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5 – A VIA DE PI3K/AKT EM CÉLULAS Y-1 E A RESPOSTA ANTI-MITOGÊNICA DE ACTH

A linhagem Y-1 de células adrenais de camundongo apresenta superexpressão do oncogene ki-ras e altos níveis da proteína Ki-Ras ativada (Figura

35). Tratamentos com ACTH39 e mesmo FGF2 não modulam a atividade desta

proteína em células carenciadas (Figura 35), porém são capazes de ativar a via de ERK1,2 (Figuras 24A) e induzir a expressão de genes de resposta primária, como fos e jun (Tabela V). Por outro lado, o proto-oncogene c-myc, que também é classicamente induzido por fatores de crescimento como FGF2, apresenta-se com níveis basais relativamente altos em células Y-1 carenciadas para soro (Figura 23)

(Kimura et al, 1993). A desregulação parcial do gene c-myc nestas células tem sido atribuída aos altos níveis basais de Ki-Ras; além disso a redução dos altos níveis da proteína c-Myc (por aumento de sua degradação) por ACTH tem sido considerada até agora como a principal causa dos efeitos anti-mitogênicos de ACTH (Armelin et al, 1996; Lepique et al, 2000).

A proteína Ras é a mais importante e mais estudada GTPase envolvida com crescimento, proliferação e diferenciação celular sendo mediadora de muitas vias de transdução de sinal que estão por trás destes fenômenos celulares fundamentais (Barbacid, 1987). Dentre estas vias, a mais recentemente descoberta (década de 90) e atualmente muito explorada está a via de PI3K/AKT, principalmente por ser mediadora de processos de apoptose, alteração de citoesqueleto e quiescência ou parada de crescimento (Brunet et al, 1999), este último há anos documentado na linhagem Y-1 e causado por ACTH, porém através de mecanismos desconhecidos.

V. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 144

Verificamos, recentemente ,que células Y-1 carenciadas ou em crescimento exponencial, apresentam níveis altos e praticamente constitutivos da proteína AKT/PKB ativada (Figura 36) (Forti & Armelin, 2000). Quando tratadas com inibidores de PI3K, wortmanina e LY, ocorre redução total de AKT ativada mostrando que este efeito é mediado por PI3K (Figuras 36 e 37). Quando inibidores de Src são usados nestes experimentos, nota-se que também ocorre uma redução total de AKT ativada (Figura 38), sugerindo que Src, assim como Ras, é outra proteína que pode estar promovendo uma ativação constitutiva de AKT nessa linhagem de células através de PI3K (Liu et al, 1998). É conhecido que Src ativa PI3K fosforilando a subunidade p85 desta e recrutando-a para a membrana; isto é mediado pela ativação da proteína adaptadora Cbl por Src. Por outro lado, a proteína tirosina fosfatase Shp-2 (que em alguns sistemas celulares é um substrato de Src) quando ativada por fosforilação, promove redução da ativação de AKT por PI3K pela desfosforilação da subunidade p85 (Hakak et al, 2000).

Quando células Y-1 são submetidas a tratamentos com ACTH (Figuras 40 e 41), forskolina, db-cAMP ou toxina de cólera (Figura 43) o mesmo efeito tem sido observado, ou seja, uma redução muito forte e rápida dos níveis de AKT fosforilada que, no caso de ACTH, independem da presença de soro ou FGF2 no meio e se mantém por até 4h (Figura 41). Estes resultados mostram o envolvimento de PKA, possivelmente indireto, na desfosforilação de AKT nestas células. Quando o inibidor de PKA H-89 e/ou clones de células Y-1 deficientes em PKA (Figura 44) são carenciados para soro e estimulados com ACTH, não ocorre redução dos altos níveis de AKT ativada, comprovando a mediação por PKA deste efeito inibitório de ACTH sobre esta via (Forti & Armelin, 2000). Além disso, este efeito inibitório de

ACTH é dependente do ACTHR (Figura 42) e célula-específico, pois transfectantes 3T3 e AR-1 ACTHR não possuem basal de AKT ativada e não apresentam qualquer efeito ativador ou inibitório de ACTH nesta proteína (Figuras 46 e 47).

Embora apenas uma proteína tirosina fosfatase tenha sido descrita ser regulada por ACTH em células adrenais através de PKA (Sayed et al, 1997; Jones et al, 2000; Rocchi et al, 2000), nossos resultados de redução dos níveis de AKT fosforilada sugerem que alguma proteína com atividade de tirosina, treonina ou serina fosfatase está sendo regulada por ACTH, muito provavelmente ao nível de atividade catalítica, através de fosforilação por PKA. Além disso, não existem dados descrevendo que PKB possui algum domínio de reconhecimento por PKA e seja um substrato direto desta quinase. Pelo contrário, os poucos trabalhos descrevendo alguma relação entre estas vias mostram que PKA pode promover ativação de PKB em outros sistemas celulares, provavelmente inibindo alguma fosfatase regulatória de AKT por fosforilação (Van Obberghen et al, 1999). Não podemos deixar de salientar também que este efeito de ACTH é mais um, dos poucos documentados até agora, onde um GPCR está regulando a atividade de AKT (Figura 50) (Gutkind et al, 2000).

Uma vez que os efeitos de ACTH em células Y-1 são mediados pelas vias de PKC e MAPK, é importante verificar se estas vias sinalizadoras participam, de alguma forma, no efeito inibitório de ACTH sobre AKT: mesmo na presença de inibidores específicos de MEK (PD 98059) e PKC (GF 109203X e Go6983) ACTH promove uma rápida e forte redução dos basais de AKT fosforilada (Figura 45), mostrando ser este um efeito exclusivamente dependente de PKA, segundo nossos resultados atuais. Além disso pode-se sugerir que, assim como os já conhecidos,

V. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 146

este novo efeito de ACTH está sendo mediado exclusivamente por proteínas Gs, pois pré-tratamentos com altas concentrações de toxina de pertussis não bloqueiam a redução de AKT ativada por ACTH (Figura 39).

Recentemente, identificou-se em linhagens de mamíferos genes

“correspondentes” aos descritos em C. elegans (daf-16), envolvidos com senescência ou parada de crescimento celular. Os produtos destes genes correspondem a proteínas da família de fatores de transcrição conhecida como “Forkhead” (AFX, FKHR, FKHR-L1), que são mediadores da via de PI3K/AKT (Medema et al, 2000). Estes fatores de transcrição, quando superexpressos, são conhecidos por promoverem a inibição de crescimento de diversas linhagens celulares, incluindo células transformadas com Ras ou que não expressam o gene supressor de tumor PTEN, que codifica para uma proteína fosfatase de fosfolipídeos de membrana envolvidos na regulação da atividade de PKB e outras vias (Graff et al, 2000). Como mediadores da via de PI3K/AKT e promotores de inibição de crescimento, as proteínas “Forkhead” regulam a transcrição do gene p27Kip1, aumentando a expressão da proteína p27Kip1 que leva a inibição dos complexos CiclinaD/Cdk4 ou CiclinaE/Cdk2 (Figura 8), fazendo com que a célula estacione na fase G1 do ciclo celular (Collado et al, 2000). Este fenômeno mantém as células num estado de quiescência (senescência replicativa) ou parada de crescimento, após vários ciclos de divisão in vivo ou in vitro, como um caminho alternativo à apoptose. Esta parada de crescimento descrita se assemelha muito aos efeitos anti- mitogênicos de ACTH (inibição de crescimento e bloqueio da transição G1→S) em células adrenais Y-1, uma vez que após a retirada do estímulo hormonal, estas células podem reentrar na fase S e progredir pelo ciclo celular.

Em colaboração com uma aluna de doutorado do laboratório, iniciamos uma investigação da expressão da proteína p27Kip1 a fim de saber se a inibição de AKT promovida por ACTH pode estar envolvida com os efeitos anti-mitogênicos de ACTH. Experimentos de “western blot” em células Y-1 carenciadas para soro e estimuladas com agentes mitogênicos como FGF2 e soro ou agentes anti- mitogênicos como ACTH (por 5h de estimulação) e wortmanina, notamos que ACTH promove uma forte indução da expressão de p27Kip1 sobre os níveis basais, mesmo na presença de soro ou FGF2, os quais promovem uma redução da expressão desta proteína. Já o inibidor de PI3K, wortmanina, na presença ou não de ACTH, também leva a aumentos da expressão de p27Kip1 conduzindo as células à uma parada de crescimento (Forti, Schwindt & Armelin, manuscrito em preparação).

Uma vez que a inibição de AKT por ACTH é dependente de PKA, ao utilizarmos clones de Y-1 deficientes em PKA ou o inibidor H-89, obtivemos como resultados um bloqueio da indução de p27Kip1 por ACTH (Forti, Schwindt &

Armelin, manuscrito em preparação). Assim sendo, a ativação da expressão de p27Kip1 bem como a ativação da desfosforilação de AKT, promovidas por tratamentos com ACTH, são dependentes de PKA e decorrentes da seguinte via de sinalização:

ACTHR → cAMP/PKA −| Akt −| AFX/FKHR → p27Kip1, conforme esquematizado na

V. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 148 ACTH7-38 ACTH39 Gsα β γ AC PKA Forskolina Toxina de Cólera (CTX) cAMP 8Br-cAMP db-cAMP RAS PI3K AKT PKB p27Kip1 Ciclina/ CDK ? p27Kip1 ? AFX/FKHR ? H-89 ANTI-MITOGÊNICO Cbl Shp2 Src ? ? Wortmanina LY PP1, T47A ?

Figura 50. Esquema ilustrativo mostrando as vias de transdução de sinal que contribuem para o mecanismo de ação de ACTH em células adrenais Y-1 assim descrito: “ACTH se liga ao

ACTHR que ativa Gs, cuja Gsα ativa a adenilato ciclase a produzir cAMP. cAMP ativa PKA que

deve estar ativando uma fosfatase inibidora de AKT ativada, por desfosforilação. Os níveis constitutivos de AKT ativada, por sua vez, são mantidos por Ras-GTP e ou Src, através da ativação de PI3K. Ao ser inibida, AKT deixa de inibir, por fosforilação, os fatores de transcrição

da família dos “Forkhead” (AFX/FKHR) (que se dissociam da proteína adaptadora 14-3-3 no citoplasma e migram para o núcleo), ligando-se então a elementos promotores de vários

genes, dentre estes o de p27Kip1, cuja transcrição é aumentada (e a expressão da proteína

também). Uma vez no citoplasma, p27Kip1 inibe a atividade de complexos Ciclina/Cdk

bloqueando o ciclo celular. O esquema também sugere prováveis vias e comunicações entre vias que podem estar mediando e contribuindo para os efeitos anti-mitogênicos de ACTH

VI. CONCLUSÕES

1. Os clones transfectantes AR-1 e 3T3 ACTHR expressam estavelmente o receptor de ACTH funcional. A construção gerada e utilizada não apresenta limitações de expressão e atividade da proteína produzida. A ativação de adenilato ciclase por ACTH, exibida por estes transfectantes, tem cinética e intensidade de ativação muito semelhantes às células adrenais Y-1. Isto mostra que os sinais estão sendo iniciados no ACTHR que foi transfectado (exógeno expresso).

2. ACTH ativa fracamente a expressão de c-FOS em clones 3T3 ACTHR bem como outras proteínas das famílias FOS e JUN, porém não tem efeito na expressão de c-MYC. A ativação destes genes por ACTH não se correlaciona com a ativação de adenilato ciclase exibida pelos clones, indicando que a via de PKA não é importante na mediação deste efeito.

3. Tratamentos curtos de ACTH ativam fracamente a fosforilação de ERK1,2 e do fator de transcrição p35 ATF1/p37 CREM1 nos clones 3T3 ACTHR, porém não tem efeitos na atividade de JNK/SAPK. Por outro lado, as vias de PKA, PKC e MAPK não estão envolvidas diretamente na indução da expressão de c-FOS em clones 3T3 ACTHR.

4. Estes resultados levam-nos a concluir que ACTH está se ligando especificamente ao receptor funcional expresso nas células 3T3 e AR-1. ACTHR é capaz de promover a ativação de Gαs/AC e provocar aumentos de cAMP intracelular, que aparentemente, não são responsáveis pela indução de c-FOS via PKA. Além disso, ACTHR inicia outros sinais ao nível da membrana que estão ativando vias ainda não identificadas promovendo uma indução não coordenada dos genes fos e jun, e que podem até ser atribuídas às subunidades βγ de proteínas G.

VI. CONCLUSÕES 150

5. ACTH não regula os níveis constitutivos da proteína Ras-GTP em células adrenais Y-1 que, por sua vez, apresentam níveis constitutivos da proteína AKT/PKB ativada (fosforilada), independentemente da fase do ciclo celular em que se encontram, e que são dependentes de Ras/PI3K ou Src/Cbl/Shp2/PI3K. 6. ACTH promove de forma rápida e forte uma redução dos níveis constitutivos de

AKT fosforilada, efeito este que se mantém por algumas horas. O efeito inibitório de ACTH sobre AKT está sendo mediado pela via de PKA, que provavelmente ativa alguma proteína serina/treonina fosfatase que desfosforila e inativa AKT. 7. Tratamentos longos de ACTH ativam a expressão da proteína p27Kip1 em células

Y-1 carenciadas de uma forma também dependente da via de PKA.

8. Estes resultados documentam, pela primeira vez, que um sinal iniciado num receptor do tipo GPCR que se acopla exclusivamente a Gs, no caso o ACTHR, pode promover a desativação de AKT. Aparentemente, a desativação de AKT é suficiente para levar à indução da expressão de p27Kip1, mecanismo que contribui para explicar a ação anti-mitogênica de ACTH em células adrenais, fenômeno descrito há décadas, mas cujo mecanismo permanece não esclarecido.

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