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A UNIDADES DE CUIDADOS INTENSIVOS: LUGAR DE ACOLHIMENTO DA PESSOA EM

Durante as últimas décadas, com a industrialização, o desenvolvimento tecnológico e científico tornou as unidades de cuidados intensivos num contexto específico de prestação de cuidados de saúde, proporcionando mais e melhores cuidados à pessoa em situação crítica, permitindo uma monitorização e vigilância contínua durante 24 horas.

As unidades de cuidados intensivos surgiram da crescente necessidade de aperfeiçoamento e concentração de recursos materiais e humanos, para o atendimento de doentes graves cujo estado crítico exigia uma observação, avaliação e assistência permanente (Vila & Rossi, 2002).

Já Florence Nightingale em 1854 durante a guerra da Crimeia tinha essa preocupação, selecionava os doentes mais graves, dispondo-os na enfermaria para que estes ficassem mais próximos da enfermeira, de forma a favorecer o cuidado imediato e a observação constante (Lino & Silva,2001).

Segundo o Ministério da Saúde (2003, 6) as unidades de cuidados intensivos são: “locais qualificados para assumir a responsabilidade integral pelos doentes com disfunções de órgãos, suportando, prevenindo e revertendo falências com implicações vitais, (…) mas que são potencialmente reversíveis. Proporcionando oportunidades para uma vida futura com qualidade. Para tal, é necessário concentrar competências, saberes e tecnologias em áreas dotadas de modelos organizacionais e metodologias que as tornem capazes de cumprir aqueles objetivos ”.

Ainda segundo o mesmo órgão “o internamento em unidade de cuidados intensivos é, por definição, um tempo transitório para alguns dos doentes em risco de vida, pelo que é parte de um processo e não um fim em si” (2003,6).

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Embora seja o local ideal para o atendimento a doentes em risco de vida, recuperáveis, a UCI parece oferecer um dos ambientes mais agressivos, tensos e traumatizantes do hospital, onde domina a tecnologia (Vila & Rossi, 2002).

Estas unidades diferenciam-se dos outros serviços pela sofisticação tecnológica de monitorização e de intervenção terapêutica, pelos recursos humanos altamente especializados e pela situação de particular vulnerabilidade inerente à gravidade do estado clínico das pessoas admitidas, em que a morte está eminente, encontrando-se a vida constantemente ameaçada (Almeida & Ribeiro, 2008).

Para Silva (2010) A Unidade de Cuidados Intensivos é um local, do Hospital, apto a receber doentes que necessitam de uma vigilância constante, tanto do ponto de vista médico, como de enfermagem e cuidados diferenciados que não podem ser assegurados numa unidade normal. Esta concentra meios técnicos, humanos e materiais necessários à vigilância e tratamento de pessoas em situação crítica com a finalidade de normalizar as funções vitais. Nestas unidades, os cuidados constituem a integração de um todo, ou seja, todos os conhecimentos científicos e competências desenvolvidas são integrados no sentido de proporcionar o cuidar da pessoa como um todo.

As unidades de cuidados intensivos integram as mais sofisticadas intervenções de carater médico e de enfermagem na prestação de cuidados críticos a pessoas altamente instáveis, em que a variabilidade da resposta humana aos problemas de saúde podem alterar-se de minuto a minuto.

Segundo Rosário (2009) o ambiente não familiar de alta tecnologia e de terapia intensiva que se vive nas unidades de cuidados intensivos é uma das fontes de stress mais sentidas pelo doente e família. O doente e família, embora parcialmente conhecedores da natureza especial dos cuidados nestas unidades, reparam sobretudo no aspeto exterior: luzes que se apagam e acendem; aparelhos que apitam; ambiente ruidoso e excessivamente iluminado; pessoal atarefado equipado com máscaras, batas; entre outros.

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No estudo desenvolvido por Wang, Zhang, Li e Wang (2009) cujo objetivo foi compreender a experiência dos utentes chineses internados em UCI, submetidos a ventilação mecânica, o ambiente da UCI é descrito como algo terrível, como uma prisão. Os participantes sentem como se tivessem entrado noutro mundo. Alguns participantes mencionaram a perturbação causada pelos alarmes, no entanto, a maioria considera que o ruído dos alarmes foi mais suportável que a voz dos profissionais quando estavam a conversar. A utilização dos equipamentos e tecnologia avançada é referida como invasão do corpo, sentindo-se os participantes desconfortáveis e isso fazia-os sofrer. As tecnologias avançadas foram referidas pelos participantes que apesar de salvar vidas também fazem com que se sintam dependentes e temerosos, pensando que a morte está iminente, sendo os seus últimos dias de vida.

As UCI são descritas como uma sinfonia tecnológica, devido especialmente ao alto nível de atividade, sons de equipamentos e alarmes, telefones e vozes dos profissionais. O ambiente tecnológico é descrito como desagradável (Johnson, St John & Moyle, 2006; Almerud, Alapack, Fridlund & Ekebergh, 2007; Perkins, 2008) em que o “ouvir o alarme do monitor cardíaco” o “ouvir os ruídos e alarmes das máquinas” é fonte de stress nos doentes na UCI (Almeida & Ribeiro, 2008). A UCI é percebida como um ambiente desconhecido e pouco acolhedor, acabando por gerar ansiedade e insegurança, associado à morte e doença grave, constituindo-se como um local de sofrimento (Severo & Perlini, 2005).

Num estudo realizado por Almerud et al (2007) os participantes referem que apesar de serem constantemente monitorizados e observados na UCI, sentem-se invisíveis como pessoas, reduzidos à condição de órgãos, objetos ou diagnósticos. Inconscientemente dentro do ambiente altamente tecnológico a pessoa em situação crítica e a tecnologia fundem-se. O ruido da tecnologia silencia o discurso da pessoa e as suas reais necessidades. Os participantes referem que o seu corpo objeto, o corpo que têm, é um cabo conectado a aparelhos.

Com base que no que foi exposto pudemos inferimos que é consensual que as unidades de cuidados intensivos surgem-nos como um ambiente hostil quer para a PSC quer para a família.

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A família é definida como um grupo de indivíduos unidos por uma ligação emotiva profunda e por um sentimento de pertença ao grupo, que se identificam como fazendo parte daquele grupo. Esta definição é flexível o suficiente para incluir as diferentes configurações e composições de famílias que estão presentes na sociedade atual (Galera & Luis, 2002).

A família forma uma rede social que funciona como suporte importante para os seus membros, é a principal fonte de apoio para a PSC, necessita de se organizar, adaptar- se a esta nova situação e fazer face aos diversos problemas.

O internamento de um membro da família na UCI é sempre uma situação de crise em que a integridade da família fica ameaçada pela separação, é um acontecimento normalmente abrupto e inesperado, assustador para os familiares implicando sofrimento e mudanças na vida quotidiana, enfrentando novos desafios (Silveira & Angelo,2006). O impacto do internamento é potenciado por não ser precedido de preparação, não tendo o doente e a família oportunidade para se adaptar às alterações de papéis que o internamento impõe. Segundo Hughes, bryan e Robbins (2005) o internamento de um familiar em cuidados intensivos é diferente de ser noutro serviço, pela insegurança que a situação acarreta.

Os familiares vivem momentos angustiantes de medo e incerteza em relação ao futuro do seu familiar, sentindo-se ansiosos perante a possibilidade de perda do seu familiar, da cisão na vida familiar. O equilíbrio familiar encontra-se alterado não conseguindo, por vezes, os elementos da família encontrar os recursos e potencialidades para lidar com a situação de transição saúde-doença que se encontram a atravessar.

Estas mudanças significativas que acontecem a um ritmo alucinante obrigam a família a gerir não só o contexto do internamento mas também tudo o que lhe é externo, podendo trazer perturbações psicológicas como a ansiedade ou depressão (Pochard et al,2005), e a nível físico perturbações a nível do sono e da alimentação (Horn & Tesh, 2000).

No estudo desenvolvido por Freitas, Mussi e Menezes (2012) sobre os desconfortos vividos no quotidiano de familiares de pessoas internadas na UCI os resultados mostraram que a interação das famílias com a ameaça à vida de um de seus membros

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na UCI produziu, como desconforto central, a descontinuidade da vida quotidiana, a qual foi caracterizada por quatro categorias: vivendo a angústia da possibilidade de perda, vivendo uma cisão na vida familiar, sofrendo mudanças na vida social e profissional e tendo dificuldade para cuidar de si.

O período da visita é considerado um momento de apoio e de ajuda aos familiares. Normalmente os familiares da PSC são excluídos da prestação de cuidados, dado que estão condicionados ao período da visita. Cabe ao enfermeiro perceber de que forma a família vivencia esta experiência de internamento de um membro da família. Phipps et al (1999) referem que o enfermeiro deve ter consciência da compreensão e perceção da doença por parte da família.

Para Hughes, bryan e Robbins (2005) a PSC não pode ser considerada como uma unidade individual. Estes fazem parte de uma unidade familiar e a relação cuidativa implica que a equipa preste cuidados igualmente à pessoa e seus familiares.

No estudo desenvolvido por Engström e Söderberg (2007) os resultados mostraram que a presença dos familiares era tida como garantida pelos enfermeiros. As informações que estes disponibilizavam eram importantes para uma prática de cuidados individualizados.

Ao fomentar a presença do familiar o enfermeiro contribui para que a PSC sinta que continua a ter o seu lugar na família. A família não funciona apenas como um sistema de suporte mas como uma componente central no processo da recuperação. Esta mantem a conectividade da PSC ao mundo exterior. A PSC precisa de segurança, de saber que a família e os amigos estão com ela, e que lhes proporcionam apoio e ânimo.

Numa primeira visita do familiar à unidade em que este se encontra sozinho, situação que lhe trás alguma vulnerabilidade, é essencial que o enfermeiro esteja atento a toda a panóplia que envolve a PSC e o receba e lhe explique como vai encontrar o seu familiar, afim de minimizar o choque inicial de o ver, permitindo-lhe esclarecer dúvidas, ficando este informado com o facto de que o seu ente querido não vai conseguir conversar com ele. É importante que os familiares se sintam apoiados pelos enfermeiros.

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O sentimento de impotência perante um familiar que se visita e que se encontra ventilado, monitorizado, com seringas e bombas infusoras e possivelmente a fazer hemofiltração está presente de forma muito profunda, instalando-se medos em relação à situação e até mesmo em relação à morte (Castro,2007). Os familiares devem ser informados que apesar de todo aquele aparato que rodeia o seu ente- querido, eles podem ser tocados e acariciados.

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