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4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.5. Testes-desafio a agentes antimicrobianos

De acordo com a metodologia APPCC, dentre os microrganismos que permaneceram na lista é preciso saber qual deles é destruído durante o processamento. Para investigar a eficiência do processamento ou resistência dos microrganismos aos sanitizantes utilizados nos restaurantes foram realizados os testes de desafio microbiológico.

4.5.1. Avaliação da concentração dos princípios ativos dos sanitizantes químicos utilizados nos restaurantes comerciais

As análises titulométricas revelaram a concentração dos princípios ativos:

a) A solução preparada a partir de dicloroisocianurato de sódio apresentou 170 mg·L-1de CRT, expressos em Cl

2, pH de 6,13 a 25,7 °C.

b) A solução de vinagre apresentou ácido acético na concentração de 0,16%, expressos em HAc, pH 3,06 a 25,3 °C.

c) O vinagre escuro, da marca Toscano, usado nos restaurantes, apresentou ácido acético na concentração de 4,5%, expressos em HAc, pH 2,30 a 24,3 °C.

As soluções sanitizantes utilizadas nos restaurantes foram preparadas a partir de dicloroisocianurato de sódio, da marca Nippo-clor. Os colaboradores prepararam a solução conforme recomendação da embalagem do produto. A água foi medida com um recipiente graduado e a cloramina em pó medida em copo fornecido pelo fabricante. A solução de ácido acético foi preparada com vinagre escuro, da marca Toscano, o mesmo

utilizado nas preparações culinárias do restaurante. A água foi coletada em uma bacia e o vinagre adicionado, sem medida.

Os resultados das concentrações desses princípios ativos serviram de base para os estudos que se seguiram, como proposto pela metodologia de análises de perigos para os testes-desafio.

4.5.2. Eficiência de soluções de ácido acético adicionado de cloreto de sódio sobre células planctônicas de Escherichia coli, Cronobacter sakazakii e Klebsiella pneumoniae avaliada pelo teste da suspensão

As soluções sanitizantes avaliadas não apresentaram diferenças significativas (p≥ 0,05) nas médias das reduções decimais (RD) de células planctônicas de E. coli. Em média, as soluções testadas reduziram a população inicial desse microrganismo em 0,60 ciclo log (Figura 28). No entanto, as médias das RD nas populações de células planctônicas de C. sakazakii e de K. pneumoniae indicaram diferença significativa (p < 0,05), entre os mesmos tratamentos (p < 0,05).

Resultados do teste de suspensão

0,56(ns) 0,79(ns) 0,68(ns) 0,70(ns) 0,40(ns) 0,45(ns) 1,68(ab) 1,85(a) 1,23(bc) 0,96(c) 0,82(c) 0,86(c) 0,71(bc) 0,67(bc) 0,54(c) 0,74(bc) 1,73(a) 1,49(ab) 0,00 0,50 1,00 1,50 2,00

NaCl (0%) NaCl (0,5%) NaCl (1%) NaCl (1,25%) NaCl (1,5%) NaCl (2%)

Ácido Acético (2%) Ácido Acético (1,5%) Ácido Acético (1%) Ácido Acético (0,75%) Ácido Acético (0,5%) Ácido Acético (0%) Tratamentos R e d u ç õ e s d e c im a is (l o g U F C )

E. coli C. sakazakii K. pneumoniae

Figura 28 - Reduções decimais em populações de células planctônicas de Escherichia coli,

Cronobacter sakazakii e Klebsiella pneumoniae, após exposição a soluções de

vinagre acrescentadas ou não de cloreto de sódio, realizadas pelo teste da suspensão. As barras representam os desvios-padrão da média. Médias seguidas pela mesma letra não diferem entre si pelo teste de Tukey.

A solução de ácido acético 2% foi a que reduziu em 1,85 ciclos log, sobre C.

sakazakii, sendo estatisticamente igual ao tratamento de ácido acético 1,5% e cloreto de

sódio 0,5% sobre as células planctônicas de K. pneumoniae. As médias das reduções com os demais tratamentos foram diferentes e inferiores. Portanto, a solução contendo ácido acético 1,5% e cloreto de sódio 0,5% foi escolhida para o teste em que a inativação será realizada com os microrganismos aderidos à alface.

Porém, os sanitizantes à base de vinagre e de cloreto de sódio não foram aprovados pelo teste de suspensão, cujo objetivo é de reduzir a população inicial em 99,999%. Fatores inerentes à resistência fisiológica das próprias linhagens bacterianas testadas podem ter contribuído para a reprovação das soluções sanitizantes quanto à eficácia microbiana.

Tanto as linhagens patogênicas quanto as não patogênicas da bactéria E. coli têm capacidade inerente de sobreviver ao estresse ácido. As linhagens patogênicas são substancialmente mais resistentes a esse estresse do que a outros. Muitos microrganismos possuem uma resposta adaptativa que lhes confere a capacidade de sobreviver a ambientes extremamente ácidos. Este mecanismo denominado resposta de tolerância a ácidos está bem caracterizado para E. coli. Estudos demonstraram que a exposição a um pH que causa injúria subletal induz a expressão de numerosas proteínas do choque ácido que promove a sobrevivência bacteriana em subsequentes ambientes extremamente ácidos. Tais sistemas de tolerância a ácidos estão presentes em bactérias Gram-positivas e Gram-negativas e, atualmente, há aumentada evidência de que esta resposta ao estresse ácido é um importante componente da sobrevivência de patógenos bacterianos dentro do nicho que é o organismo do hospedeiro (MERREL; CAMILI, 2002).

Arnold et al. (2001) identificaram 26 genes induzidos após a exposição ao acetato. Dentre eles, estão muitos fatores regulados pelo regulon RpoS, incluindo cfa, que codifica uma ATP sintase F0F1. Ácidos graxos ciclopropanos são os principais componentes dos fosfolipídios de E. coli e um importante componente da resistência a ácido.

Outros componentes identificados incluíram uma porina de membrana denominada OmpC, que tem a função de proteção uma vez que regula a passagem de algumas moléculas através da membrana externa bacteriana, e Slp, uma lipoproteína de membrana que induz as células a entrarem na fase estacionária. Nesse estado, ocorrem importantes mudanças fisiológicas que permitem a célula sobreviver a uma variedade de estresses ambientais, como o osmótico e a radiação ultravioleta (ALEXANDER; ST. JOHN, 1994).

As informações da cinética de inativação de C.Sakazakii foram resultados dos experimentos de Edelson-Mammel, Porteous e Buchanan (2006). Os autores indicaram que a capacidade de C. sakazakii de tolerar condições ambientais ácidas é fortemente

dependente do pH. Das 12 linhagens testadas por eles, quase todas toleraram o desafio de sobreviver em caldo TSB acidificado por 5 h. Quando expostas ao pH 3,5, a redução no número de células viáveis foi de 0,5 log UFC·mL-1em 10 linhagens e 1,1 log UFC·mL-1 e 3,5 log UFC·mL-1 para outras duas linhagens. Porém, a exposição ao pH 3,0 produziu perda da viabilidade maior e mais rápida, e as 12 linhagens testadas apresentaram RD > 6 log UFC·mL-1. Dois tipos da cinética de inativação ficaram aparentes. As linhagens mais resistentes apresentaram redução logarítmica linear durante o período de exposição testado. Já as linhagens menos resistentes apresentaram inativação muito rápida na primeira 1 h de exposição, seguido de um lento declínio da população sobrevivente. Houve diferença na sobrevivência em pH 3,0 e pH 3,5 com diversidade de resistência ao pH ácido entre as linhagens. Concluíram que C. sakazakii pode ser classificada como uma Enterobacteriaceae moderadamente resistente a ácido.

Quando comparada a outros patógenos, C.Sakazakii é menos resistente a ácido que Escherichia coli enterohemorrágica, conforme informado por Buchanan e Edelson (1999), e que Listeria monocytogenes, também informado por Buchanan e Golden (1998). De acordo com Tetteh e Beuchat (2003a), a resistência de C.Sakazakii aos ácidos é similar à de Shigella flexneri, e é similar à resistência da Salmonella spp, informada por Gorden e Small (1993). Porém, é mais resistente que Vibrio

parahaemolyticus, de acordo com as pesquisas de Wong e Wang (2004).

O mecanismo, ou vários deles, que confere resistência aos ácidos não foi ainda bem elucidado. Supostamente é o mesmo observado em outras bactérias da família

Enterobacteriaceae(EDELSON-MAMMEL; PORTEOUS; BUCHANAN, 2006).

Quanto à inativação de K. pneumoniae, os dados são escassos. Caetano (2003) observou que K. pneumoniae não cresceu em dietas com pH 3,9. Porém, o pesquisador não informou dados sobre reduções na população inicial inoculada na dieta enteral investigada.

4.5.3. Avaliação da eficiência da água e de soluções sanitizantes em reduzir populações de células de Escherichia coli, Cronobacter sakazakii e Klebsiella pneumoniae aderidas à alface

A ação antimicrobiana das soluções do composto clorado orgânico e do ácido acético a 1,5%, acrescentada de 0,5% de cloreto de sódio, apresentou diferenças (p < 0,05) em comparação com a higienização somente com água (Figura 29). No entanto, não foi observada diferença entre a ação da água e da solução de ácido acético a 1,5%. Nenhuma solução sanitizante atingiu 3 RD na população microbiana, conforme recomendado para células sésseis (MOSTELER; BHISHOP, 1993).

Ação de sanitizantes sobre enterobactérias aderidas à folha de alface 1,28(ab) 1,77(b) 1,11(a) 1,15(a) 1,26(ab) 0,92(a) 1,93(b) 1,90(b) 0,58(a) 1,95(b) 1,53(ab) 1,86(b) 0 0,5 1 1,5 2 2,5

Água Cloramina Ácido Acético (1,5%) Ácido Acético (1,5%) + NaCl (0,5%) Tratamentos R e d u ço es d ec im ai s (l o g U F C )

E. coli C. sakazakii K. pneumoniae

Figura 29 - Reduções decimais em populações de Escherichia coli, Cronobacter sakazakii e

Klebsiella pneumoniae aderidas em folha de alface devido à ação da água e de

sanitizantes químicos. As barras representam o desvio-padrão da média. Médias seguidas pela mesma letra não diferem entre si pelo teste de Tukey (p≥ 0,05).

Foi avaliada também a resistência entre bactérias E. coli, C. sakazakii e K.

pneumoniaeaderidas à folha de alface em relação aos mesmos tratamentos. A análise

de variância das médias das reduções decimais proporcionados pelos tratamentos não identificou diferença (p ≥ 0,05) na resistência dos diferentes gêneros de bactérias em relação ao mesmo tratamento.

Concentrações de cloro residual mais elevada que a usada nesse experimento poderia ser uma alternativa para aumentar a ação antimicrobiana. No entanto, tratamentos com dosagens de cloro mais altas podem causar modificações nas qualidades sensoriais da alface, como alteração de cor, gosto e odor, limitando o uso para aplicações imediatamente antes do consumo. Hortaliças com tecidos delicados, por exemplo, a alface, não suportam tratamentos com concentrações de cloro residual elevadas. Além disso, as recomendações para uso seguro em frutas e hortaliças frescas são de 50 a 200 mg·L-1(FDA, 2001).

Deve-se ressaltar que a solução de ácido acético a 1,5% mostrou-se de baixa eficácia no controle dos microrganismos aderidos. Além disso, a adição de 0,5% de cloreto de sódio à solução de ácido 1,5% aumentou reduções decimais durante inativação, à semelhança de outras pesquisas. Tsujihata et al. (1998) informaram que soluções combinadas de ácido acético e cloreto de sódio tinham efeito sinérgico e eram capazes de inativar células planctônicas de E. coli O 157:H7, reconhecida por ser

extremamente resistente a ácidos orgânicos. Combinação semelhante à utilizada pelo autor foi testada e demonstrou ter ação sinérgica em inativar C. sakazakii e K.

pneumoniae. No entanto, não foi eficaz contra E. coli do tipo 1. O fato de E. coli ser

inerentemente mais resistente refletiu em menor redução decimal de sua população. O cloreto de sódio, quando adicionado ao vinagre, sensibiliza as enterobactérias à ação dos ácidos orgânicos. Para homeostase interna, os níveis citoplasmáticos de íons Na+precisam ser mantidos baixos ou o crescimento cessa. Os mecanismos de expulsão ativa, que operam sob essas condições, envolvem antiporters NhaA e NhaB, que exportam íons Na+ com o concomitante influxo de íons H+ e são dependentes da força próton motora, isto é, com gasto de energia. O poro NhaA é induzido pelos íons sódio e é regulado em nível transcricional pela proteína NhaR. Já o poro NhaB não é afetado pelos níveis de íons Na+, e sua síntese não é regulada pela proteína NhaR. Desde que esses antiporters catalisem a entrada de H+ associado com efluxo de Na+, é possível que a sensibilidade a ácido dos organismos expostos ao NaCl pode envolver mudanças no funcionamento dos antiporters (ROWBURY; GOODSON; HUMPREY, 1994).

A maioria dos tratamentos com ácido acético, considerados eficazes em reduzir populações de microrganismos aderidas em hortaliças, utilizou-o em concentrações altas. Por exemplo, a população de Y. enterocolítica inoculada em salsa foi reduzida em mais que 7 log UFC g-1 após a tratamento de 15 min em soluções de 2% de ácido acético (KARAPINAR; GONUL, 1992a). Também o tratamento de folhas de salsa inteiras por 5 minutos a 21 °C com vinagre 7,6% reduziu a população de S. sonnei mais que 6 log UFC·g-1(WU et al., 2000).

4.6.Cinética

de

inativação

de

Klebsiella

pneumoniae

com

soluções