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12. CASO DE ESTUDO

12.1. Tratamento por digestão anaeróbia

Na presente dissertação desenvolveu-se um cenário que teve como objectivo determinar o potencial de produção de biogás através do processo de digestão anaeróbia das águas ruças para os dois lagares considerados. A realização deste cenário permitiu estimar a produção de energia eléctrica para cada lagar, o potencial económico associado ao tratamento do seu efluente e o retorno do investimento no caso da venda desta energia à rede eléctrica nacional (REN). De acordo com Sousa (2009), a tarifa renovável assumida para energia eléctrica produzida através do biogás é de 110,17 €/MWh, determinada a partir da equação de remuneração apresentada no Decreto-Lei nº225/2007. O primeiro passo no desenvolvimento do cenário teve como objectivo determinar a energia produzida a partir do aproveitamento do biogás. Segundo Ramos-Cormenzana (1995), a produção de biogás consequente do tratamento de águas ruças é de 30 m3/m3 afluente ao reactor. Considerando o caudal afluente característico de cada um dos lagares em estudo foi estimada a energia produzida com base no caudal de CH4, admitindo-se o poder calorífico do mesmo de 8550 kcal/m3 (Metcalf&Eddy 2004).

As necessidades térmicas do reactor foram estimadas admitindo que o peso específico da água ruça é de 1.020 kg/m3 e que o calor específico é de 1,02 kcal/kg.ºC. Os coeficientes de transferência térmica do reactor admitidos foram de 0,781, 0,586 e 0,733 kcal/ºC.m2 para o ar, para a terra seca envolvente ao reactor e para a soleira, respectivamente (Metcalf&Eddy 2004). Assumiu-se igualmente que a temperatura do ar seria de 15ºC, do solo de 5ºC, abaixo da soleira de 10ºC, que o efluente à entrada seria de 15ºC e que o interior do reactor estaria a 35ºC.

Caso o balanço da energia térmica seja positivo, o reactor considera-se auto-sustentável, sendo viável a sua operação, com a opção de aproveitamento de energia eléctrica com recurso a um sistema de co-geração. Desta forma é possível estimar-se a receita proveniente da venda de energia eléctrica à REN. Segundo Metcalf&Eddy (2004), admite-se que cerca de 30% da energia produzida pela valorização do biogás pode ser convertida em energia eléctrica e que cerca de 60% desta última se destina a consumo próprio. O preço de venda de energia eléctrica à rede é de 110,17 €/MWh determinado a partir da equação de remuneração apresentada no Decreto-Lei nº225/2007.

Por forma a estimar o período de retorno do investimento para cada um dos casos foi necessária uma avaliação dos custos de investimento e de operação inerentes ao processo. Foram considerados os custos associados à construção civil e aos equipamentos electromecânicos de co-geração. Relativamente aos custos de operação e manutenção, admitiu-se que representam 3% ao ano do capital fixo referente aos custos de investimento no reactor e nos respectivos equipamentos electromecânicos.

Considerando que o efluente tratado não se apresenta em condições de descarga no meio hídrico ou na rede de colectores municipal, foi estimado igualmente o investimento associado a uma lagoa de evaporação tendo em conta o caudal de sobrenadante do digestor anaeróbio. Segundo a revisão bibliográfica, a dimensão de uma lagoa de evaporação deverá seguir a razão de 1 m2/2,5 m3 de água ruça. Foram igualmente considerados os valores de 6,30 €/m2 de geocompósito bentonítico e de 4,24 €/m2 de geomembrana em PEAD de 2,0 mm (Cabeças 2012).

De acordo com as considerações anteriores, resumem-se na Tabela 12.4 os resultados obtidos para os dois cenários considerados (lagar A e lagar B) durante o desenvolvimento do caso de estudo.

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Tabela 12.4: Resultados obtidos da simulação da aplicabilidade da digestão anaeróbia como tratamento das águas ruças do lagar A e lagar B

Parâmetros Unidades Lagar A Lagar B

Energia produzida a partir da valorização do biogás

Duração da campanha dias 70 212

Caudal afluente de águas ruças m3/dia 38,5 138,7

Caudal de sobrenadante encaminhado para lagoa de evaporação m3/dia 24,8 88,9

Tempo de retenção dias 10 10

Volume do reactor m3 385 1.387

Caudal de CH4 m3/dia 750,8 2.704,70

Energia total produzida kcal/dia 6.419.340 23.124.757,50

Energia térmica produzida kcal/dia 3.209.670 11.562.378,80

Energia eléctrica produzida kcal/dia 1.925.802 6.937.427,30

Perdas de energia kcal/dia 1.283.868 4.624.951,50

Necessidades térmicas do reactor

Necessidades de aquecimento kcal/dia 801.108 2.886.069,60

Queda de temperatura ⁰C/dia 2,2 2

Necessidades térmicas do reactor kcal/dia 1.699.994,40 5.824.652,70

Balanço da energia térmica kcal/dia 1.509.461,90 5.737.726,10

Receita pela venda de energia eléctrica produzida à rede eléctrica nacional

Energia eléctrica produzida kWh/dia 2.239,70 8.068,20

Receita pela venda de energia eléctrica €/campanha 6.898 75.260

Custos de investimento no reactor e na lagoa de evaporação

Custos de construção civil do reactor € 37.170 97.140

Custos em equipamentos electromecânicos € 44.604 116.568

Desmatação, modelação e escavação da lagoa € 29.000 176.145

Impermeabilização da lagoa de evaporação com uma camada de

geocompósito bentonítico e uma geomembrana em PEAD de 2,0 mm € 14.540 89.283

Custo total do investimento € 125.314 479.136

Custos de operação e manutenção do reactor

Custos de operação e manutenção €/ano 2.453 6.411,20

Período de retorno

Custo total do investimento no reactor e no sistema de co-geração € 81.774 213.708

Receita pela venda de energia eléctrica €/campanha 6.896 75.260

12.1.1. Considerações acerca da viabilidade da digestão anaeróbia

Da análise dos resultados obtidos, verificou-se que se o produtor de azeite optar pelo tratamento das águas ruças produzidas no seu lagar pode obter um lucro bastante aliciante. A produção de biogás e o seu aproveitamento em energia térmica e eléctrica acarreta algumas condições técnicas que podem condicionar a sua aplicação. Alguns dos aspectos que influenciam a decisão de se utilizar o processo de digestão anaeróbia no tratamento de águas ruças, decorre, não no processo em si mas no que a sua aplicação envolve, isto é:

• O recurso à digestão anaeróbia obriga ao respeito por inúmeras condições de segurança; • Pelo facto de esta indústria ser sazonal, todo o equipamento está parado entre campanhas. Durante a fase de inactivação, não há produção de biogás e consequentemente não há possibilidade de venda de energia eléctrica;

• Lagares pequenos como o caso do lagar A, estariam sem produzir durante nove meses por ano, investindo em equipamentos que necessitam de manutenção e que não estão a utilizar;

• O período de tempo de arranque de um digestor anaeróbio é bastante alargado devido à inoculação do reactor repercutindo-se numa gestão técnica complexa e individualizada antes do início da própria campanha;

• A presença de um técnico especializado é obrigatória. Todo o processo deve ser controlado por forma a haver o devido tratamento da água ruça e consequentemente maximizar ao máximo a produção de biogás;

• A instalação de uma unidade de produção de biogás obriga todo um sistema complexo de purificação do biogás e de produção energia térmica, eléctrica ou ambas.

Estes aspectos fazem com que o tratamento das águas ruças por digestão anaeróbia não possa ser considerada uma opção viável, mesmo que a sua aplicação em indústrias sazonais seja possível mediante uma gestão técnica complexa. O investimento exigido em reactores de produção de biogás e a necessidade de adequado acompanhamento técnico tornam difícil a aplicação deste processo de tratamento especialmente em lagares de pequena dimensão. É de facto economicamente vantajoso durante o período de produção mas este é relativamente curto. As contrapartidas inerentes têm grande peso e não compensam toda a gestão necessária.

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