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CAPÍTULO 2: A CRIMINALIDADE RACIONAL

2.1 Teorias não-econômicas de criminalidade

2.1.6 Teoria do autocontrole

Os pioneiros nessa abordagem são Michael Gottfredson e Travis Hirschi que defendem que o comportamento desviante de um indivíduo que pode levá-lo ao crime resulta de falhas no sistema de controle social. Segundo a teoria do autocontrole, um indivíduo de comportamento irregular (com algum tipo de vicio) diferencia de outros indivíduos pelo fato de não ter desenvolvido mecanismos

psicológicos de autocontrole na infância, ou seja, entre os dois e quatro anos de idade até o início da adolescência, em torno dos 12 anos.

Pais ou responsáveis, segundo essa abordagem, teriam “falhado” na imposição de limites numa fase importantíssima da formação humana. Ou seja, a pessoa em formação desenvolveria diversos vícios98 e apresentaria comportamento “anormal”.

Tal anormalidade decorreria de deformações no processo de socialização da criança, motivadas pela ineficácia na conduta educacional ministrada pelos pais, que falharam em não impor limites e estabelecer limites à criança, seja por conseqüência da falta de uma supervisão mais próxima, ou seja, por negligenciar eventuais faltas de comportamento da criança, não impondo relativas punições à mesma, endossando assim o seu comportamento egoísta. Como resultante da má-formação desse mecanismo de autocontrole, o indivíduo, a partir da adolescência, passa a exibir uma persistente tendência de agir baseado exclusivamente em seus próprios interesses, com vistas à obtenção do prazer no curto prazo, sem considerar, contudo, eventuais conseqüências de longo prazo e os impactos de suas ações sobre terceiros99.

Essa teoria vem para suprir as falhas existentes em outras abordagens que associam a criminalidade a fatores como desemprego, pobreza, discriminação racial e falta de oportunidade social-econômica100. Viapiana (2006) analisa que a teoria do autocontrole se distancia das teorias ditas sociais e se aproxima da teoria econômica do crime pelo aspecto da “escolha racional”.

O ponto central da teoria do autocontrole é que existe um elemento comum em todos os atos desviantes e / ou crimes, sejam eles leves ou graves, que consiste precisamente na existência de um agressor não contido, disposto a correr o risco de arcar com custos de longo prazo em troca de benefícios pessoais imediatos. Não existe diferença nos benefícios desejados; afinal, todos almejam as mesmas coisas – dinheiro, poder, bens materiais, sexo, enfim (p. 109).

Para obter os benefícios almejados, algumas pessoas se utilizam do desenvolvimento de habilidades através da educação e esforço próprio, já outras pessoas não conseguem esperar o tempo necessário de maturação e preferem obter os benefícios de forma mais rápida e fácil. As pessoas que agem desta última forma pouco consideram os resultados a longo prazo, ou seja, são pessoas de baixo

98

Diversos tipos de drogas, fumo, prática de jogos de azar, promiscuidade sexual, alcoolismo, entre outros.

99

Conforme Cerqueira e Lobão (2003, p. 9 e 10). 100

“Gibbs, Giever e Martin (1998), Arnekley et alii (1993) e Polakowski (1994) foram alguns dos estudos que mais se notabilizaram nesse campo, tendo os autores encontrado sempre, ainda que parcialmente, evidências a favor da teoria do autocontrole para explicar a delinqüência”, (Ibid. p. 10).

autocontrole, ou ainda, não consideram que são adultas e muitas vezes agem como crianças101. Então a diferença básica localiza-se nos meios legítimos ou ilegítimos de obter os benefícios desejados, ou seja, no longo ou curto prazo.

Michael Gottfredson e Travis Hirschi (apud Viapiana, 2006) apresentam um conjunto de características comuns no comportamento e perfil dos criminosos, são as seguintes:

¾ Os indivíduos mantêm ao longo da vida variações nas taxas de criminalidade – significa que os criminosos têm baixa probabilidade de deixar de cometer crimes. ¾ Geralmente os programas de tratamento de delinqüentes não resultam em

sucesso – ênfase no sistema carcerário.

¾ Penas mais severas teriam pouca eficácia – conclusão por demais questionada, pois existem vários exemplos que aplicação de penas mais severas reduzem taxas de crimes102.

¾ Existe uma tendência de a taxa de crimes reduzir como o passar dos anos do delinqüente – laços familiares, capacidade física, menor tendência ao perigo. ¾ Uso de drogas lícitas e ilícitas – crimes e drogas não costumam andar em

direções opostas.

¾ Possuem fracos vínculos com família, escola, sociedade.

¾ Um olhar mais efetivo para a instituição família pode ser a saída da porta de entrada do crime.

A teoria do autocontrole analisa que o crime pode ser conseqüência da ausência de controle na fase da infância e pré-adolescência, sem deixar de considerar a opção racional do indivíduo. Uma outra abordagem sobre condutas desviantes é conhecida como teoria da anomia, uma das mais tradicionais explicações a respeito do comportamento criminoso, analisada no próximo item.

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“ O autocontrole é em parte natural e em parte adquirido e aprendido socialmente. Quando ainda são pequenas, as pessoas aprendem por meios naturais que é preciso ter cuidado com o fogão com subir em mesas, cadeiras, sofás e escadas, com energia elétrica e com piscinas, rios ou lagos, enfim, com situações nas quais ela mesma, por si só, vai percebendo os riscos e perigos. Por exemplo, quando a criança é pequena ela pode mentir, usar a força contra um coleguinha da escola, furtar um brinquedo, sem que tenha consciência de que tais atitudes sejam erradas ou más. No entanto, a partir de uma certa idade, 7 ou 8 anos, ela vai percebendo que tais atitudes não são mais aceitas como naturais e implicam reprovação. É precisamente nessa idade que ela começa a controlar seus atos” (Viapiana, 2006, p. 110).

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