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Um rascunho do século 20

No documento Carlos Guerra Schrago (páginas 34-51)

Poucas ciências tiverem um desenvolvimento tão intenso ao longo do século 20 como a biologia. Os avanços nas diversas áreas das ciências biológicas influenciaram consideravelmente o pensamento evolutivo. Uma síntese da biologia evolutiva no século 20, portanto, será necessariamente incompleta. De forma geral, podemos classificar a história do pensamento evolutivo no século 20 em quatro períodos. O primeiro período se estende desde a redescoberta das leis de Mendel até a consolidação do neodarwinismo na década de 1930. O segundo período é a síntese evolutiva, que vai de 1937 até aproximadamente 1950. O terceiro período, pós-síntese, é caracterizado pela descoberta da estrutura do DNA, em 1953, e o desenvolvimento da evolução molecular e tentativas de formalização de teorias macroevolutivas. Por fim, o período moderno, após os anos da década de 1980, é marcado pelo avanço sem precedentes das técnicas de biologia molecular, notavelmente a genômica, para o estudo dos processos evolutivos e genética do desenvolvimento.

Neodarwinismo

Na literatura, o neodarwinismo é comumente caracterizado como a síntese da seleção natural darwiniana com a herança mendeliana. Essa caracterização é correta, embora ela

seja simplista por desconsiderar a dimensão científica que isto significou para o pensamento evolutivo. Conforme mencionado anteriormente, no período entre o final do século 19 e início do século 20, diversas alternativas a alguns dos componentes do darwinismo foram propostos. Esse período foi denominado por Julian Huxley de ‘eclipse do darwinismo’ em alusão ao crescente descrédito que a seleção natural e a evolução gradual sofreram. Cabe analisarmos aqui as razões destes componentes da teoria de Darwin terem sido desacreditados. Incialmente, na ausência do entendimento das leis da hereditariedade, muitos acreditavam que a herança dos caracteres ocorria por simples mistura entre as características parentais. Se isso fosse verdade, ao longo das gerações, a variação das populações iria consequentemente diminuir e, portanto, a matéria prima da seleção natural iria se extinguir. Essa observação, formulada incialmente pelo engenheiro Fleeming Jenkin, preocupou Darwin e ocupou uma parte considerável dos seus estudos após o Origem das Espécies. Além do desconhecimento das bases da hereditariedade, acreditava-se que a evolução gradual darwiniana por seleção natural era um processo muito lento e não poderia ser responsável por toda variação geográfica das populações naturais. Para piorar a situação, no início do século 20, os estudos sobre a hereditariedade estavam sendo conduzidos segundo duas lógicas diferentes de pesquisa. Um grupo de pesquisadores da escola da biometria se dedicou a herança das características contínuas, como peso e altura. Enquanto um segundo grupo, os mendelistas, estudavam a herança das características discretas. Não estava claro qual dos dois tipos de caracteres era mais relevante para o processo de origem de novas espécies.

Foi neste cenário de considerável confusão intelectual que, nos anos de 1920, o estatístico inglês Ronald A. Fisher se interessou pelo problema da interação entre a seleção natural e as leis da hereditariedade. No ano de 1908, dois pesquisadores haviam, independentemente, aplicado um desdobramento das então redescobertas leis de Mendel em populações. G.H. Hardy e W. Weinberg verificaram que a frequência dos genes e dos genótipos tenderiam a um equilíbrio nas populações panmíticas. Foi a partir desta abordagem inovadora que Fisher começou a desenvolver sua análise quantitativa da ação da seleção natural. Ele também contribuiu para terminar com a disputa entre as escolas da biometria e do mendelismo, pois mostrou que características contínuas são resultado da ação de vários loci e, portanto, não precisavam de uma teoria da

geneticistas estavam interessados em quantificar a ação do endocruzamento em populações artificiais e, consequentemente, extrapolá-la para populações naturais. Neste contexto, Sewall Wright se destacou, utilizando a abordagem quantitativa recém desenvolvida por Fisher. Na Inglaterra, J.B.S. Haldane, contemporâneo de Fisher, publicou uma série de dez trabalhos dedicados, entre outras coisas, a calcular o tempo necessário para a seleção natural causar diferenças genéticas significativas.

Em conjunto, os trabalhos de Fisher, Wright e Haldane fundaram a genética de populações e resgataram a importância da seleção natural e incorporaram quantitativamente o seu estudo à genética mendeliana. Além disso, eles mostraram que a seleção natural é uma força suficientemente capaz de explicar as diferenças encontradas dentro das populações e entre as espécies e, portanto, a herança dos caracteres adquiridos não era necessária para acelerar a taxa de evolução de características adaptativas. Embora as demonstrações sobre a dinâmica das forças evolutivas nas populações naturais existissem, elas não alcançaram imediatamente todos os biólogos, pois foram feitas de forma puramente matemática e ainda existiam poucas aplicações em populações naturais.

Hereditariedade particulada e a origem das espécies

Nas primeiras duas décadas do século 20, o entendimento da mecânica da hereditariedade mudou significativamente. Embora após os trabalhos posteriormente caracterizados como “neodarwinismo”, a dinâmica da seleção natural seja descrita como intimamente associada ao mendelismo, a situação no início do século era bem diferente. A razão da disputa estava em, em última análise, associada ao esclarecimento de dois problemas fundamentais: (1) a natureza das mutações; e (2) a existência de uma parcela da herança, especialmente de características contínuas, que estaria sujeita a processos lamarckianos. Ambos tinham relação direta com duas algumas das proposições darwinianas sobre a evolução: a eficiência da seleção natural e a evolução gradual. Com relação à natureza das mutações, uma parcela da confusão era oriunda da falta de uma definição universalmente aceita para o termo. Criado por Hugo de Vries em 1901, o termo mutação foi inicialmente empregado para designar novas formas discretas de variação encontradas nas populações. Era similar às variações denominadas de sports

Evolution. Não apenas de Vries e Bateson estavam interessados nesse tipo de variação discreta, mas também Johannsen e Morgan. Posteriormente, Morgan iria reformular o conceito de mutação para algo mais próximo ao entendimento contemporâneo do termo: qualquer modificação herdável no material genético, independente de sua magnitude e efeito. Muitos dos pesquisadores que se dedicavam ao estudo das mutações no início do século 20 entendiam que essas características discretas estavam associadas à herança mendeliana particulada. Os caracteres quantitativos contínuos não estariam associados ao mecanismo da herança mendeliana e, muito possivelmente, respondiam evolutivamente de forma lamarckiana. Isso seria um duplo problema para premissas do darwinismo – além da origem das espécies estar associada às mutações discretas, a variação de características contínuas estava sujeita à herança de caracteres adquiridos por interação ambiental conforme sugerido por Lamarck ao invés da ação de seleção natural.

Apesar da ligação entre a variação de caracteres contínuos e Lamarck ser defendida por muitos pesquisadores, inclusive naturalistas (zoólogos, botânicos e paleontólogos), alguns ainda entendiam que a seleção natural seria a principal força na evolução dessas características quantitativas. Weissman, A. R. Wallace, Pearson e Weldon eram os principais defensores da eficácia da seleção natural no início do século. Weldon e Pearson procuraram mecanismos alternativas ao mendelismo para explicar a herança de caracteres contínuos. Entre estas, estava a lei da correlação entre pais e filhos das características quantitativas. Para resolução desta cisão entre os pesquisadores interessados em hereditariedade e evolução, era necessário que fosse demonstrado que os caracteres contínuos também estão sujeitos ao mecanismo mendeliano.

Neste sentido, alguns trabalhos tiverem relevância significativa. Um dos primeiros desenvolvimentos foi a demonstração de que a variação genética não diminui com a reprodução sexual, realizados por William Castle (1903), Hardy (1908) e Weinberg (1908). Em 1909, Johannsen, que cunhou os termos genótipo e fenótipo, mostrou que a variação contínua poderia ser decomposta nos componentes genético e ambiental. Entretanto, talvez o avanço mais importante tenha sido a demonstração de que a herança dos caracteres quantitativos pode ser explicada por mecanismos mendelianos de segregação independente de alelos em vários loci. Esse princípio foi demonstrado por Herman Nilsson-Ehle, Edward East e Rollins Emerson entre os anos de 1909 e 1913.

Era o início da consolidação da explicação particulada para os caracteres quantitativos. Finalmente, em 1918, Ronald Fisher demonstrou matematicamente que as correlações calculadas pelos biometristas poderiam também ser compreendidas por mecanismos mendelianos de segregação independente em múltiplos loci. Além disso, Fisher apresenta a decomposição da variação genética em seu componente aditivo e de interação gênica, mostrando que a eficácia da seleção natural é diretamente afetada pela quantidade de variação genética aditiva nas populações. Em termos teóricos, por volta de 1920, o problema da hereditariedade estava praticamente solucionado dentro do arcabouço mendeliano. Seria o início do renascimento da seleção natural.

Naturalistas e o conceito de espécie

Ernst Mayr, um dos articuladores da síntese moderna, insistia que a ideia de que a síntese era equivalente ao neodarwinismo reduzia bastante o papel dos naturalistas no processo de unificação das diversas linhas de pesquisa de biologia evolutiva na década de 1940. Portanto, denominava de “neodarwinismo” os desenvolvimentos dos geneticistas teóricos nos anos de 1920-30, após o fim da disputa entre mendelistas e biometristas. Paralelamente, até 1940, os naturalistas – zoólogos, botânicos e paleontólogos – também desenvolveram novas ideias especialmente relacionadas a dois temas: especiação e macroevolução. Existiria também um conjunto pequeno de pesquisadores que incorporaram às suas pesquisas ambas as tradições (genética e história natural). Os exemplos mais importantes foram Chetverikov, Sumner e Ford. Embora o título da obra mais famosa de Darwin faça referência à especiação, muitos concordam que ele foi muito mais eficiente em explicar o processo mecânico responsável pelas adaptações. Efetivamente, o conceito darwiniano de espécie não é claro e, em diversos momentos, ele sugeriu que as espécies não corresponderiam a unidades biológicas reais. Por outro lado, as anotações de Darwin ao final da década de 1830, além do rascunho de 1844, fazem alusão ao papel do isolamento geográfico na formação das espécies. No início do século 20, foi justamente Alfred R. Wallace, co-descobridor do princípio da seleção natural, que defendeu mais claramente como o processo de especiação deveria estar associado a mecanismos de isolamento. Wallace influenciou zoólogos como Edward Poulton e Karl Jordan. Ambos, em 1904 e 1905

respectivamente, já discutiam sobre as espécies aplicando o que viria a ser chamado de ‘conceito biológico’ por Dobzhansky em 1937 e Mayr em 1942. Até Dobzhansky, entretanto, o problema da especiação não foi plenamente contextualizado em termos da nova genética de populações.

Fisher, Wright e Haldane

E o que era essa nova genética interessada em fenômenos populacionais? A extensão dos mecanismos mendelianos para toda uma população possibilitou a análise quantitativa da ação da seleção natural ao longo das gerações. Três pesquisadores foram responsáveis por abordar problemas evolutivos usando esta estratégia: os ingleses Ronald Fisher e John Haldane, e o americano Sewall Wright. Quase sempre, as análises matemáticas eram baseadas em pressupostos simplificados. Entre estes, os principais seriam: (1) uma correspondência direta entre genótipo e fenótipo; (2) a existência de poucos alelos em um lócus – geralmente dois alelos; (3) a investigação da dinâmica da seleção em geralmente um lócus apenas; e (4) a estabilidade da pressão seletiva. Desta forma, a análise da dinâmica evolutiva iniciava com os chamados valores relativos de

fitness (adaptativos), simbolizados por w, de cada genótipo, por exemplo, AA = wAA, Aa

= wAA – s e aa = wAA – q, onde s e q seriam os coeficientes de seleção contra dos genótipos Aa e aa. Os valores adaptativos representam a contribuição dos genótipos para o conjunto de gametas produzidos por uma geração, que serão usados para constituir a geração seguinte. Quanto maior o w de um genótipo, maior será a contribuição relativa. Os coeficientes de seleção quantificam, por outro lado, a diminuição relativa da contribuição de cada genótipo quando comparada com o melhor dos genótipos.

Embora bastante simplificados, esta modelagem matemática ajudou elucidar de alguns problemas importantes a cerca do processo evolutivo. Um dos mais relevantes foi a demonstração quantitativa da eficácia da seleção natural em transformar a composição genética de uma população. Neste sentido, Fisher foi um dos principais arquitetos da fase do neodarwinismo. Além de seu estudo de 1918, que unificou a escola da biometria com o mendelismo, ao longo da década de 1920 ele derivou a teoria matemática da seleção natural. Num trabalho de 1922, foi o primeiro a investigar como o tamanho das

populações influenciaria a variação da frequência genotípica entre as gerações, um tema que seria posteriormente analisado por Wright. Esta flutuação estocástica das frequências dos alelos foi denominada de “efeito Hagedoorn” por Fisher e, posteriormente, seria conhecida como deriva genética. As derivações matemáticas de Fisher demonstraram que mesmo com pequenas vantagens seletivas, a frequência de um genótipo seria rapidamente aumentada pela ação da seleção natural, independentemente de flutuações estocásticas das frequências entre as gerações. A seleção natural, para Fisher, era não apenas eficiente, mas também suficiente para explicar o processo evolutivo. Em 1930, suas ideias foram resumidas no clássico The Genetical Theory of Natural Selection, considerado até hoje a principal obra que concluiu a unificação do mendelismo, darwinismo e biometria.

Haldane também se interessou pela ação da seleção natural, entretanto em situações menos idealizadas do que as elaboradas por Fisher. Numa série de artigos iniciada em 1924 com o título “A mathematical theory of natural and artificial selection” e que culminaram no seu livro The Causes of Evolution de 1932, Haldane investigou questões que se mostrariam muito relevantes. Por exemplo, em 1927, ele estudou a probabilidade de um novo alelo mutante ser fixado por seleção. As análises de Haldane ajudaram a consolidar a ideia da autossuficiência da seleção natural, particularmente ao mostrar que o tempo (em gerações) necessário para consolidação de novidades evolutivas era pequeno e proporcional a intensidade do coeficiente de seleção. Analisando o famoso caso do melanismo industrial das mariposas de Manchester, Haldane calculou um coeficiente de seleção entre 0,3 e 0,5 contra a forma mais clara. Com esses valores, em poucas gerações, a forma escura seria prevalente.

Ao longo da década de 1930, a escola inglesa ficou progressivamente dominada pela ideia da autossuficiência da seleção natural, pois fatores além da seleção, principalmente a deriva e a taxa de mutação, eram secundários e, muitas vezes, não mereciam sequer serem considerados na análise. Em 1931, Sewall Wright, que posteriormente estudara os efeitos do endocruzamento, publicou seu artigo “Evolution in mendelian populations”, onde ele analisou, entre outros temas, a taxa de decaimento da proporção de heterozigotos numa população pela ação de deriva. O tratamento de Wright é semelhante ao encontrado hoje nos livros textos de evolução e genética de populações. Talvez devido a sua experiência com a seleção artificial em pequenas

populações animais, ele repetidamente defenderia que a eficiência da seleção natural deveria ser relativizada pelo tamanho da população. Além disso, Wright se interessou pelas consequências do efeito da interação da ação de genes na evolução. Essa era uma complicação frequentemente ignorada nos modelos mais simplistas do processo evolutivo.

No início dos anos de 1930, a teoria clássica da genética do processo evolutivo estava plenamente formada quase que inteiramente pelos trabalhos realizados na década anterior por Fisher, Wright e Haldane. Entretanto, conforme o próprio Haldane admitiria, os desenvolvimentos da genética de populações eram matemáticos demais para interessar os biólogos e não suficientemente sofisticados para interessar os matemáticos. Com relação à aceitação pela comunidade biológica, os esforços de Theodosius Dobzhansky foram bastante relevantes.

Um novo entendimento sobre as mutações

Além dos desenvolvimentos teóricos, o período anterior a 1930 também foi importante para o aprofundamento do entendimento sobre as mutações. O grupo de pesquisadores associados a Thomas Hunt Morgan foram fundamentais neste sentido, particularmente Sturtevant, Bridges e Muller. Primeiramente, Morgan e seus estudantes mostraram claramente que os fatores estudados pelos mendelistas estavam localizados nos cromossomos, estruturas localizadas no núcleo das células. Isso confirmava as hipóteses de Sutton e Boveri do início do século. Essas ideias seriam sumarizadas em The Mechanism of Mendelian Heredity de 1915. Morgan também demonstrou que as mutações poderiam ser responsáveis pelo aparecimento de pequenas variações morfológicas, muitas vezes não detectáveis a olho nu. Usando a ideia da ligação física dos fatores mendelianos nos cromossomos, do crossing over, e da expectativa de frequência genótipos na geração filial, Alfred Sturtevant foi capaz fazer o primeiro mapa genético em 1913.

Entretanto, o mecanismo por trás do aparecimento das mutações nos cromossomos não era muito claro. Em 1927, Herman Muller, ex-aluno de Morgan, demonstrou que raios-X eram capazes de gerar novas mutações. Muller verificou que a maioria dessas mutações detectáveis eram deletérias. Ele também foi um dos primeiros pesquisadores a consolidar a noção de gene. Durante seu período de trabalho fora dos EUA,

particularmente na URSS, Muller se interessou em efetivamente medir a taxa espontânea de mutação. Apesar de seus estudos sobre a natureza das mutações, que inclusive lhe renderam o Nobel, Muller era um ardoroso defensor da seleção natural, embora talvez mais como uma força purificadora do que criadora.

A Síntese evolutiva moderna

No ano de 1937, Theodosius Dobzhansky, um russo que emigrou para os Estados Unidos, publicou um livro, o Genética e Origem das Espécies, que sumarizava os principais achados de Fisher, Wright e Haldane e fazia relações frequentes com estudos realizados em populações naturais. O momento era muito mais convidativo para o casamento da genética com a história natural do que 30 anos antes. Em síntese, Dobzhansky explicava os resultados obtidos em populações naturais por zoólogos e botânicos sob a luz da genética de populações.

A obra de Dobzhansky foi seminal e outros pesquisadores tentaram abordagens similares, tentando explicar os resultados obtidos baseados no corpo teórico desenvolvido pelos geneticistas. Em especial, Ernst Mayr, um ornitólogo alemão radicado nos Estados Unidos, sumarizou seus estudos sobre especiação em populações naturais em Sistemática e a Origem das Espécies, de 1942. O ambiente intelectual da biologia próximo ao meio do século 20 era distinto daquele encontrado nos 50 anos anteriores. Biólogos de diversas áreas pareciam estar conversando numa mesma língua e concordando, ao menos, com a existência de princípios gerais pela primeira vez. Também em 1942, Julian Huxley, neto de Thomas Huxley – o buldogue de Darwin, sintetizou este momento de unificação das ciências biológicas em Evolution, the Modern Synthesis. Em 1944, em Tempo and Mode of Evolution, o paleontólogo americano G.G. Simpson decidiu testar se os achados teóricos e empíricos da genética de populações poderiam explicar a variação encontrada no registro fóssil. Simpson concluiu que sim e sugeriu alguns modos de evolução possíveis a partir dos dados coletados do registro fóssil. Entre esses modos, estava a especiação quântica, um processo de formação de novas espécies que ocorreria num intervalo de tempo muito curto. A ideia de Simpson que, de alguma, forma aludia ao saltacionismo, seria resgatada algumas décadas depois. Por fim, o botânico estadunidense G. Ledyard

Stebbins mostraria, em 1950, em Variation and Evolution in Plants, que alguns processos evolutivos, raros em animais, eram importantes no entendimento da evolução das plantas, como a hibridização e a poliploidização. Essas obras consistem nos denominados livros canônicos da síntese evolutiva. No início dos anos de 1950, esta estava consolidada. Entretanto, surpreendentemente, as bases últimas de hereditariedade – a estrutura da molécula de DNA – ainda não haviam sido decifradas.

No ano de 1953, James Watson e Francis Crick publicaram o estudo que, enfim, desvendava a estrutura da molécula informacional da vida. Os autores imediatamente perceberam que a estrutura evidenciava um mecanismo de replicação. Da mesma forma, os evolucionistas também notaram que a sequência linear de nucleotídeos dava uma pista sobre a origem última da variação genética. Ao longo dos anos seguintes, o crescimento da genética molecular mostrou, por fim, que qualquer hipótese de origem direcionada da variação ou herança dos caracteres adquiridos não tinha qualquer respaldo bioquímico ou empírico. A chamada hard inheritance, a herança dura, um termo cunhado Ernst Mayr para descrever que o ambiente não influencia de forma teleológica a origem da variação, tinha vencido. Era a ruína do lamarckismo e de todas

No documento Carlos Guerra Schrago (páginas 34-51)

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