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3.3. MANEJO SANITÁRIO DOS ANIMAIS

3.3.1. Vacinação

Os agricultores entrevistados possuem o hábito de vacinar os animais. As vacinas utilizadas pelos agricultores/as são contra febre aftosa, raiva, brucelose e carbúnculo sintomático (conhecido como “mal de ano”).

As vacinas que os agricultores de Divino consideram mais relevantes para os rebanhos são contra raiva e carbúnculo sintomático, mesmo estas vacinas não sendo de caráter obrigatório no país. Foi observado que todos os agricultores vacinam os bovinos contra essas enfermidades, pelo menos uma vez ao ano, sendo que a maioria dos agricultores opta pela vacinação dos animais duas vezes ao ano, de forma a abranger toda a faixa etária susceptível, respeitando os protocolos preconizados para prevenção dessas enfermidades.

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A justificativa, segundo os agricultores, é a alta incidência de casos na região, sendo que já perderam animais com sintomas das doenças em questão, e/ou tiveram vizinhos, ou parentes, que também perderam.

Historicamente, segundo eles, é comum relatos de animais morrendo com sintomas dessas doenças, principalmente em propriedades onde os animais não são vacinados. Os casos ocorrem de forma recorrente. Abaixo, segue o relato de um agricultor, se referindo à raiva:

[...] tem que vacinar. Tem muitos casos da doença na região. Conheço um monte de gente que perdeu muita criação. Já presenciei muitos casos de vizinhos, que perderam animais. Está mais controlado agora, mas vira e mexe morre. [...] tem ataque de morcegos [...] geralmente, não espero vencer o prazo da vacina [...] já perdi uma bezerra e uma leitoa, com sintomas da doença. Já vi morrer cavalo também.

(agricultor X, 52 anos, 2014)

Os ataques de morcegos hematófagos, principal agente transmissor da raiva, são comuns na região. A Figura 1 um registra um caso de um animal com mordedura por morcego, feito durante uma visita à propriedade do agricultor X, autor do relato acima.

O diagnóstico dos animais com raiva ou “mal de ano”, relatados pelos agricultores, foram realizados a partir da observação dos sintomas clínicos apresentados pelos animais, e não foram confirmados por testes laboratoriais confiáveis, que comprovasse efetivamente a presença dos patógenos causadores das enfermidades. Entretanto, os sinais clínicos apresentados pelos animais, associados, no caso da raiva, aos ataques de morcegos (Figura 1) e o elevado relato de casos das doenças na região, geralmente associados a animais que não haviam sido vacinados, são evidências suficientes, segundo os agricultores, que justificam sua preocupação e o rigor adotado na vacinação dos animais.

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Figura 1- Bezerro com ferimento decorrente de mordedura de morcego em propriedade no município de Divino

Colaborando com tal afirmativa, os agricultores afirmam que não ocorreram mais perdas de animais em suas propriedades após a adoção da prática de imunização dos animais através do uso de vacinas.

Em relação à vacinação dos animais contra brucelose e febre aftosa, foi observado que os agricultores vacinam os animais principalmente pelo fato de ser uma exigência legal no país, ou seja, vacinam porque é obrigatório, sendo que alguns também consideram que, se existe a campanha, é porque ela tem a sua importância, o seu fundamento, e por esse motivo aderem a ela. Em relação a vacina contra febre aftosa, todavia, a grande maioria dos agricultores a considera desnecessária, uma vez que não há relatos de casos da doença na região há muitos anos. Outro fato que desagrada os agricultores em relação ao uso dessa vacina é a reação local que ela provocada nos animais, que costumam apresentar abscesso no local da inoculação do antígeno.

Uma estratégia praticada pelos agricultores que consideram importante a vacinação dos animais contra febre aftosa, mas que não possuem o Cartão de Identificação do Produtor Rural, ou cujos animais não se encontram nele registrados e, portanto, não conseguem comprar a vacina, consiste em adquirir as doses excedentes dos frascos de vacina compradas por outros agricultores. Como os frascos de vacina geralmente contém doses para a imunização de 10 ou 50 animais, ocorre uma sobra de doses de vacina dos agricultores que participam oficialmente

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das campanhas estaduais para imunização dos rebanhos. É importante esclarecer que o Cartão de Identificação do Produtor Rural é emitido pelo Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), que serve para comprovar as vacinações contra Febre Aftosa e Brucelose e também, para a emissão da Guia de Trânsito Animal - GTA.

Outro aspecto levantado por agricultores do município de Araponga, que questionam a necessidade de vacinação frequente dos animais contra febre aftosa, é o fato de haver tanto rigor no controle dessa enfermidade, pois além de não haver relatos de ocorrência de casos na região há vários anos, essa enfermidade possui pouca relevância como zoonose, enquanto que para outras enfermidades, como a brucelose e tuberculose, não se vê uma campanha tão forte. Na opinião deles, essas enfermidades, por constituirem zoonoses importantes, e estarem presentes nos rebanhos brasileiros, deveriam ser alvo de campanhas mais efetivas para controle e erradicação.

Em relação à vacinação contra brucelose, os agricultores não apresentam nenhuma objeção em fazê-la e reconhecem a importância da estratégia de imunização dos animais. Porém, justificam a falta de rigor no comprimento da exigência devido principalmente ao reduzido número de bezerras em idade adequada na propriedade para receber a vacina, que é entre 3 e 8 meses de idade, e em relação a Araponga, também em função da carência de vacinadores habilitados, segundo os agricultores, para realizarem a vacinação no município.

Devido ao número reduzido de animais existentes na propriedade, e/ou o parto das vacas ocorrerem em períodos distintos do ano - o que é estratégico para o agricultor, pois é uma forma de não faltar leite na propriedade - o número de bezerras de 3 a 8 meses na propriedade é sempre pequeno. Desta forma, existe uma resistência dos vacinadores em se deslocar até as propriedades, pois o número de animais para vacinar é baixo, geralmente 2 ou 3 animais, não compensando financeiramente, na opinião deles. Além disso, a imunização de menor quantidade de animais aumenta o custo da vacinação por animal para os produtores. Dessa forma, alguns animais acabam passando da idade de vacinar.

Uma estratégia adotada por uma agricultora do município de Araponga para vacinar a sua única bezerra foi percorrer as propriedades vizinhas, buscando por bezerras em idade apropriada para receber a vacina. Desta forma, ela conseguiu juntar um número maior de animais, o que incentivou a vinda do vacinador, e

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resultou também em um valor menor pago por animal vacinado. Porém, segundo ela, é uma alternativa difícil e cansativa, pois é preciso se deslocar até as outras propriedades para conversar com os agricultores, às vezes mais de uma vez, pois nem sempre os encontra no momento da visita. Isso demanda disponibilidade de tempo, o que nem sempre é possível devido às atribuições diárias na propriedade.

3.3.2. Relato das principais enfermidades e forma de tratamento dos animais nas propriedades

De uma maneira geral, quando os animais adoecem nas propriedades, os agricultores buscam por alternativas de tratamento, que variam em função do tipo de enfermidade apresentada e da experiência do agricultor em relação às práticas terapêuticas dos animais.

Quando questionados sobre o histórico de adoecimento dos animais nas propriedades, os agricultores reafirmaram que dentre as principais causas de adoecimento e morte dos animais, no passado, estavam a raiva e o mal de ano. Segundo eles, não havia o hábito de vacinar os animais contra essas enfermidades, em conformidade com o protocolo sugerido para regiões endêmicas para as doenças. Hoje, devido ao maior rigor adotado na vacinação dos animais para prevenção dessas enfermidades, praticamente não há mais relatos de casos de perdas de animais nas propriedades dos agricultores entrevistados, em decorrência dessas patologias.

A ocorrência de diarreia em bezerros foi apontada como um dos principais problemas sanitários existentes nas propriedades, sendo também a principal causa de perda de animais por óbito. O problema é mais recorrente no período das chuvas, e em alguns casos, o quadro clínico dos bezerros com diarreia foi agravado devido ao fato deles também apresentarem pneumonia, e o desfecho foi o óbito dos animais.

O medicamento utilizado pelos agricultores de Divino para tratar os animais foi a Terramicina®, um produto que possui como princípio ativo a oxitetraciclina. De acordo com os agricultores, esse é o principal antibiótico utilizado nas propriedades. Depois de perder dois bezerros, um agricultor passou a utilizar a Terramicina de

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forma “preventiva”, aplicando três doses nos bezerros, sendo a primeira no dia em que nascem, e as seguintes com intervalo de 10 dias da última aplicação.

Em relação à mastite, os agricultores relataram que não é muito comum a ocorrência de casos clínicos nas propriedades. Mas quando ocorre, o tratamento consiste no uso de antibióticos de administração intramamário, que é aplicado no quarto da glândula mamária acometido. Além disso, fazem a ordenha três vezes ao dia e deixam o bezerro solto com a vaca para mamar à vontade, que é uma estratégia para evitar o acúmulo de leite residual no úbere - um rico meio de cultura- dificultando assim a propagação microbiana.

A presença de ectoparasitas nos bovinos, como carrapatos e bernes, é outro problema existente nas propriedades. O berne é a fase larval da mosca Dermatobia hominis, que uma vez presente nos animais, causa a chamada miíase furuncular ou dermatobiose. Os agricultores relataram que o controle, na maioria das vezes, é feito através do uso de produtos químicos, ectoparasiticidas, dentre os quais foram citados principalmente o Dectomax® (princípio ativo é o Doramectin, produto derivado da classe das avermectinas), Colosso® e Aspersin® (princípios ativos Cipermetrina e Clorpirifós, dos grupos químicos Piretróide e Fosforado) e Triatox® (princípio ativo Amitraz, do grupo químico Amidina). A aplicação desses produtos é realizada pelos agricultores de acordo com a forma de uso recomendada pelo fabricante, podendo ser injetável, ou por meio de banhos de aspersão ou aplicação dorsal nos animais, no caso das preparações pour-on. O intervalo de aplicação relatado variou de um a três meses em média, podendo ser maior ou menor, em função do grau de infestação dos animais.

Os agricultores relataram que evitam ao máximo a aplicação desses produtos nas vacas em lactação, pois dizem temer o risco potencial que os resíduos no leite e nos seus derivados, como queijo, podem representar para a saúde da família e de outros consumidores. Porém, se a infestação nos animais estiver elevada, eles relatam que não possuem outra opção, e acabam usando os produtos químicos, pois desconhecem outras estratégias para combate dos ectoparasitas. Os ectoparasiticidas geralmente são receitados pelos vendedores das casas agropecuárias.

Os produtos citados pelos agricultores possuem licença vigente para uso no Brasil (BRASIL, 2013). O problema é que existe um período de carência

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estabelecido para consumo do leite e da carne, após o uso dos ectoparasiticidas, que na maioria das vezes não é respeitado, seja por desconhecimento por parte de alguns agricultores, ou simplesmente pelo fato de não haver fiscalização e/ou políticas para controle de resíduos no leite.

De acordo com agricultores que vendem o leite para laticínios da região, o controle de qualidade em relação à presença de resíduos se dá através da verificação da presença de resíduos de antibióticos, que é feita através da coleta de amostras periódicas do leite produzido. A preocupação da indústria em relação à presença de resíduos de antibióticos no leite se dá principalmente em função das grandes perdas econômicas geradas, visto que os antibióticos podem inibir o desenvolvimento das culturas lácticas usadas na fabricação de diversos produtos, como o iogurte.

Outros problemas relacionados à saúde dos animais relatado pelos agricultores foram alguns casos clínicos pontuais, como distúrbio digestivo provocado por mudanças bruscas no manejo nutricional dos animais, principalmente no período da seca; parto distócico; hiperplasia interdigital (Gabarro) e claudicação em vacas no período periparto.

3.3.3. Tratamentos alternativos

De uma maneira geral, quando os animais adoecem nas propriedades, os agricultores buscam por alternativas de tratamento, que variam em função do tipo de enfermidade apresentada e da experiência do agricultor em relação às práticas terapêuticas dos animais.

No município de Divino, quando há algum animal doente na propriedade, o principal procedimento adotado pelos agricultores é se dirigirem aos estabelecimentos agropecuários da cidade, e no caso das enfermidades mais conhecidas, como diarreia nos bezerros e mastite, efetuam a compra dos medicamentos que utilizam rotineiramente para tratar os animais. Todavia, três agricultores relataram o uso de tratamentos alternativos em determinadas situações para tratar os animais.

Um dos casos relatados foi quanto ao uso de tratamento alternativo para cura da mastite, em que o agricultor relatou que, após o insucesso do tratamento de uma