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Um município em potencial

No documento MIGUEL RODRIGUES DA SILVA JÚNIOR (páginas 71-75)

Barbosa e Pinto (2009), ao desenvolverem um estudo etnofarmacêutico no município de Igarapé-Miri, em 2000 e 2008, constataram um significativo conhecimento da população local acerca do uso de plantas medicinais na terapêutica. Através de entrevistas semi-estruturadas, os autores levantaram 236 espécies vegetais utilizadas pelos moradores do município, bem como suas respectivas indicações terapêuticas e formas de uso.

No que tange uma possível inserção na atenção básica em saúde, dentre as 236 espécies, se destacaram oito: o anador (Alternanthera dentata Moe.), o marupazinho (Eleutherine plicata Herb.), o mastruz (Chenopodium ambrosioides L.), o pariri (Arrabidaea chica Verlot.), o pirarucu (Kalanchoe pinnata), o óleo elétrico (Piper callosum Ruiz), a sucuuba (Himatanthus sucuuba) e a verônica (Dalbergia monetária L.) (BARBOSA e PINTO, 2009). Observa-se, portanto, que existem, no próprio município, espécies com potencial para a inserção na atenção básica e conhecimento popular sobre o suas indicações terapêuticas e formas de uso.

Outro fator importante a se considerar é o fato de existir no município uma associação (Associação dos Agentes Comunitários de Saúde de Igarapé-Miri – AACSIM) que tem dentre seus objetivos produzir plantas medicinais e produtos derivados voltados para a inserção no setor público de saúde municipal. Esta associação, portanto, pode se constituir no empreendimento solidário por meio do qual poderá se consubstanciar o desenvolvimento da fitoterapia solidária no município de Igarapé-Miri. Segundo Frentz (2002), “a associação expressa uma relação dinâmica, uma relação em movimento, em direção a um lugar melhor pela cooperação. O desenvolvimento é um processo também fundado em relações sociais associativas, das quais podem nascer formas cooperativas”.

eficácia e qualidade asseguradas, torna-se indispensável o apoio de outras instituições que atuam no setor farmacêutico (Figura 3). No contexto atual, o Laboratório de Etnofarmácia (LAEF) do Núcleo de Meio Ambiente (NUMA) e a Faculdade de Farmácia da UFPA, são importantes agentes de cooperação nesse sentido, uma vez que já desenvolveram estudos relacionados à possibilidade do desenvolvimento da fitoterapia no município de Igarapé-Miri a partir de empreendimentos solidários. Tal cooperação propicia tanto o desenvolvimento de produtos com padrões exigidos pela legislação sanitária vigente, quanto a capacitação dos atores locais no que tange as Boas Práticas de Fabricação de Produtos Farmacêuticos.

Quanto ao processo produtivo das matérias primas (plantas medicinais in natura), é imprescindível o apoio de instituições de pesquisa e extensão rural (Figura 3), como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA); a Secretaria de Estado de Agricultura o Estado do Pará (SAGRI); Empresa Brasileira de Extensão Rural – EMATER, de modo a garantir a qualidade da matéria prima, a sustentabilidade do processo produtivo e a capacitação dos produtores – que no caso de Igarapé-Miri podem ser os agricultores familiares situados ao longo das estradas ou nas comunidades ribeirinhas do município. Cabe reiterar que “a inclusão da agricultura familiar nas cadeias e nos arranjos produtivos das plantas medicinais, insumos e fitoterápicos é uma das premissas” da PNPMF (BRASIL, 2006b).

No que se refere aos produtos a serem inseridos na atenção básica, em função da necessidade de menores recursos técnicos e financeiros para o seu desenvolvimento, torna-se mais viável, em princípio, a produção de plantas medicinais na forma de rasuras, que, por sua vez, é regulamentada pela RDC 10 da ANVISA. Cabe enfatizar que, em geral, as rasuras de plantas medicinais representam custos de produção bem inferiores a outros produtos farmacêuticos (como os medicamentos sintéticos e fitoterápicos), o que favorece o alcance de preços acessíveis tanto para a população, quanto para a prefeitura de Igarapé-Miri.

Com relação ao lançamento dos produtos no mercado e à gestão do empreendimento, torna-se mister, sobretudo nos primeiros anos, o apoio de instituições como o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), em face da capacidade limitada de gestão dos atores locais observada nas visitas técnicas, que constitui um dos principais fatores responsáveis pela falência de empreendimentos solidários locais como fora o caso da COOPFRUT. Contudo, no caso da AACSIM, um

fato positivo diz respeito aos seus integrantes já desempenharem atividades de gestão na associação, que podem ser aprimoradas no que concerne a gestão do possível empreendimento.

Outros fatores positivos apresentados pelo município são:

 A disponibilidade de adubo orgânico (principal insumo a ser utilizado no processo de cultivo e manejo), tendo a Cooperativa de Reciclagem de Igarapé- Miri (COOPRIM) como unidade produtora, situada na PA-407. É importante frisar que a PNPMF estimula “o uso e o desenvolvimento de sistema de produção orgânica plantas medicinais” (BRASIL, 2006b)

Figura 3 – Expõe que o desenvolvimento do empreendimento solidário (com seus respectivos membros representados pelos círculos verdes) é potencializado a partir da cooperação com instituições de apoio técnico, financeiro e comercial, tendo os agentes de desenvolvimento (por exemplo, um instituto de desenvolvimento sustentável) como os principais mediadores entre o empreendimento solidário e tais instituições. Observa-se, também, a importância fundamental do poder público no que concerne o processo de implantação da fitoterapia solidária no município, podendo atuar como cooperação técnica (por exemplo, contribuindo no processo de seleção das espécies de maior interesse para o sistema de saúde local), financeira (por exemplo, fornecendo a área para a implantação do empreendimento, subsídios fiscais e apoio logístico) e comercial (utilizando seu poder de compra).

 A existência de extensas áreas desmatadas cujas espécies cultivadas (quando cultivadas), como a mandioca e a pimenta-do-reino, apresentam baixo valor financeiro no mercado regional, o que pode favorecer a adesão dos produtores locais no que concerne o plantio de plantas medicinais – em especial utilizando sistemas agroflorestais, de modo a evitar impactos ambientais relacionados aos monocultivos.

 A facilidade na recepção da matéria-prima (caso o empreendimento seja montado na sede do município), tanto proveniente de produtores ribeirinhos, quanto daqueles situados ao longo das estradas da região.

 O fato da utilização de plantas medicinais na terapêutica fazer parte da cultura da população local. “Com relação aos parâmetros de assistência, constatou-se, em, 2000 que 64% das famílias entrevistadas usavam remédios caseiros, 15% utilizavam apenas medicamentos industrializados e outros 20% apenas os dois tipos de recursos terapêuticos” (BARBOSA e PINTO, 2009). O cenário em 2008 apresentou um perfil semelhante, 60%, 20% e 20%, respectivamente (id.). Isto pode facilitar a sensibilização dos médicos, em prescrever as plantas medicinais rasuradas, e dos usuários do sistema de saúde municipal, em aderir ao tratamento fitoterápico proposto.

 A facilidade relacionada ao escoamento da produção, uma vez que o empreendimento pode ser implantado na própria cidade de Igarapé-Miri, onde está situada a SESMA, que é o órgão responsável pela distribuição dos produtos farmacêuticos para o Hospital Santana e para os Postos e Unidades de Saúde do município. Além disso, Igarapé-Miri encontra-se perfeitamente integrada com os demais municípios do Território do Baixo Tocantins, seja pela via rodoviária, seja pela via fluvial.

Em suma, observa-se que o município apresenta conhecimento sobre espécies vegetais, que são potenciais para inserção na atenção básica (podendo ser complementadas com espécies que constituem a RENISUS), e dispõe de área, insumos e mão-de-obra para produzir as matérias-primas; de trabalhadores para efetuar, mediante a supervisão de farmacêuticos, a produção de plantas medicinais rasuradas e; de um potencial mercado consumidor dos produtos comercializados pela cooperativa (ver adiante)

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No documento MIGUEL RODRIGUES DA SILVA JÚNIOR (páginas 71-75)

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