• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO V – OS USOS MÚLTIPLOS DAS ÁGUAS E SUAS IMPLICAÇÕES

5.3 Uso hidrelétrico

A análise do uso da água na geração de energia elétrica buscou apontar a forma de apropriação e as possíveis implicações sócio-ambientais oriundas de tal atividade. Para tanto, foram utilizado os Indicadores de Sustentabilidade na Gestão das Águas da Fundação Getúlio Vargas e do Modelo PER, na classe geração de energia hidrelétrica na análise dos: Indicado- res de Pressão – (potência instalada, toxidez das águas, atividades executadas na área inunda- da, acidentes, dentre outros); Indicadores de Estado – (disponibilidade hídrica da área/bacia, aptidão agrícola dos solos, freqüência, duração e extensão dos períodos de carência de água, vegetação marginal aos rios, segundo o seu estado de conservação, espécies ameaçadas, den- tre outros); Indicadores de Impacto – (alteração no regime hídrico, diminuição de espécies animais e vegetais, atividades econômicas afetadas, perda de patrimônio histórico-cultural, dentre outros) e Indicadores de Resposta – (gerenciamento integrado de bacias, criação de comitês, aumento de pesquisas científicas na área, gastos com prevenção e limpeza dos corpos hídricos, desenvolvimento de projetos ambientais, dentre outros).

A atividade de uso da água identificada na área estudada é feita pelo Aproveitamen- to Hidrelétrico Queimado, atualmente abrangendo além do município de Unaí, Cabeceira Grande em Minas Gerais, de Formosa e Cristalina em Goiás, além da área administrativa do Paranoá, no Distrito Federal.

Maiores informações, de cunho técnico, puderam ser obtidas na visita à usina de Queimado, feita no dia 24/05/2006, através do engenheiro ambiental Murilo, funcionário da usina. Segundo o funcionário, o empreendimento representa um investimento de 113 milhões de reais, investimento que a região necessitava para o desenvolvimento de atividades que de- mandam grande consumo de energia. Em funcionamento, atualmente, existem três turbinas com capacidade de geração de 35 MW cada, capazes de gerar 105 MW de potência total. Para tanto, a usina conta com um reservatório de 40,11 km² de área alagada com um volume útil de 590 milhões de m³

As obras tiveram início em julho de 2001, quando foi feito o desvio da principal fon- te de abastecimento do reservatório, o Rio Preto. O projeto foi desenvolvido por meio de um consórcio entre Companhia Energética de Minas Gerais – CEMIG (82,5%), e pela Com- panhia Energética de Brasília – CEB (17,5%). A figura abaixo retrata as obras na fase de in- tervenção na cachoeira do Queimado pelo desvio do Rio Preto.

Figura 33 – Interrupção da cachoeira do Queimado e desvio do Rio Preto

Créditos: SILVA, L. M. (2006).

O empreendimento levou cerca de 36 meses para entrar em funcionamento. Em ja- neiro de 2003 teve início o enchimento do reservatório e a primeira operação em abril de 2003. Porém o processo que envolveu a construção e o funcionamento da usina teve várias etapas. A negociação com os proprietários das terras inundadas pelo reservatório da usina começou ainda em 2001, através de negociações do consórcio e da Associação dos Atingidos pela Construção da Usina de Queimado, representado por seu presidente Odilon de Oliveira.

Segundo Informativo AHE Queimado de dezembro de 2005 algumas ações foram desenvolvidas pelo consórcio no sentido de minimizar os impactos gerados pelo empreendi- mento.

No mês de outubro de 2001, o geógrafo Jackson Campos visitou a região para avali- ar os focos de erosão na área do entorno do reservatório a fim de promover as correções ne- cessárias. Foram feitas visitas para posicionar a instalação dos diversos equipamentos de mo- nitoramento dos recursos hídricos do Rio Preto, onde são medidos constantemente a vazão e os sedimentos do rio.

Em dezembro do mesmo ano, o engenheiro florestal Mauro Megale esteve na região e manteve contato com o Presidente da Associação dos atingidos, a fim de buscar informações sobre as atividades agropecuárias que, até então, eram desenvolvidas nas propriedades.

Na etapa de implantação, segundo informações da usina, foi realizada visitações no local onde seria implantada a Estação Climatológica, prevista para ser montada no CIF –

Campo de Instrução de Formosa – do Exército Brasileiro, localizado no município de Formo- sa, Goiás.

Em contrato firmado entre o consórcio CEB e a CERNAGEM/EMBRAPA para co- leta de material genético (semente e plântulas) a fim de produzir as mudas que serão utilizadas nas áreas que vão ser replantadas. Em outubro de 2001 ainda aconteceu a primeira campanha de monitoria das águas na bacia do Rio Preto, dentro da fase de pré-enchimento do reservató- rio. Este trabalho será realizado com freqüência, para que se monitore a qualidade da água do Rio Preto e seus afluentes.

Após a liberação das licenças ambientais pelo IBAMA, foram realizadas campanhas de reconhecimento nos meses de setembro, outubro, novembro e dezembro de 2001. No mo- mento biólogos foram envolvidos no projeto de monitoramento de aves, répteis, mamíferos, etc.

Em dezembro de 2001, diversas reuniões foram feitas com as escolas locais, buscan- do definir no calendário escolar espaço para a disciplina de educação ambiental. Na oportuni- dade, a pedagoga Maria José Furtado esteve também com os secretários municipais de educa- ção de Unaí e de Cabeceira Grande.

Na fase de construção do empreendimento, foi detectado na área a existência de um patrimônio arqueológico cujo material foi encaminhado ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, a solicitação de autorização para a realização dos trabalhos de prospecção arqueológica na área do reservatório. A figura abaixo demonstra a dimensão do projeto de geração de energia elétrica pelo aproveitamento das águas do Rio Preto.

Figura 34 – Visão aérea da construção da Usina de Queimado

Fonte: Construtora Queiroz Galvão, 2005.

As ações hoje fazem parte da história do processo de estabelecimento do empreen- dimento na área de estudo. Entretanto, são relatos que se têm apenas durante o período de implantação do empreendimento, em resposta às normativas estaduais e federais que regula- mentam o processo de construção de uma obra dessa natureza. Não foram fornecidas maiores informações quanto a atualidade das ações outrora desenvolvidas.

Em entrevista com o senhor Murilo, engenheiro ambiental, foi questionado quanto a mortandade de peixes identificada pela população no Rio Preto durante a fase de enchimento do reservatório. Segundo o engenheiro, a mortandade foi um fato isolado que não ocorreu seguidamente e esteve relacionado não só com a redução brusca da vazão do rio, mas também com a inversão térmica da lâmina d’ água do rio.

O engenheiro menciona ainda que a usina tem tido a preocupação com o Rio Preto. Na fase de formação do reservatório, houve a necessidade de se desmatar 1.100 hectares para a retirada de vegetais que, posteriormente, ao se decomporem, poderiam vir a alterar a quali- dade da água do rio além de comprometer o processo de geração de energia. É destacado que a geração de hidroeletricidade é uma “atividade limpa”, ou seja, não gera alteração na quali- dade da água e que a usina faz o controle, periodicamente, para que não haja vazamentos de óleo ou qualquer outra substância que possa alterar a qualidade do Rio Preto.

Foi questionado ao engenheiro quanto a forte enchente ocorrida em 2005 que, se- gundo a imprensa local deixou mais de 4000 desabrigados, e que segundo moradores afetados

foi agravada pela existência da usina. Segundo o funcionário, uma usina deve também funcio- nar no controle de inundações, pois contém a água durante o período de intensa pluviosidade evitando as cheias na cidade. Somente quando o reservatório chega a seu limite é que se torna necessário verter essa água, até por uma questão de segurança, ressalta o engenheiro.

Quanto a disponibilização da água durante o período de estiagem, foi perguntado como é feita a geração de energia, sendo que há reduzido volume de água e sabendo que não é possível afetar as comunidades ribeirinhas quanto ao uso do rio. Nesse sentido, completa o engenheiro dizendo que antes do empreendimento o rio tinha uma média de 5 a 10 m³ por segundo e que hoje, com a usina, há uma regularização na vazão, que chega a ser constante num fluxo de 60 a 70 m³ por segundo.

É ressaltado que, apesar do impacto ambiental gerado na fase de implantação da usi- na, um empreendimento como esse é de fundamental importância para o desenvolvimento regional. A Usina de Queimado hoje é capaz de fornecer energia para uma cidade de aproxi- madamente 300 mil habitantes.

É importante frisar que no desenvolvimento de estudos de planejamento do setor elé- trico haja uma relação direta com plano de recursos hídricos, bem como devem ser consulta- dos os órgãos responsáveis quanto aos volumes e restrições a serem consideradas para aten- dimento dos usos múltiplos, visando a que se busque e implemente, em tempo hábil, alternati- vas energéticas para a região, em função dos impactos dos demais usos (retiradas d’água e restrições de defluências e níveis, bem como o controle de cheias) sobre os requisitos hidráu- licos das usinas já implantadas e a serem implementadas. Com relação às usinas implantadas vale ressaltar que os detentores de concessão e de autorização de uso de potencial de energia hidráulica expedidos até 2002 estão dispensados da solicitação de outorga do direito de uso dos recursos hídricos, mas a ANA tem a competência de definir e fiscalizar as regras de ope- ração dos respectivos reservatórios, bem como órgãos ambientais em âmbito estadual.