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O espaço tornou-se instrumental para diversos fins, seja para articular estratégias, seja para organizar os fluxos, seja para induzir determinado uso. Ele é o palco da festa, do lúdico, da reprodução social, do econômico. Ele é regido por representações simbólicas no qual deixou de ser neutro geograficamente e geometricamente. Visto isso, esse subcapítulo é desenvolvido a partir das representações das tríades da produção espacial social conceituadas pelo filósofo Henri Lefebvre e pelo geógrafo Edward Soja, que desenvolvem suas tríades a partir da obra de Lefebvre. Esse subcapítulo tem a finalidade de compreender o processo de análise da produção espacial, seus significados e apropriações. Por fim, procura-se conceituar as tipologias para entender o fenômeno contemporâneo do objeto em estudo nessa pesquisa, a Festa de Sant’Ana de Currais Novos/ RN.

Henri Lefebvre

Henri Lefebvre coloca a problemática do espaço como objeto da ciência, lugar onde a reprodução do espaço urbano, os espaços de lazer, os espaços ditos educativos e a dinâmica diária acontece.“Essa reprodução se realiza através de um esquema relativo à sociedade existente, cujo caráter essencial é ser conjunta-disjunta, dissociada, mantendo uma unidade, a do poder, na fragmentação”(LEFEBVRE, 2008, p. 49). A forma dialética de Lefebvre de apreender e refletir sobre as transformações socioespaciais é uma forma de distinguir o senso comum da filosofia, como destaca Ester Limonad (2003).

A espacialidade pode ser distinguida entre o espaço físico e o espaço mental, a cognição e a representação, cada um dos quais usado e incorporado na construção social da espacialidade,

ou seja, eles se relacionam, não podendo ser interpretados isoladamente. Definir as interligações do mental, físico e social, continua a ser um dos desafios da teoria social contemporânea, especialmente considerando que o debate histórico tem sido monopolizado pelo dualismo físico-mental.

A teoria do espaço social, defendida por Lefebvre (2008), é uma analogia crítica da realidade urbana e da vida cotidiana, do conjunto de atividades prático-sociais com a finalidade de sintetizá-las, mas não as reduzir. Para ele, “o espaço social é o resultado de um processo com várias variantes: significante e não-significante, percebido e vivido, prático e teórico” (LEFEBVRE, 2000, p. 160). O autor procura compreender qual a relação entre o espaço mental e o espaço social, entre o espaço de representação e representação do espaço e como ele está inserido na prática social, econômica ou política, industrial ou urbana, sua eficiência e limites. A prática espacial põe e supõe uma interação dialética entre dominação e apropriação. Assim, esta prática espacial de uma sociedade se descobre decifrando seu espaço. Para isso Lefebvre (2000) analisa a prática dominante capitalista:

Ela associa estritamente, no espaço percebido, a realidade cotidiana (o emprego do tempo) e a realidade urbana (os percursos e redes ligando os lugares do trabalho, da vida ‘privada’, dos lazeres). A competência e a performance espaciais próprias a cada membro dessa sociedade só se examinam empiricamente. Uma prática espacial deve possuir uma certa coesão, o que não quer dizer em coerência (intelectualmente elaborada: concebida e lógica) (LEFEBVRE, 2000, p. 65-66).

O espaço, para Lefebvre, é ao mesmo tempo:

abstrato-concreto, homogêneo e desarticulado, social e mental, teórico e prático, ideal e real - sendo um produto da sociedade constatado empiricamente antes de qualquer teorização, é resultado de normas e valores da sociedade burguesa, cuja reprodução das relações se efetua na cotidianidade (LEFEBVRE, 2008, p. 63).

Com uma voz profunda da “periferia” da espacialidade, Lefebvre desconstrói o dualismo com um outro termo e, ao fazê-lo, reconstitui uma ontologia social, da "dialética socioespacial" e através da interação problemática entre espaço e tempo, a criação de geografias históricas, conforme observa Soja (1996).

A triplicidade espacial, defendida pelo filósofo, corresponde à tentativa de superação que a filosofia dificilmente conseguiu analisar além dos dois termos: o sujeito e o objeto (LEFEBVRE, 2000). Para o autor, o reducionismo em todas as suas formas, incluindo as versões marxistas, começa com a atração do binarismo, a compactação do significado em uma

oposição ou oposição fechada entre dois termos, conceitos ou elementos. Lefebvre introduziu um outro termo ao pensamento binário, uma terceira possibilidade. Não é, por isso, uma combinação simples, quizá, a mais importante para a transformação da lógica categórica e fechada dialeticamente, com a finalidade unir “campos” que geralmente são apreendidos separadamente. Quando a trialética do ser é reduzida às relações entre a historicidade e a sociabilidade, a espacialidade tende a ficar fora da reflexão. O tímido interesse em reativar o espaço de forma mais central, porém sem discussão detalhada da espacialidade, podem “ser encontrados nos escritos de muitos filósofos críticos, de Kant e Hegel a Heidegger e Sartre; e no trabalho de teóricos sociais críticos (Simmel, Kracauer, Benjamin, Giddens, Harvey, para citar apenas alguns)”, como destaca Henri Lefebvre (2000, p. 71-72).

A historicidade e a espacialidade/ geografia, se relacionam simultaneamente, onde o tempo se conhece e se realiza no espaço, fazendo emergir outro campo de interpretação na dialética espaço-temporal, a trialética do ser. Essa trialética gera, assim, três campos ontológicos da formação do conhecimento – história, sociabilidade e espacialidade.

Os três momentos da trialética ontológica, segundo Lefebvre, não podem ser entendidos isoladamente ou epistemologicamente privilegiados, separadamente, embora, normalmente sejam analisados em disciplinas compartimentadas, como exalta Soja (1996), pois eles juntos fornecem interpretação e conhecimento para a compreensão da produção do espaço vivido.

Lefebvre (2000) organiza a produção do espaço em torno da dialética do vivido e concebido, o "real" e o "imaginário", o mundo material e nossos pensamentos sobre isso. Desse modo, emergindo a tríade conceitual das práticas espaciais, das representações dos espaços e dos espaços de representações. Deixando claro que os espaços carregam em si simbolismos explícitos ou clandestinos da vida cotidiana, no qual transmitem mensagens de poder e dominação. Para tanto, o entendimento da semiologia se faz necessário para classificar as representações, as impressões e evocações do código dos sentimentos pessoais, o código simbólico (decifráveis), ou seja, identificar o discurso/ ideologia que está inserido no espaço.

A tríade de Lefebvre vai do espaço percebido - da percepção comum à escala do indivíduo e de seu grupo, a família, a vizinhança - aí compreendendo o que se chama “ambiente”, o espaço concebido (mental, geométrico) e o vivido (social). O espaço percebido e concebido é onde se encontra o espaço teórico e a teoria do espaço. Já o espaço vivido está vinculado à prática social, sendo a sua problemática um aspecto importante e talvez essencial de um conhecimento da realidade urbana. Assim, a partir dos três aspectos colocados, Lefebvre

aponta “a problemática do espaço pertencente à teoria do urbano e à sua ciência e, por seguinte, a uma problemática ainda mais vasta, a da sociedade global” (LEFEBVRE, 2008, p. 41).

O espaço percebido é a materialidade espacial rica em códigos, símbolos, caracterizado por uma prática espacial, onde estão as significações sócio-políticas. Os espaços concebidos são aqueles que estão armazenados nas teorias do espaço, no qual os arquitetos e políticos projetam a ideia de espaço, ou seja, a representação do espaço. Já os espaços vividos são os espaços marcados pelas práticas sociais, como a vida cotidiana se realiza, quando há uma apropriação contra uma dominação e o espaço se transforma. É o aspecto mais complexo de se desvendar, por ter várias significações subjetivas do sujeito que faz seu uso – esse é o espaço de representação.

Os espaços de representação, vividos mais que concebidos, possuem elementos simbólicos e imaginários, espaços reais e imaginados concomitantes. É o espaço dos “habitantes”. Trata-se do “espaço dominado, portanto, suportado, que a imaginação tenta modificar e apropriar”, como enfatiza Lefebvre (2000, p. 66). Esses espaços “incorporam os ‘simbolismos complexos’, às vezes codificados, às vezes não [...], que Lefebvre descreveu como uma codificação não do espaço de forma mais geral”, como relata Soja (1996, p. 67). Presume-se a inconsciência parcial, o sublime não-verbal dos espaços de representações, que deve ser decifrado para a transformação ativa do mundo que vivemos.

O espaço vivido é anterior ao espaço pensado, o espaço percebido, “antes que o espaço se desenhe como meio de possibilidades distantes, lugar das potencialidades, do intelecto analítico que separa, bem antes do saber, existe uma inteligência do corpo” (LEFEBVRE, 2000, p. 243). Ele é a prática social.

Lefebvre (2008) afirma que o sujeito, passivamente experiente, dominado, busca mudar o espaço a partir da sua apropriação. Nele podemos encontrar não apenas as representações espaciais do poder, o concebido, mas o espaço de resistência à ordem dominante de seu posicionamento subordinado, periférico ou marginalizado, como afirma Soja (1996).

As representações do espaço, ou seja, o espaço concebido pelos cientistas, planejadores, urbanistas, arquitetos, é o espaço dominante numa sociedade – um modo de produção. As concepções do espaço tenderiam, conforme Lefebvre, para um sistema de signos verbais, portanto elaborados intelectualmente (SOJA, 1996). Este espaço concebido também está ligado à ordem ou ao desenho, linguagem, discurso, textos, logotipos. Essa ordem é constituída através do controle do conhecimento, sinais e códigos: sobre os meios de decifrar a prática espacial.

O arquiteto, produtor do espaço, confunde projeção do “real” e “ideal”, que em projeto mostra a técnica cheia de códigos. Portanto, uma concepção cheia de conteúdos limitados, à sua realidade, com o risco de não compreender a demanda social. Seu desenho se reduz à forma, função e à estrutura, com a prática de não incorporar a relação “significante - significado”, e sim, uma área tratada de maneira rentável. De acordo com Lefebvre (2008):

O arquiteto não pode se contentar em desenhar e não pode deixar de consultar oralmente (pela palavra) os outros agentes dessa produção, o espaço. E, de início, o usuário; mas também o burocrata, o político, o financiador, e assim por diante. A tal ponto que atualmente desponta uma tendência que apresenta o arquiteto como um ‘homem de palavra’ e não mais como um homem do desenho, segundo a tradição. Tese interessante e contestável, pois ela esquece a problemática geral do espaço (de sua produção), para somente reter, a partir de uma problemática particular (a da arquitetura). […] Ademais, cada um sabe que, para o usuário e para o arquiteto, nem os ‘significantes’ nem os ‘significados’, nem seus encadeamentos, coincidem (LEFEBVRE, 2008, p. 29).

O espaço percebido, de acordo com Lefebvre, não é o espaço cênico nem o espaço público, é o fictício-real, é a representação do espaço e o espaço de representação.

As representações do espaço teriam um alcance prático, com influência específica, “elas se inserem, modificando-as, nas texturas espaciais, emprestadas de conhecimentos e de ideologias eficazes” (LEFEBVRE, 2000, p. 70). Ela alcança seu êxito quando um monumento é inserido em um contexto espacial que não se apaga no simbólico e no imaginário, por exemplo. Ela tem a tendência “ao quantitativo, ao homogêneo, à desaparição do corpo que busca refúgio na arte”, destaca Lefebvre (2000, p. 161).

Em contrapartida, os espaços de representação não seriam produtivos, senão de obras simbólicas, “frequentemente únicas, por vezes determinando uma direção ‘estética’ esgotando- se ao fim de um certo tempo depois de ter suscitado uma série de expressões e de incursões no imaginário”, como destaca Lefebvre (2000, p. 71), que continua a confirmar que a distinção deve ser trabalhada com cuidado, porque ela deve restituir a unidade reprodutora, desse modo não generalizada.

O espaço percebido, um terceiro espaço, que não é a representação do espaço, nem espaço de representação, mas sim ambos, é exemplificado por Lefebvre (2000):

[...] o espaço é percebido como intervalo separando das ações retardadas [posterior/tardia] o gesto que anuncia, a prepara, a significa. Os gestos se encadeiam segundo oposições (rápidos ou lentos, rígidos ou flexíveis, pacíficos ou violentos) e segundo regras rituais (codificadas). É assim que eles constituem uma linguagem na qual o expresso (corpo) e o significativo (para

os outros, corpos e consciências) não se separam mais que a natureza e a cultura, o abstrato e o prático (LEFEBVRE, 2000, p. 294).

A principal atenção na "decifração analítica" do que Lefebvre chamou de prática espacial ou de espaço percebido é analisada por Soja (1996), como uma mensuração empírica:

[...] das posições absolutas e relativas das coisas e atividades, sites e situações; em padrões de distribuição, desenhos e diferenciação de uma multiplicidade de fenômenos materializados em espaços e lugares; nas geografias concretas e mapeáveis de nossos mundos, que vão desde as ‘bolhas’ emocionais e comportamentais que invisivelmente cercam nossos corpos para a complexa organização espacial das práticas sociais que moldam nossos ‘espaços de ação’ nas famílias, nos edifícios, nos bairros, nas aldeias, nas cidades e nas regiões, nações, estados, economia mundial e geopolítica global (SOJA, 1996, p. 74-75).

Para Lefebvre, as práticas espaciais correspondem “a projeção sobre o terreno de todos os aspectos, elementos e momentos da prática social [...], onde ocorre a produção e reprodução espacial, são os lugares específicos e conjuntos espaciais próprios a cada formação social”, como apresenta Limonad (2003, p. 26). Ou seja, é o espaço da simultaneidade dos lugares, das ações e dos signos, do cotidiano banalizado e dos espaços privilegiados, por fim, de lugares políticos e sociais.

Contudo, tendo o espaço social como resultado de múltiplos aspectos e movimentos, “o espaço gerado pelo tempo é sempre atual, sincrônico e dado como um todo; ligações internas, conexões religam seus elementos, elas também produzidas pelo tempo” (LEFEBVRE, 2000, p. 161). As três dimensões têm as suas práticas ajustadas ao longo de uma história onde denotam, conotam e intervêm na produção do espaço social.

Edward Soja

Edward Soja desenvolve sua tríade – primeiro espaço (Firstspace), segundo espaço (Secondspace) e terceiro espaço (Thirdspace) – a partir da análise “lefebvriana”.

Nenhuma das três formas de conhecimento espacial recebem privilégio ontológico, porém, existe um privilégio estratégico do terceiro termo, como meio de combater o possível limitador do conhecimento espacial do Firstspace e epistemologia em Secondspace, as suas teorizações associadas, análises empíricas e práticas sociais. Justifica Soja:

As epistemologias do primeiro espaço tendem a privilegiar a objetividade e a materialidade, e apontar para uma ciência formal do espaço. A ocupação humana da superfície da terra, as relações entre a sociedade e a natureza, as

arquitetônicas e as geografias resultantes do ‘ambiente construído’ humano, fornecem as fontes quase ingenuamente fornecidas para a acumulação de (primeiro) conhecimento espacial (SOJA, 1996, p. 74).

A espacialidade assume assim as qualidades de um texto substancial para ser cuidadosamente lido, digerido e compreendido em todos os seus detalhes. Como um texto empírico, o Firstspace é convencionalmente lido em dois níveis diferentes, um que se concentra na descrição precisa das aparências da superfície e o outro que busca explicação espacial principalmente em termos sociais, psicológicos e biofísicos exógenos.

Outra forma para a análise do Firstspace, Soja (1996) indica cinco “camadas aninhadas” de busca de padrões, desde os "movimentos" fluentes de pessoas, bens e informações, até a formação de "redes" regulares de tais movimentos, para o crescimento de "nós" nessas redes, ao padrão hierárquico desses nós de diferentes tamanhos e funções, e finalmente a "superfícies" compostas que resumem o desenvolvimento desigual sobre o espaço de todos esses padrões.

No campo da Geografia, estes e outros processos de análise fazem parte do fundamento conceitual para uma "ciência espacial", positivista, baseada principalmente na descrição quantitativa e matemática desses padrões de dados espaciais do Firstspace. “As funções matemáticas foram ‘adequadas’ nos padrões de ‘pontos dos nós’ para explicar a configuração distributiva”, como enfatiza Soja (1996, p. 75). Já para a "física social" baseada no “modelo de gravidade e outras medidas do ‘atrito da distância’ foi usada para descrever as interações humanas sobre o espaço e o zoneamento concêntrico de usos da terra nas cidades e em torno dos mercados” (SOJA, 1996, p. 75). Quanto às teorias matemáticas foram aplicadas para medir os níveis de acessibilidade nas redes de transporte e comunicação, assim como, as linguagens bidimensionais e tridimensionais e as gramáticas desenvolvidas para descrever todo tipo de espaço, formas, "estruturas e desenhos” (SOJA, 1996).

Hoje, a ciência espacial está cada vez mais focada em Sistemas de Informação Geográfica (SIG) e detecção remota por fotografia de satélite para coletar e organizar bancos de dados maciços descrevendo o conteúdo empírico do Firstspace. O que essas técnicas fornecem são formas mais sofisticadas e objetivamente precisas de fazer o que a maioria dos geógrafos, analistas espaciais estavam fazendo o tempo todo: “acumulando e mapeando o que se presumiu que seja um conhecimento ‘concreto’ preciso sobre os lugares e as relações entre os lugares sobre a superfície da terra”, como observa Soja (1996, p. 76). A principal diferença causada pela mudança instrumental de levantamento de dados quantitativos na geografia, foi a

presunção de que essas descrições empíricas cada vez mais precisas da "realidade" geográfica também contêm fontes intrínsecas da teoria espacial.

Quando cativados por ilusões tão realistas e impulsionados pelas presunções do cientificismo, as epistemologias de Firstspace tornam-se fixadas na forma material das coisas no espaço:

[...] com a espacialidade humana vista principalmente como resultado ou produto. A explicação e a construção da teoria, por sua vez, derivam essencialmente da forma material e da covariação dos padrões espaciais, com uma ou mais configurações geográficas ‘independentes’, explicando a configuração ou o resultado ‘dependente’ em equações cada vez mais complexas e cadeias causais (SOJA, 1996, p. 76).

Tanto na geografia como nas abordagens mais científicas de outras disciplinas espaciais, essa epistemologia positivista, de uma forma ou de outra, continua a dominar o pensamento e a análise espacial.

Nessas e outras tentativas de estudar e compreender a produção do Firstspace, Soja (1996) teoriza na busca de explicar e construir as variáveis nos comportamentos e atividades sociais presumivelmente não espaciais, como desenvolvimento histórico, consciência de classe, preferências culturais e escolha econômica racional. “O fluxo de causalidade nessa epistemologia tende a se dirigir principalmente em uma direção, desde a historicidade e a socialidade até as práticas e configurações espaciais” (SOJA, 1996, p. 77). Isso resultou em uma compreensão cada vez mais rigorosa e perspicaz de como o Firstspace é produzido socialmente, bem como uma exploração bem-vinda por geógrafos e outros analistas espaciais de uma ampla gama de disciplinas e ideias "não espaciais".

Por muitas razões diferentes, no entanto, é dada pouca atenção ao fluxo causal na outra direção, ou seja, “como as geografias materiais e as práticas espaciais moldam e afetam a subjetividade, a consciência, a racionalidade, a historicidade e a socialidade” (SOJA, 1996, p. 77). O impacto de Firstspace na história e na sociedade, no sentido mais amplo, foi ignorado; “ou foi conscientemente evitado por medo de que a análise do Firstspace seja presa dos perigos presumidos do determinismo ambiental ou espacial” (SOJA, 1996, p. 78).

Apesar dessas sobreposições, as epistemologias de Secondspace são imediatamente distinguíveis pela sua concentração explicativa no espaço concebido em vez de percebido e sua suposição implícita que o conhecimento espacial é produzido principalmente por meio de representações discursivas do espaço, através do funcionamento espacial da mente. Ainda Soja:

Na sua forma mais pura, Secondspace é inteiramente ideacional, constituído por projeções no mundo empírico a partir de geografias concebidas ou imaginadas. Isso não significa que não exista uma realidade material, nem o espaço de Firstspace, mas sim que o conhecimento dessa realidade material seja compreendido essencialmente através do pensamento (SOJA, 1996, p. 79).

Desse modo, ao fortalecer a mente a explicação torna-se mais reflexiva, subjetiva, introspectiva, filosófica e individualizada, ou seja, uma imagem de um ideal empírico não coletivo e não real.

O Secondspace é o local interpretativo do artista criativo e do arquiteto, visualmente ou literalmente reapresentando o mundo à imagem de seus imaginários subjetivos; o urbanista utópico que busca a justiça social e espacial através da aplicação de melhores ideias, boas intenções e melhor aprendizado social; o geógrafo filosófico que contempla o mundo através do poder visionário das epistemologias científicas ou da imaginação kantiana da geografia como forma de pensar ou a "poética" mais imaginativa do espaço; o semiologista espacial reconstituindo Secondspace como espaço "simbólico", um mundo de significância racionalmente interpretável; o teórico do desenho que busca capturar os significados da forma espacial em conceitos mentais abstratos. Também estão aqui os grandes debates sobre a "essência" do espaço, seja ele "absoluto" ou "relativo" e "relacional", abstrato ou concreto, uma maneira de pensar ou uma realidade material.

No entanto, em Secondspace, a geografia imaginada tende a se tornar a geografia "real", com a imagem ou representação que vem definir e ordenar a realidade. As formas reais de material recuam na distância como significantes fixos e mortos que emitem sinais que são processados, e assim entendidos e explicados quando julgados necessários, através do funcionamento racional (e às vezes irracional) da mente humana. Aqui também, como no

Firstspace, há pelo menos dois níveis de conceituação, um introvertido e “indígena” e o outro

mais extrovertido e exógeno (SOJA, 1993).

As abordagens “indígenas” do conhecimento do Secondspace - que vão desde o gênio

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