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2.2. A dêixis e a subjetividade

2.2.2 Uso e classificação dos termos dêiticos

Já vimos com as orientações de Bühler (1950) que o sujeito EU é o responsável por gerar outros termos dêiticos que organizam relações espaciais e temporais. Isto quer dizer que em torno do EU subjetivo é que são tomados os pontos de referência AQUI e AGORA, ONTEM, NO ANO PASSADO, AMANHÃ, CÁ, ESTE e coordenadas que dizem respeito ao interlocutor, tais como TU, AÍ e ESSE, por exemplo.

No estudo das coordenadas dêiticas, que compõem o centro dêitico, EU-AQUI- AGORA, Bühler percebe que não existem usos homogêneos. Um mesmo dêitico pode ser usado de três formas: ad oculos, anafórico e fantasma. Reportemo-nos aos usos apontados pelo autor. No caso da dêixis ad oculo, palavras como AQUI, AGORA, LÁ, etc são recuperadas pelo monitoramento áudio-tátil-visual. Esse mesmo uso é chamado por Fillmore (1971) de gestual. Nele, os interlocutores compartilham um campo perceptível comum e, ao ouvir um dado dêitico, os interlocutores devem acompanhar o ato de apontar do locutor. Um exemplo desse uso é apresentado por Levinson (2007,p.98):

(20) Place it here. Coloque-o aqui.

Para identificação do dêitico “aqui”, só é possível encontrar o referente acompanhando o movimento dos dedos do locutor para um dado local que, certamente, é um local que está próximo de onde ele se encontra.

Um outro uso é o anafórico, também chamado assim por Fillmore (1971). Esse uso caracteriza-se pela mostração que não encontra no espaço perceptivo o referente, mas este é recuperado no próprio texto, ou seja, as coordenadas dêiticas encontram o seu referente no texto.

(21) I was born in London and have lived there ever since.

Eu nasci em Londres e moro lá desde então. (Levinson, 2007, p.82)

O último uso é o da mostração fantasma, tratada por Fillmore como dêixis simbólica. Nessa mostração, não existem os recursos disponíveis na mostração ad

oculo. O locutor leva o ouvinte a interpretar o referente considerando os parâmetros do

conhecimento espácio-temporal. As expressões dêiticas são, portanto, construídas na ausência, no reino da fantasia.

(22) I’m writing to say I’m having a marvelous time here.

Estou escrevendo para dizer que o tempo que passo aqui está sendo maravilhoso. (Levinson, 2007, p.98)

Os conhecimentos interpessoais partilhados permitem o reconhecimento de “aqui”. Sobre esse uso específico, Bühler (1950) traz uma pergunta que já é respondida pela conceituação de Fillmore (1971). Como é possível guiar e ser guiado por meio desse tipo de referência? A resposta está no conjunto de conhecimentos partilhados.

Vale ressaltar, para encerrar esta seção, que a dêixis não mostra somente as coordenadas pessoais, temporais e espaciais, já mencionadas. Em trabalhos posteriores ao de Bühler (1950), como os de Fillmore (1971) e os de Lyons (1977), é possível perceber essa maior elasticidade que o termo ganha. Nas palavras de Lyons (1997:637):

Por dêixis, eu entendo a localização e a identificação de pessoas, objetos, eventos, processos e atividades falados ou referidos em relação ao contexto espácio-temporal criados e sustentados pelo ato de fala e pela típica participação de um único falante e pelo menos um destinatário.13

Essa noção mais abrangente possibilita uma expansão das categorias dêiticas, portanto, além da classificação de dêixis de pessoa, de tempo e de espaço, são acrescidas outras categorias de dêixis:

Estes [aspectos do ato comunicativo] incluem, como já mencionei, a identificação dos interlocutores na situação comunicativa, coberta pelo termo dêixis pessoal; o lugar ou lugares em que esses indivíduos estão localizados, para os quais nós temos o termo dêixis de lugar; o tempo em que o ato comunicativo toma lugar - para isto precisamos distinguir o encoding time, o tempo em que a mensagem é enviada, do decoding time, o tempo no qual a mensagem é recebida - os dois juntos estão sob o título de dêixis de tempo; a matriz de material lingüístico de que faz parte o enunciado, isto é, as partes precedentes ou conseqüentes do discurso, a que nós podemos nos referir como

dêixis discursiva; e a relação social, por parte dos participantes na

conversação, que determina, por exemplo, a escolha de níveis de discurso honoríficos ou polidos ou íntimos ou insultantes, etc., os quais podemos agrupá-los sob o termo dêixis social. (Filmore, 1971, p.39) 14. Grifo meu

13

By deixis* is meant the location and identification of persons, objects, events, processes and activities being talked about, or referred to, in relation to the spatiotemporal context created and sustained by the act of utterance and the participation in it, typically, of a single speaker and at least one addressee. 14

These incluse, as I have already mentioned, the identity of the interlocutors in a communication situation, covered by are located, for which we have the term place deixis; the time at which the communication act takes place as for this we may need to distinguish as the encoding time, the time at which the message is sent, and as the decoding time, the time at which the message is received—these together coming under the heading of time deixis; the matrix of linguistic material within which the utterance has a role, that is, the preceding and following parts of the discourse, which we can refer to as discourse deixis; and the social relationships on the part of the participants in the conversation, that

Vale ressaltar que as classificações não cessam por aqui. Tratar de todas elas seria desnecessário e desgastante neste trabalho, visto que nosso foco é apenas as coordenadas dêiticas que remetem a espaço. Como acreditamos que a exploração sobre a noção de dêixis, relacionada ao caráter subjetivo, e a identificação e reconhecimento dos termos foram contemplados exaustivamente, partiremos para o ponto mais específico do trato com os dêiticos, o estudo dos espaços dêiticos.

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