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2 REVISÃO DE LITERATURA

2.5.1 Tradução – uma Ferramenta de Aquisição de SL

Ao apresentar as idéias de Paz e Steiner meu objetivo era colocar a tradução como um processo natural, habitual em nossas vidas – em qualquer língua. A respeito do seu papel na aquisição de SL, cada vez mais pesquisadores argumentam que a tradução é parte inevitável da aquisição; e impedir seu uso vai contra a natureza, pois nosso cérebro trabalha por associação: associamos aquilo que é novo com aquilo que já conhecemos (RIDD, 2009). No entanto, quando a tradução chega nas aulas de SL ela desperta opiniões conflitantes.

A tradução foi banida das aulas de SL quando o Método Gramática-Tradução (doravante MGT), acusado de enfatizar o ensino da gramática de maneira desmedida e empregar a tradução como um fim em si mesma, caiu em descrédito. O Método Direto o substituiu e pregava o ensino de SL sem o intermédio da LM e acabou se refletindo em diversas abordagens, muitas delas usadas até os dias atuais328. Com o Método Direto, a LM passou a ser tratada como uma inimiga que precisava ser combatida a qualquer custo (i.e. através de mímica, realias, ou qualquer recurso que impedisse o uso da mesma). Com a exclusão da LM, a tradução perdeu completamente o seu espaço nas aulas de SL.

Essa inimizade, contudo, começou a ser questionada em diversos contextos: no ensino de SL, de ensino bilíngue, multilíngue, e em programas de imersão. No ensino bilíngue a própria noção de bilinguismo foi desafiada quando pesquisadores apontaram que ao separar completamente329 a LM e a LA, o ensino de línguas torna-se duplamente monolíngue (CREESE & BLACKLEDGE, 2010) ou de duas solitudes (CUMMINS, 2007). Além disso, ele cria uma situação artificial de uso de ambas as línguas que, em geral, não condiz com o uso diário delas. Especialmente em espaços onde o emprego da LA não significa a proibição da LM, ou vice versa: durante o intervalo das aulas, por exemplo, os alunos podem transitar facilmente entre uma língua e outra; e alunos imigrantes podem usar ambas as línguas em casa ou em suas comunidades. A partir dessas observações, novas

328 A abordagem comunicativa, a audiolingual/audiovisual e a natural, entre outras, contém traços reminiscentes do método direto.

329 Geralmente, usa-se uma língua em um turno (digamos, matutino) enquanto que no próximo turno (digamos, vespertino) emprega-se a outra outra. Ou ministra-se algumas disciplinas na LA e as demais na LM, em proporções similares. Para mais detalhes sobre o ensino bilíngue cf. as obras citadas acima.

abordagens para ensino bilíngue foram sugeridas, entre elas o

bilinguismo flexível (CREESE & BLACKLEDGE, 2010) conhecido

também como translanguaging330 (GARCÍA, 2007, 2009). Diferente

do ensino tradicional bilíngue, essa nova abordagem emprega ambas as línguas concomitantemente: fala-se na LM e responde-se ou escreve-se na LA ou vice-versa.331

Quanto à tradução332, devido às lembranças amargas do MGT, alguns professores e instituições de ensino ainda a rejeitam de antemão. Porém, cada vez mais tem se refletido acerca do seu papel nas aulas de SL (MALMKJAER, 1998; WITTE et al, 2008; RIDD, 2009). Longe de defender o retorno do MGT ou de diluir a centralidade da LA (CUMMINS, 2007), a tradução quando usada em doses adequadas e significativas 333 tem o potencial de facilitar a aquisição da SL ao permitir que os aprendizes explorem e comparem os modos de criar significados em ambas as línguas (ULRYCH, 1986; SOUZA, 1996; ROMANELLI, 2006); consequentemente, eles ganham um entendimento mais robusto tanto da LM quanto da LA. Contrário àquelas lembranças amargas do passado, a tradução agora é apontada como a “capacidade de compreender línguas enquanto sistemas, e de estabelecer relações entre esses sistemas” (LEAL, 2006, p. 3). Quer dizer, traduzir seria a quinta habilidade linguística do falante (NEWMARK, 1991; LARSEN-FREEMAN, 2003) e o seu ensino pode ser encorajado juntamente com as demais habilidades linguísticas – ouvir, falar, ler, e escrever.

Outras reflexões poderiam ser aqui tecidas334, todavia eu encerro com aquela que coloca a tradução como uma ferramenta eficiente para medir a compreensão (KLEIN, 1986), pois ela

330 O termo translanguaging vem do termo galês trawsieithu, que foi cunhado em 1994 por Cen Williams.

331 Leo Van Lier defendeu o emprego dessa abordagem em uma palestra proferida recentemente (abril/2010). Os slides da mesma podem ser encontrados no seguinte endereço: <www.dilit.it/allegati/Leo%20van%20Lier%20slide%20comments.pdf>. Acesso em: 27, mar. 2011.

332 Em verdade, existem diferentes modalidades de tradução. Explorá-las em detalhe, contudo, foge ao escopo dessa tese, e referir-me-ei apenas ao termo geral: tradução. Para mais detalhes sobre essas mo- dalidades cf. Ridd, 2009.

333 Para uma melhor compreensão a respeito da utilização eficiente da tradução como uma ferramenta auxiliar na aprendizagem da SL cf. Witte at al, 2008.

334 Para uma reflexão mais aprofundada a respeito do lugar da tradução no ensino/aprendizagem de SL, consulte as obras citadas nessa subseção. Além delas, o

Common European Framework of Reference for Language também trata do assunto:

<http://www.coe.int/t/dg4/linguistic/source/Framework_EN.pdf>. Acesso em: 30 maio 2011.

descarta a eventual limitação de expressão na LA (PELLATT, 2008). Essa reflexão vem ao encontro dos estudos exploratórios, que serão descritos no próximo capítulo, onde testes de tradução foram fabricados e aplicados a fim de se obter dados mais precisos do que aqueles obtidos com a aplicação de testes tradicionais – entre eles, os de múltipla escolha. Para auxiliar a análise dos dados obtidos, um modelo (= abordagem) de tradução foi adotado e será descrito a seguir.