto a partir de algum limite ou determinação prévia. Esses conceitos constituem avanços científicos na escola da cibernética e, embora o objetivo principal não tenha sido alcançado, abriu-se um novo campo de pesquisa: as ciências cognitivas, concentrando-se dessa vez no humano e na construção de sua ontologia.

c) O complexo humanista

A visão humanista é a terceira etapa evolutiva da Teoria da Complexidade, com origem em questões que a ciência da cibernética não podia responder em relação a um novo foco: o vivo, em particular, o humano. As três palavras chave que caracterizam esse complexo são: autonomia, emergência e relação.

A autonomia vem da Teoria da Autopoiese, que a define como a capacidade do ser vivo em administrar seu próprio viver por meio de sua auto- organização, autodeterminação e autocriação.

A emergência, segundo Silva (2002), é o resultado de uma dialógica que define a qualidade de uma matéria ou fenômeno, associada à dimensão que se observa. Ou seja, a emergência é um fenômeno não material que produz uma qualidade nova a partir da relação entre duas dimensões e que não existe isoladamente nas dimensões. As diversas dimensões e suas partes estão conectadas por um padrão de ligação: o sagrado, que coloca nexo ao todo. A relação entre duas unidades materiais produz uma emergência. O objeto da Teoria da Complexidade é o conjunto dessas relações e seu aprendizado.

3.3.2 O comportamento do complexo

Silva (2002), em seu artigo sobre a COMPLEXIDADE E AMBIENTE: Uma perspectiva metodológica para a construção de dimensões complexas do ambiente, organizou uma síntese sobre o comportamento dos sistemas complexos em três componentes: o comportamento organizacional, o relacional e o termodinâmico.

a) O comportamento organizacional

O comportamento organizacional resulta de três lógicas: a lógica estrutural, relacionada ao acoplamento estético do sistema, ou seja, seus elementos que se posicionam nos campos de influência uns dos outros em uma harmonia perfeita de distâncias, energias e movimentos para aquele momento; a lógica difusa, definida pelo acoplamento estrutural estético que ocorre em função das relações de pertinências entre dois (binário) ou múltiplos elementos (difusa); e a lógica organizacional, que se refere à emergência utilitária que resulta das relações autopoiéticas do sistema, determinadas pelo seu acoplamento estrutural ao ambiente. Essa emergência é uma qualidade que, externalizada do sistema, passa contribuir e se relacionar com outras emergências utilitárias no ambiente (Silva, 2002).

b) O comportamento relacional

- A lógica das unidades:

A primeira vertente relacional é a das relações no interior da unidade, que fornecem a idéia de que o sistema é a união de elementos complexos, ou seja, cada elemento em si é uma unidade com uma lógica organizacional. Assim, a complexidade de um sistema está, em primeiro lugar na complexidade de suas unidades constituinte (SILVA, 2002).

- A lógica do ambiente:

Essa segunda vertente relacional é a das relações entre unidades e traz a noção de indissociabilidade entre unidade e ambiente. A condição inicial para a ontologia do ambiente são as emergências organizacionais de cada unidade e as relações difusas entre elas, ou seja, as relações de pertinência entre as emergências em um espaço externo à unidade (ambiente) e, portanto sujeita à deriva. Desse modo, o ambiente não se sustenta sem a qualidade das emergências das unidades enquanto estas não sobrevivem isoladamente.

- A lógica do complexo:

O complexo se apresenta como uma terceira realidade que surge para fornecer sentido às duas anteriores (unidade e ambiente), possibilitando a identificação da pertinência entre suas lógicas relacionais, ou seja, as relações das relações. “Essa pertinência é o padrão que liga, é o sagrado que encanta, é o nexo do complexo, é a química do processo” (SILVA, 2002).

c) O comportamento termodinâmico

Os três conceitos que permitem a descrição desse comportamento são: as estruturas dissipativas, os estados de não equilíbrio e as bifurcações de instabilidade.

Primeiramente, podemos entender os sistemas como estruturas dissipativas, isto é: uma vez que são abertos ao ambiente os sistemas perdem energia conforme realizam sua ontologia e também recebem e fixam fluxo de energia do ambiente, tornando seu balanço energético positivo e o somatório da entropia negativo, direcionando seu movimento para a ordem. Isso possibilita o crescimento dos seres vivos.

A troca de energia de uma estrutura dissipativa representa o estado de não equilíbrio da unidade, gerando uma necessidade permanente de reestruturação para a manutenção e continuidade do movimento. Além disto, as instabilidades geram bifurcações em busca da estabilidade e o sistema se divide, pois o limiar de seu ótimo de operar foi ultrapassado. (Silva. 2002).

d) O raciocínio complexo

Após a caracterização do comportamento do complexo, Silva (2002) adentra no campo do raciocínio complexo, justificado pela necessidade de se adensar e ampliar as redes neurais do observador, que possibilitarão a integração do núcleo inteligência, pensamento e consciência para a aplicação da Teoria da Complexidade. Para isso, utiliza-se de três raciocínios: o ecológico, o estratégico e o difuso.

A partir das leis básicas da Ecologia, a homeostase, a resiliência, a emergência e a neguentropia, revela-se a idéia de que a sustentabilidade não está impressa na biologia do vivo, sendo resultado das relações

autopoiéticas e do aprendizado com o operar dos ecossistemas. Conclui-se que além da necessidade cognitiva de entendimento do fenômeno, é necessária a associação da episteme de sustentabilidade no foco da aplicação dos conceitos.

Da caracterização do raciocínio estratégico, revela-se a idéia de que a subjetividade do outro não faz parte da dialógica estratégica, sendo necessária uma ética que relaciona todas as partes a serem consideradas, incluindo além do importante, do fundamental e do urgente, o emergente. Disso decorre a necessidade de associação da episteme da subjetividade do outro à dialógica estratégica.

Por fim, o raciocínio difuso fornece as idéias de pertinência, lógica e contornos difusos, revelando a possibilidade da não exclusão dos elementos nos conjuntos a partir de um pertencimento parcial. Essa noção compõe, segundo Silva (2002), uma episteme poderosa para o paradigma da sustentabilidade, na qual o reconhecimento coletivo do outro como parte de si e do Universo (pertinências múltiplas) produz uma emergência de ordem espiritual: a afinidade.

A revisão apresentada constitui da construção da episteme do complexo, transcendendo o que seria uma descrição da Teoria da Complexidade. Dentro do hall de teorias otimistas, a teoria aqui apresentada, juntamente à Teoria da Autopoiese, constitui os pilares da Teoria da Transdisciplinaridade, já que a episteme do complexo permite a construção de uma cognição e de uma aprendizagem dialógicas, cujo resultado humanista e humanizador é a atitude transdisciplinar.

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