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4 A FORMATAÇÃO JURÍDICA PARA A LAVRATURA DE PROCURAÇÕES PÚBLICAS NO DISTRITO FEDERAL AGREGA ELEMENTOS IMPORTANTES À POLÍTICA

4.7 VANTAGEM TRIBUTÁRIA

Sobre as procurações públicas lavradas pelos cartórios de notas do Distrito Federal acerca de bens locais não incide tributação, o que incentiva o seu uso. As procurações públicas lavradas pelos cartórios de notas do Distrito Federal, seja com ou sem cláusulas de irretratabilidade, irrevogabilidade ou isentas de prestação de contas, seja com poderes para alienação para si mesma, nos moldes do art. 117 do Código Civil, ou “in rem suam”, nos moldes do art. 685 do Código Civil, não estão sujeitos a tributação. Mas nem sempre foi assim.

A Lei distrital nº 3.830, de 14 de março de 2006, previu em seu art. 2º, III que o imposto sobre transmissão “inter vivos” de bens imóveis e direitos a eles relativos - ITBI incidiria sobre cessão de direitos à aquisição de bens imóveis e o §5º estendeu a hipótese de incidência a mandatos concedidos “em causa própria” ou com cláusulas de irrevogabilidade e congêneros, nos seguintes termos:

15 O valor dos emolumentos é dado de forma aproximada, pois no seu cálculo o ato normativo da Corregedoria de Justiça

do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Portaria CGJ nº 3.210/2017, permite o repasse de custos tributários de qualquer origem, art. 4º, II, por exemplo do imposto municipal sobre serviço de qualquer natureza – ISSQN.

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§ 5º Tratando-se da hipótese prevista no inciso III do caput, consubstanciada por intermédio de mandato com cláusula “em causa própria” ou com poderes equivalentes para transmissão de bem imóvel e respectivo substabelecimento, desde que contenha cláusula de irrevogabilidade e irretratabilidade, observar-se-á:

I – caso, no momento do registro da escritura definitiva do imóvel, verificar-se que a aquisição do bem não foi feita pelo primeiro mandatário, presumir-se-ão ocorridos tantos fatos geradores quanto cessões que servirem de base ao registro;

II – em razão do disposto no inciso anterior, a alíquota do Imposto será multiplicada pelo número de sucessivos mandatários, de forma a incidir sobre cada uma das cessões.

Portanto, segundo a lei do ITBI, haveria tributação quando da lavratura das procurações “em causa própria” e semelhantes, com um número de fatos geradores equivalentes ao número de procurações mais substabelecimentos. O inciso I levaria a crer que tal exigência se daria apenas no momento que fossem utilizadas tais procurações para a aquisição imobiliária, contudo, em razão da responsabilidade tributárias dos tabeliães de notas, como previsto no art. 8º II da mesma lei e do art. 134, VI do Código Tributário Nacional, Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, os tabeliães, por cautela, exigiam já na lavratura do ato notarial, o prévio recolhimento tributário. O recolhimento do ITBI nas procurações se extendeu por 2007, até que, fruto da ação direta de inconstitucionalidade de nº 2007 00 2 008203-7 perante o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, foi declarada a inconstitucionalidade de ambos incisos do §5º, art. 2º da lei distrital, dentre outros dispositivos da mesma. O Conselho Especial do Tribunal entendeu, por maioria, que o fato gerador do ITBI só se dá com o efetivo registro da transmissão no registro imobiliário e não quando da lavratura de títulos ou instrumentos translatícios.

Portanto, tirando um breve período entre a vigência da Lei nº 3.830 de 2006 e sua declaração de inconstitucionalidade em 2008, a lavratura de procurações públicas para a alienação ou aquisição imobiliária não está sujeita a tributação, seja ela na competência municipal do Distrito Federal para atos onerosos, ITBI, seja ela na competência estadual do Distrito Federal para atos gratuitos, ITCMD. A ausência de tributação barateia as negociações imobiliárias, pois sobra apenas, como espécie tributária, a taxa cartorial.

5 CONCLUSÃO

Com base nos dados estudados nos três setores habitacionais da cidade de Planaltina-DF, constatou-se que: 1) suas urbanizações não seguiram as normas registrais, havendo a inversão da ordem legal (planejamento -> registro -> ocupação), primeiro se promovendo a ocupação para, somente depois, se proceder com a conclusão do planejamento e registro; 2) a existência de enorme lapso temporal entre a ocupação e a individualização registral das unidades imobiliárias, remontando em alguns casos a quase duas décadas; 3) baixo percentual de unidades imobiliárias

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onde a política pública de distribuição de lote concluiu seu intuito de promover a transferência de titularidade; 4) dentre as poucas situações onde se transmitiu a propriedade ao particular foi extremamente relevante o uso de procurações, em média 54% dos casos.

A formatação da política pública de distribuição de lotes estimula a existência de mercado imobiliário informal fruto do I) grande lapso temporal entre a ocupação por meio da entrega de atos de concessão e a posterior possibilidade de escrituração, II) proibição de alienação dos bens imóveis e III) requisitos estritos para a habilitação no programa habitacional estimulam o mercado.

O mercado informal viu no uso das procurações públicas ferramenta útil, pois tanto garante a segurança da ocupação como instrumentaliza a escrituração e consequente aquisição da propriedade. Os seguintes elementos foram identificados como relevantes à utilidade da procuração pública no mercado informal de imóveis oriundos de assentamentos de origem pública: A) a autonomização da procuração no Direito brasileiro; B) a criação de cadeias de legitimação, com a interferência da atividade notarial agregando segurança jurídica em relação a identificação dos “contratantes”; C) o reconhecimento e tutela das cadeias de representação pelo Poder Judiciário local, protegendo o ocupante procurador de interferências de ocupantes anteriores, terceiros e até o próprio ente público; D) a facilidade em se lavrar os atos notariais, sendo dispensável inclusive a comprovação formal da titularidade do imóvel, objeto dos poderes concedidos; E) a análise restrita a outorga de poderes, sem o crivo jurídico sobre a relação contratual, apesar de permitir maior número de vícios, agiliza as transações; F) o baixo custo para a lavratura de procurações públicas no Distrito Federal torna acessível e pouco onerosa sua utilização; G) e a ausência de tributação sobre a prática do ato também torna economicamente atrativa sua adoção. Boa parte desses elementos se encontram presentes em outros Estados, mas algumas, como o custo de emolumentos e a ausência de tributação não são comuns a todas as unidades federativas.

Desta forma, a procuração pública se apresenta como instrumento útil aos cidadãos, pois de forma fácil e barata agrega segurança jurídica a suas relações contratuais, bem como é relevante dentro da política pública, aumentando as chances de conclusão de seu procedimento (com a outorga da propriedade aos ocupantes) e dá um mínimo de segurança e rastreabilidade ao mercado informal que surge como seu efeito colateral.

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