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Trabalho realizado por Maclaren et al. (2006) relatou indícios da presença de uma transformação martensítica reversa de ferrita para austenita em um aço nanocristalino perlítico com alto teor de níquel. Nesse estudo, o material foi deformado por torção e através da análise utilizando microscopia eletrônica de transmissão, notou-se a presença da fase austenita. Os autores argumentaram que a transformação de fases ocorreu devido a um processo de cisalhamento, que pode ser observado na Figura 37, no qual o mecanismo reverso ao processo de cisalhamento normal, com a fase  se transformando em ’: uma discordância parcial de 1/6 na direção [11̅0]𝐶𝐶𝐶 provoca o cisalhamento que muda o empilhamento do tipo ABAB do plano (110) da estrutura CCC para o empilhamento da estrutura ABCABC da estrutura CFC, fazendo com que uma relaxação atômica natural ou um segundo cisalhamento transforma a geometria em cúbica, fazendo com que o retângulo torcido pelo cisalhamento da CCC se transforme no hexágono da CFC (MACLAREN et al., 2006).

Figura 37 - Diagrama esquemático do processo de transformação do empilhamento da estrutura cúbica de corpo centrado (CCC) para cúbica de face centrada (CFC).

Fonte: MACLAREN et al, 2006.

No trabalho de simulação computacional realizado por Latapie e Farkas (2003) para avaliar a formação de novos grãos através da aplicação de tensão em uma trinca em um material Fe- nanocristalino, com estrutura CCC, os autores observaram a formação de novos grãos induzidos por tensão através de uma transformação de fase metaestável de CCC para CFC na ponta da trinca presente na amostra simulada (LATAPIE e FARKAS, 2003).

Ao se aumentar a intensidade da tensão aplicada, ocorreu a propagação da trinca na orientação cristalográfica mais favorável, e notou-se que parte da região CFC mais próxima a trinca foi transformada de volta em CCC, porém com uma orientação cristalográfica diferente da estrutura CCC inicial. Com isso, os autores concluíram que a deformação plástica na ponta da trinca de Fe- não está associada somente à geração de discordâncias, mas também às transformações de fase, nucleação e crescimento de novos grãos. Assim, CCC1 transformou-se em CFC que por sua vez transformou-se transformou em CCC2, como pode-se observar na Figura 38, mostrando que houve transformação de fase de ferrita para austenita, e de austenita para ferrita induzidas por deformação, ou seja, ocorreriam transformações martensíticas diretas e reversas induzidas por deformação plástica no material simulado (LATAPIE e FARKAS, 2003).

Figura 38 – Transição de fase de grãos CFC do grão original CCC1 para o novo grão CCC2.

Fonte: Autora, “adaptado de” LATAPIE e FARKAS, 2003.

Diversos autores como Li et al (2008), Ivanisenko et al (2006), Litovchenko et al (2012) e Litovchenko et al (2013) estudaram a transformação martensítica reversa através do ensaio de alta pressão aplicada com torção ou HTP (High-Pressure Torsion) que é uma técnica de deformação plástica severa na qual obtém-se excelente refinamento de grãos em materiais policristalinos, através da imposição de elevadas taxas de deformação. Esta técnica confere ao material uma granulação ultrafina, e com isso uma elevação das propriedades mecânicas do material impraticáveis a quaisquer outras técnicas de deformação plástica severa ou processos termomecânicos convencionais (FERREIRA, 2017).

O ensaio consiste na deformação plástica, por cisalhamento simples, com aplicação simultânea de esforços de compressão e torção sobre uma pequena amostra metálica, em formato de disco, alojado entre duas matrizes. A matriz inferior introduz torque enquanto a matriz superior introduz pressão, como pode se observar no esquema da Figura 39 (FERREIRA, 2017).

Figura 39 – Representação esquemática do princípio fundamental do ensaio HPT.

Fonte: FERREIRA, 2017.

Li et al (2008) estudando o aço inoxidável austenítico 304 através da deformação através de ensaio de alta pressão aplicada com torção em temperatura ambiente, observaram a ocorrência de transformação martensítica direta ( → ’) e, ao aumentar a velocidade do ensaio, observaram a transformação martensítica reversa (’ →), com a formação de grãos equiaxiais nanocristalinos de austenita. Baseado nas difrações de raios-X, observou-se que a fração volumétrica de martensita mudou com o aumento da deformação e velocidade de ensaio, como pode-se observar nos gráficos da Figura 40 e da Figura 41. Os autores atribuíram a transformação martensítica reversa ao aumento da temperatura no material durante o ensaio, que chegou a 200 °C, além das tensões de cisalhamento aplicadas ao material durante o ensaio (LI et al, 2008).

Na Figura 40 (b) onde tem-se um gráfico que relaciona a fração volumétrica das fases presentes à deformação equivalente da amostra ensaiada com velocidade de rotação de 0,2 rpm, observa-se que, para a deformação equivalente de 1, o que corresponde a 0,03 voltas, tem-se uma fração volumétrica de 18% de fase austenita (), 10% de fase martensita () e 72% de fase martensita (’). Observa-se que com o aumento da deformação equivalente há uma redução da fração volumétrica de austenita () e martensita (), fazendo com que na deformação equivalente de 4, onde tem-se 0,5 de volta, existia uma fração volumétrica de 100% de fase martensita ’.

Já na Figura 41 (b), onde a amostra foi ensaiada com velocidade de rotação de 5 rpm, observa-se uma grande redução da fração volumétrica da fase austenita () de 80% a 10% até

a deformação equivalente de 3 seguido de um aumento gradual até aproximadamente 55% de austenita () em uma deformação equivalente de 9.

Figura 40 – Difratograma de raios-X e frações volumétricas das amostras antes e depois do ensaio de torção de alta pressão com velocidade de rotação de 0,2 rpm. (a) Difratograma de raios-X, (b) fração volumétrica das fases presentes.

Fonte: Autora, “adaptado de” Li et at, 2008.

Figura 41 - Difratograma de raios-X e frações volumétricas das amostras antes e depois do ensaio de torção de alta pressão com velocidade de rotação de 5 rpm. (a) Difratograma de raios-X, (b) fração volumétrica das fases presentes.

Fonte: Autora, “adaptado de” Li et at, 2008.

Através do estudo de transformação de fase da ferrita em austenita em um aço carbono submetido ao ensaio de alta pressão aplicada à torção, Ivanisenko et al (2006) observou que a transformação ( → ) ocorre através da aplicação de uma severa deformação plástica em um aço perlítico, resultando em uma estrutura nanocristalina. O grupo concluiu que o aumento da energia livre de Gibbs da ferrita devido à formação da estrutura nanocristalina e da dissolução de carbonetos, junto com a tensão de cisalhamento promovida pela tensão de alta pressão, forneceram a força motriz para ocorrer a transformação martensítica reversa, uma vez que o material não atingiu uma temperatura superior a eutetóide durante o ensaio, e não houve o aquecimento adiabático no material, nem mesmo a formação de bandas de cisalhamento adiabático seguido de têmpera (IVANISENKO et al, 2006).

Nas micrografias obtidas através do microscópio eletrônico de transmissão do trabalho de Ivanisenko et al (2006) representadas na Figura 42, é possível observar na Figura 42(a) que a microestrutura do material após 5 rotações é homogênea e nanocristalina. Na Figura 42(b) tem-se o padrão de difração de uma área selecionada, mostrando a existência de anéis de Debye-Scherrer das fases ferrita e austenita, além da presença de cementita. Na Figura 42(c) tem-se a imagem de campo escuro utilizando a reflexão da fase ferrita, mostrando que os grãos de ferrita possuem tamanho de aproximadamente 10 nm e apresentam morfologia equiaxial, sem a existência de lamelas. Também é possível observar que há maior quantidade de pontos de fase austenita que ferrita. Na Figura 42(d) é possível observar a imagem de campo escuro utilizando a reflexão de cementita, mostrando que ela se encontra uniformemente distribuída (IVANISENKO et al, 2006).

Figura 42 – Micrografias de microscópio eletrônico de transmissão do material após ensaio de HTP. (a) imagem de campo brilhante, (b) padrão de área de difração, (c) imagem de campo escuro usando reflexão de ferrita, (d) imagem de campo escuro usando reflexão de cementita.

Fonte: IVANISENKO et al, 2006.

Litovchenko et al (2012) avaliou a transformação martensítica direta e reversa em um aço inoxidável austenítico através de ensaios de laminação e ensaio de alta pressão aplicada à torção, ambos realizados em temperatura ambiente. Resultados de difratometria de raios-X e ferritoscópio mostram que a deformação plástica por laminação levam a uma transformação martensítica direta, mostrando o aumento da fração volumétrica de martensita com o aumento da redução da espessura dos corpos de prova, como pode ser observado no gráfico da Figura 43 (LITOVCHENKO et al, 2012).

Figura 43 – Volume em porcentagem de martensita ’ versus redução de espessura a partir da deformação por laminação, obtidos por difratometria de raios-X e medidas magnéticas.

Fonte: Autora, “adaptado de” Litovchenko et al, 2012.

Já para o ensaio de torção, observa-se um aumento de martensita para 70 – 95% em 3 voltas de torção, uma redução para 50 – 75% em 5 voltas e um aumento para 80% em 8 voltas, sugerindo que não apenas a transformação martensítica direta ocorre, mas também a reversa, como pode-se observar no gráfico da Figura 44, que relaciona resultados quantitativos obtidos por DRX e medições magnéticas do volume da fase martensita pelo número de voltas no ensaio de torção (LITOVCHENKO, 2012).

Figura 44 - Volume em porcentagem de martensita ’ versus número de voltas a partir da deformação por torção de alta pressão, obtidos por difratometria de raios-X e medidas magnéticas.

Fonte: Autora, “adaptado de” Litovchenko et al, 2012.

No trabalho realizado por Litovchenko et al (2012), não houve aumento significativo de temperatura que justifique a transformação de fase, apesar de alguns pontos excederem 60

°C, levando-se a conclusão de que a maior causa da transformação martensítica reversa foram os campos de alta tensão local e seus gradientes gerados através da deformação plástica severa aplicada durante o ensaio nas estruturas de martensita com elevada densidade de discordâncias (LITOVCHENKO et al. 2012).

Em outro trabalho, Litovchenko et al (2013), utilizando o mesmo material de seu trabalho anterior, avaliou a influência da taxa de carregamento na transformação de fase do material através do ensaio de alta pressão aplicada à torção e observou que a mudança na taxa de carregamento influencia na transformação da martensita. Em baixos carregamentos, observou-se o aumento da fração de martensita, que atingiu 80% em 8 voltas no ensaio de torção. Já em altos carregamentos, houve a diminuição da fração de martensita, que alcançou

no máximo 50% em 4 voltas e reduziu a aproximadamente 20% em 8 voltas, como pode-se observar no gráfico da Figura 45 (LITOVCHENKO et al, 2013).

Figura 45 – Variações de volume da martensita ’ durante deformação em ensaio de torção de alta pressão mensurados por difratometria de raios-X (XRD) e medidas magnéticas (Magn).

(a) Taxa de carregamento  = 360 deg/min, (b)  = 200 deg/min e  = 915 deg/min.

Fonte: Autora, “adaptado de” LITOVCHENKO et al, 2013.

Litovchenko et al (2013) observaram algumas diferenças na fração volumétrica de martensita medida pelas técnicas de difratometria de raios-X e ferritoscopia, e atribuíram a diferença a distribuição da fase no material. Através de análises realizadas em microscópio eletrônico de transmissão nas amostras após 5 rotações no ensaio, notou-se regiões de austenita livre de defeitos, o que mostra que o material sofreu uma recristalização dinâmica e assumiu-se que essas áreas foram formadas como resultado da transformação martensítica reversa e também recristalização dinâmica. Com isso, tem-se que o conteúdo de martensita ’

é dependente do grau de deformação, e que a redução da fração volumétrica de martensita é a prova experimental da transformação martensítica reversa. Através dos resultados, além da dependência do conteúdo de martensita com o número de voltas, ou seja, com a deformação plástica severa aplicada, foi sugerido a existência de uma transformação de fase cíclica ( → ’ →  → ’), que ocorre devido ao aumento da temperatura local, levando a recristalização dinâmica seguida ou acompanhada da transformação martensítica reversa. Os autores concluíram que os processos de transformação direto e reverso ocorrem simultaneamente ao processo de acúmulo e relaxação dos defeitos, o que pode ser uma das

formas de dissipação de energia durante o processo de torção de alta pressão (LITOVCHENKO et al, 2013).

Em trabalho realizado por Marangoni (2012), onde avaliou-se a possibilidade da transformação martensítica reversa da ferrita em austenita induzida por deformação no aço inoxidável dúplex UNS S31803, ou SAF 2205, realizou-se a deformação plástica através do processo de laminação em temperatura ambiente, observando-se uma redução da fração volumétrica de ferrita com o aumento da deformação plástica aplicada, como mostra a Figura 46. Por meio de difração de raios-X e micrografias, percebeu-se que tanto nas condições originais quanto depois de aplicado o trabalho mecânico à frio, a microestrutura do material em estudo não apresentou outra fase a não ser ferrita e austenita (MARANGONI, 2012).

Figura 46 - Porcentagem de ferrita em função da deformação plástica.

Fonte: MARANGONI, 2012.

Observou-se também que em dada deformação plástica, a fração da fase ferrítica passa a não decrescer mais com o aumento da deformação, e é estabilizada em aproximadamente 43%, como mostra a linha verde do gráfico da Figura 46. Esse resultado mostra a possibilidade de existir um mínimo de ferrita presente no material em estudo; assim, mesmo aplicando mais energia de deformação nesse aço inoxidável dúplex, a transformação de fases induzida por deformação não ocorre mais. Observou-se também que o limite de deformação plástica efetiva é de aproximadamente 0,2, representado pela linha verde no gráfico da Figura

46. A autora concluiu que uma possível explicação para esse fenômeno seria que em determinada deformação, existe uma elevada quantidade de discordâncias e um grau de encruamento bastante elevado, impedindo a ocorrência dos campos de tensões elásticas necessários para a nucleação de austenita (MARANGONI, 2012).

Através das micrografias das seções longitudinal e transversal das amostras apresentadas por Marangoni (2012) representadas nas Figuras 47 e 48, respectivamente, pode-se obpode-servar as fapode-ses ferrita, lisa e em alto relevo, e austenita, com maclas e baixo relevo nas condições sem deformação, além de amostras com dois valores intermediários de deformação plástica e com o máximo de deformação plástica aplicada. Nas amostras mais deformadas plasticamente nota-se formação serrilhada nos contornos de ferrita e austenita, que estão representadas por círculos vermelhos. Estes podem ser indícios da transformação de fase induzida pelo trabalho mecânico a frio aplicado similar a uma transformação martensítica reversa (MARANGONI, 2012).

Figura 47 – Micrografias com aumento de 50 vezes e ataque com ácido oxálico na seção longitudinal. (a) Amostra original (b) 15% deformada (0,187 de deformação) (c) 40%

deformada (0,549 de deformação) e (d) 55% deformada (0,852 de deformação).

Fonte: MARANGONI, 2012.

Figura 48 - Micrografias com aumento de 50 vezes e ataque com ácido oxálico na seção transversal. (a) Amostra original (b) 15% deformada (0,187 de deformação) (c) 40%

deformada (0,549 de deformação) e (d) 55% deformada (0,852 de deformação).

Fonte: MARANGONI, 2012.

Em trabalho posterior realizado pela mesma autora, Marangoni (2015) estudou a mesma transformação de fases, porém com trabalho mecânico à frio realizado através de ensaios de compressão em temperatura ambiente no aço inoxidável superdúplex UNS S32750. O resultado obtido foi similar a seu trabalho anterior, ou seja, observou-se a diminuição da fração volumétrica de ferrita com o aumento do encruamento sem a formação de novas fases, como pode-se observar no gráfico da Figura 49, que relaciona a fração volumétrica da fase ferrita com a redução de altura do corpo de prova (MARANGONI, 2015).

Figura 49- Fração de ferrita da área lateral dos corpos de prova em função da redução de altura aplicada.

Fonte: MARANGONI, 2015.

O mesmo fenômeno foi observado no trabalho de doutorado de Forgas (2016), cujo objetivo era comprovar a transformação de ferrita em austenita em um aço inoxidável dúplex UNS S31803 induzida por deformação plástica através de ensaios de tração em temperatura ambiente em amostras solubilizadas em temperaturas diferentes, e observou-se que a quantidade de ferrita diminuiu com o aumento do encruamento, como pode-se observar no gráfico da Figura 50 que relaciona a fração de ferrita à deformação efetiva. O autor comenta que não houveram fenômenos térmicos que expliquem tal transformação, além de que as únicas fases presentes antes e após a deformação são a ferrita e austenita, concluindo-se que a transformação de fase observada se deu como consequência da deformação plástica imposta, similar a transformação martensítica reversa induzida por deformação (FORGAS, 2016).

Figura 50 - Variação da fração em volume de ferrita, medida pelo ferritoscópio, pela deformação efetiva.

Fonte: FORGAS, 2015.

Em trabalho realizado pelo grupo de pesquisas em que se insere essa dissertação (FORGAS, MARANGONI, OTUBO, DONATO, MAGNABOSCO, 2016) estudou-se a possibilidade da transformação martensítica reversa induzida por deformação da ferrita em austenita em dois tipos de aço inoxidável dúplex tratados termicamente em três temperaturas de solubilização, sendo elas 1000, 1100 e 1200 °C, deformadas plasticamente em ensaios de tração na região de deformação não uniforme (estado triaxial de tensão), compressão (estado uniaxial) e laminação (estado biaxial). Para cada temperatura de solubilização, avaliou-se o efeito do estado de tensão-deformação na transformação martensítica reversa. Para cada deformação aplicada, mediu-se a fração volumétrica das fases presentes através da ferritoscopia, difração de raios-X e análises metalográficas, e avaliou-se as fases presentes, verificando-se a presença de apenas fases ferrita e austenita em todas as amostras estudadas.

Observou-se uma menor fração volumétrica de ferrita nas amostras onde houve uma maior deformação plástica, confirmando a hipótese da transformação martensítica reversa induzida por deformação de ferrita em austenita, e que a quantidade de transformação

martensítica é proporcional a deformação ou energia de deformação aplicada. Todavia, os diferentes estados de tensão levam a diferentes comportamentos de transformação.

Segundos Forgas et al (2016), o estado de tensão triaxial gerou uma maior quantidade de ferrita transformada pela TMRID em relação aos demais estados, devido ao seu nível de energia de deformação ser superior aos estados biaxial e uniaxial, concluindo-se que não apenas a quantidade de deformação plástica aplicada, mas também os diferentes estados de deformação influenciam no comportamento da TMRID da ferrita em austenita nos aços inoxidáveis dúplex.

Com isso, tem-se que o processo de deformação gera a energia de ativação necessária em consequência do cisalhamento imposto no trabalho mecânico para que a transformação martensítica reversa aconteça. Quanto maior o estado de tensão axial no material, maior é a tensão de cisalhamento e mais pronunciada é a TMRID, pois maior é a geração de discordâncias e suas interações, o que aumenta a energia interna do material e com isso a energia total do sistema. Dessa forma, pode-se associar esse aumento da energia total do sistema devido a energia de deformação imposta pelo trabalho à frio com a energia livre necessária ao potencial termodinâmico (U’) para a transformação de fases definida na Figura 9, podendo ser essa a responsável pela redução da fração volumétrica da fase ferrita na TMRID.

Quando o material é submetido a esforços mecânicos, ocorre a transformação martensítica onde a fase com maior energia livre de Gibbs se transforma na fase com menor energia de Gibbs. Em aços convencionais, a austenita é mais estável em altas temperaturas enquanto a ferrita é mais estável em baixas temperaturas; durante a transformação martensítica, a austenita se transforma em ferrita. Já nos aços inoxidáveis dúplex, como pode-se obpode-servar no diagrama de equilíbrio reprepode-sentado na Figura 51, a austenita é a fapode-se mais estável em temperaturas baixas (por apresentar menor energia livre de Gibbs), fazendo que quando se aplica um esforço mecânico no material, a ferrita metaestável de altas temperaturas se transforma martensiticamente em austenita, caracterizando a transformação martensítica reversa induzida por deformação.

Figura 51 - Fração das fases em função da temperatura para o aço SAF 2507 (UNS S32760) calculados pelo Thermo-Calc usando a base de dados TCFE9.

Fonte: Autora.

Dessa maneira, para a transformação martensítica reversa, abordada no presente trabalho, tem-se o diagrama esquemático da Figura 52, onde a fase ferrita se torna austenita com a aplicação do trabalho mecânico a frio aplicado, antagônico ao diagrama da Figura 9.

Figura 52 - Gráfico de Energia Livre de Gibbs em função da temperatura para as fases austenita e martensita de um aço inoxidável dúplex que passaria por transformação martensítica reversa induzida por deformação.

Fonte: Autora, “adaptado de” WAYMAN e BADESHIA, 1996.

Por meio dos trabalhos aqui abordados, tem-se evidências da ocorrência da transformação martensítica de austenita induzida por deformação, tanto nos trabalhos referentes aos aços inoxidáveis austeníticos, quanto nos de dúplex: há a transformação da austenita em martensita com a aplicação da deformação plástica a frio. Nota-se ainda que, a fração de martensita transformada aumenta quanto maior é a deformação plástica aplicada, assim como quanto maior é o superresfriamento ao qual o material é submetido durante a deformação.

Diversos trabalhos relataram indícios da transformação martensítica reversa induzida por deformação, como o trabalho realizado por Maclaren et al (2006) que relatou a transformação martensítica de ferrita para austenita em um aço nanocristalino perlítico através da deformação por torção, que provocou uma tensão de cisalhamento no material fazendo com que a estrutura CCC se transformasse em CFC. Ivanisenko et al (2006) também observou

a transformação de ferrita em austenita através da aplicação de uma deformação plástica severa em um aço perlítico, resultando em uma estrutura nanocristalina.

Apesar de alguns trabalhos relatarem a transformação de fase martensítica (TMID) nos aços inoxidáveis dúplex, como nos trabalhos de Aguiar et al (2019), Aguiar et al (2020), Tavares et al (2006) e Breda et al (2014), houve trabalhos que relataram a não ocorrência da TMID em aços dúplex e superdúplex, como no trabalho de Lo e Lau (2010) e Tavares et al (2020). Nos trabalhos realizados pelo grupo de pesquisas que se insere o presente trabalho, observou-se a ocorrência da transformação martensítica reversa induzida por deformação plástica (TMRID) em temperatura ambiente de aços inoxidáveis dúplex e superdúplex

Com base nos resultados obtidos nos trabalhos anteriores justifica-se o objetivo do presente trabalho, que avaliará a Transformação Martensítica Reversa Induzida por Deformação (TMRID) de ferrita em austenita de um aço inoxidável superdúplex UNS S32750 a partir da avaliação da influência do grau de deformação e da temperatura de trabalho a frio, comparando-se o material deformado com diferentes deformações e em temperaturas ambiente e criogênica.

3 METODOLOGIA

O material em estudo foi obtido na forma de uma barra cilíndrica de 82 mm de diâmetro e 3 metros de comprimento de aço inoxidável superdúplex UNS S32750, fornecido pela empresa Villares Metals, cuja composição química pode ser observada na Tabela 6. O material foi entregue na condição de tratamento térmico através de solubilização realizado a 1120 °C por 1,5 h com resfriamento em água, e processo de acabamento por descascamento.

Tabela 6 – Composição química (%massa) do aço inoxidável dúplex em estudo fornecido pela Villares.

Cr Ni Mo N Mn Si W Cu Fe

25,17 6,88 3,61 0,25 0,60 0,40 0,69 0,58 bal.

Fonte: Villares Metals

A barra foi estudada através de equipamentos de propriedade do Centro de Desenvolvimento de Materiais Metálicos – CDMatM-FEI conforme será apresentado na sequência.

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