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3 AS UNIVERSIDADES NO CONTEXTO DE TRANSFORMAÇÕES ESTRUTURAIS

3.3 A IES PÚBLICA E A IES PRIVADA ANALISADAS.

3.3.2 A Universidade Privada

A IES privada, objeto de estudo deste trabalho, chamada agora de Universidade Empresa, foi fundada no ano de 1984 e composta por profissionais com ampla experiência na área educacional, os quais ocupavam funções técnico-administrativas, como direção de faculdades, chefia de departamentos, coordenação de cursos de Mestrado e coordenação de programas de pesquisa em universidades baianas.

A missão da Universidade Empresa, por meio da difusão do conhecimento, estava pautada no compromisso em formar profissionais competentes e críticos, capazes de desenvolver e implementar transformações que melhorassem a qualidade de vida da comunidade na qual estava inserida e da sociedade em geral.

Inicialmente, concentrou suas atividades na área de gestão de organizações e tecnologia em processamento de dados com a finalidade de formar profissionais nessas áreas. Em 1989, ela obteve as autorizações para o funcionamento dos cursos de Administração e Tecnologia em Processamento de Dados. Em 1990, as primeiras turmas dos referidos cursos iniciaram suas atividades em instalações próprias.

Posteriormente, em 1997, a Universidade Empresa identificou uma significativa demanda por cursos de graduação na área de Computação e Informática no estado da Bahia. Assim, foi submetido à apreciação do MEC o projeto de autorização do curso de Bacharelado em Ciência da Computação. Autorizado a funcionar em março de 1998, o curso iniciou suas atividades no mesmo ano.

Nesse mesmo período, a Universidade em questão observou também uma grande demanda por cursos no campo da Psicologia. Na época, havia na Bahia apenas o curso de Psicologia oferecido pela Universidade Federal da Bahia. Além disso, visava contemplar a inserção comunitária dos estudantes com a viabilização de ações realizadas em comunidades menos favorecidas, possibilitando vivências que lhes conferissem consciência e compromisso sociais, quando do exercício profissional. Em 1997, submeteu ao MEC o projeto do curso de Psicologia (Bacharelado e formação de psicólogo) e o curso foi autorizado em junho 1998, iniciando suas atividades em agosto (MENEZES, 2014).

Visando ampliar as oportunidades no campo do conhecimento e da formação continuada, a Instituição estruturou seu Programa de Pós-graduação, passando a oferecer cursos em nível de especialização (lato sensu). O princípio norteador dessa iniciativa residia na oferta de cursos que possibilitassem maior qualificação dos egressos de seus cursos de graduação. Em 1999, o Programa de Pós-graduação foi implantado com a oferta inicial de sete cursos lato sensu (MENEZES, 2014).

Em 2001, a Universidade Empresa apresentou ao MEC o projeto de conversão do curso de Tecnólogo em Processamento de Dados para Bacharelado em Sistemas de Informação, obtendo a autorização de funcionamento em dezembro de 2001. Em agosto do ano seguinte, o curso teve início com a sua primeira turma.

Por fim, em 2002, submeteu ao MEC o projeto de funcionamento do curso de Direito, mantendo coerência com os objetivos de consolidar as ações acadêmicas orientadas ao exercício da cidadania, já existentes nos cursos oferecidos por esta Instituição. O curso de Direto foi autorizado em março de 2002, iniciando suas atividades em agosto do mesmo ano.

Em 2003, ela procedeu com algumas adaptações em seu estatuto em decorrência do novo Código Civil Brasileiro. De 2003 até 2008, a Universidade Empresa manteve funcionando os cursos de Administração, Ciência da Computação, Sistemas de Informação, Psicologia, Direito e os cursos do Programa de Pós-graduação lato sensu, oferecendo, ainda, cursos de extensão.

A credibilidade conquistada pela Universidade Empresa durante os seus anos de atuação foi marcada pela experiência em educação do seu idealizador, bem como pela competência e o compromisso dos docentes com a educação e com a certeza de que estavam a serviço de uma Instituição séria, que investia em um projeto de qualidade e em uma equipe de coordenadores, professores e pessoal administrativo trabalhando de forma integrada e sem o peso hierárquico (MENEZES, 2014).

Pode-se perceber que o ideal da educação na Universidade Empresa era burguês e desejava, dentro de uma proposta arrojada de formação crítica, preparar também os estudantes para que fossem os melhores no mercado. A Instituição orgulhava-se em assumir que tinham os melhores professores, melhores funcionários e melhores alunos, e o seu principal slogan apontava para uma continuidade sem fim dessa relação.

A Universidade Empresa, manteve-se fiel ao seu ideal de educação até a sua venda no segundo semestre de 2008 para um Grupo Norte Americano de Educação. Tal Grupo assumiu o poder desmontando o projeto pedagógico da Universidade Empresa, apesar

de manter o nome anterior para aproveitar o conceito de qualidade da Instituição. Notadamente, essa venda ocorreu em sigilo absoluto e os alunos e professores receberam a notícia durante o recesso de junho, após a venda ter sido efetivada. Alguns rumores já existiam sobre a possibilidade da venda, mas sempre que eram questionados sobre o assunto, os dirigentes negavam. Desta forma, a surpresa foi ainda maior quando a comunidade acadêmica recebeu a notícia pelo portal da Instituição (MENEZES, 2014).

A comoção foi geral, a troca de e-mails entre alunos, professores e funcionários demonstrava que eles estavam com dificuldades em aceitar que a venda realmente havia acontecido. Após a divulgação, os professores foram convocados para uma reunião para a apresentação do novo grupo e o anúncio das mudanças que ocorreriam, segundo professor da Instituição.

O representante do projeto pedagógico do Grupo adquirente iniciou seu discurso afirmando que o projeto anterior era ultrapassado e “medieval” e que a nova proposta fazia parte de uma tendência inovadora. O novo projeto pedagógico da Instituição apontou a pedagogia por experiências, tendo a “Escola Nova” e o “construtivismo” como principais motivadores para a proposta Institucional. Os dirigentes indicaram o norte-americano John Dewey como ícone da nova educação e distorceram as propostas de pesquisadores como Piaget, Vygotsky e Montessori para dar respaldo a uma proposta que, segundo eles, superava a “inércia” do modelo anterior (MENEZES, 2014).

O “Ensino baseado em experiências” é o objetivo central da Nova proposta pedagógica e seus fundamentos consistem na flexibilidade, foco no mercado e tecnologia.

Para cumprir esse objetivo, a Instituição apresentou as seguintes reformas: Sistema Modular, os redatores afirmaram que o modelo anterior era cartesiano e que o sistema modular, com a criação de currículos “flexíveis”, traria muitos benefícios aos alunos. Esse sistema baseia-se no oferecimento de módulos semestrais, os quais possuem uma espécie de minicurso dentro do próprio curso. Os redatores chamaram esse minicurso de “terminalidade” e apresentaram-no como uma possibilidade de haver articulação entre as disciplinas do mesmo módulo, de forma a desenvolver nos alunos um conjunto de competências que façam sentido, com uma carga horária de 300 horas. Para eles, essa lógica de “terminalidade” traz o benefício de flexibilizar os currículos, rompendo com a lógica cartesiana de disciplinas em sequência (MENEZES, 2014).

Outro aspecto apontado como vantagem da flexibilização foi o valor que passou a ser dado à aprendizagem fora da sala de aula, como trabalhos acadêmicos, visitas técnicas,

participação em eventos, concursos e outras experiências que permitem ao aluno vivenciar experiências que lhe façam sentido.

O documento afirmava que “para deixar Jonh Dewey muito feliz” era necessário permitir que os alunos escolham apenas as disciplinas que lhe despertem seu interesse e que façam sentido. Tal proposta seria muito interessante se o real interesse não fosse a pulverização do conhecimento, tornando o aluno um potencial trabalhador polivalente e multifuncional que não questiona o sistema e ainda se sente beneficiado por ele, uma vez que passa a estar inserido nos pressupostos da empregabilidade.

O projeto pedagógico deixava bem claro que o seu foco era no mercado. A Instituição tinha uma opção pedagógica clara ao focar a formação de seus alunos para o mercado de trabalho. Era pretendido que os alunos tivessem sucesso em suas profissões ao atuarem como empregados ou como empresários. Desta maneira, o sistema modular foi apresentado como uma das grandes estratégias criadas para atingir tal objetivo, pois os módulos procuravam representar “fatias” do mercado de trabalho, focando as disciplinas através do conceito de “terminalidade” citado anteriormente.

“É minha lei, é minha questão Virar esse mundo, cravar esse chão Não me importa saber Se é terrível demais”

Chico Buarque