• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 3. VALORES HUMANOS

3.1. Valores Instrumentais e Terminais de Rokeach

Na Psicologia Social os valores humanos têm sido amplamente explorados, possivelmente em razão do papel importante que exercem no processo seletivo das ações humanas (Rokeach, 1973). Foi Rokeach, com sua obra The nature of human values, o responsável por destacar a centralidade dos valores e fornecer arcabouço teórico para os estudos deste construto, sendo considerado o pai da temática na Psicologia Social e referência obrigatória quando se trata de valores humanos (Medeiros, 2011).

Na década de 1960, este autor foi o primeiro a proceder uma análise sistemática dos valores, passível de medição empírica, por meio do Rokeach Value Survey (Ros, 2006), constituído por 18 valores instrumentais e 18 terminais, distribuídos em listas distintas, instrumento que fora adaptado para diversos contextos (Wang, Rao, & D'Auria, 1994), incluindo o Brasil na década de 1980 (Günther, 1981). O modelo teórico deste autor parte de cinco pressupostos básicos: (1) o número de valores que um indivíduo possui é relativamente pequeno; (2) independentemente da cultura na qual estejam inseridos, os indivíduos possuem os mesmos valores, sendo esses diferenciados apenas pela forma de adesão dos indivíduos aos mesmos e ao grau de importância atribuído a cada um deles; (3) os valores se encontram organizados em sistemas de valores; (4) a explicação dos valores pode ser determinada pela cultura, pela sociedade e por suas instituições, além da própria personalidade; e (5) as consequências dos valores humanos

76

se dão em fenômenos que podem vir a ser estudados e compreendidos pelos cientistas sociais.

Segundo Rokeach (1973), os valores são conceituados como “uma crença duradoura de que um modo de conduta específico ou estado final de existência é pessoal ou socialmente preferível em oposição a outro modo de conduta ou estado final de existência” (p. 5). Neste sentido, compreendem-se valores como crenças prescritivas – proscritivas que permitem aos indivíduos julgar objetos ou ações como desejáveis ou indesejáveis, recomendáveis ou não (Medeiros, 2011). Ele indica que quando ocorre a internalização de um dado valor, ele se torna, consciente ou inconscientemente, um padrão ou um critério que serve como guia das ações humanas (Rokeach, 1981).

Rokeach (1973, 1979, 1981) apresenta uma diferenciação do que são valores e atitudes. Segundo o autor, os valores são crenças transituacionais pertencentes a metas desejáveis, classificados pela relevância atribuída pelos indivíduos, que guiam as atitudes e os comportamentos, diferentemente das atitudes, que são crenças específicas sobre um determinado objeto ou situação. No entanto, um dos aspectos que desperta o interesse do autor e de certo foi uma de suas grandes contribuições, diz respeito a técnica de autoconfrontação, elaborada a partir da sua concepção de que os indivíduos comumente não tem consciência dos valores que orientam sua conduta, fazendo com que a autoconfrontação seja uma maneira de ajudá-los a se comportar de acordo com os valores considerados relevantes (Ros, 2006).

Neste modelo de valores, são identificados dois tipos principais: instrumentais e terminais. Os primeiros são definidos como meios para alcançar o desejável (por exemplo, ambicioso, honesto, responsável) e que podem ser subdivididos em valores morais (sua transgressão provoca culpa, com foco interpessoal) e de competência (sua transgressão provoca vergonha, com foco intrapessoal). Já os valores terminais (o próprio

77

desejável), representam estados finais de existência (por exemplo, igualdade, felicidade, etc.) que podem ser divididos em pessoais - centrados na própria pessoa, foco intrapessoal – e em sociais - centrados na sociedade, foco interpessoal. Na Tabela 2 é apresentado um esquema descritivo destes valores.

Tabela 2. Tipos de valores instrumentais e terminais propostos por Rokeach (1973)

TIPOS DE VALORES Terminais

Estados finais de existência

Instrumentais

Modos de comportamento

Pessoais

Centrados na própria pessoa, foco intrapessoal. Exemplos: salvação,

harmonia interior.

De competência

Sua transgressão provoca vergonha, foco intrapessoal. Exemplos: lógico,

inteligente.

Sociais

Centrados na sociedade, foco interpessoal. Exemplos: um mundo de

paz, amizade verdadeira.

Morais

Sua transgressão provoca culpa, foco interpessoal. Exemplos: honesto,

responsável.

De acordo com Rokeach (1973), a função dos valores é servir de modelo para orientação do comportamento do indivíduo em situações e condições diversas. Desta maneira, os valores são empregados na resolução de conflitos e tomadas de decisões. Um aspecto relevante deste modelo é a menção realizada sobre as funções dos valores, dividida pelo autor em cinco:

Ego-defensiva: os sentimentos ou as ações pouco aceitos podem se modificar de maneira que socialmente representem conceitos culturalmente justificáveis.

Conhecimento ou autorrealização: alguns dos valores provocam a busca de significado e compreensão, indicando conhecimentos e, por conseguinte, autorrealização.

Critérios de orientação: diante de problemas, tarefas, atitudes e comportamentos que em outra situação seria pessoal ou socialmente condenado moralmente, e necessário à manutenção da autoestima.

Motivacional: os valores são guias das ações humanas no dia-a-dia e expressam as necessidades humanas básicas.

78

Adaptativa: o conteúdo de alguns valores acentua a modos de conduta ou estados finais que são de orientação adaptativa ou orientados para a utilidade.

Não obstante, apesar de inevitavelmente se reconhecer as contribuições de Milton Rokeach para os estudos de valores humanos, são identificadas algumas limitações. Por exemplo, a medida empregada ser de natureza ipsativa (sugere uma dependência entre as pontuações de um mesmo indivíduo), e a indefinição na sua estrutura dos valores e a restrição de amostras dos seus estudos, realizados principalmente com estudantes universitários estadunidenses. Estes são alguns dos aspectos motivadores para o desenvolvimento de outros modelos teóricos acerca de valores, tal como o de Schwartz que será discutido a seguir.

Documentos relacionados