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4 ANÁLISE DOS DADOS

4.4 Verificação dos valores recuperados pelo Tribunal de Contas

No exercício de sua função, o Tribunal de Contas eventualmente confirma a ocorrência de irregularidades, cabendo-lhe aplicar, ao final do processo, as sanções de multa e/ou débito.

Pois bem, os valores das condenações devem ser realizados mediante o pagamento pelos responsáveis ou pelo arresto de bens equivalente ao valor de- vido. A legislação define o procedimento sobre como se dará a fase de execução das penas, estando previsto no art. 78, § 3º, da Constituição do Estado do Ceará, e no art. 156, §§ 3º e 4º, do Regimento Interno do TCM/CE.

Em resumo, o Tribunal fixa um prazo para o recolhimento voluntário das penalidades. Findo esse prazo sem a comprovação do respectivo depósito inte- gral, o órgão comunicará a Procuradoria Geral do Estado para assumir a co- brança forçada sobre o patrimônio do devedor.

O resultado da cobrança é evidenciado de forma diferente para multa e para o débito. Na multa, o valor é contabilizado como receita junto ao cofre do Estado. No débito, quando há recuperação a destinação varia conforme a iden- tificação do ente sobre o qual se deu o dano ao erário. Por exemplo, qualquer um dos 184 municípios podem realizar a cobrança dos débitos que o Tribunal

lhe atribuiu como pertencente, ou o próprio Estado, caso a obrigação de ressar- cimento se refira a dano ocorrido em seu patrimônio.

Na sequência, temos a receita de multas obtida junto à contabilidade do Estado, administrada pela Secretaria da Fazenda:

Tabela 5: Receitas de Multas e Dívida Ativa, 2014-2017

Ano Receita Multas TCM Receita Dívida Ativa Multas TCM Total TCM

2014 R$ 486.768,40 Não contabilizado R$ 486.768,40

2015 R$ 898.687,31 Não contabilizado R$ 898.687,31

2016 R$ 1.126.778,84 R$ 144.089,62 R$ 1.270.868,46

2017 R$ 379.755,33 R$ 366.881,14 R$ 746.636,48

Fonte: Elaboração própria com dados do Balanço Geral do Governo do Ceará.

Sobre a Tabela 5, verificou-se uma limitação de dados nos anos de 2010 a 2013 devido a omissão de escrituração pela contabilidade do Estado do Ce- ará. Os balanços anteriores a 2014, ou não registravam as receitas de multa, sejam do TCM ou TCE (2010 e 2011), ou registravam, porém sem a distinção quanto a origem, denominando genericamente como sendo de ambos os Tribu- nais de Contas (2012 e 2013).

Tabela 6: Receita de Multas TCM, 2010-2013

Ano Receita Multas dos Tribunais de Contas Origem TCM ou TCE

2010 - -

2011 - -

2012 R$ 82.579,07 Não especificado

2013 R$ 33.986,50 Não especificado

Fonte: Elaboração própria com dados do Balanço Geral do Estado do Ceará.

Com relação ao resultado da dívida ativa, esta representa a parte (ou fra- ção) do estoque de valores das condenações aplicadas em exercícios anteriores que foi realizado em decorrência da cobrança em ação de execução, logo con- vertidos em receita.

Tabela 7: Receita de Multas e Dívida Ativa – TCE, 2014-2017 Ano Receita Multas TCE Receita Dívida Ativa Multas TCE Total TCE

2014 R$ 76.757,93 Não contabilizado R$ 76.757,93

2015 R$ 46.092,33 Não contabilizado R$ 46.092,33

2016 R$ 76.216,38 Não contabilizado R$ 76.216,38

2017 R$ 159.076,32 Não contabilizado R$ 159.076,32

A partir dos valores destacados, torna-se oportuno realizar uma análise acerca do percentual de eficácia das execuções de cobrança, comparando

com o total das condenações. Tendo em vista que o objeto se trata da sanção

da espécie multa, não serão considerados por enquanto os valores a título de débito.

Tabela 8: Condenações em Multa e Multas Convertidas em Receita, 2010- 2017

Ano Condenações em Multa TCM (total aplicado) Multas convertidas em Receita TCM Percentual realização 2010 R$ 12.170.827,45 R$ - 0% 2011 R$ 14.667.777,58 R$ - 0% 2012 R$ 19.425.409,89 R$ - 0% 2013 R$ 18.614.260,86 R$ - 0% 2014 R$ 10.547.529,90 R$ 486.768,40 5% 2015 R$ 11.935.945,63 R$ 898.687,31 8% 2016 R$ 8.062.843,46 R$ 1.270.868,46 16% 2017 R$ 12.170.827,45 * R$ 746.636,48 6%

Fonte: Elaboração própria com dados do TCM.

Obs.: Para o valor do total aplicado em multas em 2017 foi realizado uma estimativa com base na média aritmética da série histórica, haja vista que os dados ainda não estão disponíveis.

De acordo com o quadro acima, podemos afirmar que o panorama sobre

a eficácia das decisões do Tribunal de Contas, notadamente quanto a sanção

da espécie multa, expressa um percentual extremamente baixo, indicando a pre-

cária resolutividade das punições aplicadas. Consideramos alarmante, visto

que reflete a constatação de impunidade para aqueles que cometem irregulari- dades e prejudicam a sociedade.

Também se demonstrou preocupante a omissão do estoque de multas dos Tribunais de Contas na contabilidade do Estado, de forma que se provou não evidenciado o saldo acumulado das multas no balanço patrimonial. Tam- pouco se registraram as inscrições e baixas de valores a partir da DVP – De- monstração das Variações Patrimoniais.

Portanto, verifica-se um desfalque expressivo na contabilidade do Go- verno, haja vista a não contabilização de soma vultosa de ativo realizável. Ora, uma vez que as multas aplicadas pelos Tribunais de Contas constituem créditos em favor do Estado do Ceará, tem-se valores pendentes de recebimento, cuja escrituração se faz necessária. A Tabela 9 apresenta o estoque de multas do TCM no período 2010-2017:

Tabela 9: Estoque de Multas do TCM, 2010-2017 Conta de Ativo Realizável Valores Originais Recebimento (conta redu- tora de ativo) Saldo (diferença) Condenações Multas TCM (consolidado) R$ 107.595.422,22 R$ 3.402.960,65 R$ 104.192.461,57 Multa TCM 2010 R$ 12.170.827,45 R$ - R$ 12.170.827,45 Multa TCM 2011 R$ 14.667.777,58 R$ - R$ 14.667.777,58 Multa TCM 2012 R$ 19.425.409,89 R$ - R$ 19.425.409,89 Multa TCM 2013 R$ 18.614.260,86 R$ - R$ 18.614.260,86 Multa TCM 2014 R$ 10.547.529,90 R$ 486.768,40 R$ 10.060.761,50 Multa TCM 2015 R$ 11.935.945,63 R$ 898.687,31 R$ 11.037.258,32 Multa TCM 2016 R$ 8.062.843,46 R$ 1.270.868,46 R$ 6.791.975,00 Multa TCM 2017 R$ 12.170.827,45 R$ 746.636,48 R$ 11.424.190,97 Fonte: Elaboração própria com dados do TCM.

Do total apresentado, ainda falta contabilizar as perdas por prescrição, fixada, normalmente, em 5 anos a partir da expedição do título executivo pelo Tribunal de Contas. De modo que os valores aplicados no período de 2010 a 2013 podem estar prescritos, salvo a incidência de alguma hipótese de suspen- são ou interrupção representada pela Procuradoria Geral do Estado. Logo, além da baixa eficácia das multas, ocorrem perdas definitivas dos valores a receber.

Com relação a sanção da espécie débito, os dados são ainda mais pessi- mistas. Por se tratar de punição, cuja responsabilidade pela cobrança é do ente que sofreu o dano ao erário, o controle da realização dos valores se torna mais difícil, porque cada município (ao todo são 184) possui uma estrutura fiscal e de execução diferente um do outro.

O TCM-CE, por sua vez, não dispõe de um relatório consolidado que de- monstre a receita proveniente das ações de ressarcimento (débito). O que seria possível acompanhar são as inscrições na dívida ativa (confirmadas mediante certidão) e a proposição de ação de execução fiscal (cobrança). A informação está fragmentada nas 184 prestações de contas de governo, a qual se trata de um documento que verifica, em um de seus itens, a dívida ativa não tributária oriunda de débitos e multas do TCM.

Tabela 10: Débitos Aplicados pelo TCM, 2010-2016

Conta de Ativo Realizável Valores

Recebimento (conta redutora de ativo) Saldo (diferença) Condenações Débito TCM (consolidado) R$ 459.506.944,44 R$ - Igual Débito TCM 2010 R$ 35.206.851,37 R$ - Igual Débito TCM 2011 R$ 39.940.450,57 R$ - Igual Débito TCM 2012 R$ 69.192.319,92 R$ - Igual Débito TCM 2013 R$ 79.837.817,82 R$ - Igual Débito TCM 2014 R$ 97.341.638,18 R$ - Igual Débito TCM 2015 R$ 43.490.856,61 R$ - Igual Débito TCM 2016 R$ 94.497.009,97 R$ - Igual Fonte: Elaboração própria com dados do TCM.

A Tabela 10 expressa o saldo acumulado da conta de débitos aplicados pelo TCM, caso todos os municípios tivessem seus créditos controlados de

forma centralizada. Para a coluna de recebimentos não foram localizados re-

gistros contábeis de qualquer realização em ações de ressarcimento.

Apenas a título de dimensionamento do valor do estoque, que está pró- ximo de totalizar meio bilhão de reais, sua repartição igualitária dentre os 184 municípios, caso viesse a ocorrer hipoteticamente, resultaria na quantia de R$ 2,5 milhões de reais para cada um.

Volvendo ao quadro, o resultado evidencia uma situação de extrema gra- vidade, porquanto tem-se a constatação da completa inviabilidade de recom-

posição do dano ao erário ou de sê-lo improvável. Considerando o número

do percentual de realização no quadro das multas, no qual temos uma variação em torno da faixa até 10%, infere-se que o percentual para a realização das condenações em débito seja próximo de 0%.

As razões dessa estimativa pessimista se justificam pela precariedade dos órgãos municipais para promoverem execuções judiciais que demandam uma estrutura mais bem equipada. Além disso, normalmente as pessoas res- ponsabilizadas pelo Tribunal de Contas são próximas ou envolvidas no cotidiano político do município, de modo que há pouco interesse em dar seguimento a ação de cobrança. Terceiro lugar, o valor das punições em débito geralmente excede com folga o valor das multas, o que transforma quase impossível o ar- resto de bens em valores compatíveis com o montante devido.

Nesse sentido, o eminente jurista Jorge Ulisses Jacoby, em sua obra, Tri- bunais de Contas do Brasil, 2016 (pág. 398), endossa a falta de perspectiva na recuperação dos valores pelos tribunais de contas:

Nos estados, no Distrito Federal e nos municípios, quando a condena- ção pelos Tribunais de Contas for em favor das respectivas adminis- trações diretas, a respectiva procuradoria deverá ser encarregada da execução forçada da deliberação.

[...]

Por óbvio, a partir da fixação desse aspecto é que se torna compreen- sível porque muitas deliberações das Cortes de Contas não chegam a ser efetivadas. É consabido que, de uma forma geral, esses órgãos de representação judicial são precariamente estruturados, com carências acentuadas de recursos humanos e materiais, conservando ainda em várias unidades da federação como titular agente de confiança do chefe do Poder Executivo, muitas vezes, coincidentemente, o inscrito como responsável no título executivo lavrado pela Corte de Contas.

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