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TIPO DE ESTUDO E TÉCNICAS

No documento Bruna Silva do Nascimento (páginas 79-84)

3 A CONSTRUÇÃO DO CAMPO CIENTÍFICO: TRÊS ARENAS

4.1 TIPO DE ESTUDO E TÉCNICAS

No que concerne ao polo técnico da pesquisa, a tese caracteriza-se pela

exploração do contexto da produção científica brasileira, proveniente dos bolsistas

de produtividade do CNPq, no campo da Educação. Nesse sentido, os estudos de

autoria se propõem a identificar informações acerca do agente principal que constitui

o campo acadêmico: o pesquisador. Assim, os traços significantes intrínsecos à

informação são utilizados como formas de apreensão da realidade observada.

(BRUYNE; HERMAN; SHOUTHEETE, 1977). Eles proporcionam não só uma visão

ampla dessa classe profissional (suas características como gênero, titulação, vínculo

institucional entre outras), mas também permitem a identificação das práticas de

produção científica, bem como facilitam um melhor entendimento do papel e da

influência exercidos pelas agências de fomento no que concerne à distinção dos

pesquisadores por meio da concessão de bolsas de produtividade no contexto de

produção do saber.

Deixando de lado os julgamentos de valor, parece clara a importância de se dispor de uma distribuição que nos informe sobre o número de autores, trabalhos, países ou revistas que existem em cada categoria de produtividade, utilidade ou o que mais desejarmos medir. (SOLLA PRICE, 1976, p. 39).

Para tanto, o estudo analisa a produção científica disponível no currículo

Lattes dos 382 bolsistas de produtividade (ver Apêndice A) distribuídos nos

seguintes estratos: PQ-1 (A, B, C e D), PQ2 e PQ-SR/CNPq do campo da Educação

no Brasil no período de 1990 a 2015. A importância desse tipo de pesquisa está no

fato de que “[...] a identificação dos agentes, dos lugares e da produção de textos

fornece as chaves para o entendimento da forma de realização dessa ideologia

dominante.” (HEY, 2008, p. 48). O conceito de ideologia dominante, utilizado pela

referida autora, reflete sua afiliação com os preceitos bourdiesianos, pois aproxima o

campo político de outros campos como o científico e social. A dominação não se dá

somente por via de mão única, o móbile de Calder – como exposto anteriormente –

permite a representação visual dessa mútua influência entre os campos. Ao propor

uma análise relacional do campo acadêmico da Educação no Brasil acredita-se que

verificar não só a produção científica dos agentes, como também os elos sociais por

eles estabelecidos possibilitará uma ampla compreensão do contexto da pesquisa

em Educação no Brasil. Para tanto, optou-se pela utilização da análise de conjuntura

para não só facilitar a compreensão dos dados quantitativos, mas também – e

principalmente – contextualizar as informações qualitativas inscritas no contexto do

fenômeno.

É sabido que, com o volume de informações veiculadas diariamente, é “´[...]

necessário identificar os ingredientes, os atores [agentes], os interesses em jogo

[enjeux]. Fazer isso é fazer análise de conjuntura.” (SOUZA, 2004, p. 7). Ainda de

acordo com Souza (2004), a técnica de análise de conjuntura promove a interação

entre a descoberta e o conhecimento prévio sobre determinado fato. Nesse sentido,

entende-se que ao escolher trabalhar com a elite do campo da Educação no país

alguns conhecimentos e interpretações antecederam as descobertas por ora

expostas. De maneira nenhuma, pode-se considerar esse saber pregresso como

sinônimo de qualquer tipo de contaminação da pesquisadora com o universo

trabalhado, pelo contrário, o conhecimento prévio permitiu um mergulho mais

profundo nos questionamentos propostos e nas hipóteses levantadas.

A análise de conjuntura é sempre empregada em prol de alguma necessidade

ou interesse, sendo assim, não é neutra ou desinteressada. (SOUZA, 2004). Antes

de algum julgamento de valor, cumpre ressaltar que Ziman (1979) corrobora essa

interpretação, pois o autor acredita que não há ciência neutra. Como preconizar a

neutralidade se ela é fruto da interação humana? Algo feito por e para o ser humano

poderia ser neutro? O que de fato move o interesse dos homens pela Ciência? Para

Ziman (1979) isso se dá de maneira natural e evolutiva, ou melhor, o teórico

compreende a Ciência como algo social, ininterrupto e cumulativo. Amparam-se as

análises realizadas na certeza de que antes da pretensão de uma suposta

neutralidade, busca-se a aproximação com a verdade representada pelos dados

quantitativos e pelas informações que deles se pode depreender.

O cume da arte, em ciências sociais, está sem dúvida em ser-se capaz de por em jogo coisas teóricas muito importantes a respeito de objetos ditos empíricos [...] Tem-se demasiada tendência para crer [...] que a importância social ou política do objeto é por si mesmo suficiente para dar fundamento à importância do discurso que lhe é consagrado – é isto sem dúvida que explica que os sociólogos [...] se mostrem muitas vezes os menos atentos aos procedimentos metodológicos. (BOURDIEU, 2011b, p. 18).

Em relação ao anteriormente citado, coloca-se como fundamental – para a

proposição de uma tese – que a metodologia seja detalhada tendo suas etapas

descritas de modo a clarificar as tessituras que serão realizadas para analisar o

fenômeno proposto. Ainda sobre isso, Souza (2004) afirma que na contramão do

desinteresse deve estar a objetividade do pesquisador para analisar o fenômeno que

o inquieta. Como ser social e, portanto, político tanto o pesquisador, quanto o agente

observado estabelecem uma relação objetiva com a realidade política, social e

histórica. Desse modo, empregar a análise de conjuntura não é uma tarefa fácil:

[...] exige não somente um conhecimento detalhado de todos os elementos julgados importantes e disponíveis de uma situação determinada, como exige também um tipo de capacidade de perceber, compreender, descobrir sentidos, relações, tendências a partir dos dados e das informações. (SOUZA, 2004, p. 8, grifo nosso).

Para operacionalizar esse conhecimento detalhado acerca do universo

escolhido foi necessário buscar informações a respeito da construção das trajetórias

acadêmicas desses agentes, objetivando-se construir um cenário concreto para o

emprego da análise de conjuntura.

Sendo assim, estabelecer as categorias (Ver Quadro 2) e suas correlações,

na presente pesquisa, facilitou a visualização desse contexto.

Quadro 2 – Categorias para a Análise de Conjuntura

Categorias

Acontecimentos:

indicam certos

sentidos e

percepções

Cenários:

ações da

trama

social e

política

Atores

[Agentes]:

representa um

papel dentro de

um enredo

Relação de

Forças:

confronto,

coexistência,

cooperação

revelam

relações de

domínio,

igualdade ou

subordinação

Articulação

(relação) entre

a Estrutura e

a Conjuntura:

o fenômeno

estabelece

relação com a

história, com o

passado, com

as relações

sociais,

econômicas e

políticas

Correlações com o Contexto da Pesquisa

Surgimento das

Agências de

Fomento

Institucionalização

dos PPG’s

Produção

da Ciência

Brasileira

Pesquisadores

(bolsistas de

produtividade)

= Elite

consagrada do

campo da

Educação

Agências de

fomento e

Instituições de

Ensino

Superior (IES)

Análise das

trajetórias

acadêmicas

dos

pesquisadores

Fonte: adaptado de Souza (2004).

Segundo Ziman (1979) e Souza (2004), a grande dificuldade em analisar a

produção científica encontra-se nas idiossincrasias de quem a produz: o próprio

homem concreto. Sendo assim, ela não é constituída de modo neutro, como o

anteriormente exposto, e – por conseguinte – isenta da complexidade inerente às

relações humanas e sociais. Não há interações causais, ou descomprometidas com

uma miríade de processos políticos que determinam a intensidade dessas relações

e, portanto, são peças fundamentais no entendimento e na análise de conjuntura do

fenômeno observado.

De modo geral, as análises de conjuntura são conservadoras: sua finalidade é reordenar os elementos da realidade, da situação dominante, para manter o funcionamento do sistema, do regime. Uma análise feita tendo como pressuposto uma correção de rota, mas não de direção fundamental. (SOUZA, 2004, p. 16, grifo nosso).

No entanto, ressalta-se que a Análise de Conjuntura não se enquadra sob a

perspectiva conservadora quando o olhar lançado ao objeto é proveniente das

classes dominadas. Aqui essa visão analítica é representada e garantida pelo não

pertencimento ao universo observado, mas, sobretudo, pelo emprego da Análise

Relacional de Pierre Bourdieu que garante um estudo isonômico sob o ponto de

vista da indicação de possíveis alterações de rumo às práticas já instauradas no

campo.

Ainda segundo Souza (2004), junte-se a isso a imprevisibilidade da ação

política, ou seja, muitas vezes a lógica que se pretende encontrar estaria presente

no mundo ideal, e não no mundo real. Em resumo, identificar as estratégias

utilizadas pelos agentes para galgar seus objetivos é a instância mais próxima da

verdade que se pode intentar atingir em qualquer pesquisa social.

Sobre as técnicas utilizadas para a análise dos dados “[...] o dado faz-nos

pois abandonar o solo doxológico e nos introduz na região epistêmica.” (BRUYNE;

HERMAN; SHOUTHEETE, 1997, p. 203). Sendo assim, procurou-se aplicar técnicas

cientométricas que possibilitassem melhores visualizações desses dados, seja

graficamente, seja no cotejamento de variáveis. É sabido que inúmeras críticas são

feitas à aplicação de estudos métricos para a explicação de fenômenos sociais. Em

contrapartida, autores como Richardson (1999) e Meadows (1999) acreditam que o

problema não está nas técnicas quantitativas em si, mas sim no uso que se faz

delas.

Ainda nesse sentido, Bourdieu (2004) aponta que o emprego das técnicas

métricas, em desalinho a uma análise social, funcionaria como ratificador das

posições de poder, uma vez que os critérios de avaliação são propostos pela cúpula

dominante. Ora, cabe aqui a ressalva de que essa elite é formada por membros do

próprio campo aos quais são impostos os mesmos critérios, embora seu capital

científico temporal proporcione, não raro, a conversão facilitada em capital científico

puro.

Acredita-se que ao trabalhar com os diferentes polos constituintes do campo

acadêmico, ou seja, não só com a produção científica (indicadores de produção e de

ligação), mas também analisá-los sob a luz da Sociologia Reflexiva será possível

uma melhor compreensão acerca de como se institucionalizou o próprio campo da

Educação no país. Para Bourdieu (2011b), analisar relacionalmente e, portanto, de

maneira completa, um fenômeno significa romper com o “[...] monoteísmo

metodológico [...]” (2011b, p. 24) que encerra o pesquisador à utilização de apenas

um viés (técnica) para a compreensão dos dados. Bourdieu (2011b) afirma que o

mais importante na Sociologia Reflexiva é por em prática (ação) os instrumentos

teóricos (habitus, campo, capital entre outros) e, não somente, trabalhá-los em si

mesmos.

Entende-se, portanto, que com a utilização das técnicas cientométricas aliada

à reflexão sociológica será possível analisar satisfatoriamente o fenômeno proposto,

pois parte-se da convicção de que o conjunto das relações entre os agentes e o

contexto resulta e/ou representa a própria construção e institucionalização científica.

Favorecendo, desse modo, a reflexão, não somente sobre conteúdos, como também

sobre expressões discursivas passíveis de categorização e estudos, graças às

possibilidades concretas de análise de seu conteúdo, tanto sob uma visão

diacrônica, por ora priorizada, quanto sincrônica da produção científica em pauta.

No documento Bruna Silva do Nascimento (páginas 79-84)