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Capítulo 02. Do movimento dos saraus ao Sarau do Binho

2.1 Sarau do Binho

2.1.3.1. A Viagem do Sábado

Esse sábado fez parte do primeiro acompanhamento ao lado do grupo, no qual pude ficar o maior tempo imerso conjuntamente com os participantes do Sarau do Binho, que geralmente participam das atividades externas do sarau, já que até então minha participação era somente como expectador do Sarau no “BBinho”, ou em conversas com o casal Binho e Suzi em sua residência.

No papel de pesquisador, resolvi adotar como estratégia a aproximação vagarosa, desfrutando das informações de acordo com o tempo das apresentações, dos projetos, das pessoas, sem muita pressa de buscá-las, principalmente junto aos participantes, por considerar que a cultura periférica não é para ser “consumida” de forma rápida e passageira, somente para fins de pesquisa, mas como processo de identificação, de reconhecimento, como processo político, já que me incluo em tal cenário e o considero por tais parâmetros.

Ao todo foram duas apresentações em um mesmo dia, são elas a participação do projeto Ônibus-biblioteca, com itinerário na Estrada do Alvarenga, altura n. 1614 (zona sul), e a participação e lançamento do livro no “Sarau dos Mesquiteiros, na E.E. Jornalista Francisco Mesquita, em Ermelino Matarazzo (zona leste).

Chego à casa do Binho e, como sempre, abraços são distribuídos, clima de final de semana, alegria, sarau, o Binho preparando uma vitamina de café da manhã, ao fundo a Suzi, sempre atarefada, mesmo quando não acompanha

o grupo, ela está preocupada se todos comeram se estão levando blusas, tudo o que precisam para as apresentações.

As pessoas chegam e durante a refeição falam sobre diversos assuntos, dentre os quais o rap e a sua trajetória tornam-se motor da prosa, perpassando pela questão do movimento negro, o engajamento do movimento hip-hop, assim como a situação das pessoas que trabalham com cultura na atualidade.

No caminho para a primeira apresentação, o assunto passou para a participação do jovem negro na universidade e como são suas perspectivas atuais no mercado de trabalho, principalmente o cultural, tendo em vista a falta de poder aquisitivo.

Chegamos ao destino, Estrada do Alvarenga, via importante utilizada para chegar ao extremo da zona sul, algumas pessoas vão aos bares ao redor para ir ao banheiro, o Binho aproxima-se do ônibus e conversa com as agentes do ônibus-biblioteca, acertam o início e o grupo começa a se preparar.

Estávamos em dois carros, totalizando oito pessoas, o estandarte93 do Sarau do Binho foi posto, os livros distribuídos e as apresentações começaram, inicialmente no ponto de ônibus comum para atrair o público e chamar a atenção para o ônibus-biblioteca, algumas pessoas chegaram a contemplar as apresentações e não mais se preocuparem com a condução desejada.

Já nas apresentações dentro do ônibus-biblioteca, os integrantes alternavam-se em recitar poesias, cantos ou com histórias para o público leitor, que no caso variava ao longo das exibições em cerca de vinte pessoas. As exibições estenderam-se novamente para o exterior do ônibus em tom tranquilizador, pois as exibições passaram a ser essencialmente musicais Pensar no tamanho da cidade de São Paulo é também levar em consideração os seus problemas, principalmente tratando-se de aparatos públicos para a leitura, pois ainda em 2014 há a necessidade de ônibus-biblioteca itinerantes para atender os locais distantes do centro.

Foto: Estandarte do Sarau do Binho e o ônibus-biblioteca ao fundo, 28/09/2013 (Diego Elias)

Foto: Intervenção no ponto de ônibus na Estrada do Alvarenga, 28/09/2013 (Diego Elias)

Foto: Cantoria ao lado do ônibus-biblioteca, 28/09/2013 (Diego Elias)

Foto: Intervenção dentro do ônibus-biblioteca, 28/09/2013 (Diego Elias)

As apresentações duraram aproximadamente duas horas e, no final, todos se reuniram e fomos em direção à zona leste, Ermelino Matarazzo, percorrendo uma distância de 60 km até a EE. Jornalista Francisco Mesquita, no Sarau dos Mesquiteiros.

Coordenado pelo professor de história Rodrigo Ciríaco desde 2009, Sarau dos Mesquiteiros é um coletivo artístico cultural começado por iniciativas isoladas dentro de uma escola estadual para hoje tornar-se um grupo de

professores, adolescentes e pessoas preocupadas com a literatura periférica e sua divulgação.

O Sarau dos Mesquiteiros em si ocorre todo último sábado do mês e conta com participações especiais de poetas, escritores, artistas, dentre outras pessoas ligadas à cultura periférica preocupadas em disseminar ao público jovem suas sabedorias.

Neste dia em específico, eram três as atividades especiais: o lançamento do livro “Sarau do Binho VIVE!”, “Ângela: um Jardim no Vermelho”, de José Sarmento, “Dias de inferno na Síria” (prêmio Jabuti 2013), do jornalista Klester Cavalcanti, além de debates com os autores e o relato especial do jornalista Klester Cavalcanti sobre a sua viagem e prisão na Síria.

Estavam presentes aproximadamente 50 pessoas, dentre elas muitos alunos da escola que vêm para prestigiar o projeto no final de semana. Os livros citados e outros títulos da Literatura Marginal foram postos nas mesas para consulta, assim como pendurados para que qualquer um que passasse pudesse consultá-los.

Inicialmente, o Sarau foi aberto e Rodrigo Ciríaco agradeceu a participação de todos, principalmente dos convidados, que foram sem nenhuma remuneração, somente para ajudar o projeto, em seguida o jornalista iniciou a sua fala, contando os motivos da sua ida à Síria, suas dificuldades, assim como o conflito Síria-Líbano e a própria contradição interna do país.

Depois do relato, abriram o bate-papo para perguntas e em seguida o Sarau em si começou, o interessante a ser destacado é que, por falta de tempo os outros autores, Binho e José Sarmento, não falaram para possibilitar a participação de todos.

Cada sarau da periferia de São Paulo tem a sua especificidade e as características marcantes do Sarau dos Mesquiteiros e o comprometimento das pessoas em abrir e se responsabilizar por uma escola pública no final de semana, a participação efetiva dos alunos, que inclusive nesse dia apresentaram poemas, músicas e uma esquete, a contribuição de outras pessoas e artistas ligados à cultura periférica no geral, fazendo com que em uma região como Ermelino Matarazzo, sem aparatos públicos de lazer e cultura, ocorram atividades culturais de qualidade, feitas gratuitamente de forma coletiva.

Foto: Frente da E.E. Jornalista Francisco Mesquita, 28/09/2013 (Diego Elias)

Foto: Início do Sarau dos Mesquiteiros, 28/09/2013 (Diego Elias)

Foto: Bate-papo com o Jornalista Klester Cavalcanti, 28/09/2013 (Diego Elias)

Foto: Oficina artesanal durante o Sarau dos Mesquiteiros, 28/09/2013 (Diego Elias)

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