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Transformações nas relações de produção e as bases para o ataque aos trabalhadores

4 TRANSFORMAÇÕES NAS RELAÇÕES DE PRODUÇÃO E A OFENSIVA AOS TRABALHADORES

4.1 Transformações nas relações de produção e as bases para o ataque aos trabalhadores

Conforme argumenta Bihr (2010), no momento inicial ao pós-Segunda Guerra mundial, ocorre um acelerado crescimento da produção e dos níveis de produtividade. Porém, esse ganho contínuo de produtividade, que marcou a primeira etapa dos trinta anos que os entusiastas do capital trataram como “gloriosos”, não se repetiu continuamente nas décadas seguintes. Sucedendo esse primeiro movimento, verificou-se, principalmente a partir do decênio de 1960, uma queda nos ganhos de produtividade. Isto significava que as matizes orientadoras do modelo produtivo vigente, bem como sua rigidez de processos de produção de mercadorias e controle sobre os trabalhadores demonstravam preocupantes sinais de esgotamento. “Essa inversão de tendência ocorreu mais cedo nos Estados Unidos (desde meados dos anos 60) do que na Alemanha e no Japão (início da década de 70); mas nenhum país capitalista desenvolvido dela escapou” (BIHR, 2010, p. 69).

Do ponto de vista político, o processo de concentração do proletariado em grandes plantas industriais era um aspecto que viabilizava condições mais favoráveis para o fortalecimento da organização política dos trabalhadores, ainda que esse elemento não fosse a

única variável que beneficiava o aglutinamento político do movimento proletário. Ainda de acordo com Bihr, as massas de trabalhadores concentradas pelo padrão produtivo fordista “dotaram o proletariado industrial de uma capacidade objetiva e subjetiva de luta que lhe permitiu, durante alguns anos, bloquear ou pelo menos entravar seriamente o processo de sua exploração” (2010, p. 87). Acrescente-se a esse aspecto que a rígida separação entre as áreas de produção e controle também abria espaços para a organização política do operariado, pois acentuava o caráter de hierarquia e coerção, provocando a reação operária.

A prática de grande concentração de força de trabalho em suas plantas industriais era um elemento necessário para possibilitar o desenvolvimento do modelo fordista de produção em massa “verticalizado”. Contudo, esse agrupamento de trabalhadoras causava sempre um risco para os capitalistas, visto que ampliava as possibilidades de mobilização política do proletariado. Bernardo esclarece que a existência dessas grandes unidades de produção criava um “limite, além do qual o acréscimo da concentração começa também a ter como efeito economias de escala decrescentes” (BERNARDO, 2004, p. 77). Em outras palavras, com a continua incorporação de novos maquinários aos equipamentos já instalados, agrupava-se mais força de trabalho para o seu funcionamento, o que progressivamente desacelerava os ganhos de produtividade, que se tornaram relativamente menores com o passar dos anos.

Ainda de acordo com a análise de Bernardo (2004, p. 77), diante desse contexto, no período compreendido entre os decênios de 1960 e 1970, “desenvolveu-se em todo o mundo um vasto movimento de contestação que, em vez de se limitar a exigir uma maior participação nas riquezas, teve como características principais colocar em causa a disciplina reinante nas empresas”. Tratava-se de impor lutas políticas que se confrontavam diretamente com as formas de controle exercidas sobre o trabalho.

A manifestação ampliada e potencialmente mais explosiva dessas contestações e resistências se materializou nas gigantescas mobilizações, não apenas de estudantes, mas principalmente de trabalhadores, na França, em 1968 (BERNARDO, 2008); e no ano seguinte, no chamado Autunno Caldo (Outono Quente) na Itália, com intensas mobilizações operárias30, o que resultou na obtenção de uma série de conquistas trabalhistas na Itália; e

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Numa conjuntura marcada por enormes greves e protestos na Itália, em novembro de 1969, cem mil operários metalúrgicos de todo país reuniram-se em Roma para pressionar o patronato nas negociações da convenção coletiva de trabalho. O resultado dessas intensas mobilizações no final dos anos 60 na Itália foi a criação em 1970 do Statuto dei Lavoratori e de outras legislações trabalhistas. Conforme Kumar (2006, p. 79), “as leis desses anos deram aos trabalhadores uma segurança quase absoluta no emprego e permitiram que os sindicatos estabelecessem conselhos de fábrica dotados de grandes poderes”. A resposta da burguesia italiana não tardou a vir; chegou entre as décadas de 1970 e 1980. Uma das principais estratégias foi a dispersão de unidades produtivas, cuja principal expressão foi a “Terceira Itália”, nome cunhado para descrição do desenvolvimento da produção capitalista nas regiões central e norte-oriental da Itália, com “pequenas oficinas e fábricas, empregando

ainda em 1969, no Cordobazo, na Argentina. Já nos Estados Unidos, o poder de domínio da estrutura de poder burguesa foi abalado pelo movimento em torno da luta por direitos civis durante toda década de 1960 e início do decênio seguinte. A efervescência desse período também se expressou nos movimentos de contracultura, na luta contra os embates bélicos no Vietnã, no movimento dos negros americanos e dos gays de São Francisco, além dos grupos feministas na Europa.

No período de auge do modelo fordista em combinação com as políticas keynesianas, todos os indicativos sinalizavam que a acumulação capitalista ia muito bem, garantindo elevadas taxas de lucratividade e ciclos econômicos com repetidos aumentos na produção, crescimento nos índices de produtividade e resultados positivos com vultosos excedentes de capital. Quando tudo parecia perfeito, isso era, na verdade, o sinal que uma enorme crise se aproximava no horizonte. De forma sintética: a produção e a acumulação capitalistas, aceleradas em sua máxima velocidade possível, não promovem a reprodução de seus períodos de ascensão a um patamar superior de virtuosidade. Muito pelo contrário, seu “bom” funcionamento é o que leva ao seu próprio colapso. O mercado estava saturado de mercadorias e o montante de capital acumulado já não encontrava amplo espaço para a circulação de seu fluxo de valorização.

O cenário econômico, político e social da segunda metade da década de 1960 já indicava que o binômio fordista/keynesiano achava-se com significativos sinais de depauperamento para agir como propulsor do processo de acumulação (ANTUNES, 2009). Em outros termos, os mecanismos de impulso aos ciclos de valorização de capital passaram a apresentar falhas para a manutenção de um fluxo ampliado de acumulação. Ainda que tais debilidades não impedissem o processo de acúmulo de capitais, criavam obstáculos econômicos, com efetivos desdobramentos também no controle político.

Do ponto de vista mais estritamente econômico, durante cerca de trinta anos o capitalismo vivenciou uma longa onda de crescimento, que se iniciou na segunda metade da década de 1940, período em que a produção capitalista se elevou consideravelmente (BIHR, 2010), em especial nos países de capitalismo avançado. Num período de quase vinte anos, o crescimento do Japão chegou a atingir, entre 1947-1966, taxas de 9,6%, e as seis principais economias da Europa cresceram 8,9% (MANDEL, 1982). O metabolismo do sistema apresentava sinais aparentemente seguros de uma vitalidade duradoura quanto ao crescimento.

em geral não mais de 5-50 operários” (KUMAR, 2006, p. 77). O autor complementa, argumentando que a Terceira Itália “é principalmente resultado de uma fuga para proteger-se do trabalho organizado e uma tentativa de recuperar o controle sobre a força de trabalho” (KUMAR, 2006, p. 79).

A expansão industrial nessa quadra histórica, mesmo que apresentando índices e parâmetros heterogêneos e diferenciados, desenvolveu-se em várias regiões do mundo (VICENTE, 2009). Apesar desses fatores positivos, um dos limites mais significativos para o processo de acumulação foi o poder de organização dos trabalhadores, pois “havia escassez de mão de obra, tanto na Europa quanto nos EUA. O trabalho era bem organizado, razoavelmente bem pago e tinha influência política” (HARVEY, 2012, p. 20).

O quadro econômico dos países imperialistas ao final dos anos sessenta apresentava sinais consistentes de problemas graves. Harvey (2002) diz que já partir de 1966 houve uma queda nos níveis de produtividade nos EUA, cuja correção por meio de medidas econômicas resultou em um crescimento inflacionário, solapando “o dólar como moeda-reserva internacional estável” (2002, p. 135). O adensamento da situação ocorreu em razão da necessária tentativa de manutenção do movimento de expansão, fazendo com que entre os anos 1969 e 1973 esse crescimento tenha se dado mediante “uma política monetária extremamente frouxa por parte dos Estados Unidos e da Inglaterra” (HARVEY, 2002, p. 136), contribuindo para a elevação das taxas de inflação.

Contudo, cabe ponderar que esse crescimento inflacionário no período denotava apenas em “termos” esse afrouxamento, isso porque a inflação também se tornou um mecanismo para que os grandes monopólios pudessem majorar o valor de suas mercadorias, ajustando preços a padrões de acumulação mais elevados. O resultado disso foi a retirada de um maior volume de riqueza do conjunto da sociedade, em benefício dos monopólios e de uma parcela rentista que já se tornara cada vez mais poderosa. Esse processo tornou-se possível porque os grandes monopólios capitalistas possuem uma robusta capacidade de investimento, de manipulação dos mercados internacionais e de domínio dos aparatos ideológicos, além de um elevado poder para pressionar os Estados em seus benefícios31.

Mas, no final da década de 1960, o quadro de piora econômica também esteve acompanhado de algumas fraturas no poder de domínio do imperialismo monopolista. Linhart

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Se esta é a realidade hoje, e se o capitalismo monopolista teve sua consolidação somente ao final do século XIX, Smith já indiciou os malefícios do poder dos monopólios em associação com os governos de sua época. Se aquelas protoformas embrionárias dos monopólios já eram um motivo de preocupação para Smith, o que diria o velho professor inglês de filosofia moral ao ver as atrocidades sociais patrocinadas pelas megacorporações do século XXI? Vejamos a crítica de Smith: “O comércio, que deveria naturalmente ser, entre as nações como entre os indivíduos, um traço de união e de amizade, transformou-se na mais fecunda fonte de discórdia e de animosidade. A ambição extravagante de reis e ministros, durante o século atual e o passado, não tem sido mais fatal para a tranquilidade da Europa do que a inveja impertinente dos comerciantes e dos manufatores. A violência e a injustiça dos governantes da humanidade constituem um mal antigo para o qual receio que a natureza dos negócios humanos dificilmente encontre um remédio. Entretanto, embora talvez não se possa corrigir a vil capacidade e o espírito monopolizador dos comerciantes e dos manufatores, que não são nem deveriam ser os governantes da humanidade, pode-se com muita facilidade impedi-los de perturbar a tranquilidade de pessoas que não sejam eles mesmos” (1996, p. 471).

chama atenção para o período entre 1968 e 1975, classificando-o como “tempo de recusa” (2007, p. 35), com violentas greves, inclusive com várias dessas ações fugindo ao controle dos organismos sindicais, que durante algumas décadas haviam optado pela estratégia da conciliação e da “negociação”. Os trabalhadores, individualmente ou organizados coletivamente, promoveram o boicote e a resistência ao trabalho taylorista/fordista e ao despotismo fabril. Registraram-se também altos índices de absenteísmo, de turnover e uma elevada taxa de rotatividade.

Mas o período não foi marcado tão somente por uma efervescência política favorável às demandas dos trabalhadores, já que também houve algumas contradições e limites. Sobre o processo de luta política estabelecido entre as classes durante os trinta anos de expansão acelerada do capital, há também que se considerar um aspecto contraditório central. A luta política travada ocorreu, fundamentalmente, por direitos e outras demandas alojadas no interior dos limites burgueses; sua direção não apontou diretamente para a libertação das amarras capitalistas. Se, por um lado, houve um fortalecimento do poder político dos trabalhadores, sua ação reivindicatória também fez gestar algumas características que se colocaram, em seguida, como problemas para o proletariado.

Bihr salienta que:

[...] ao longo de todo o período fordista, as organizações sindicais e políticas tentaram canalizar a conflitualidade proletária, propondo-lhe e/ou impondo-lhe objetivos e perspectivas compatíveis com os termos do dito compromisso, e combatendo violentamente qualquer tentativa de explosão do quadro desse compromisso. Por exemplo, as organizações sindicais responderam às lutas, que alguns elementos do proletariado ocidental continuaram a conduzir contra sua expropriação crescente em relação ao processo de trabalho, com reivindicações relativas aos salários, classificações, carreiras etc., tornando-se assim aliadas, se não cúmplices, das direções capitalistas. (2010, p. 46).

As formas de organização política dos trabalhadores, tipicamente vinculadas à social- democracia europeia, tiveram na possibilidade de integração com a burguesia parte de sua lógica e tática desenvolvida, tendo na negociação o instrumento mediador. Entretanto, isso não se reduz a dizer que os conflitos e as contradições pudessem ser sanados. Coube ao Estado encarregar-se de criar condições relativamente adequadas para o atendimento de algumas das demandas dos trabalhadores, sem que com esse atendimento fossem negados os interesses do capital. Assim, o Estado foi, simultaneamente, gerenciador de respostas às lutas empreendidas pelos organismos políticos dos trabalhadores e garantidor de que o

compromisso fordista pudesse ser efetivado sem um rompimento com o metabolismo expansionista do sistema.

Mas, se as dimensões políticas estatais estiveram fortemente presentes na dinâmica da reprodução social durante o Estado de bem-estar, as mazelas sociais continuaram a ser geradas pelos mecanismos de acumulação do capital. Movida por insanáveis contradições, a virtuosidade que o sistema apresentou durante algumas décadas, contraditoriamente, era expressão de uma virtuosidade que, ao ser processada e ampliada, promovia no seu interior seus próprios obstáculos e decadência. O ciclo de ascendente vitalidade da economia capitalista foi gerando no seu metabolismo as contradições que se colocaram, em seguida, como barreiras para a expansão da acumulação. Os fundamentos teóricos dessas contradições são exatamente aqueles apontados por Marx na Lei geral da acumulação capitalista.

O constante investimento em capital constante acelerou os níveis de produtividade e jogou no mercado uma quantidade progressivamente maior de produtos. Por sua vez, as condições históricas de expansão do mercado, conduzidas pelos grandes monopólios para a periferia, e o fortalecimento das economias centrais propiciaram condições de ganhos contínuos e num fluxo crescente.

Porém, tudo isso que a priori poderia ser tomado como fatores inegavelmente positivos, acabou por criar as condições de adversidade que o próprio capital teve de enfrentar. No plano econômico, o rebaixamento da taxa média de lucratividade e a saturação do mercado com a massa de bens produzidos apresentaram-se como obstáculos. No plano político, havia o desafio de enfrentar o poder de aglutinação e contestação da classe trabalhadora. O movimento de ascensão do capital iniciado no pós-segunda guerra depara-se na década de 1960 com falhas no seu padrão de acumulação. Em resumidas palavras: após um período de bonança para o capital, uma longa crise tinha início.

Se a década de 1960 expressou os sinais de aviso de uma grave crise, a década de 1970 demonstrou a magnitude de sua severidade, debilitando as taxas de acumulação, ao tempo que o poder organizativo dos trabalhadores ainda mantinha uma resistência relativamente consistente. Alguns episódios históricos no início daquele decênio ficaram marcados como símbolos das dificuldades que o capital enfrentava. Em 197332, o substancial aumento do

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Conforme argumenta Vicente: “A denominada crise de 1973 aconteceu em contrapartida ao apoio dos Estados Unidos dado a Israel em relação à ocupação de territórios palestinos durante a guerra do Yom Kippur. Como represália, os países árabes organizados na Opep decidiram aumentar o preço do petróleo em mais de 300%. O embargo pretendia ainda pressionar o mundo ocidental a apoiar os árabes contra os israelenses. Em 1979, a paralisação da produção iraniana, como consequência da revolução islâmica liderada pelo aiatolá Khomeini, provocou o segundo grande choque do petróleo, elevando em mais de 1.000% o preço médio do barril iraniano. Os preços permaneceriam altos até 1986, quando voltaram a cair” (VICENTE, 2009, p. 125).

preço do petróleo e, em seguida, a derrota americana no Vietnã, expuseram as fraturas no sistema, o que ocorria devido a uma relativa perda de controle do imperialismo monopolista, além de resistências nas bordas periféricas. Somam-se a isso, no decorrer da mesma década, os processos revolucionários em Portugal, na Nicarágua e, em alguma medida, também no Irã.

4.1.2 Contradições da acumulação de capital no interior da rigidez fordista

O final da década de 1960 já sinalizava a exaustão do processo de crescimento acelerado da produtividade. Havia o agravante de que as taxas de lucratividade, que antes se mantiveram em elevados índices, exibiam um preocupante quadro de declínio33 (HARVEY, 2002). Não há uma concordância entre os autores pesquisados quanto ao tamanho ou à proporção em que essa queda ocorreu. Contudo, há um entendimento de que a tendência predominante entre fins da década de 1960 e durante a década de1970 foi de queda nas taxas de lucros. De acordo com Pergher e Valada (2016), existe certo consenso na interpretação dos autores marxistas de que a queda na taxa média de lucratividade é parte nuclear para a interpretação sobre a anatomia da crise capitalista desencadeada na década de 1970.

A respeito das características e dos efeitos da tendência de diminuição na taxa média de lucratividade, Mészáros assinala alguns argumentos pertinentes ao contexto do capitalismo contemporâneo:

O estreitamento da margem de acumulação lucrativa do capital afetou grandemente as perspectivas do movimento dos trabalhadores até mesmo na maioria dos países de capitalismo avançado. Não apenas piorou o padrão de vida da força de trabalho em emprego formal (para não mencionar as condições de milhões de pessoas desempregadas e subempregadas), mas, como mencionado na última seção, também reduziu as possibilidades da sua ação autodefensiva como resultado da legislação autoritária imposta às classes trabalhadoras pelos seus parlamentos supostamente democráticos. (MÉSZÁROS, 2002, p. 824).

Ao analisar as médias de taxas de lucros dos monopólios não financeiros norte- americanos entre 1947 e 2010, Shaikh (apud PERGHER; VALADA, 2016) aponta para seu

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Ao analisarem o esgotamento do binômio fordista/keynesiano e seus desdobramentos econômicos no final da década de 1960 e início da década seguinte, Netto e Braz (2008, p. 215) indicam que: “A taxa de lucro, rapidamente começou a declinar: entre 1968 e 1973, ela cai, na Alemanha Ocidental, de 16,3% para 14,2%. Na Grã-Bretanha, de 11,9% para 11,2%; na Itália, de 14,2% para 12,1%; nos Estados Unidos, de 18,2% para 17,1% e, no Japão, de 26,2% para 20,3%”. No período entre 1980-1982, essas taxas tiveram um declínio ainda maior. Harvey (2002, p. 137) expõe uma vigorosa queda nas taxas de lucratividade e de acumulação entre 1968 e 1975, seguida por uma pequena melhora nos anos seguintes e uma nova queda entre 1978 e 1980.

mais baixo nível alcançado em 1982, quando essa média chegou a 5%, contrastando com a média de pouco mais de 15% em 1951. Os autores ainda assinalam a existência de uma relativa oscilação das taxas entre 1947 e 1982. Essas flutuações foram impulsionadas por diversos fatores, porém a tendência observada ao longo desse período foi essencialmente de queda.

A retomada das taxas de lucratividade só veio a partir de 1983; a força motriz que conduziu esse crescimento esteve baseada na elevação da exploração sobre o trabalho. Em resumidas palavras: “[...] em países como os Estados Unidos e o Reino Unido, houve um aumento sem precedentes na exploração do trabalho, manifesto na diminuição dos salários reais em relação à produtividade” (SHAIK apud PERGHER; VALADA, 2016, p. 149).

O aumento da superpopulação relativa e as transformações tecnológicas possibilitaram que as taxas de lucro fossem retomadas nos anos seguintes. Numa breve análise desses elementos, é possível realizar algumas reflexões pertinentes a essa conjuntura histórica. As práticas neoliberais, incorporardes pelos governos de praticamente todo o mundo, nas décadas de 1970, 1980 e 1990, promoveram aumento do desemprego, a ampliação da desigualdade e o ataque aos organismos políticos dos trabalhadores, como remédios para a recuperação das taxas de lucratividade. Por sua vez, profundas mudanças tecnológicas marcadas pela inserção de novos aparatos microeletrônicos e informacionais, potencializaram o uso da força de trabalho. O conjunto de ações políticas desencadeados pelo receituário neoliberal, em articulação com as intensas transformações tecnológicas, foi um elemento propulsor para o crescimento da superpopulação relativa em escala global, ao tempo que possibilitou a retomada de maiores taxas de lucro.

Ao analisarem a variável das taxas de lucros nos Estados Unidos, Duménil e Lévy (2014) avaliam um período histórico bem mais extenso, de 1880 até 2008, quando eclode o último grande pico de crise capitalista. Conforme considerações dos autores, o momento de auge de média dessa taxa se localiza na segunda metade da década de 1940 (DUMÉNIL;