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O termo “blue” é um MC pertencente ao domínio ideológico e é o termo com maior índice de chavicidade do sub-corpus. As variações “bluer” e “bluest” também apareceram com alto índice de chavicidade e serão analisadas a seguir.

Tabela 1 - Traduções do MC “blue” MC: Blue Ocorrência:108 Chavicidade: Bluer:294,06 Blue: 292,48 Bluest: 80,01

O Olho Mais Azul Freq. Absoluta

1. Of a colour

intermediate between green or violet, as of the sky or sea on a sunny day (Oxford Dictionary). Azul Blue Mais azul 65 13 27 TOTAL 105

O termo “blue” representa uma cor, mas também envolve diferentes significados e simbologias entre diferentes culturas. De acordo com o Longman Dictionary of English Language and Culture (1998), por exemplo, no contexto britânico, “blue” pode ser um título atribuído a pessoas que representam as universidades de Oxford ou Cambridge em algum esporte, enquanto na Austrália o termo pode ser uma gíria sinônima de briga. No contexto dos Estados Unidos, onde The Bluest Eye está ambientado, “blue” pode representar: “(a member of) the army in the US Civil War which fought for the US to remain whole and against slavery (the Union Army): The Blue and the Gray.”

Devido às diferentes percepções sensoriais e ideológicas entre as culturas, as cores podem atribuir significados e simbologias diferentes em cada país. A cor azul, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, pode simbolizar confiança, sabedoria e tranquilidade. Contudo, em inglês essa cor pode conotar melancolia e tristeza, como na expressão “I’m feeling blue”, enquanto em português, a cor azul comumente tem conotações mais positivas, como nas expressões “tudo azul”, que significa que está tudo tranquilo ou tudo bem, e “estar no azul”, que se refere a estar com dinheiro e sem dívidas.

A soma das ocorrências de “blue”, “bluer” e “bluest” no romance totaliza 108. Dessas 108 ocorrências, 80 estão adjetivando o substantivo “eyes”. Dentro do contexto do romance, há uma forte relação entre a cor em questão e a parte do corpo, o que explica a alta frequência desse colocado com o MC “blue”.

O romance The Bluest Eye narra a história da menina negra de 11 anos, Pecola Breedlove, que é rejeitada tanto por brancos quanto por negros e deseja a qualquer custo ter olhos azuis. Morrison deixa claro que o desejo por olhos azuis representa não só a necessidade da menina em se encaixar em um estereótipo que era considerado um padrão de beleza. Para a menina, ter olhos azuis significava ser aceita e admirada pelos outros. Além disso, Pecola acreditava que se ela tivesse olhos azuis, todos os seus problemas desapareceriam, como descrito no seguinte excerto:

[TBE] p.46: It had occurred to Pecola some time ago that if her eyes, those eyes that held the pictures, and knew the sights—if those eyes of hers were different, that is to say, beautiful, she herself would be different. Her teeth were good, and at least her nose was not big and flat like some of those who were thought so cute. If she looked different,

beautiful, maybe Cholly would be different, and Mrs. Breedlove too. Maybe they’d say, “Why, look at pretty-eyed Pecola. We mustn’t do bad things in front of those pretty eyes.” Pretty eyes. Pretty blue eyes. Big blue pretty eyes.

No excerto acima, podemos identificar que Pecola se culpava pelo fato dos seus pais, Cholly e Pauline Breedlove, brigarem tanto na sua frente e sua crença de que se seus olhos fossem azuis, ela automaticamente enxergaria beleza em si mesma e seus pais não teriam coragem de brigar diante dela. Ao final do romance, Pecola perde a sensatez e acredita que um falso pregador, Soaphead Church, transformou seus olhos pretos em azuis.

Em todas as ocorrências o comparativo “bluer” e o superlativo “bluest” estão adjetivando o substantivo “eyes” no plural.

[TBE] p. 203: Please. If there is somebody with bluer eyes than mine, then may be there is somebody with the bluest eyes. The bluest eyes in the whole world.

[OMA] p. 203: Por favor. Se houver alguém com olhos mais azuis do que os meus, talvez exista alguém com os olhos mais azuis. Os olhos mais azuis no mundo todo.

Todas as ocorrências de comparativos e superlativos de “blue” seguiram o mesmo padrão na tradução: “mais azul do que” para o comparativo e “o mais azul” para o superlativo. Apesar do superlativo “bluest” ter ocorrido todas as vezes no plural, o título do romance está no singular: The Bluest Eye.

De acordo com a interpretação de Michael Awkward (1989), “the bluest eye” pode implicar solidão tanto pela simbologia da cor quanto pela semelhança de pronúncia entre “eye” no singular e o pronome “I”. Essa solidão pode implicitamente sugerir um distanciamento da sua origem pelo anseio dos olhos azuis, ou seja, o status da Pecola como “the bluest eye” é resultado da sua adoção dos padrões brancos de percepção.

Ferreira manteve a tradução do título no singular, O Olho Mais Azul. Ao traduzir a expressão no singular, Ferreira manteve o senso de solidão e exclusão, pois está se referindo a um único olho. Contudo, a simbologia da cor e o possível jogo de pronúncias é perdido na tradução para o português.

No romance há um personagem chamado Blue Jack que, na infância de Cholly Breedlove, era quem oferecia apoio a ele. Ao carregar a cor azul no nome, o personagem pode apresentar a conotação de tranquilidade da cor, afinal ele oferecia certo alívio para Cholly na infância. No texto meta, o nome do personagem não foi traduzido para o português.

[TBE] p.133: He swept up, ran errands, weighed bags, and lifted them onto the drays. Sometimes they let him ride with the drayman. A nice old man called Blue Jack. Blue used to tell him old-timey stories about how it was when the Emancipation Proclamation came. How the black people hollered, cried, and sang.

[OMA] p. 134: Varria a loja, fazia serviços de rua, pesava sacos e colocava-os nas carroças. Às vezes deixavam-no ir com o carroceiro. Um velho simpático chamado Blue Jack, que lhe contava histórias de antigamente, de como eram as coisas na época da Proclamação de Emancipação. Como os negros gritaram, choraram e cantaram.

No excerto do texto fonte, há duas ocorrências do nome do personagem. Na primeira ocorrência, o tradutor manteve o nome em inglês, e na segunda ocorrência, omitiu o nome, simplificando com o uso de uma conjunção. Apesar do nome do personagem ocorrer 16 vezes no texto fonte, ocorre 13 vezes no texto meta, devido às simplificações feitas na tradução.

As únicas ocorrências de “blue” que não foram traduzidas como “azul” foram nesses casos em que se referiam ao personagem. A maioria das ocorrências de “blue” fazia referência à cor dos olhos.

[TBE] p. 182: I, I have caused a miracle. I gave her the eyes. I gave her the blue, blue, two blue eyes. Cobalt blue. A streak of it right out of your own blue heaven. No one else will see her blue eyes. But she will.

[OMA] p. 182: Eu, eu fiz um milagre. Eu lhe dei os olhos. Eu lhe dei os olhos, dois olhos azuis, azuis. Azul cobalto. Uma nesga do Seu firmamento azul. Mais ninguém verá os olhos azuis dela. Mas ela verá.

O excerto acima faz parte da fala do pregador que fez Pecola acreditar que tinha recebido a dádiva de ter olhos azuis. Analisamos que todas as ocorrências de azul nesse excerto se referem aos olhos, mesmo quando não adjetivam diretamente esse substantivo. O trecho “Uma nesga do Seu firmamento azul”, por exemplo, é uma alusão ao desejo de Pecola que foi, de certo modo, realizado e ela obteve um pedaço desse paraíso que, para ela, era ter olhos azuis.

Analisamos que a maioria das ocorrências foi traduzida como “azul” ou “mais azul”, exceto quando o termo se referia ao nome do personagem Blue Jack, que foi mantido ou omitido no texto meta. Alguns significados atribuídos à cor azul foram perdidos na tradução devido às diferenças ideológicas entre as culturas do texto fonte e do texto meta a respeito da cor.