• Nenhum resultado encontrado

1. Ensino Superior e Terapia Ocupacional

1.5. Terapia Ocupacional Social

A Terapia Ocupacional Social, enquanto uma área específica de atuação e de produção de conhecimento na terapia ocupacional, teve seus primeiros contornos na década de 1970, por meio do questionamento de alguns profissionais, a partir dos processos sociais da época6, do seu papel social como técnico na sociedade, assim como pelas contradições da sociedade capitalista, estruturalmente desigual (BARROS et al., 2007), e dos limites impostos pela forma reducionista do modelo biomédico em saúde, com foco no indivíduo, visto como fragmentável em partes constitutivas de um todo, sem considerar a suas interdependências e a influência dos contextos sociais no qual esses indivíduos estão inseridos (SOARES, 1991).

A inserção dos seus conteúdos nos currículos dos cursos de graduação em terapia ocupacional do Brasil variou desde então. Já em meados da década de 1970,

6 Luta pela redemocratização do país, que estava sob a repressão do regime militar e a luta pelos direitos de populações marginalizadas e segredadas, em especial o movimento pela Reforma Sanitária, pela Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial, Movimento das Pessoas Portadoras de Deficiência e do Movimento de Mulheres que congregavam parte dos profissionais.

51 alguns cursos desenvolviam disciplinas específicas, contudo, com a emergência da discussão no interior da profissão acerca das correntes metodológicas, levantou-se um debate intenso em toda a terapia ocupacional, o que rebateu negativamente na terapia ocupacional social, que foi “considerada uma redundância na medida em que toda terapia era tida como social, mesmo que sob perspectivas filosóficas distintas” (BARROS, et al., 2007, p.350), o que levou à extinção das disciplinas específicas da área em muitos cursos que com elas contavam e à incorporação de parte de seus conteúdos em outras (BARROS et al, 2007; PINTO, 1990).

O processo de reconhecimento da terapia ocupacional social como um campo específico de atuação teve forte impulso em meados da década de 1990, com grande investimento de docentes da terapia ocupacional, apresentando como ponto de destaque o afastamento do campo da saúde e, portanto, dos processos saúde-doença e de sua mediação nos processos de intervenção (BARROS et al., 2007).

Um fato determinante para a consolidação da área foi a criação do Projeto Metuia, por meio de parcerias entre docentes dos cursos de graduação em terapia ocupacional da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUCCamp), que vinham investindo nessa área em suas instituições, com o objetivo inicial de se constituir enquanto um grupo interinstitucional de estudos, formação e ações pela cidadania de crianças, adolescentes e adultos em processos de ruptura das redes sociais de suporte (BARROS et al., 2002). Isso possibilitou pautar o debate acerca de um campo até então minoritário na terapia ocupacional, assim como a articulação para o desenvolvimento de pesquisas e atividades voltadas para a formação (LOPES, PAN, 2012).

O campo social compõe um espaço em que as ações se desenvolvem em dois âmbitos: no campo, que tem um caráter mais geral e interdisciplinar e nos núcleos, com as atuações específicas de determinadas áreas (MALFITANO, 2005). A terapia ocupacional, portanto, se constitui enquanto um núcleo de saber dentro desse campo.

52 Desta forma,

o campo social implica em uma leitura da realidade e da problemática expressa pela pessoa que só se alcança através de recorte metodológico específico, que seja capaz de revelar e interagir com aquilo que se oculta em manifestações que apenas de forma superficial e reducionista podem ser vistas como restritas ao indivíduo. É preciso trabalhar e desenvolver instrumentos para a interpretação da realidade pessoal-social e, também, guias para a atuação em um universo complexo de interações e interconexões(BARROS et al., 2002).

A terapia ocupacional social se propõe a trabalhar, tomando os problemas, as características e as necessidades concretas dos sujeitos, individuais e coletivos, para os quais se direciona (BARROS et al., 2007), estabelecendo ações para aqueles cujas demandas emergem da sua condição de exclusão do acesso aos bens sociais e pelo agravamento das condições de vida a que estão submetidos (GALHEIGO, 2003).

Compreende-se, do ponto de vista sociológico, o estado de vulnerabilidade social, conforme proposto por Castel (1997), como um fenômeno produzido pela conjunção da precaridade do trabalho, frente à estrutura econômica desigual, com a fragilidade do vínculo social. Dessa maneira, intervenções que se direcionem ao mundo do trabalho, bem como a constituição de ações que fortaleçam as redes pessoais e coletivas dos sujeitos, são fundamentais para lidar com processos de rupturas sociais que decorrem desse ordenamento (BARROS et al., 2002).

O trabalho no campo social implica em demandas específicas para a formação profissional, assim, na medida em que este se torna um campo de intervenção também da terapia ocupacional, como consequência da crescente relevância das questões socias no mundo contemporâneo, tem sido necessário pautá-lo nos cursos de graduação, pós-graduação e na produção de conhecimento na área (LOPES et al., 2010).

A terapia ocupacional social atualmente passa por um processo de maior reconhecimento tanto no interior da profissão, como também por outros profissionais. Dois grandes exemplos disso são a Resolução Nº 383/2010 do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO) que reconhece o campo social como

53 uma das possíveis áreas de atuação do terapeuta ocupacional e a Resolução Nº 17/2011 do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), que estabelece o terapeuta ocupacional como um dos profissionais que podem vir a compor a equipe básica, tanto na atenção das especificidades dos serviços socioassistenciais como na gestão do Sistema Único de Assistência Social (SUAS).

Contudo, em pesquisa realizada entre os anos de 2010 e 2011 acerca do ensino de terapia ocupacional social nas universidades públicas do estado de São Paulo, instituições de referência para a terapia ocupacional, verificou-se que, embora suas temáticas estivessem presentes em todos os cursos, isso se dava de forma muito diferente entre eles, especialmente no que tange a: carga horária, número de disciplinas, conteúdos abordados, recursos humanos destinados especificamente à área, distribuição ao longo da graduação e articulação efetiva com o perfil do profissional que se pretende formar. A falta de recursos humanos especialmente dedicados a esse campo também foi um problema encontrado; por conta disso, embora não apenas, foram observadas dificuldades conceituais relativas à área, tanto no aspecto teórico quanto prático, o que pode não satisfazer as exigências postas para a formação profissional na graduação (LOPES, PAN, 2012).

Na medida em que o terapeuta ocupacional é cada vez mais solicitado para atuar em torno de demandas que circunscrevem o campo social, é indiscutível a necessidade de que os cursos de graduação em terapia ocupacional do país ofereçam os conteúdos básicos para a formação de profissionais capacitados para tais ações.

Sendo assim, este estudo objetivou, de forma geral, descrever o ensino na área da terapia ocupacional, ao nível de graduação, no sistema federal de ensino superior, buscando compreender o processo de implantação e o rebatimento das atuais políticas de ensino superior, em especial o REUNI e o Pró-Saúde, para os Cursos de Graduação em Terapia Ocupacional das Instituições Federais de Ensino Superior e para os seus respectivos Projetos Político-Pedagógicos, traçando um panorama geral de como vem sendo desenvolvido o ensino de terapia ocupacional

54 nessas instituições, desde esse enfoque, bem como identificar a discussão explicita, por meio de conteúdos curriculares, na graduação acerca da terapia ocupacional social em particular.

55

Documentos relacionados