CAPÍTULO 3 A REGIÃO HIDROGRÁFICA DO RIO URUGUAI
3.1 Alto Uruguai e as Hidrelétricas
3.1.4 UHE de Campos Novos
A Usina Hidrelétrica de Campos Novos foi construída na divisa dos municípios de Campos Novos e Celso Ramos, atingindo segundo Baquero, Morais e Vasconcelos (2013), moradores dos municípios catarinenses Celso Ramos, Curitibanos, Abdon Batista, São Cristóvão do Sul, Água Doce, Irani e Jaborá, tendo seu reservatório inundado uma área de 25,9 Km².
Figura 10
Localização UHE Campos Novos
Fonte: Xavier e Correa, 2008.
As negociações para a construção da usina tiveram início já em 1995, quando na cidade de Campos Novos foi realizada uma audiência pública que contou com a presença da FATMA, a ELETROSUL (então proprietários do projeto), a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), a Magna Engenharia (empresa que realizou o EIA-RIMA), os governos dos municípios afetados e a CRAB. Essa audiência era um dos pré-requisitos para a emissão da Licença Ambiental Prévia (LAP) (IPPUR, 2014).
Segundo o IPPUR (2014), na ficha de Impacto ambiental e social constava que a implantação da usina acarretaria a erosão do solo por ocasionar sua exposição pelo desmatamento realizado; a contaminação do ar, do solo e da água pois as:
[...] atividades de construção (como escavação, terraplanagem, limpeza e manutenção de veículos, movimentos de caminhões, perfuração e explosão, alojamento para os trabalhadores e instalações de apoio, etc.) resultarão em aumento temporário de ruído, poeira, emissões no ar, poluição da água (esgotos, escoamento de águas pluviais) e eliminação de resíduos (IPPUR, 2014, p. 2).
Além disso, também influenciariam na fauna e na flora local, em função da fragmentação dos habitats, o que poderia acarretar a extinção de espécies
locais ou mesmo a proliferação de outras em razão da perda de seus predadores naturais (IPPUR, 2014).
A Empresa Campos Novos Energia S/A (ENERCAN), recebeu em 2000 a concessão para exploração do potencial energético da UHE Campos Novos por um período de 35 anos (MORAIS e BAQUERO, 2014). Essa empresa tem como principais acionistas CPFL Geração, COPEL Participações S.A., CEEE e CELESC. No ano de 2002, a ANEEL realizou um leilão para a concessão da linha Campos Novos cujo vencedor foi o consórcio Planalto Transmissão - CEEE, Alcoa, CPFL, Camargo Corrêa e DME (HÜFFNER e ENGEL, 2011).
A ENERCAN juntamente com a ELETROSUL realizou até março de 2001 as reuniões e negociações com os moradores das localidades atingidas, porém, a partir daí a ENERCAN assumiu sozinha esse processo (IPPUR, 2014). Em outubro de 2001, em uma das reuniões, foi constituída a Comissão de Negociação que era composta por comissões municipais de quatro municípios atingidos (Campos Novos, Celso Ramos, Anita Garibaldi e Abdon Batista) (ENERCAN, 2002).
A partir disso, gerou-se um acordo para remanejamento da população rural atingida pela formação do reservatório. Esse documento estabelecia os condicionantes e as diretrizes para o remanejamento das comunidades atingidas (ENERCAN, 2002). No caso do Auto-reassentamento (carta de crédito), seriam contemplados:
Proprietários
Proprietários de lotes rurais com área de até 25 hectares, atingidos total ou parcialmente pelo empreendimento, desde que:
a) Não possuam outra propriedade economicamente viável fora da área atingida pelo empreendimento [...];
b) dependam da propriedade atingida para a sua subsistência;
c) remanescente da propriedade atingida, se houve, resulte inviabilizado economicamente;
d) não tenham adquirido a propriedade após dezembro de 1998 [...]; 2) Não Proprietários
a) arrendatários, meeiros, parceiros rurais, agregados, posseiros e outros trabalhadores rurais que comprovadamente mantenham ou tenham mantido, até dezembro de 1998 [...];
b) filhos de proprietários de áreas atingidas pelo empreendimento, que comprovadamente mantenham ou tenham mantido, até dezembro de 1998 [...] vínculo efetivo com propriedade atingida pelo empreendimento [...]. Filhos solteiros, maiores de 18 anos, que comprovadamente sejam independentes, poderão, após estudo de caso, ter acesso a esta modalidade de remanejamento, devidamente adequada às suas necessidades (ENERCAN, 2002, p. 2-3).
De acordo com a ENERCAN (2014), no processo de implantação da hidrelétrica foram negociadas 362 propriedades com indenizações e benefícios para 759 famílias, e reconstruíram-se dois núcleos rurais, Barra do Arroio em Abdon Batista e Rosário em Anita Garibaldi, “a maioria das famílias que precisou ser relocada nos dois núcleos não precisou ir para longe, continuando a viver próximo ao antigo local onde vivia e onde foi implantado o novo núcleo” (ENERCAN, 2014, p. 1).
Essa UHE entrou em operação em 2005, mesmo sem ter sido liberada sua LO pelo IBAMA, iniciando o alagamento da área do reservatório, o que acarretou em novembro desse mesmo ano, a ocupação da área por integrantes do MAB e pela população atingida, entretanto:
[...] cerca de 50 policias invadiram os acampamentos dos atingidos e queimaram os barracos. No confronto um agricultor foi preso e alguns dias depois cerca de 300 famílias reocuparam o canteiro da usina. Durante a reocupação também ocorreram confrontos com a polícia e vários agricultores ficaram feridos (IPPUR, 2014, p. 3).
A situação gerada provocou a vinda de representantes da ONU, em dezembro do mesmo ano, para averiguar as denúncias realizadas sobre a violação de direitos humanos (HÜFFNER e ENGEL, 2011).
Em 2006, ocorreu o esvaziamento total da área do reservatória da UHE em função da existência de rachaduras na estrutura. Ao ser esvaziada, foi possível observar uma grande rachadura na estrutura (SUZUKI, 2006), o que revelou “os erros na construção do empreendimento e justifica a apreensão que a população da região sofre vivendo sob os riscos e os impactos das barragens no rio Uruguai” (MONTEIRO, 2006, p. 1).
Para o MAB (2011) além da questão ambiental, do medo com a qual a população local tem convivido após o incidente (rachaduras), os danos sociais são muito elevados. O MAB diz que ao contrário das informações apresentadas pelo consórcio, o número de famílias atingidas chegou a 1706. Somado a isso, em torno de 300 famílias não foram reconhecidas pela empresa como atingidas, e mesmo constando no acordo firmado sobre os beneficiados, aproximadamente 250 destas não foram reconhecidas por serem meeiras ou arrendatárias, não recebendo as indenizações (HÜFFNER e ENGEL, 2011).