Fica claro, quando percorremos as páginas da história de Agostini, que uma de
suas preocupações, quando esteve à frente de seus periódicos, de conquistar um maior
número de assinantes, por isso fazia sempre referência àqueles que poderiam assinar a
folha, ou melhor, pagar por ela. Esta preocupação data do primeiro número da Revista,
em que o editor através do personagem central D. Beltrano, convida o leitor a assinar
seu jornal. Na última página do número inaugural, D. Beltrano é retratado segurando
um “livro de assinantes” (ver figura 8), e dirige ao leitor com as seguintes palavras:
“Desejo ao respeitável público da Corte e da Província muito boas saídas e melhores
entradas. Agora, para mim, as melhores entradas que me podem desejar...não sei se me
entendem...”. As melhores entradas a que alude o personagem era o ingresso do leitor
no livro de assinantes, que mais tarde Agostini apelidaria de “estatística dos homens de
bom gosto do Império do Brasil”. Esta denominação não era aleatória, tampouco livre
de significado mais contundente, antes estava afiliada a um projeto editorial de Agostini
que visava a um leitor, ou ainda, a leitores específicos.
Outras estratégias no sentido de induzir os leitores a compor um público fiel,
ligado à Revista por meio das assinaturas, podem ser observadas na prática editorial de
Agostini. Uma delas, e bastante interessante, seria um discurso que declarava ter um
leitor definido: a população. Um leitor um tanto amplo que fez com que a Revista
apropriasse-se de um discurso em que se procurou destacar, fundamentalmente, o
caráter popular do jornal, justificado pelo que Agostini denominou como uso da
linguagem de forma mais popular.
Percebe-se, no entanto, que a linguagem mais popular tem um sentido diverso
do que hoje poderíamos conceber. Neste contexto não se referia à linguagem falada
pelo povo, nem mesmo se trata de uma linguagem não-formal, pois esta concepção não
justificaria o texto de 22 de dezembro de 1877, em que se criticou os desvios de
ortografia, de sintaxe e de pontuação no jornal Mequetrefe:
“O Mequetrefe assentou decidamente em viver n’um divorcio eterno com a syntaxe e com a ortographia.
Cada número que apparece, é uma série de attentados contra a infeliz gramática.
Parece que todo o seu programma consiste n’esta phrase negativa.
Nem syntaxe, nem ortographia!”80
A linguagem mais popular defendida por Agostini poderia referir às
características do gênero caricatura. Por mais que saibamos que, para entender ou
interpretar uma caricatura, ainda que em seu próprio tempo, o leitor tenha de dispor de
conhecimentos partilhados entre si e aquele que compõe o desenho, Agostini insistia no
fato dessa arte ser de fácil acesso e interpretação. Admitia não precisar de “grandes
conhecimentos especiais
81”, o que na verdade revelava uma tentativa de aproximar seu
ofício a um número maior de pessoas, consequentemente, leitores e assinantes.
O editor tinha consciência de que era o público a peça mais que essencial para o
sucesso de seu jornal e, por isso, fazia um esforço para atribuir sempre características
que delineavam quem era o leitor de sua Revista, como ocorre em um artigo assinado
por Agostini em resposta ao editor do Jornal do Commercio sobre uma série de críticas
dirigidas ao italiano e outros estrangeiros atuantes em periódicos ilustrados. Publicado
em 1876, afirma que:
“O publico é o principal juiz em matéria de imprensa. As folhas illustradas são sustentadas por elle. Até agora graças a este publico, tenho podido; não fazer fortuna, como diz o illustre folhetinista, mas sustentar certa reputação que adquiri com meus trabalhos com desenhos82.”
E retoma em outra parte o discurso sobre a linguagem popular da caricatura:
“Quanto a mim, estando no Brazil desde 1859, não tenho tido senão este publico para julgar dos meus trabalhos, e estou muito reconhecido pelo bom acolhimento que me tem sempre dispensado.Estou certo porém, que se eu seguisse o conselho
80 Revista Illustrada, Rio de Janeiro, 1877, ano II, n. 95, p.3. 81
Revista Illustrada, Rio de Janeiro, 1876, ano I, n. 1, p.3.
do illustre folhetinista e fosse para Pariz, encontraria talvez a mesma aceitação. Não vejo porque razão o publico de lá deva ser melhor que o d’aqui. A caricatura não é uma arte que requeira grandes conhecimentos especiaes para poder ser comprehendida e apreciada.”83
Enfim, ao analisarmos o discurso da Revista Illustrada com o objetivo de construir
a idéia que apresenta sobre o público do periódico, várias são as indagações, algumas
são as conclusões. O projeto editorial de Agostini nunca abandonou a premissa de ser
“porta-voz” daqueles que não tinham direitos na sociedade, desta forma, colocava-se
como representante dessa parcela da população. Em uma leitura mais superficial,
pensaríamos ser este o público alvo da Revista, uma vez que os desenhos caricaturais
poderiam atrair leitores não alfabetizados.
No entanto, a discussão sobre a linguagem mais formal dos periódicos em
circulação, naquele período, supõe que a Revista prestigiasse um público mais
especializado, embora insistisse em dizer que a caricatura ampliaria a rede de seus
leitores. Possivelmente, Agostini tinha em mente, sobretudo, aqueles que pudessem
acompanhar toda a reflexão política que se engendrava por suas páginas e não apenas
aqueles que pudessem se deleitar com as ilustrações.
O perfil dos leitores da Revista mostra-se de extrema importância para
observarmos a quem se dirige o conteúdo do periódico bem como a quem interessam
os comentários sobre os romances, foco de nosso próximo capítulo.