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CAPITULO VI – PRESTAÇÃO RETRIBUTIVA NÃO PECUNIÁRIA

6.1. RETRIBUIÇÃO EM ESPÉCIE

6.1.1. VEÍCULO AUTOMÓVEL

Tem sido controversa a atribuição do veículo automóvel como parte integrante da retribuição, nomeadamente no que concerne à sua utilização fora do horário de trabalho e para fins que não profissionais. Quando a viatura automóvel é atribuída em função do cargo que o trabalhador exerce, v.g., um técnico comercial ou um diretor, e a sua utilidade restringe-se única e exclusivamente a questões profissionais, não subsiste qualquer hesitação, concluindo-se de forma consensual que nestas situações o uso da viatura automóvel não pode ser considerado retribuição, na medida em que a sua utilização é indexada e pressuposto da sua função e serviço prestado, constituído por isso uma ferramenta de trabalho, devendo o trabalhador zelar pela sua conservação e boa utilização, nos termos da alínea g) do artigo 128º do CT.

Distinta disposição, e um quanto ao tanto controverso, é a que sucede quando o seu uso extrapola o profissional e entra na esfera pessoal. Por exemplo, nos casos em que a viatura é adjudicada para uso extra profissional, inclusive durante fins-de-semana e período de férias. Aqui importa apurar as condições em que a viatura é concedida, i.e., a qualificação ou não como retribuição varia consoante a utilização para fins pessoais significa ou não uma mera liberalidade por parte do empregador, i.e., consoante se evidencie que o uso para fins pessoais se traduziu numa mera tolerância por parte do empregador ou antes, numa verdadeira intenção de atribuição de um benefício económico ao trabalhador, que neste caso e no meu entendimento deverá ser clarificado antecipadamente pelo empregador como tal e estipulado contratualmente quando assim seja, pois quando o não é, a intenção do empregador esgota-se na faculdade de proporcionar uma mera generosidade ao trabalhador. Ainda que o legislador presuma que tudo é retribuição até que prove o contrário.97

A este propósito tem-se pronunciado a jurisprudência. Nesse sentido explicou o Tribunal da Relação de Lisboa, em 22 de janeiro de 2005: “O nosso Supremo Tribunal tem entendido uniformemente que a atribuição a um trabalhador de veículo automóvel, com despesas de manutenção a cargo da entidade patronal para o serviço e para o uso particular, constitui ou não retribuição conforme se prove que essa retribuição é feita com carácter obrigatório e não como um ato de mera tolerância”. Entende-se que tem carácter vinculativo quando decorra da lei, de IRCT, cláusula contratual, regulamentação interna

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ou pelos usos, sendo que na ausência de qualquer um destes fundamentos, a sua atribuição consistirá numa mera liberalidade do empregador.

Assim sendo conclui-se que, caso o empregador consiga derrubar e ilidir a presunção de que o uso da viatura constitui uma mera tolerância, estamos perante um complemento que não é retribuição, se pelo contrário, o empregador não conseguir provar a natureza da liberalidade e se concluir que esta traduz um benefício económico para o trabalhador, ai deverá integrar o conceito de retribuição. A este propósito assentou o STJ em 30 de abril de 2014.98

O Tribunal da Relação do Porto, 17 de setembro de 2012, decidiu que quando se prove que esta constitui um elemento essencial do contrato, cuja inexistência não teria culminado na celebração do vínculo contratual, é obrigatória e por isso considerada uma componente da retribuição. Já o STJ reforçou o seu carácter retributivo e inquestionável irredutibilidade ao deliberar que “Tendo-se provado que o empregador distribuiu ao trabalhador um veículo ligeiro de passageiros para seu uso exclusivo, ficando todos os encargos, manutenção, seguros, portagens e combustível a cargo daquela e que o trabalhador utilizava a viatura para uso exclusivo, nas deslocações da residência para o local de trabalho, nos fins-de-semana e férias, para efeitos pessoais, a mencionada atribuição de veículo automóvel assume natureza retributiva, estando o empregador vinculado a efectuar, com carácter de obrigatoriedade, essa prestação.”99

Base de tributação viatura para uso pessoal: Se a viatura é atribuída como retribuição em espécie, ou seja, quando se prove que a viatura é cedida para uso pessoal, é sujeita a tributação, correspondente a 0,75% do custo de aquisição da viatura.

O artigo 46º-A do CCont considera a viatura para uso pessoal como retribuição em espécie quando tal deva constar de acordo escrito do qual conste a afetação em permanência da viatura ao trabalhador, a referência ao suporte, por parte do empregador, dos encargos com a viatura e com a sua utilização, assim como a menção expressa da possibilidade de utilização para fins pessoais ou da possibilidade de utilização durante 24 horas por dia.

Nos termos do artigo 46º do CCont, “consideram-se remunerações as prestações pecuniárias ou em espécie que nos termos do contrato de trabalho, das normas que o

98 Processo nº 714/11.00TTPRT.P1.S1.

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regem ou dos usos são devidas pelas entidades empregadoras aos trabalhadores como contrapartida do seu trabalho e delimita na alínea s) que integra a base de incidência contributiva “as despesas resultantes da utilização pessoal pelo trabalhador de viatura automóvel que gere encargos para a entidade empregadora nos termos do artigo seguinte.” Base de tributação da viatura como instrumento de trabalho: Neste caso aplicam-se os limites de isenção previstos nos termos da alínea d) do nº3 do artigo 2ª do CIRS. Constituem base de tributação as importâncias auferidas pela utilização de automóvel próprio em serviço da entidade patronal, na parte em que ambas excedam os limites legais ou quando não sejam observados os pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado.100