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2 SAEB 015

5.1 O contexto da pesquisa colaborativa

5.1.5 Texto literário selecionado

PROSA – NARRATIVA FICCIONAL

A discussão sobre a qualidade estética de uma obra sempre está atrelada ao valor literário que ela possui. É razoável pensar que todo docente de Língua Portuguesa tenha experimentado os mais diversos tipos de leitura, inclusive da literatura clássica, compondo, assim, sua escala valorativa do que é clássico, popular e até sem valor literário. O gosto pela literatura clássica, de certa maneira, faz com que professores optem por trabalhar com esse nível de leitura, porque entendem que os estudantes devem ter a “formação leitora de qualidade” e isso só é ´possível com a leitura de clássicos da literatura. Todavia, alguns teóricos discutem essa “ formação de qualidade” como única possibilidade de formar leitores, levando em consideração que a compreensão do contexto de circulação de obras clássicas, do vocabulário, das tramas e o reconhecimento da qualidade ficcional de um clássico da literatura demandam construção de um background que pode e deve levar em consideração, como início de formação, as obras mais populares e de gosto dos estudantes.

Nessa perspectiva, Fontão (2010, p.187) problematiza que

[...] Se pensarmos a escola do passado e a escola contemporânea, vamos perceber que o desenvolvimento de um leitor proficiente não se faz somente com um tipo de texto e sim com um conjunto de livros e textos que apresentam linguagens variadas, como também variados devem ser os métodos de desenvolvimento de leitura. No entanto, parece que fica evidente, também, o fato de que não basta ao aluno ler um clássico ou mesmo um livro didático que traga fragmentos de textos de obras-primas da literatura universal e brasileira, mas sim ler pelo gosto do ler, pela aventura do ler, pelo desejo de penetrar no mundo da leitura daquele determinado texto, daquela determinada história, apreendendo sobre a estética, as regras, características e parâmetros, a fim de descortinar e sanar o nível de dificuldade em realizar a leitura de diferentes gêneros textuais, produzir e interpretar textos. São dificuldades como estas que assombram os estudantes e professores em todos os níveis de ensino neste país, desde o século passado até nossos dias.

Assim, a obra Mistério do Cinco Estrelas (2005) embora não seja considerada “clássico da literatura moderna” reúne qualidade narrativa e ficcional que dialoga com a idade

dos estudantes em que será ofertada (adolescentes entre 13 e 15 anos). Tem personagens adolescentes, o que permite identificação do leitor com a obra; conflitos do primeiro amor; dificuldades para conseguir o primeiro emprego; um assassinato, acusações injustas contra um jovem humilde e a reunião de jovens amigos para provar a inocência do protagonista da história. Pensamos que esse seja um bom texto para despertar o prazer da leitura, o envolvimento do jovem leitor, estimular o posicionamento crítico frente aos temas propostos.

Nesse bojo, Fontão (2010, p.188) discute que

[...] podemos trabalhar com os clássicos, com o cânone e com os textos mais consagrados da literatura brasileira e universal tornando a aula mais atraente, sem, no entanto, desconsiderar a literatura local, regional e o fazer do estudante. Os clássicos seriam a base, o fundamento para o estudo e o aprendizado, o campo fértil para a construção da intelectualidade em conhecimento de textos e obras da Literatura dita de valor[...]

Assim, é importante lembrar que a formação leitora não deve ser constituída apenas de grandes obras literárias, posto que cada leitor estabelece seu cânone. Nesse contexto, Abreu (2006) reflete que:

[...] as obras literárias conduzem à identificação com personagens e cenas fazendo que, ao final da leitura, sejamos pessoas mais experientes, mais sensatas, mais justas. Como em geral, os leitores são levados a se identificar com personagens fracos, sofredores ou perseguidos, a experiência da leitura literária nos torna mais humanos, desenvolvendo nossa solidariedade, nossa capacidade de admitir a existência de outros pontos de vista além do nosso, nosso discernimento acerca da realidade social e humana [...] (ABREU,2006,p.81)

Ainda conforme Abreu (2006), é preferível trabalhar uma obra por bimestre, em que se discuta, problematize, estimule a interação do leitor com a obra em vez de usar exclusivamente o livro didático. De maneira geral, esse suporte geralmente traz trechos de textos literários, o que de certa forma compromete a compreensão global do texto, além de serem usados meramente para localizar informações na superfície do texto, ou mesmo usar como pretexto de letramento gramatical. Dessa forma, nossa tese é que o texto escolhido para dar início à formação leitora não precisa ser um “clássico da literatura”. Precisa, antes, dialogar com o contexto em que os estudantes estejam inseridos.

Bordini e Aguiar (1988), nessa esfera, propõem uma prática de leitura que esteja calcada na obra literária e dizem que essa obra

[...]pode ser entendida como uma tomada de consciência do mundo concreto que se caracteriza pelo sentido humano dado a esse mundo pelo autor. Assim, não é um mero reflexo na mente, que se traduz em palavras, mas o resultado de uma interação ao mesmo tempo receptiva e criadora. Essa interação se processa através da mediação da linguagem verbal, escrita ou

falada. O texto produzido, graças a essa natureza verbal, permite o estabelecimento de trocas comunicativas dentro dos grupos sociais, pondo em circulação esse sentido humano. (AGUIAR, BORDINI, 1988, p. 14).

O sentido humano que a literatura se presta a promover, através da leitura literária, precisa de práticas significativas que viabilizem esse ideal. Ao trabalhar com a narrativa ficcional contemporânea O Mistério do Cinco Estrelas pretendemos justamente abordar as questões familiares e sociais, como por exemplo a questão das dificuldades financeiras da família brasileira que leva o adolescente a procurar emprego para ajudar nas despesas em casa, a importância de dizer sempre a verdade, ser honesto e firme, mesmo diante de injustiças sociais. Com base nisso, buscamos confirmar o que Cândido ensina sobre o papel humanizador da literatura, visto que ela “(...) confirma e nega, propõe e denuncia, apoia e combate, fornecendo a possibilidade de vivermos dialeticamente os problemas” (1995, p. 243).

Desse jeito, entendemos que o desafio de trabalhar com uma narrativa ficcional longa esbarre em vários empecilhos que vão desde a quantidade de livros para toda a turma, condições de empréstimo na biblioteca escola, tempo e local em que se realiza essa leitura e mesmo, quanto à motivação para realizar essa atividade.