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Tratado de Amsterdam e as instituições européias

2. União Européia e o histórico institucional: sob o prisma da origem do déficit democrático

2.3. Processo de Integração e Cooperação Comunitário: origem nos interesses intergovernamentais

2.3.5. Tratado de Amsterdam e as instituições européias

A Conferência Intergovernamental de Turim (29.03.96) seria encerrada pela Reunião do Conselho Europeu de Amsterdam (16.06.97) da qual decorreu o respectivo Tratado (02.10.97). Em que pesem as alterações implementadas, a opinião majoritária é de que ele tenha ficado aquém das expectativas.187

Resultava evidente a necessidade de revisão do Tratado de Maastricht188, principalmente no que dissesse respeito ao processo de adoção de normas comunitárias e sua relação com a legitimidade das instituições européias. A redução dos procedimentos decisórios, a extensão do processo de co-decisão, e a sua simplificação, e ainda o acatamento da proposta irlandesa relativamente à participação dos Parlamentos nacionais foram as principais modificações do TUE.

A revisão preferiu levar a cabo mudanças não cruciais para o sistema comunitário e manteve as soluções anteriores para os casos de unificação dos Três Pilares da União e de hierarquia de normas comunitárias. Outras questões como a aplicação do princípio da subsidiariedade189 e da transparência ou publicidade dos atos comunitários190 permaneceram quase que afastadas dos debates na esfera

187 A revisão desse Tratado realizada em Dezembro/2000, na Conferência de Nice, menos de um

ano após a última ratificação, vem confirmar a opinião da autora. (PALMA, Maria J. Desenvolvimentos recentes na União Européia: o Tratado de Amsterdão In: Revista Jurídica de Blumenau n. 4/5 , Blumenau: Ed. Acadêmica, 1998/99, p. 140).

188O art. B do TUE, previa que a possibilidade de revisão pela Conferência que deve examinar “a

medida em que as políticas e formas de cooperação estabelecidas no presente Tratado devem ser revisadas para assegurar a eficácia dos mecanismos e instituições comunitárias”.

189 Recebeu guarida institucional no protocolo n. 07 ao Tratado de Amsterdam, sobre o princípio

da subsidiariedade e da proporcionalidade na aplicação de seus meios, proposta da presidência irlandesa que reconheceu o conteúdo dos acordos de Edimburgo de 1992 e o interinstitucional entre PE, Comissão e Conselho. No respectivo protocolo, resta claro o caráter deste princípio, que não atribui competências, mas apenas regulamenta os casos de repartição competencial entre CE e Estados-membros. A Declaração n. 3, de Alemanha, Áustria e Bélgica, propõe a ampliação dessas competências também para províncias ou estados federados. (Cf. PASTOR, Roberto V., Ob. cit., p. 204)

190 Inobstante a ocorrência dos debates em torno da garantia do princípio da transparência,

restaram ínfimas as modificações alcançadas. Além da nova redação do art. 207.3 TCE, segundo a qual o Conselho fixará, em seu regulamento interno, as condições de acesso ao público de seus documentos. Ainda recorreu-se ao novo art. 1 do TUE, garantindo à adoção das decisões

européia.

Relativamente à proposta de unificação dos Três Pilares da União Européia, contrariamente ao disposto nos informes do PE e do Conselho da União191, permaneceu a estrutura anterior: cada Comunidade manteve a sua capacidade jurídica garantida, em que pese o fato do ente político da União Européia continuar a carecer de proteção equivalente.

O sistema normativo comunitário, fundado na atribuição de competências singulares de cada instituição, sejam elas decisões do Conselho, exclusivamente, ou deste e do PE, conjuntamente, da Comissão ou do Banco Central Europeu, baseia a distinção de suas normas na diversidade de seus destinatários e na intensidade dos efeitos normativos (art. 189 TCEE).

Ao desconhecer a forma institucional da separação dos poderes, guardando a paridade formal entre as instituições comunitárias, o sistema comunitário acaba dificultando a racional e transparente produção legislativa, provocando inúmeras formas de desequilíbrio organizacionais. Ao impedir uma hierarquia normativa entre Lei e Regulamento, confunde e compartilha competências parlamentares e executivas, contribuindo para a descaracterização de um sistema legitimamente institucional.

O art. 189-B.8 TCE já expressava a possibilidade de ampliação do procedimento de co-decisão para outras matérias192. Atualmente esse procedimento abrange quase todas as matérias do procedimento de cooperação, à exceção da matéria relativa à implementação da União Econômica e Monetária, e também de algumas cobertas pelo procedimento de consulta, como no caso do aumento da capacidade legislativa do PE. No entanto, algumas competências definidas no âmbito legislativo pela Comissão não foram incluídas nesta transferência. Destas, são exemplos a política comercial comum, a política

comunitárias de forma “mais aberta possível”. A solução adotada é, no entanto, insatisfatória para os interesses da cidadania, pois permite que tal princípio seja aplicado, segundo as condições impostas por cada instituição. (Idem, p. 206)

191 Informe da Secretaria Geral do Conselho sobre a simplificação dos Tratados, SN 513/95. 192

Das competências existentes: política da não-discriminação(art. 12), da cidadania (art. 18), seguridade social (art. 42), liberdade de estabelecimento e serviços (arts.46.2 e 47.2), transportes (arts. 71.1 e 80), social (art. 137 e antigo Protocolo Social ), Fundo Social Europeu (art. 148), formação profissional (art. 150.4), redes transeuropéias (art. 156), aplicação de decisões do FEDER (art. 162), meio ambiente (art. 175) e cooperação e desenvolvimento(art. 179); acrescentam-se as competências relativas à política de emprego (art. 129), cooperação aduaneira (art. 135), igualdade de oportunidades e de tratamento(art. 141), saúde pública, no que se refere aos quesitos de segurança e alimentar e medidas fitossanitárias (art. 152), princípios gerais para implementar a transparência (art. 255), luta contra a fraude(art. 280), estatísticas (art. 285) e autoridade independente em matéria de proteção de informação (art. 286). (Cf. PASTOR, Roberto

comunitária sobre asilo e imigração, bem como alguns aspectos da PAC. Também não recebeu guarida a intervenção legislativa do PE em matéria de Fundos Estruturais e de Coesão, na disciplina de um Procedimento Eleitoral Uniforme (PEU) para a sua eleição193, em relação à adesão de novos Estados-membros, sem falar na participação, quase nula, no processo de revisão dos Tratados.

Restou simplificado o procedimento de co-decisão, agora circunstanciado no art. 251 do TCE, que permite aprovação, em primeira leitura, quando ambas as autoridades legislativas acordarem. E, em caso de desacordo, o trâmite passa a ocorrer diretamente entre as instituições, eliminando o papel mediático da Comissão. Suprimiu-se a possibilidade de atuação unilateral do Conselho na ausência de acordo na segunda leitura, esclarecendo que o exame pelo Comitê de Conciliação, se limita às emendas propostas pelo PE. Por último, revogou-se a terceira leitura.

Quanto à definição da máxima participação dos parlamentos nacionais nas tomadas de decisão comunitárias, o Tratado de Amsterdam se limitou a incorporar o Protocolo n. 13, no qual as instituições européias comprometem-se a repassar um maior número de informações àqueles órgãos.194

Foi mantido o rol de competências do Segundo Pilar (PESC), enquanto restaram transferidas algumas matérias do Terceiro (imigração e asilo) para o Primeiro Pilar. Ao Terceiro Pilar foi acrescida a possibilidade de realizar acordos externos no âmbito de sua competência.

A principal crítica em relação a esse Tratado, é a de que ele consagrou o mecanismo de cooperação reforçada, permitindo que alguns Estados-membros avancem no processo de integração mais do que outros. Para Maria Palma, isso significa a aceitação de uma construção diferenciada na Europa195, à guiza de

V, Ob. cit., p. 212)

193 Não houve resolução para o problema crônico do procedimento eleitoral europeu, deixando às

legislações nacionais a regulamentação de uma norma comum parcial, mas não necessariamente única (art. 190.4 TCE).Quanto ao Estatuto dos Parlamentares Europeus (art.190.5 TCE), o PE disporá sobre condições gerais de admissão, estatuto e exercício de funções dos deputados, segundo um regime comum, terminando com a atual fragmentação estatutária dos parlamentos europeus.(Cf. SOSPEDRA, Manuel M., Ob. cit., p. 90)

194 O Protocolo prevê o dever da Comissão em comunicar aos Parlamentos Nacionais as propostas

de legislação. Esta informação restará intermediada pelos Governos nacionais, no intuito de, ao final, afastá-los do processo legislativo europeu: “As propostas legislativas da

Comissão(...)estarão disponíveis com suficiente antecedência para que o Governo de cada Estado-membro possa levar para que seu Parlamento Nacional a receba de forma adequada.”(Idem, p. 91)

195A consagração do princípio da cooperação reforçada pode ser verificada no acordo firmado em

Paris (05/00), véspera da Cúpula da Maguncia:“(...) Da cooperação reforçada. Permitirá a

todo o esforço de criação de uma identidade comum.

Para a autora, a extensão das atividades parlamentares outorgada pelo TA ainda deixa muito a desejar. Seria necessário aumentar a pauta de competências nos seguintes aspectos: a) a obtenção de parecer obrigatório do PE em sede de revisão dos Tratados; b) abolição da distinção, em matéria orçamentária, de despesas obrigatórias e não-obrigatórias; c) a extensão do voto por maioria qualificada; d) a aplicação da co-decisão à totalidade das matérias.

Mesmo assim, o PE tem exercido algumas atividades de controle democrático, principalmente através das Comissões de Inquérito, o que conduziu à criação do Instituto Europeu de Inspeção Veterinária e Fitossanitária, para controle da doença das vacas loucas. Também foi em razão das pressões do PE que se instituiu o Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) em matéria orçamentária. Este poder vem unir-se ao direito de censurar a Comissão. A aprovação de uma moção de censura obrigaria a Comissão a demitir-se. Em março de 1999, conforme documento da Instituição196 e na seqüência do relatório do Comitê de Sábios, encomendado pelo PE sobre a gestão da Comissão, houve o prelúdio da aprovação desse procedimento. Para evitá-lo a Comissão preferiu destituir-se.

CAPÍTULO 3