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Capitulo 2: Mulheres no movimento hip hop: um breve perfil

2.2. Trabalhos, dificuldades financeiras e percursos escolares

No que se refere ao acesso a trabalho e renda, comentários de tipo “para onde eu ando meu currículo vai atrás”, fazem parte do cotidiano das jovens integrantes do movimento hip hop da cidade de Recife. As dificuldades de acesso ao trabalho formal é um problema evidenciado por elas. Sempre nos momentos de campo, nas conversas informais elas relatavam sua situação financeira, dificuldades de arrumar emprego e falta de oportunidades de trabalhar com a arte que fazem.

Na pesquisa de campo esse ponto me chamou atenção, muitas dessas jovens faziam comentários em relação a tensões entre trabalho, participação no movimento, estudos e discriminações. Elas relataram 1) que não gostavam do trabalho: a) sofria discriminações por ser negra, b) eram tratadas como “escravas”, pois ganhava pouco e trabalhava muito, 2) que o trabalho tomava muito tempo, fato que impede maior

dedicação a arte, 3) que tiveram que abrir mão da sua participação no movimento por questões de limitação do tempo e cansaço ocasionados pelo trabalho, 4) o desejo de viver da arte, 5) dificuldades de conciliar trabalho e estudo; 6) que tiveram que sair da cidade de Recife e até mesmo do Estado de Pernambuco, em busca de melhores condições de vida.

Observa-se que essas 82 (oitenta e duas) jovens integrantes do movimento estão distribuídas entre as que possuem, 1) trabalho formal; 2) trabalho informal; 3) desempregadas 4) renda adquirida na produção artística a partir da inserção no movimento hip hop; 5) trabalhos indiretamente envolvidos com a arte produzida no hip hop.

O trabalho formal se refere ao trabalho com carteira assinada e direitos trabalhistas. Nessas condições de trabalho formal elas estavam distribuídas entre vendedora, operadoras de telemarketing (CONTAX e TIM), garçonete de pizzaria, design, agência de propaganda, arte educadora e uma que trabalha na Petrobrás. É importante destacar que dentro dessa categoria de trabalho formal, existe uma diferenciação que se refere àqueles considerados qualificados e não qualificados. Essa distinção nos descreve que a maioria dessas jovens está enquadrada na categoria do trabalho não qualificado. Isso significa que apesar de possuírem carteira assinada e os direitos trabalhistas assegurados, têm rendas baixas, que estão em torno de um salário mínimo.

O trabalho informal compreende o serviço que não possui vínculos ou benefícios fornecidos por uma empresa mais conhecido como sem carteira assinada. Percebe-se que muitas jovens do movimento hip hop encontram-se nessa categoria, como garçonete, empregada doméstica, recreadora, coreografa, venda de camisas, bolsas e acessórios no comércio informal, vendedora de água mineral, dentre outras.

O desemprego também é alto nesse público de jovens mulheres moradoras de bairros populares e com níveis de escolaridade insuficientes. Das quarenta jovens que responderam essa pergunta do questionário, dez estão desempregadas. Inclusive duas dessas jovens relataram recentemente ir para tentar oportunidades de vida em outro lugar, uma delas foi para Brasília com seu companheiro e a outra estava com a proposta de ir para São Paulo.

No que diz respeito a renda produzida a partir da produção artística do hip hop, apenas quatro têm a arte produzida a partir dos elementos do hip hop como uma forma de renda. Elas vendem camisas, bolsas, quadros e acessórios que produzem. Vivem também de projetos financiados pelo MINC e outros órgão de incentivo a cultura, dentre outras rendas como encomendas de empresas para grafite (grafite comercial), serigrafia, aerografia, pintura em tela, em camisas, bolsas, etc. É um trabalho informal e inconstante.

Adquirir renda a partir da prática dos elementos do movimento é um dos objetivos do movimento hip hop da cidade de Recife - fornecer oportunidades de trabalho e renda aos jovens moradores de periferia a fim de evitar caminhos ligados a ilegalidade. No entanto, no que se refere ao acesso das mulheres essa situação ainda encontra-se insipiente e perpassada por dificuldades. Percebe-se que os jovens homens tem mais acesso a trabalho e renda a partir da inserção no movimento hip hop. Eles estão inseridos em projetos fornecendo oficinas, pelo PROJOVEM, Geraldão (projeto Esporte do Mangue), cargos em secretárias da prefeitura, possuem lojas que vendem discos, roupas com a marca hip hop, possuem estúdios de tatuagens, como também fazem serviços encomendados por empresas e pessoas civis.

A explicação desse cenário desigual não se encerra por marcadores ligados a quantidade e temporalidade de homens nesse espaço. Apesar de eles estarem em maior número e há mais tempo no movimento hip hop, relatos delas descrevem suas dificuldades em conseguirem legitimidade nesse espaço, seja por preconceito da sociedade, como dos próprios jovens do movimento. Elas descrevem que suas artes possuem dupla avaliação, por ser mulher e artista (COSTA e MENEZES, 2010). Há também barreiras nas seleções para programas governamentais, como por exemplo, no projeto Esporte do Mangue não existe nenhuma mulher professora de break, essa questão está sendo pautada atualmente devido a crescente quantidade de alunas que estão entrando nas oficinas.

A prática da arte comercial38 aqui mais especificamente ligados ao desenho é o mais comum entre as jovens pesquisadas. Nesse tipo de serviço a pertença a um grupo torna-se um veículo importante. O grupo geralmente possui um site ou blog, contatos e divulgações sobre seus trabalhos e isso facilita o acesso e credibilidade dos clientes.

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Quanto aos trabalhos indiretamente envolvidos com a arte produzida no hip hop, são aqueles que de certa forma tem relação com a produção artística, eles estão ligados a áreas de design, arte-educadora, desenhista, fotografa e coreografa. Elas trabalham em empresas, ONGs, academias de ginástica. Algumas delas possuem carteira assinada e outras possuem contratos temporais.

A dificuldade de acesso ao trabalho tem como um dos indicadores os percursos escolares que, na maioria delas, são insuficientes para a entrada no mercado de trabalho. Das quarenta e sete jovens que responderam os questionários, através de perguntas via on line, postagens na rede de relacionamento facebook, blog e indagações no campo, duas estão fora da escola, vinte e nove terminaram ou estão terminando o ensino médio; oito estão cursando o ensino superior, seis têm ensino superior, três terminaram ou estão cursando o técnico e duas fizeram cursos pós-graduação. As que têm ou estão cursando o ensino superior estão distribuídas entre os cursos de turismo, pedagogia, gastronomia, Ciências Sociais, administração e direito. Quanto ao curso técnico às duas que registraram essa informação estão inseridas na área de enfermagem.

Esse cenário nos fornece indicativos de que apesar da maioria das jovens terem terminado o segundo grau isso não lhes dá acesso ao mercado de trabalho qualificado. Apesar de não ter registrado a idade ligada à escolaridade a maioria delas estão na escala dos vinte, sendo a maioria acima dos vinte e quatro. Esse cenário traz indicativos de que apesar da maioria delas estarem inseridas em trabalho formal, estão em categorias de trabalho cuja renda corresponde a um salário mínimo.