• Nenhum resultado encontrado

1. O divórcio parental

No segundo milénio tem-se tornado evidente o aumento do número de divórcios, o que pressupõe uma necessidade crescente de se desenvolverem mais investigações neste âmbito para averiguar as implicações que daí possam advir. O divórcio é um acontecimento passível de ocorrer no ciclo vital familiar, podendo afetar quer a sua estrutura, quer a dinâmica das relações entre os elementos que a compõem (Cano, Gabarra, Moré, & Crepaldi, 2009).

O aumento de divórcios e recasamentos, cada vez mais frequentes na sociedade em que vivemos, dão origem a um conjunto de mudanças, tanto na estrutura como nos papéis e relações estabelecidos entre os membros que a compõem (Fonseca, 2008).

Os dados mais recentes do número de divórcios em Portugal apontam para um aumento dos mesmos, onde 70% dos casais divorciados tinham pelo menos um filho, e 56,1% compreendiam idades a partir dos 10 anos (INE, 2010).

Neste sentido, ao longo do seu desenvolvimento, os jovens para além de vivenciarem todas as mudanças e transformações inerentes ao processo da adolescência, podem confrontar-se, também, com mudanças ou alterações na configuração familiar, como o divórcio dos pais. Estas alterações podem desencadear transformações significativas com todas as vicissitudes que compreendem um processo de separação, nomeadamente pela presença de conflitos interparentais que põem em risco a homeostasia familiar.

O divórcio dos pais, inicialmente, pode gerar culpa, raiva, medo e estados depressivos nos filhos contudo, com o passar do tempo os indivíduos evidenciam um crescente bem-estar e redução da tensão inicial relativamente à separação dos pais. Da alteração da configuração familiar podem advir resultados construtivos pela oportunidade que os filhos têm de verem ultrapassados e resolvidos os conflitos interparentais, o que lhes permite desenvolverem relacionamentos harmoniosos, melhorarem o crescimento pessoal e a própria promoção do seu bem-estar (Ramires, 2004).

Embora o período pós-divórcio acarrete mudanças e dificuldades nos elementos da família, com o decorrer do tempo, e uma vez resolvidos e ultrapassados

os conflitos, esse acontecimento poderá manifestar-se como uma mais-valia para os pais e filhos, evidenciando mesmo uma melhor qualidade de vida, amadurecimento emocional e capacidade de resiliência (Cano, Gabarra, Moré, & Crepaldi, 2009).

O divórcio como resultado de um casamento conflituoso pode resultar em melhorias no bem-estar psicológico dos filhos, ficando estes resguardados de um ambiente familiar aversivo e disfuncional (Amato, 2000).

O afastamento gradual entre as figuras parentais, após o divórcio leva à diminuição paulatina dos conflitos (Orellana, Vallejo, & Vallejo, 2004) e sendo notório o carácter prejudicial dos conflitos para o bem-estar psicológico dos filhos, o divórcio até poderá ser entendido como uma mais-valia para o ajustamento dos mesmos.

Os efeitos que o divórcio parental possa produzir nos filhos, podem não resultar propriamente do divórcio em si mas das alterações sociais que advêm da separação do casal, uma vez que as redes sociais podem estar comprometidas. Os filhos do casal podem ver-se obrigados a mudar de bairro, localidade ou escola o que implica deixar o grupo de pares e atividades em que estavam envolvidos e necessária uma reorganização e adaptação a novos contextos (Orellana, Vallejo, & Vallejo, 2004).

As diferenças emocionais entre filhos de pais separados e de famílias intactas podem não se dever exclusivamente ao divórcio, mas às condições e à forma como o casal gere a separação. Ou seja, as diferenças devem-se à perceção que os filhos têm relativamente à forma como o processo de divórcio é tratado, nomeadamente no que se refere à forma como o casal gere os conflitos, que muitas vezes podem ser de carácter destrutivo, e ao suporte social da figura paterna, que muitas vezes após o divórcio torna-se reduzido (Schick, 2002).

Os conflitos interparentais oriundos de relações disfuncionais têm impacto nos filhos, e ainda que com o divórcio parental os efeitos vão atenuando, na verdade a experiência conflituosa não é esquecida na totalidade e perdura na memória dos filhos ao longo do tempo (Orellana, Vallejo, & Vallejo, 2004). Neste sentido, a literatura parece ressaltar o cariz destrutivo face à perceção de conflitos interparentais, mais do que propriamente a rutura da relação parental.

Quando o divórcio parental é concomitante com o período de adolescência dos filhos do casal, e estes por sua vez se encontram envolvidos em relações amorosas, estas relações podem ser percecionadas como pouco seguras, comprometendo a qualidade e continuidade das mesmas, uma vez que o padrão de referência da relação dos pais falhou. Neste sentido, as relações de rutura dos pais pode servir de modelo e comprometer as relações amorosas dos filhos (Summers, Forehand, Armistead & Tannenbaum, 1998).

Os filhos cujos pais se divorciaram manifestam uma maior preocupação relativamente às suas relações amorosas, uma vez que o modelo conjugal que tinham como referência falhou (Cano, Gabarra, Moré, & Crepaldi, 2009).

Os resultados do estudo de Fonseca (2008), cujo objetivo foi analisar o compromisso e confiança nas relações íntimas dos jovens adultos filhos de pais separados, numa amostra de jovens com idades compreendidas entre os 18 e 25 anos, revelaram que quanto mais velho for o indivíduo, na altura da separação dos pais, menor confiança parece depositar no parceiro amoroso.

A pertinência de se estudar os efeitos das alterações na configuração familiar, como o divórcio dos pais, incide sobretudo na importância da manutenção dos vínculos entre pais e filhos após a separação. Tem-se verificado que o divórcio parental pode modificar e favorecer as relações entre pais e filhos, cuja alteração na estrutura familiar poderá inclusive fomentar o crescimento e adaptação de ambos, pais e filhos, e não apenas como sinónimo da continuidade ou criação de novos problemas, pois o divórcio muitas vezes é a melhor solução para um ambiente familiar conflituoso e destrutivo (Ramires, 2004).

A qualidade das relações entre filhos e pais divorciados pode predizer a capacidade de ajustamento dos filhos. Neste sentido, a relação entre figuras parentais e filhos pode ser significativa face à forma como se desenvolve a relação amorosa e o desenvolvimento de problemas de internalização. A qualidade das relações que os jovens e as figuras parentais mantêm após o divórcio, parecem ter uma maior influencia no desenvolvimento de relações amorosas e psicopatologia, do que propriamente o divórcio parental (Summers, Forehand, Armistead & Tannenbaum, 1998).

Assim, parece que a adaptação dos filhos ao divórcio dos pais depende da qualidade das relações que se estabelecem entre pais e filhos, do nível de conflitos, entre outros aspetos contextuais que podem afetar a transição e modificação da estrutura familiar (Ramires, 2004).

A qualidade e manutenção dos vínculos estabelecidos com os pais são preditoras da capacidade que os indivíduos demonstram quando confrontados com alterações ou transições na configuração familiar. A vinculação segura aos pais é um fator de resiliência nas dificuldades inerentes ao processo de divórcio. Deste modo, a separação dos pais nem sempre resulta numa experiência traumática para os filhos (Ramires, 2004).

As consequências diretas do divórcio parental, no que se refere ao bem-estar dos filhos, não são lineares e uniformes para todos os jovens, uma vez que outras variáveis parecem estar implicadas e agravar os efeitos, como fatores genéticos,

características dos pais, entre outras. As investigações devem centrar-se nas diferenças individuais ou contextuais que medeiam o processo de separação e não apontar o divórcio como principal causa do desajuste emocional e comportamental dos filhos (Lamb, 2010).

A adaptação dos filhos à nova condição familiar, após o divórcio dos pais, depende em grande parte da qualidade das relações que os pais mantêm para tratar das questões relativas aos filhos. Assim, se os pais mantiverem entre si uma atitude de cooperação, caracterizada pelo contacto frequente e de concordância relativamente aos assuntos dos filhos, estes de certo modo podem beneficiar do comportamento dos pais. Pelo contrário, quando a relação entre os pais é pautada por um ambiente hostil, onde impera a discórdia e disputa por interesses individuais e não pelos interesses dos filhos, estes vêm-se afetados negativamente (Orellana, Vallejo, & Vallejo, 2004).

PARTE II

ESTUDO EMPÍRICO

Capítulo IV – Estudo Empírico

Documentos relacionados