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O Treinamento do Ator com as Emoções

3. Uma Referência Concreta : Alba Emoting™

3.5. O Treinamento do Ator com as Emoções

Como continuação, apresentarei a descrição progressiva dos exercícios preparatórios e de execução dos padrões de efeito ensinados pelo professor Andrés Céspedes, com o objetivo de estabelecer um ponto de partida concreto e corporal, visando a um melhor entendimento sobre a relação existente entre bios e emoção88. Complementando este treinamento, proponho considerar a capacidade plástica do cérebro como uma vantagem no que diz respeito ao treinamento corporal, ressaltando a importância da prática e a motivação como fundamentais para a construção e reforço de “vias neuronais”.

3.5.1. Percepção do Tônus.

No começo do treinamento, nós atores fomos instruídos a contrair e relaxar diferentes grupos de músculos com o objetivo de perceber o grau de tensão (ou distensão) do grupo muscular ativado. Este exercício podia ser feito deitado, em pé ou caminhando. Uma vez que criamos consciência dos diferentes níveis possíveis de tensão muscular, uma grande variedade de técnicas foram utilizadas para induzir o relaxamento da musculatura, como a ioga ou o método de Jacobson, isto é, contraindo e relaxando os músculos progressivamente, até conseguir um relaxamento muscular absoluto. Todos estes exercícios foram trabalhados com um ritmo respiratório baixo, onde a pausa respiratória e a expiração eram usadas para induzir e ativar o relaxamento dos músculos.

3.5.2. Treinamento Respiratório.

Nós atores fomos instruídos a respirar num ritmo baixo com respirações fundas e completas, similares às do step-out. Logo depois, experimentamos com diferentes tempos e ritmos inspiratórios e expiratórios, até que as mudanças respiratórias pudessem ser

88 Alguns desses exercícios foram aplicados por mim durante essa pesquisa, nas disciplinas Laboratório de

Criação: Investigações sobre o Trágico (2012, Programa de Pós Graduação em Artes da Cena, UNICAMP),

como PED (2012, Programa de Estágio Docente, Graduação em Artes Cênicas,UNICAMP) na disciplina Laboratório de Práticas Corporais e na disciplina Projeto Integrado de Criação Cênica (2013, Graduação em Artes Cênicas, UNICAMP).

reguladas à vontade. Numa primeira etapa, fizemos estes exercícios deitados e de bruços, para logo serem realizados em pé e caminhando. Os diferentes ritmos respiratórios foram praticados até serem completamente dominados; porém, já que o padrão de efeito respiratório é um elemento-chave deste método, este treinamento básico foi continuamente realizado através do processo todo.

3.5.3. Modulação do Tônus em diferentes posturas.

Já capazes de perceber e controlar o tônus em grupos isolados de músculos, fomos instruídos a integrar esta habilidade a posturas esdrúxulas, tanto estáticas quanto dinâmicas. Ditas posturas eram exercitadas, por exemplo, com diferentes tipos de caminhada ou passos, assim como também diferentes maneiras de deformar, esticar ou dobrar o corpo e suas partes. Também eram feitos exercícios de dissociação vertical e horizontal de grupos

musculares simétricos e assimétricos, como tencionar uma mão enquanto o resto do corpo

se mantém relaxado; ou tencionar um pé e o ombro oposto; ou tencionar o torso enquanto as extremidades da cabeça repousam relaxadas.

3.5.4. Musculatura facial.

Foram realizados exercícios de controle da movimentação dos olhos com diferentes níveis de abertura e tensão das pálpebras; exercícios de dissociação da musculatura facial, como fechar o olho direito tencionando o lado esquerdo da boca ou franzir as sobrancelhas independentemente uma da outra. Um exercício recorrente era modificar a máscara radicalmente cada vez que o professor desse uma batida de palmas.

3.5.5. Exercícios de controle da inibição.

Pediu-se para nós compartilharmos com o resto sentimentos íntimos de qualquer tipo, (sexuais, familiares, etc.); também falar palavrões, insultar e criticar os outros; expressar pensamentos agressivos e ternos; assim como também adotar posturas esdrúxulas enquanto era dita alguma frase difícil ou constrangedora. É claro que um clima de absoluta

confiança deve ser gerado pelo grupo e conduzido pelo professor, entendendo que o exercício pode tornar-se muito frágil se não é realizado com especial cuidado.

Este é um ponto importante a respeito do trabalho com as emoções, já que é preciso trabalhar num ambiente onde exista espaço para o risco e a experiência. É necessário, por assim dizer, que o grupo possua uma “seriedade descontraída” que permita ao ator se expor emocionalmente sem sentir a repressão da crítica ou do erro. Muitas vezes a inibição é prejudicial para o trabalho do ator, já que ocupa emocionalmente o bios do ator, deixando pouco “espaço” para novas emoções acontecerem.

Todos estes exercícios de desinibição, que são particularmente importantes para nós atores, foram instruídos como uma via técnica para trabalhar a timidez, prevenir pânico cênico e desenvolver a concentração. Estes exercícios também ajudam o ator a estar no controle do que ele está fazendo e, ao mesmo tempo, a estar aberto para o inesperado. Este treinamento pode variar segundo diferentes culturas, já que podemos ter outros parâmetros de inibição, mas acredito que deve ser considerado fundamental para o treinamento do ator, cuja profissão demanda, além de trabalhar com as emoções, exposição pessoal.

3.5.6. Exercícios cognitivo-sensoriais.

Devíamos explorar o espaço de trabalho e objetos ao seu redor utilizando diferentes sentidos: tato, paladar, visão, audição e olfato. Éramos instruídos a reagir rapidamente a estímulos externos e repentinos, tendo como ponto de partida estados corporais tanto tensos como relaxados. Foram praticados exercícios focados na rejeição e evasão de estímulos determinados, simulação de vômito a partir de contrações abdominais e reações corporais a estímulos desagradáveis. O conceito de abordagem-evasão (curiosidade e reação) e o paradigma de reflexos condicionados e incondicionados foram discutidos e trabalhados através de exercícios de representação cênica.

Todos os exercícios descritos anteriormente foram preparatórios e complementares ao treinamento e execução dos padrões de efeito, proporcionando as condições básicas necessárias para sua realização. O próximo passo seria a aprendizagem, treinamento e execução dos padrões de efeito das seis emoções básicas.