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2.6 Refinamento do modelo

2.6.2 Valida¸c˜ ao e deposi¸c˜ ao da estrutura

O refinamento resulta num modelo aprimorado e em novas fases. Em- bora haja alternativas, no protocolo mais amplamente utilizado, dois mapas s˜ao calculados a partir das novas fases, contra os quais o novo modelo ser´a confrontado para localizar erros e identificar novas caracter´ısticas estruturais: • 2mFobs− DFcalc: este mapa resulta de uma s´erie de Fourier cujos coe- ficientes s˜ao 2mFobs− DFcalc e as fases, as resultantes do refinamento. Os pesos m e D (Murshudov et al., 1997; CCP4, 1994; Winn et al.,

1997), definidos no Apˆendice A, evitam v´ıcios na densidade decorren- tes de um modelo imperfeito, usado no c´alculo de Fcalc. Este mapa ´e usado como guia para interpreta¸c˜ao e reconstru¸c˜ao do modelo;

• mFobs − DFcalc: este mapa, composto a partir dos coeficientes mFobs− DFcalc, ´e chamado “mapa de diferen¸ca”, entretanto, tanto este quanto o primeiro s˜ao mapas de diferen¸ca de Fourier. Os pesos m e D s˜ao os mesmos mencionados acima. O mapa de diferen¸ca ´e um instrumento importante pois indica as regi˜oes onde novos ´atomos s˜ao

necess´arios (picos positivos) e onde ´atomos foram introduzidos incorre- tamente no modelo (picos negativos). Os picos positivos s˜ao, tamb´em, o instrumento a partir do qual mol´eculas de ´agua s˜ao adicionadas ao modelo.

Se tudo correr bem, o processo de refinamento deve abaixar os indicadores Rf actor e Rf ree, levando-os at´e valores estacion´arios aceit´aveis, uma indica¸c˜ao de que mais ciclos de refinamento levam a mudan¸cas negligenci´aveis nos parˆametros. Ao mesmo tempo, os mapas de diferen¸ca tornam-se uniformes, sem picos de densidade significativos (positivos ou negativos). ´E o momento em que o refinamento ´e interrompido, j´a que toda informa¸c˜ao dispon´ıvel foi utilizada para aprimoramento do modelo.

A etapa seguinte ´e o que se chama valida¸c˜ao do modelo, que ´e a aplica¸c˜ao de crit´erios de qualidade ao modelo, verificando sua acuidade e precis˜ao. Em cristalografia de prote´ınas, acuidade diz respeito a h|∆Φ|i, a m´edia do m´odulo dos erros das fases, quantidade diretamente proporcional ao Rf ree. A precis˜ao do modelo est´a relacionada ao n´ıvel de detalhe do modelo, cuja descri¸c˜ao ´e limitada pela quantidade e qualidade dos dados (conte´udo de informa¸c˜ao). A valida¸c˜ao ´e uma etapa delicada onde v´arios aspectos s˜ao considerados. Excelentes compˆendios a respeito podem ser encontrados, por exemplo, em Kleywegt, 2000 e EU 3-D Validation Network, 1998.

Enquanto Rf actor e Rf ree s˜ao estat´ısticas globais que avaliam o modelo contra os dados experimentais, uma s´erie de crit´erios s˜ao usados para avaliar localmente a geometria e estereoqu´ımica do modelo, atrav´es da compara¸c˜ao com valores “ideais” depositados em bancos de dados (distˆancias e ˆangulos de liga¸c˜ao) de pequenas mol´eculas. Entre os crit´erios, um dos mais utili- zados ´e o plot de Ramachandran (Kleywegt & Jones, 1996), que mostra a distribui¸c˜ao dos ˆangulos torsionais ϕ e ψ da cadeia principal, constituindo um excelente indicador local de qualidade. Res´ıduos com combina¸c˜oes n˜ao usuais de valores (ϕ, ψ) provavelmente apresentam problemas e devem ser

2.6 Refinamento do modelo 58 re-examinados.

Uma vez que a qualidade da estrutura seja satisfat´oria, pode-se utiliz´a- la para an´alise biol´ogica, que ´e o fim ´ultimo que justifica o trabalho feito. Geralmente, a estrutura resolvida juntamente com os dados coletados ´e dis- ponibilizada para a comunidade cient´ıfica atrav´es da deposi¸c˜ao num banco de dados, usualmente o Protein Data Bank (PDB,http://www.rcsb.org/pdb). O processo de deposi¸c˜ao envolve v´arios passos e n˜ao ser´a descrito aqui.

Cap´ıtulo 3

β-manosidase: estudos

cristalogr´aficos

Os estudos cristalogr´aficos da β-manosidase foram iniciados em Jan/1998. N˜ao havia um modelo dispon´ıvel no PDB que pudesse ser usado com sucesso para Substitui¸c˜ao Molecular, de forma que m´etodos baseados em ´atomos pesados foram adotados.

Durante os anos de 1999 e 2000, trinta conjuntos de dados foram coletados na linha CPR do LNLS, entre nativos e derivados de ´atomos pesados. Uma segunda etapa do doutorado iniciou-se com o est´agio realizado no primeiro semestre de 2001, no York Structural Biology Laboratory (YSBL), em York, Inglaterra, quando todos os dados dispon´ıveis foram novamente analisados junto a pesquisadores do YSBL reconhecidos na ´area.

3.1

Purifica¸c˜ao e seq¨uenciamento

A β-manosidase utilizada foi purificada a partir de um filtrado da cultura do fungo Trichoderma reesei. Durante o desenvolvimento do projeto, o tra- balho de purifica¸c˜ao foi feito pelo grupo da Divis˜ao de Biof´ısica Molecular

3.1 Purifica¸c˜ao e seq¨uenciamento 60 e Radia¸c˜ao do Instituto de F´ısica Nuclear Petersburg, em S˜ao Petersburgo, R´ussia, cujo principal colaborador foi o pesquisador Alexander M. Golubev. A seq¨uˆencia da β-manosidase n˜ao era conhecida no in´ıcio do projeto, o que representava um problema, j´a que ela seria necess´aria n˜ao s´o na etapa de interpreta¸c˜ao dos mapas de densidade eletrˆonica mas em outros procedimen- tos, como a determina¸c˜ao do conte´udo da unidade ass´ım´etrica e modifica¸c˜ao de densidade eletrˆonica. O problema n˜ao foi completamente resolvido por- que apenas parte da prote´ına foi seq¨uenciada, como segue. Entretanto, essa seq¨uˆencia parcial mostrou-se ´util para alguns procedimentos (Cap´ıtulo 4).

O seq¨uenciamento parcial da prote´ına foi feito no laborat´orio do Prof. Dr. H. F. Al El-Dorry, no IQ/Bioqu´ımica - USP/ S˜ao Paulo, pelo seu aluno Eric D. Alessandro Bonaccorsi. O Dr. J¨org Kobarg, do LNLS, teve im- portante participa¸c˜ao nas discuss˜oes sobre as estrat´egias de seq¨uenciamento dispon´ıveis1.

Para a clonagem do gene da β-manosidase de Trichoderma reesei, inicial- mente o caminho cl´assico foi utilizado, onde seq¨uˆencias de pept´ıdios obtidos por clivagem com proteases seriam utilizadas para o desenho de oligonu- cleot´ıdeos degenerados, a serem usados em PCR (polymerase chain reaction) para amplificar fragmentos de DNA genˆomico ou de cDNA espec´ıficos para a β-manosidase. Bibliotecas genˆomicas de cDNA de Trichoderma reesei foram disponibilizados pelo Prof. El Dorry e utilizadas como DNA de molde.

Esta primeria tentativa foi feita como segue. A prote´ına foi purificada atrav´es de SDS-gel-eletroforese e transferida para uma membrana de PVDF usando o m´etodo de Western blotting, corada e a banda correspondente `

a β-manosidase (∼ 100 kDa) foi recortada e enviada `a University of Bri- tish Columbia, Biotechnology Laboratory (NAPS, www. biotech. ubc. ca/

naps/ napshome. htm), Vancouver,B.C./Canada para obten¸c˜ao de fragmen-

1 A quem agrade¸co, tamb´em, pela colabora¸ao na descri¸ao da metodologia utilizada

tos e sequˆencias de pept´ıdeos por degrada¸c˜ao de Edman. Os 12 pept´ıdeos abaixo foram seq¨uenciados2:

3.1 Purifica¸c˜ao e seq¨uenciamento 62

1 S T G K A S I H D L A L Q K X T V T N E Y

2 S(H/Q/T/L) A S? M(F) G(T/S) V I(G) I T A(F) G(A) S G(Y/V)

3 S Y(R/D/V) E K(F/R) A K A A I R Q H A G A

4 A(F/I/M) P V G A D A V L G(W) I L N W? N? E

5 G(F/Y) Q F(P) V(N) L(N) F(Y) A(G) P(N) L(F) Q(G) S L(A / V) P(S) Q? V

6 S A V M S V I Y G T X N G G

7 A N E L Y S R N T H D(I/G) D A S? X Q

8 S Q(E/L) A(V) X G(R/L) D D V M F X I R L F(D)

9 K? X N V(P) Y V(A) L(E) R(I) R(T) Y(F/) F(E/N) N(V) L(R) F(R) I(G)

10 K? N P E L Y X L N T D G(I/L/Q/E/A) D I G F R K.

11 K? X V X N E Y(I) G

12 K? P I L V X Q R R V G F R T I(T) L F

Nem todas essas seq¨uˆencias acima s˜ao ´uteis para o desenho de oligo- nucleot´ıdeos (as regi˜oes mais ´uteis est˜ao em negrito). Uma s´erie de oli- gonucleot´ıdeos foram desenhados, a maioria deles baseada numa seq¨uˆencia pept´ıdica derivada do N-terminal da β-manosidase (pept´ıdio 1 acima). Os oligos foram utilizados para amplificar o gene da β-manosidase usando bi- bliotecas genˆomicas de T. reesei como DNA de molde. V´arios produtos de DNA foram amplificados, clonados e seq¨uenciados. A id´eia era obter uma seq¨uˆencia com alta similaridade com as seq¨uˆencias j´a conhecidas de β-manosidase de outras esp´ecies. O DNA do respectivo clone seria, ent˜ao, utilizado para procurar um clone de cDNA da β-manosidase num banco de cDNA de T. reesei. O novo clone seria seq¨uenciado por inteiro, gerando toda informa¸c˜ao seq¨uencial da enzima.

Na abordagem baseada em PCR, tanto uma biblioteca de T. reesei quanto uma biblioteca de controle de Aspergillus niger foram usadas. Embora alguns produtos de PCR tenham sido obtidos com peso molecular compar´avel em ambas as rea¸c˜oes, o seq¨uenciamento de DNA do produto vindo de T. reesei mostrou seq¨uˆencias sem nenhuma rela¸c˜ao com as seq¨uˆencias de β-manosidase descritas nos bancos de dados. Portanto, com esta abordagem n˜ao se obteve

sucesso, o que poderia estar baseado no fato de que as seq¨uˆencias pept´ıdicas obtidas eram de baixa qualidade. Al´em disso, devido `a degenera¸c˜ao do c´odigo gen´etico, era muito dif´ıcil predizer exatamente a seq¨uˆencia de DNA corres- pondente, o que resultou num grau de incerteza nos oligonucleot´ıdeos predi- tos, mais um fator que limitou esta abordagem.

Em conseq¨uˆencia, uma nova estrat´egia de clonagem foi adotada, desta vez baseada na compara¸c˜ao entre as seq¨uˆencias do gene de β-manosidase de dois fungos estreitamente relacionados ao T. reesei : Aspergillus niger e Aspergil- lus aculeatus. A compara¸c˜ao das seq¨uˆencias entre os genes de β-manosidase nas duas esp´ecies de Aspergillus indicou v´arias regi˜oes que eram altamente conservadas entre elas, as quais seriam localizadas em regi˜oes afastadas por 1500 bp. A alta similaridade e conserva¸c˜ao destas regi˜oes indicava que as mesmas deveriam tamb´em ser conservadas no gene de β-manosidase de T. reesei .

Subseq¨uentemente, novos oligonucleot´ıdeos correspondentes a estas regi˜oes foram desenhados e usados em rea¸c˜oes de PCR. Novamente, as bibli- otecas de T. reesei foram usadas como DNA de molde e, como controle, as bibliotecas de A. niger . Um produto de 1500 bp pˆode ser obtido de ambas as rea¸c˜oes, o que indicou que a nova estrat´egia teve sucesso.

O produto de PCR amplificado foi radioativamente marcado e usado num screen de hibridiza¸c˜ao de placas de fagos contendo fragmentos de DNA genˆomico de T. reesei. O screening resultou na identifica¸c˜ao de v´arios clones reagentes. Os DNAs de fagos recombinantes foram isolados e digeridos com enzimas de restri¸c˜ao apropriadas. Dois insertos genˆomicos de ∼ 3000 e ∼ 4500 bp foram identificados, sub-clonados e submetidos a seq¨uenciamento de DNA.

O seq¨uenciamento revelou v´arios “contigs” que geraram mais de 70% da seq¨uˆencia do gene codificador de β-manosidase. Buscas em bancos de dados e alinhamentos comparativos de todos os “contigs” obtidos com seq¨uˆencias

3.2 Cristaliza¸c˜ao da β-manosidase 64

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