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5.2 Salmonella enterica

5.3.2 Utilização de antimicrobianos vs perfil fenotípico

As análises foram conduzidas em dois diferentes níveis: rebanho e bactéria. Para análises conduzidas em nível da bactéria, foram detectadas associações entre a utilização de penicilinas, lincosamidas, macrolídeos, cloranfenicol e similares, tetraciclinas e sulfonamidas e a chance de um ECN isolado ser multirresistente em modelos separados. Os resultados dos modelos finais no nível do patógeno são apresentados na Tabela 17. Nenhum efeito de interação avaliado foi considerado significativo, exceto pela interação entre o uso de diferentes drogas (penicilina, lincosaminas e macrolídeos) com o uso de tetraciclinas (P < 0,05). A utilização concomitante de tetraciclinas com as demais drogas, reduz a taxa de aumento na chance

de um ECN isolado ser multirresistente em comparação com a mesma taxa obtida com o uso das drogas sem a utilização das tetraciclinas (dados não apresentados).

Em nível de rebanho, foram detectadas associações entre a utilização de cloranfenicol e similares, macrolídeos, sulfonamidas, tetraciclinas e lincosamidas e o isolamento de pelo menos um ECN multirresistente no rebanho. Cada 1000 doses de antimicrobianos aplicados no rebanho aumentaram o risco de pelo menos um ECN isolado no rebanho ser multirresistente. O aumento no risco em termos absolutos foi de 0,25 para cada 1000 doses de cloranfenicol, 0,12 cada 1000 doses de macrolídeos, 0,09 para cada 1000 doses de sulfonamidas, 0,02 para cada 1000 doses de tetraciclinas e 0,01 para cada 1000 doses de lincosamidas. Como exemplo, a aplicação de 1000 doses de cloranfenicol em um rebanho aumenta o risco de um ECN isolado naquele rebanho ser multirresistente em 25% em relação ao risco basal. Estas associações detectadas foram comuns para diferentes Províncias, paridades, dias em lactação, sistemas de produção, tamanho de rebanhos, produção média de leite e número de isolados avaliados por rebanho. Para todas as outras drogas avaliadas, os resultados foram não significativos.

Table 17. Modelos finais de generalized estimating equations utilizando-se separadamente o uso de antimicrobianos

(AMU) das diferentes classes como previsores e resistência antimicrobiana (definida como multirresistência) de estafilococos coagulase-negativa (ECN) como outcome considerando-se o efeito de fatores introduzidos como possíveis

confounders ou modificadores.

Fator Penicilinas Lincosamidas Macrolídeos Tetraciclinas Sulfonamidas

β P β P β P β P β P

Intercept -2,76 < 0,001 -2,75 < 0,001 -2,3 < 0,001 -2,77 < 0,001 -2,51 < 0,001

Província

Alberta 0,26 0,58 0,39 0,54 0,01 0,99 0,26 0,6 0,18 0,74

Marítimas -0,38 0,4 -0,05 0,92 -0,15 0,75 -0,08 0,88 -0,25 0,62

Ontario ref ref ref ref ref

Quebec -0,56 0,27 -0,56 0,26 -0,78 0,09 -0,44 0,37 -0,66 0,15

Sistema

Free-stall -0,98 0,04 -1,09 0,06 -0,75 0,19 -0,76 0,13 -1,18 0,03

Bedded Pack -2,22 0,07 -1,73 0,12 -1,42 0,2 -1,66 0,13 -2,27 0,07

Tie-stall ref ref ref ref ref

Paridade

Novilha -0,24 0,31 -0,23 0,33 -0,27 0,23 -0,28 0,21 -0,24 0,29

Multípara ref ref ref ref ref

Isolados por rebanho1 -0,028 0,16 -0,014 0,5 -0,03 0,12 -0,15 0,39 -0,03 0,13

Tamanho do rebanho2 0,008 0,01 0,008 0,003 0,001 0,76 0,005 0,05 0,01 0,001 Produção média3 -0,056 0,18 -0,05 0,22 -0,04 0,37 -0,038 0,37 -0,04 0,43 CCS média4 -0,001 0,44 0,00 0,76 0,00 0,66 -0,001 0,4 0,00 0,41 DEL média5 0,007 0,29 0,002 0,72 0,004 0,53 0,005 0,4 0,006 0,41 AMU6 (coluna) 0,075 0,02 0,248 0,001 2,28 0,001 0,27 0,04 2,2 0,002

Qualquer estimativa de odds ratio podem ser obtidas obtendo-se a função exponencial dos coeficientes associados com os respectivos fatores de interesse, visto que todos os efeitos de interação avaliados foram não significativos.

1Número de isolados avaliados no rebanho em questão (previsor contínuo)

2Tamanho do rebanho introduzido como número de animais, avaliado mensalmente (previsor contínuo)

3Produção media de leite do rebanho em litros por animal, definida como total de leite produzido no mês / número de animais (previsor contínuo) 4Contagem de células somáticas média do rebanho em células / mL, obtida pela média mensal de todas as CCS dos animais (previsor contínuo) 5Média dos dias em lactação dos animais do rebanho em dias, obtida pela média mensal de todos os DEL dos animais (previsor contínuo)

5.3.3 Perfil de resistência genotípico

De acordo com a metodologia proposta, 439 isolados foram submetidos ao sequenciamento de genoma para a pesquisa de genes de resistência. Genes associados à resistência aos beta-lactâmicos foram os mais comumente observados (Tabela 18), seguidos de genes associados à resistência às tetraciclinas, aminoglicosídeos e macrolídeos.

Tabela 18. Frequência absoluta (N) e relativa (%) da presença dos genes

codificadores de enzimas de resistência aos antimicrobianos em cepas de

Staphylococcus coagulase-negativa (ECN) isolados de leite de vacas

Canadenses.

Resistência associada Gene N %

Beta-lactâmicos blaZ 178 40,5 Beta-lactâmicos mecA 37 8,4 Cloranfenicol cat 1 0,2 Tetraciclina tetK 77 17,5 Tetraciclina tetL 68 15,5 Tetraciclina tetM 2 0,5 Trimetoprim dfrG 4 0,9 Trimetoprim dfrK 4 0,9 Macrolídeos ermA 25 5,7 Macrolídeos ermB 7 1,6 Macrolídeos ermC 27 6,2 Aminoglicosídeos aadE 36 8,2 Aminoglicosídeos aadD 3 0,7 Aminoglicosídeos str 43 9,8 Estreptogaminas vgbA 1 0,2 Estreptogaminas vatA 1 0,2

Genes de resistência às vancomicinas vanA (tipos A, B e C) e os genes de resistência às estreptogaminas (vatB), à linezolida (cfr), aos aminoglicosídeos (aphA) e ao trimethoprim (dfrA e dfrB) não foram detectados no presente estudo.

6 DISCUSSÃO

6.1 Salmonella enterica e Klebsiella pneumoniae

Antimicrobianos em medicina veterinária são utilizados para o tratamento de enfermidades e também como promotores de crescimento, diferindo de seu uso tradicional em medicina humana. Em bovinos leiteiros, são utilizados rotineiramente como tratamento de mastites clínicas e também como terapia de prevenção durante o período seco. Em frangos de corte, eles são comumente utilizados como aditivos alimentares, particularmente os ionóforos para a prevenção da coccidiose. Moléculas de antimicrobianos utilizadas como promotores de crescimento são diferentes de moléculas utilizadas em medicina humana, pelo menos o suficiente para evitar a emergência de resistência cruzada (Schwarz e Chaslus-Dancla, 2001). Existe um extenso debate na comunidade científica sobre se o uso de antimicrobianos em animais possui associação com o aumento da resistência antimicrobiana em patógenos humanos (Seiffert et al., 2013). Este estudo, demonstrou que os perfis fenotípicos e genotípicos foram bastante distintos de isolados de S enterica humanos e animais, fornecendo evidência limitada de que os mecanismos envolvidos podem ser distintos. Porém, devido ao tipo de amostragem, estes resultados devem ser interpretados com extrema cautela.

No presente estudo, foi determinado o perfil de resistência de S enterica isolada de humanos e aves domésticas, e de K. pneumoniae isolada de quartos mamários e fezes de bovinos leiteiros. Ainda, foram detectados pela PCR genes comumente associados com a resistência antimicrobiana nestes isolados. Diversos estudos no Brasil já relataram o perfil de resistência antimicrobiana em Salmonella spp. e Klebsiella spp. Alguns estudos utilizam erroneamente o termo “prevalência” da resistência antimicrobiana em uma ampla população, quando de fato sabe-se que estudos envolvendo a resistência antimicrobiana sofrem de viés de seleção, e os valores proporcionais encontrados poderiam apenas ser generalizados para comunidades restritas. Independentemente, apesar de alguns estudos serem similares (Fonseca et al., 2006), para nosso conhecimento, este estudo é o primeiro que descreveu o perfil de

resistência antimicrobiana e detectou possíveis genes associados aos respectivos em isolados de S. enterica oriundos tanto de aves como de humanos no Brasil.

Os aminoglicosídeos são comumente utilizados em hospitais, especialmente para o tratamento de septicemias. A disseminação de resistência à esta classe de fármacos é, portanto, preocupante (Jakobsen et al., 2008). No presente estudo, resistência aos aminoglicosídeos foi comumente observada em S. enterica isolada de humanos e carcaças de frangos, corroborando com estudos prévios (Medeiros et al., 2011; Rowlands et al., 2014). Grande parte de isolados humanos resistentes aos aminoglicosídeos foi também resistente a uma segunda ou terceira classe de antimicrobianos. Em contraste, quase metade dos isolados de S. enterica aviários resistentes aos aminoglicosídeos detectados no presente estudo foram resistentes somente à estreptomicina (10 de 21).

Resistência aos aminoglicosídeos foi geralmente seguida pela presença do gene aadA, especialmente em isolados humanos (66,7% de S. enterica de humanos contra 15,4% de S. enterica de aves) corroborando com estudos anteriores (Chen et al., 2005). Em contrapartida, os isolados de S. enterica de aves geralmente apresentaram o gene aphA2. Ambos os genes codificadores da aminoglycoside-3-adenyltransferase (aadA) e aminoglycosides phosphotransferases (aphA) promovem a inativação enzimática dos aminoglicosídeos (Schwarz e Chaslus-Dancla, 2001) agindo em componentes distintos da molécula. Do ponto de vista epidemiológico, apesar de ser interessante que diferentes mecanismos de resistência estejam presentes de acordo com a origem do isolado, estudos desenhados para estimar a prevalência destes determinantes em isolados de aves e humanos seriam necessários para a melhor compreensão do papel epidemiológico destes genes na resistência aos aminoglicosídeos.

Foi observada resistência à ciprofloxacina em 5,9% das amostras de S.

enterica. Um novo ponto de corte indicativo de resistência foi implementado pelo CLSI

(Humphries et al., 2012). A ciprofloxacina é um antimicrobiano de escolha para o tratamento de salmonelose humana (Bouchakour et al., 2010). As recomendações do CLSI resultaram em um aumento na sensibilidade do diagnóstico da resistência antimicrobiana frente às fluoroquinolonas. Porém, como em qualquer método

diagnóstico, o ganho de sensibilidade é acompanhado de uma perda de especificidade. Segundo o CLSI, o padrão de referência para o resultado do antibiograma utilizando-se a ciprofloxacina como princípio ativo, depende da origem do isolado. Isolados extra intestinais necessitam de um halo maior na prova do antibiograma para a ciprofloxacina para serem considerados sensíveis a este princípio ativo. Se todos os isolados do presente estudo fossem intestinais, todas as bactérias seriam consideradas sensíveis à ciprofloxacina in vitro. Conforme abordado na seção 4.4, o presente estudo possui isolados de ambos os tipos e optou-se por considerar todos os isolados como extra- intestinais para aumentar a sensibilidade de detecção de genes de resistência.

Resistência às fluoroquinolonas emerge de diversos mecanismos, incluindo a presença de determinantes plasmidiais como os genes qnrS e qnrB (Cattoir et al., 2007) que protegem a bactéria da atividade das quinolonas. Estes genes podem conferir um nível baixo de resistência às fluoroquinolonas, permitindo aos patógenos desenvolver mutações que confiram aos mesmos um alto nível de resistência à ciprofloxacina, mesmo na presença desta droga (Li, 2005). No presente estudo, um isolado clínico resistente às fluoroquinolonas possuía o gene qnrB. Isolados aviários possuíram o gene qnrS em cinco oportunidades. Em algumas regiões da Europa, estes genes ainda são incomuns (Cattoir

et al., 2007). No Brasil, relatos da presença dos genes qnrB e qnrS são escassos (Paiva et al., 2012). Para nosso conhecimento, este estudo relatou pela primeira vez a presença

do gene qnrB em S. enterica isoladas de humanos no Brasil.

Beta-lactâmicos são comumente utilizados para tratamento de infecções causadas por S. enterica no Brasil e no mundo. A resistência frente aos beta-lactâmicos foi observada em 16,5% dos isolados humanos e 2,7% dos isolados aviários. A baixa frequência de resistência aos beta-lactâmicos observada em isolados de aves contrasta com um recente estudo Brasileiro com isolados aviários onde 21,4% dos isolados foram considerados resistentes aos beta-lactâmicos (Fitch et al., 2015), apesar deste último utilizar a ampicilina ao invés da amoxicilina, como método de triagem. Para K.

pneumoniae, praticamente 100% dos isolados foram resistentes à amoxicilina,

corroborando com estudos similares (Osman et al., 2014). A resistência aos beta- lactâmicos em bactérias Gram-negativas é comumente associada com a presença de genes codificadores de ESBLs, como o blactx-m, e algumas variantes do blashv e blatem.

(Paterson et al., 2003). blactx-m tem se apresentado como uma grande ameaça à saúde pública, com numerosos relatos de sua presença mundialmente. No Brasil, o gene blactx- m foi detectado anteriormente em isolados de aves e de humanos (Fernandes et al., 2009). No presente estudo, este gene foi encontrado em dois isolados de S. enterica oriundos de carcaças de frangos, previamente positivos na triagem fenotípica realizada pela prova da DDDA. Este resultado é preocupante e enaltece a importância de programas de vigilância focados no monitoramento da resistência antimicrobiana. Em território nacional, S. enterica possui potencial de disseminação clonal de mais de 300 milhas (Fitch et al., 2015). A presença destes determinantes de resistência em animais de produção não deve ser menosprezada.

O uso clínico de tetraciclinas tem experimentado um significante declínio em diversos países devido à resistência antimicrobiana. Resistência às tetraciclinas em S.

enterica isolada de aves no Brasil varia de 6,2% a 100% das amostras (Ribeiro et al.,

2007). No presente estudo, dois (2,7%) isolados aviários foram resistentes à tetraciclina, contrastando com resultados prévios publicados nos quais a resistência às tetraciclinas foi muito elevada (Cardoso et al., 2006; Duarte et al., 2009). Ambos os isolados aviários possuíam o gene tetA, comumente associado à resistência às tetraciclinas em patógenos aviários (Chuanchuen e Padungtod, 2009). Para S. enterica de origem humana, 16,5% das bactérias foram resistentes à tetraciclina. Todos os cinco genes associados com resistência à esta classe de antimicrobianos foram encontrados, com tetC e tetA sendo os mais frequentemente observados. Este estudo demonstra a natureza multifatorial de mecanismos de resistência às tetraciclinas que as bactérias podem adquirir. Notavelmente, um isolado de S. enterica e 6 de K. pneumoniae carreavam mais de um gene tet. A vasta maioria das bactérias descritas na literatura porta apenas um tipo destes genes (Chopra e Roberts, 2001) apesar de ser possível a ocorrência de genes diferentes em múltiplos plasmídeos.

Nenhum isolado de S. enterica oriundo de aves foi resistente às sulfonamidas no presente estudo, concordando com estudos prévios onde a resistência à esta classe de antimicrobianos é incomum (Usda, 2014; Penha Filho et al., 2016). Em contraste, 16,5% das amostras de S. enterica isoladas de humanos foram resistentes às sulfonamidas. Como foi observado para tetraciclinas, genes diferentes associados com a

resistência às sulfonamidas foram detectados, incluindo os genes sul. A ocorrência destes genes em S. enterica isolada no Brasil já foi relatada anteriormente (Peirano et

al., 2006) e como oobservado no presente estudo, estes genes geralmente estão

presentes sozinhos, sendo o gene sul1 o mais comumente observado.

Para K. pneumoniae, 33,3% do isolados oriundos de IIM foram resistentes aos aminoglicosídeos enquanto 8,2% dos isolados oriundos de fezes mostraram o mesmo resultado. Ainda, isolados de IIM apresentaram 35,8% e 19,8% de resistência à tetraciclina e a combinação de sulfametoxazol / trimetoprim respectivamente, frente à 9,4% e 0% de isolados oriundos de fezes. Para o cloranfenicol, 16,1% dos isolados de IIM foram resistentes e nenhum isolado de fezes apresentou este resultado. O perfil de resistência de K. pneumoniae isolada de fezes e casos de IIM foi distinto para estas drogas, mesmo quando consideradas apenas propriedades que enviaram amostras de ambos os tipos. Ainda, 30,9% dos isolados de IIM foram multirresistentes contra 3,53% dos isolados de fezes. Amostras de K. pneumoniae isoladas de IIM são comumente relatadas como multirresistentes na literatura (Nam et al., 2010). Esperava-se inicialmente que as diferenças no perfil de resistência seriam sutis, devido ao fato de a

K. pneumoniae ser um patógeno de mastite do tipo ambiental (Hogan e Larry Smith,

2003) e terapias antimicrobianas em animais resultarem na eliminação de resíduos no ambiente que favoreceriam a seleção de genes de resistência para isolados de K.

pneumoniae ambientais. Amostras presentes no trato gastro-intestinal seriam também

influenciadas por tratamentos antimicrobianos. Uma possível hipótese é de que devido ao fato de existirem diferentes variantes de K. pneumoniae nas fezes do mesmo animal (Nobrega et al., 2013), a bactéria que é selecionada para cultivo e antibiograma oriunda das fezes pode ser de diferentes subtipos. Já amostras oriundas de IIM, além de necessitarem de eficientes mecanismos de proteção contra a defesa do hospedeiro, podem lidar em diversas circunstancias com o efeito residual de antimicrobianos no animal, fato que promove a seleção apenas de isolados resistentes que conseguem posteriormente se estabelecer e virem a ser amostrados via leite. K. pneumoniae oriundas de quadros de IIM em teoria são mais expostas aos antimicrobianos do que bactérias oriundas de fezes devido ao fato de terapias de secagem serem, em sua grande maioria, intramamárias.

Verificou-se no presente estudo que amostras de S. enterica isoladas de humanos apresentaram maior proporção de resistência ao cloranfenicol do que amostras oriundas de aves, onde não se detectou bactéria resistente. Este resultado reflete provavelmente a proibição do uso desta substância em medicina veterinária. O gene floR foi encontrado somente na presença de genes associados à resistência antimicrobiana para outras classes. Sabe-se que a presença de integrons é responsável por grande parte da disseminação da resistência ao cloranfenicol, que está em desuso também em medicina humana.

A ausência de resistência às carbapenemas em ambos os gêneros bacterianos reflete rígidas políticas de controle da utilização destes antimicrobianos. Resistência à estes princípios é hoje uma das maiores preocupações da comunidade científica. No presente estudo, não se encontrou este perfil.

As hipóteses a serem avaliadas para S. enterica e K. pneumoniae eram de que existiram associações entre a origem do isolado e o perfil de resistência. Era esperado que isolados de determinadas origens apresentassem uma maior proporção de resistência para diversas drogas, principalmente S. enterica oriundas de ambientes hospitalares onde antimicrobianos são utilizados com frequência. Conforme esperado, no presente estudo 19% dos isolados clínicos de S. enterica foram considerados multirresistentes e portadores de diversos genes de resistência contra nenhum isolado multirresistente de aves.

Genes de resistência em S. enterica e K. pneumoniae podem ser carreados por intermédio de integrons portadores de determinantes de resistência para diversas classes de antimicrobianos (Firoozeh et al., 2011; Hsu et al., 2013). Existe uma grande possibilidade de que alguns destes isolados possam ser portadores de genes de integrase que auxiliam na disseminação destes mecanismos de resistência. Para isolados resistentes aos aminoglicosídeos por exemplo, é possível que amostras de S.

enterica isolada de humanos possuam integrons contendo o gene aadA e outros

determinantes como o gene sul1 (Ribeiro et al., 2011), resultando em multirresistência para estas bactérias enquanto amostras de aves portem apenas genes aphA, resultando em um perfil de resistência simples.

No presente estudo, 11 isolados de S. enterica e 39 isolados de K. pneumoniae foram negativos para a detecção de um gene de resistência, mesmo apresentando fenótipo resistente (no caso de K. pneumoniae 39 isolados com resistência a, pelo menos, 2 drogas, visto a quase totalidade de resistência à amoxicilina). Até o presente momento, um número enorme de genes já foi estudado e associações destes com a resistência antimicrobiana foram detectadas. A pesquisa de todos os genes de resistência conhecidos por meio de PCRs tradicionais é extremamente onerosa. Consequentemente, métodos baseados no sequenciamento de genoma e de RNA estão rapidamente se tornando uma alternativa viável em estudos de resistência antimicrobiana, principalmente devido ao rápido declínio dos custos destas técnicas mundialmente. Uma aplicação particular do sequenciamento de genoma é na predição do perfil fenotípico de acordo com os resultados do sequenciamento (Gordon et al., 2014; Bradley et al., 2015). Ainda neste tópico, apesar de ser indicativo que a presença de alguns genes está associada ao perfil fenotípico observado (por exemplo, a presença do gene blactx-m e um isolado positivo na DDDA), outros diversos genes podem ser responsáveis pelo mesmo fenótipo e não foram alvo no presente estudo. Técnicas que envolvem o sequenciamento de RNA ou outros ensaios de expressão gênica poderiam ser utilizados nestes casos.

Bactérias possuem acesso a um ambiente poli microbial, onde um enorme

pool de genes de resistência pode ser encontrado. A pesquisa de genes de acordo com

o perfil fenotípico das amostras é um método que permite aumentar a sensibilidade da detecção genotípica e salvar importantes recursos. Os resultados deste estudo podem servir como guia de estudos de prevalência de genes de resistência, sugerindo genes alvo que são mais comumente observados de acordo com diferentes origens de S.

enterica e K. pneumoniae.

Uma limitação do presente estudo é o potencial viés de seleção. No caso de

S. enterica, os isolados foram uma amostra de conveniência obtidos de diferentes

localidades de 1998 a 2012. Apenas dois hospitais participaram do envio das amostras, apesar de outros hospitais realizarem, no presente momento, a estocagem de isolados para a inclusão no presente estudo. Para K. pneumoniae, amostras de leite foram enviadas por propriedades, e o critério de seleção e envio é desconhecido para metade dos rebanhos envolvidos. Qualquer discrepância entre os isolados de diferentes origens

poderia ser, por exemplo, devido a fatores específicos de manejo de propriedades, microrregiões, hospitais e mesmo ao tempo. Diferenças nas proporções de resistência observados para amoxicilina, tetraciclina, cloranfenicol, sulfonamidas e, consequentemente, isolados multirresistentes, devem ser interpretadas com cautela devido ao protocolo de seleção. Mesmo lidando com o possível efeito de cluster devido à propriedade / abatedouro / hospital nas nossas análises, é improvável que seria removido todo os vieses, caso estejam realmente presentes. A metodologia de seleção de amostras e análise de estudos de resistência antimicrobiana são processos complexos (Bjork et al., 2015) onde é virtualmente impossível a remoção de todos os vieses. Outra limitação deste tipo de estudo é que o protocolo de seleção varia bastante em diferentes pesquisas. Consequentemente, comparações com diferentes estudos podem ser enganosas e devem ser evitadas em algumas circunstâncias.

6.2 Staphylococcus coagulase-negativa

A utilização de antimicrobianos em medicina humana e veterinária é um fator de risco para a emergência e disseminação de genes de resistência. O grande desafio para quantificar ou estabelecer a magnitude desta associação se deve à dificuldade de obtenção de dados e amostras livres de viéses. No presente estudo, foi possível a obtenção e análise de valiosas informações armazenadas na Universidade de Calgary, permitindo estabelecer associações nunca antes estudadas em rebanhos bovinos leiteiros Canadenses. Os dados e grande número de amostras coletadas em 91 rebanhos leiteiros oferecem uma oportunidade única para estudar a distribuição de ECN e fatores

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