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Tipo de aula que os alunos valorizam/querem

Parte I Discussão teórica sobre o tema

4. Pesquisas sobre adolescentes e o ensino médio no Brasil

4.2 Tipo de aula que os alunos valorizam/querem

Nos trabalhos de Spósito e Galvão (2004), Caierão (2008), Silva (2007), Zan (2005) e no relatório final da ONG Ação Educativa, os alunos indicam ter maior interesse por aulas que transmitem conteúdos mais relacionados às suas vidas. Os jovens pesquisados apontam para esse dado de diversas formas: reivindicando mais aulas práticas e de laboratório, pedindo para ―ser situados na matéria‖ (SPÓSITO; GALVÃO, 2004), para que as aulas não sejam apenas cópia de conteúdos dados pelos professores etc.

Silva (2007) – que investiga como os alunos se colocam em relação às aulas consideradas inovadoras por seus professores – aponta que a maioria dos alunos considera que ―‗aula diferente‘ é a prática pensada como mediadora de recuperação da autoestima, restabelecedora da confiança, do diálogo e do comprometimento dos diferentes sujeitos com o projeto político-pedagógico‖ (p.6). Os estudantes consideram essa aula como possibilitadora de uma relação educativa, como algo que dá sentido ao seu cotidiano escolar. ―Aprender a falar, a ouvir, a conviver, a dialogar e a construir outras relações também educativas, enfim, seus processos de escolarização passam por novas leituras e possibilidades‖. (p. 11). Os estudantes também argumentam que durante as aulas com esse formato eles se sentem mais confiantes, pois podem se colocar e ser ouvidos, além de acreditarem que esses espaços auxiliam na formação de suas identidades, pois afirmam que, ao ouvir outros colegas falando, percebem que existem outras pessoas passando por situações semelhantes às suas:

Então, o jovem estudante é possuidor de uma identidade singular que o caracteriza como um ser único, porém inserido em uma coletividade específica – a saber, a escola – e, portanto, também possuidor de uma identidade coletiva com características comuns. Ele está, então, jovem e estudante (p. 12).

Caierão (2008), Zan (2005) e o relatório da Ação Educativa (2007) fazem considerações no mesmo sentido da tese de Silva (2007), mostrando que os adolescentes afirmam gostar de aprender quando conseguem entender a lógica das matérias, quando

conseguem utilizar o que aprenderam no trabalho e ainda que aproveitam as aulas ―que saem da rotina‖ (inclusive feiras de exposição de trabalhos) e laboratórios. O relatório da Ação Educativa mostra que, quando perguntados em relação ao que poderia melhor seu aprendizado, os alunos também se referem à forma como as aulas são ministradas, considerando que a aprendizagem poderia ser auxiliada com aulas mais práticas (19%), em laboratórios (32%) e se abordassem temas mais interessantes para os alunos (12%). Os estudantes ainda sugerem que a realização de mais avaliações (12%) e maior proximidade entre alunos e professores (9%) poderiam auxiliar no aprendizado (p. 41). Os adolescentes observam também que, para possibilitar o desenvolvimento de atitudes e de autonomia para tomada de decisões, a escola precisaria reformular sua metodologia. Os alunos:

[...] aliam a formação para a vida à necessária inovação metodológica, mostrando que o modelo escolar atual não é compatível com uma educação ―para a vida e a cidadania‖. As mudanças nas metodologias, nas formas de educar, seriam um pré- requisito para a formação do jovem como cidadão, seja no desenvolvimento de suas habilidades para o mundo do trabalho, seja na sua continuidade dos estudos, ou seja, ainda, na sua relação com as pessoas e com os pressupostos morais, éticos e políticos que regem as relações da sociedade. (p. 85)

Spósito e Galvão (2004) ressaltam, no entanto, que o pedido dos alunos não parece se restringir a tentar adaptar os conteúdos ao seu cotidiano:

O estabelecimento de relações entre a matéria e o dia a dia apareceu como recurso valorizado, como completa a aluna ao dizer que o professor ―deveria fazer conexões entre as matérias e a vida cotidiana dos alunos‖. Mas parece ser menos com o sentido de aplicação prática e mais com o de implicar, relacionar, de se colocar dentro e poder entender o que aquilo tem a ver com cada um (CHARLOT, 2001) . Nesta demanda, os jovens explicitavam a necessidade de subjetivação do conhecimento para sua efetiva apropriação e de que os professores os ajudassem a ―transformar o conhecimento em caso pessoal‖ (DANTAS, 1999), transformação fundamental para cobrir o fosso que separa o reconhecimento da importância que o estudo tem para o futuro e a falta de sentido que, para muitos, ele tem no presente. Passagens das entrevistas ilustram o quanto a apropriação do conhecimento pode ir além da constatação de que encerra uma utilidade na vida prática. (SPÓSITO, GALVÃO, 2004, p. 363)

Ainda no mesmo estudo, os alunos se referem a aulas descontraídas em oposição às monótonas e repetitivas. Os adolescentes relatam que as aulas em que são obrigados a realizar o mesmo exercício diversas vezes dificultam seu envolvimento com a matéria. Discussões e debates foram valorizados pelos jovens, que se mostram ávidos a expor seus pensamentos para os professores e colegas. Porém, os alunos percebem que as aulas descontraídas podem virar aulas muito bagunçadas, criticando professores ―liberais‖ demais por permitirem essa situação:

Do mesmo modo que pediam que alguém os ajudasse a ‗se situarem na matéria‘ pareciam demandar que alguém propusesse alguns limites, pois, entregues à dinâmica própria do grupo, não conseguiriam se dirigir para aquilo que ao mesmo tempo buscam e lhes escapa – o conhecimento. (SPÓSITO, GALVÃO, 2004, p. 366)

A forma de dar as aulas parece estar intimamente relacionada com a questão da relação professor-aluno, como aponta o relatório da Ação Educativa (2007), ao indicar que os jovens pesquisados atribuem aos professores a responsabilidade de dar aulas mais dinâmicas e práticas:

É provável que estas duas dimensões estejam bastante associadas, afinal, metodologias mais ativas e dinâmicas geralmente implicam a aproximação das pessoas, que passam a trabalhar em conjunto, se conhecer melhor, perceber potencialidades e limites de cada um, gerando mais envolvimento e comprometimento de todos. Assim, a demanda por outras metodologias imbrica-se à demanda por uma relação professor-aluno mais próxima e dialogada. (AÇÃO EDUCATIVA, 2007, p. 42)

Podemos salientar ainda que na tese de Silva (2007), um pequeno número de alunos considerou que as aulas com mais diálogo, debates e exercícios práticos eram desnecessárias para seu aprendizado, considerando que essas aulas ocupam tempo em que poderiam estar estudando conteúdos que lhes serão cobrados posteriormente. (concepção tradicional de educação: ouvir e copiar).

Alguns alunos estudados por Spósito e Galvão (2004) argumentam que o seu envolvimento com o que é transmitido na escola se dá apenas para que possam obter o diploma, enquanto outros conseguem ir mais além e se apóiam ―no conhecimento para o seu processo de subjetivação‖ (SPÓSITO; GALVÃO, 2004, p.17). O grupo de alunos que disse sentir prazer em aprender acredita que esse processo não se reduz a decorar conteúdos cobrados pelas avaliações e pedem para ―se situar na matéria‖, o que se refere à compreensão de como o que é aprendido se relaciona com a vida dos estudantes, não apenas no que se refere à prática, mas à possibilidade de estudar conteúdos que façam parte da história deles.