• Nenhum resultado encontrado

VALUE-BASED HEALTHCARE: UM PANORAMA DA APLICAÇÃO NO MUNDO E NO BRASIL

No documento Lucas de Souza Silva (páginas 31-39)

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 VALUE-BASED HEALTHCARE: UM PANORAMA DA APLICAÇÃO NO MUNDO E NO BRASIL

Os cuidados de saúde baseados no valor centram-se na melhoria dos resultados de saúde do paciente, reduzindo simultaneamente o custo global dos cuidados de saúde (PORTER; TEISBERG, 2006). O valor de VBHC depende do melhor resultado para o paciente após o tratamento de uma determinada doença. Ao focar nos resultados, o objetivo é redirecionado para o tratamento da condição médica que determina as necessidades médicas requeridas naquela situação (JOHANSEN; SAUNDERS, 2017).

Em seu trabalho Redefining Health Care (2006), Porter e Teisberg, mencionam que o ponto de partida para desenvolver uma estratégia em qualquer campo é definir o negócio ou negócios relevantes em que a organização compete. Na prestação de serviços de saúde não é diferente. Os prestadores de serviços de saúde não se veem como empresas, mas eles estão no negócio de prestação de serviços a pacientes. Deste modo, os autores salientam que a pergunta "em que negócio estamos?" é importante porque orienta o raciocínio de uma organização em relação a quem é o seu cliente, que necessidades a organização está tentando atender e como deveria se organizar. Implícita em toda definição de negócio está a visão de como o valor é criado. Alinhar a visão de valor de uma organização com o valor real é uma pré-condição para em desempenho excelente. O Quadro 1, adaptado de Porter e Teisberg (2006), traz importantes imperativos estratégicos e organizacionais na abordagem de serviços de prestação de saúde baseados em valor.

Quadro 1 - Princípios de Value-based healthcare 1. Redefinir o negócio em torno de condições de saúde 2. Escolher a extensão e os tipos de serviços prestados 3. Organizar-se em torno de unidades de prática medicamente integradas

4. Criar uma estratégia distinta em cada unidade de prática

5. Mensurar resultados, experiência, métodos e atributos de pacientes por unidade de prática

6. Mudar para fatura consolidada e novas abordagens de cálculo de preço

7. Distinguir serviços no mercado em termos de excelência, singularidade e resultados

8. Crescer localmente e regionalmente nas áreas de maior competência

Fonte: adaptado de Porter e Teisberg (2006).

Os benefícios de um sistema de saúde baseado em valor se estendem a pacientes, provedores, seguradoras, fornecedores e sociedade como um todo, como mostrados na Figura 1 abaixo, adaptada de Catalyst (2018), e detalhado na sequência.

Figura 1 - Benefícios do sistema de saúde baseado em valor.

Fonte: adaptado de Catalyst (2018).

• Pacientes gastam menos para obter melhores resultados: gerenciar uma doença crônica ou condição como câncer, diabetes, hipertensão arterial, doença pulmonar obstrutiva crônica ou obesidade pode ser caro e demorado para os pacientes. Os modelos de cuidados baseados em valor se concentram em ajudar os pacientes a se recuperarem mais

rapidamente de doenças e ferimentos e evitar doenças crônicas. Como resultado, os pacientes enfrentam menos consultas médicas, exames médicos e procedimentos, e gastam menos dinheiro com medicamentos prescritos à medida que a saúde a curto e a longo prazo melhoram. • Provedores alcançam eficiência e melhores taxas de

satisfação de pacientes: embora os provedores precisem passar mais tempo em novos serviços para pacientes baseados em prevenção, eles gastarão menos tempo com o gerenciamento de doenças crônicas. As medidas de qualidade e engajamento do paciente aumentam quando o foco está no valor, em vez de no volume. Além disso, os provedores não são colocados sob o risco financeiro que vem com os sistemas de pagamento capitalizados. Mesmo provedores com fins lucrativos, que podem gerar maior valor por episódio de cuidado, devem ser recompensados sob um modelo de cuidado baseado em valor.

• Seguradoras controlam custos e reduzem riscos: o risco é reduzido ao expandir-se através de uma população maior de pacientes. Uma população mais saudável e com menos reclamações se traduz em menor resgate de prêmios e investimentos dos pagadores. O pagamento com base no valor também permite que os contribuintes aumentem a eficiência agrupando pagamentos que cobrem o ciclo completo de atendimento do paciente, ou para condições crônicas, cobrindo períodos de um ano ou mais.

• Fornecedores alinham preços com os resultados de pacientes: os fornecedores se beneficiam por serem capazes de alinhar seus produtos e serviços com resultados positivos para o paciente e custo reduzido. • Sociedade melhora a saúde geral enquanto diminui os

gastos com sistema de saúde: menos dinheiro é gasto ajudando as pessoas a gerenciar doenças crônicas e internações e emergências médicas caras. Em um país como os Estados Unidos, onde os gastos com saúde respondem por quase 18% do Produto Interno Bruto (PIB)

(CATALYST, 2018), os cuidados baseados em valor prometem reduzir significativamente os custos gerais gastos com saúde.

Ainda baseando-se nos trabalhos de Porter e Teisberg (2006), o valor ao paciente na prestação dos serviços, como já discutido, só pode ser compreendido no nível de condições de saúde. O valor é determinado por quão bem um prestador atende a cada condição de saúde, não pela amplitude dos seus serviços. O valor entregue em uma condição de saúde é decorrente de um conjunto completo de atividades e especialidades envolvidas. Os autores afirmam que não são os papéis, as habilidades ou as funções, isoladamente, que importam, mas o resultado geral. Além disso, para cada aspecto do atendimento, o valor é determinado por quão bem se reúne o conjunto de habilidades e funções necessárias. Em cirurgia, por exemplo, o valor depende não apenas do cirurgião, mas também do anestesiologista, dos enfermeiros, do radiologista, de técnicos bem-preparados e outros, todos desempenhando bem em equipe. No entanto, não obstante o elevado nível da equipe cirúrgica, o ciclo de atendimento como um todo é crucial. A menos que o problema do paciente seja diagnosticado com precisão, o paciente seja adequadamente preparado e a recuperação e reabilitação sejam bem gerenciadas, os resultados serão prejudicados. Na verdade, o impacto do ciclo de atendimento é maior ainda. O valor pode ser aumentado sem cirurgia e tratando do caso de uma forma diferente. O valor pode ser maior ainda se atendimento e aconselhamento preventivo forem fornecidos ao longo do tempo, de forma que pouco ou nenhum tratamento seja necessário (PORTER; TEISBERG, 2006).

O estudo Value-based healthcare: A global assessment (2016), executado pela organização EIU (EIU, 2016), comissionado pela Medtronic, empresa multinacional de dispositivos tecnológicos para a área médica, evidencia uma série de alinhamentos de 25 países (Austrália, China, Índia, Indonésia, Japão, Coréia do Sul, França, Alemanha, Polônia, Rússia, Holanda, Espanha, Suécia, Reino Unido, Egito, Turquia, Emirados Árabes Unidos, Nigéria, África do Sul, Brasil, Chile, Colômbia, México, Canadá e Estados Unidos) com sistemas de prestação de saúde baseados em valor. Para conduzir esta pesquisa, a EIU definiu os cuidados de saúde baseados em valores e construiu uma estrutura de componentes principais do VBHC. A pesquisa é organizada em torno de quatro componentes-chave, ou domínios do VBHC, compostos por um total de 17 indicadores qualitativos, apresentados em detalhes no Anexo A. Os quatro domínios são:

• Capacitação de contexto, políticas e instituições para gerar valor no setor de saúde (8 indicadores);

• Medição de resultados e custos (5 indicadores);

• Assistência integrada e focado no paciente (2 indicadores);

• Abordagem de pagamento baseada em resultados (2 indicadores).

Os indicadores qualitativos foram pontuados pela EIU usando diretrizes de pontuação padronizadas em todos os países e chegando a pontuações binárias de sim/não ou pontuações numeradas de 0-2, 0-3 ou 0-4. As pontuações dos indicadores individuais foram acumuladas por domínio e os países foram classificados em um dos quatro grupos: baixo, moderado, alto ou muito alto, com base no nível de alinhamento com VBHC. A EIU agregou as pontuações dos indicadores individuais nos scores dos domínios e os scores dos domínios em um score geral composto. Cada domínio é igualmente ponderado e cada indicador é igualmente ponderado em cada domínio. Os principais pontos do estudo são listados a seguir:

• A Suécia é o único país que surge com um alinhamento muito alto com o VBHC e o Reino Unido é o único país com alto alinhamento com o VBHC (o alinhamento pode ser baixo, moderado, alto ou muito alto). A maioria dos países desenvolvidos no estudo tem um alinhamento moderado com abordagens de cuidados baseadas em valor.

• Índia e China - Os dois países no estudo com população superior a 1 bilhão - têm resultados geralmente semelhantes, mas divergem fortemente nos níveis de cobertura de saúde, com apenas 18% da população da Índia coberta por algum tipo de seguro de saúde enquanto na China, mais do que 95% da população é coberta por seguro de saúde pública.

• Um forte apoio político, que ajuda os países a alinhar seus sistemas de saúde mais de perto com os princípios do VBHC, tende a ser encontrado em países mais ricos. Dos sete países com uma política ou plano de alto nível para o

VBHC, apenas dois - a Turquia e a Colômbia - são países em desenvolvimento.

• O ímpeto para medir resultados e custos é fortalecido através da presença de registros de doenças e esforços de muitos países para implementar registros eletrônicos de pacientes. No entanto, em muitos casos, essas fontes de dados de saúde não são coordenadas e os sistemas de TI não são interoperáveis. Além disso, os dados de resultados, que são um pré-requisito para o alinhamento com o cuidado baseado em valor, são quase universalmente inexistentes.

• Mudar de atendimento em um único local, com base em um único provedor, para um atendimento coordenado e baseado em equipe continua sendo um desafio. Cerca de um quarto dos países do estudo (Egito, Indonésia, Nigéria, Holanda, Rússia e EUA) não tem caminhos nacionais de atenção coordenada em nenhuma das cinco áreas de terapia revisadas (cuidados de saúde mental, cuidados com diabetes, atendimento a pacientes com HIV, cuidados maternos e idosos). Nos EUA, existem vias coordenadas de atendimento, mas apenas dentro de hospitais ou grupos de provedores, e elas não são padronizadas nacionalmente.

• A vantagem dos pagamentos agrupados para coordenar os cuidados e focar no paciente é cada vez mais reconhecida. Em seis dos 25 países, os pagamentos em pacote estão sendo implementados por uma ou mais seguradoras.

• Os altos gastos com saúde nem sempre significam a presença de fatores de apoio para o alinhamento com o VBHC: nem o Japão nem os EUA - dois países que gastam mais de 10% do PIB em saúde - possuem uma Organização Nacional de Avaliação de Tecnologia em Saúde (HTA) reconhecida.

• Como a pontuação dos países no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da Organização das Nações Unidas (ONU) correlaciona-se com o alinhamento com VBHC: países com scores de IDH de nível baixo ou médio (África do Sul, Indonésia, Índia, Egito e Nigéria) precisam se concentrar em outros desafios, incluindo o aumento do acesso básico aos cuidados de saúde, assim o estabelecimento do ambiente favorável para VBHC é menor na lista de prioridades nacionais.

Em relação ao Brasil, também baseando-se no estudo supracitado, embora o sistema público atenda a 75% da população brasileira, apenas 46% do valor total dos custos com saúde são direcionados para o setor, o que resulta em uma alocação mais baixa de recursos públicos per capita e uma correspondente qualidade mais baixa da assistência destinada aos usuários do SUS em comparação com os de planos de saúde particulares. As prioridades estratégicas das autoridades de saúde são assegurar uma cobertura eficiente e melhoria da qualidade do atendimento - sem menções explícitas aos componentes do modelo de assistência com base em valor. Apesar dos esforços limitados empreendidos por uma parte do setor privado na implementação de sistemas de gestão para acompanhamento de pacientes ao longo do tempo, bem como das iniciativas de governos locais no sentido de melhorar a eficiência na parceria com o setor privado, não há políticas nacionais para organização da prestação de serviços de saúde em unidades integradas ou promoção de mudanças sistemáticas e abrangentes relacionadas a abordagens centradas nos pacientes. A Tabela 1 abaixo resume o resultado dos indicadores de alinhamento em VBHC relacionados ao Brasil.

Tabela 1 - Alinhamento do Brasil em relação aos indicadores VBHC Brasil

Alinhamento geral Baixo

Domínios

Capacitação de contexto, políticas e instituições para gerar valor no setor de saúde

Baixo

Mensuração de resultados e custos Baixo Assistência integrada e centrada

no paciente

Abordagem de pagamentos com base em resultados

Baixo Fonte: adaptado de EIU (2016)

Ainda de acordo com o estudo, apesar da necessidade de integração dos sistemas de TI voltados para a saúde com o intuito de aprimorar o processo de tomadas de decisões, os sistemas de informação no Brasil são organizados por nível da assistência e os registros não são vinculados, o que reflete o alto nível de fragmentação no próprio sistema de saúde. Isso não proporciona uma visão abrangente do sistema nem permite o acompanhamento dos custos de tratamento e resultados de pacientes individuais nos diferentes níveis e tipos de serviço. O sistema de saúde brasileiro teve sucesso na implementação de protocolo integrado de assistência a pacientes com Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), disponibilizando atualmente acesso quase universal a medicamentos e tratamentos por meios de diversos prestadores. A Figura 2 evidencia os baixos resultados do Brasil no alinhamento VBHC, quando comparados com a Suécia (primeiro colocado) e com a média dos países analisados no estudo.

Figura 2 - Comparação Suécia, Brasil e média dos 25 países no alinhamento VBHC

2.2 PNEUMONIA ADQUIRIDA NA COMUNIDADE E TEMPO DE

No documento Lucas de Souza Silva (páginas 31-39)