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2. O ABANDONO DE CRIANÇAS: PERSPECTIVA HISTÓRICA

2.3 Os Enjeitados em Torres Vedras

2.3.4 Vidas de alguns expostos sobreviventes

A atenção recentemente concedida à história da gente “pouco importante” leva-nos a querer conhecer o percurso de vida de alguns expostos sobreviventes. Histórias de vidas que podem contribuir para a História da própria região

Na nossa base de dados temos 16 expostos da Roda de Torres Vedras, com nascimentos entre 1832 e 1881, 10 deles com fortes ligações à área do nosso estudo, dos quais sabemos terem nascido pelo menos 34 filhos.

José Martins é o exposto supra referido, que em 1789 foi encontrado à porta de José Gomes, dos Casais do Rijo e que a Câmara de Torres Vedras entregou à Ama Maria Quitéria, dos Campelos. Casou em primeiras núpcias em Janeiro de 1816, com Luiza da Conceição, dos Casais dos Rijos, que faleceu em Fevereiro do ano seguinte, voltando a casar com Luiza Maria, natural do Casal das Quintas, em Janeiro de 1819, ficando a viver em Campelos.

Deste casamento nasceram em Campelos pelo menos 7 filhos, entre 1821 e 1833, dos quais pelo menos três casaram nas proximidades, donde há pelo menos 20 netos.

Temos 485 descendentes deste José.

O seu neto José Martins Nunes, nascido no Bombarral em 1858, casou com Justina Rosa, também ela exposta da Roda de Torres Vedras, em Fevereiro de 1889, na Igreja de Santa Maria do Castelo, a noiva tinha 18 anos. Foram pais de 11 filhos, nascidos em Campelos, entre 1899 e 1914, donde descendem pelo menos 33 netos todos nascidos na mesma localidade268.

265

A.M.T.V. Livro de Acórdãos da Câmara de Torres Vedras, nº 25 (1812-1818), p. 57, vide Anexo 5. 266

A.M.T.V. Livro de Acórdãos da Câmara de Torres Vedras, nº 25, Agosto de 1814. 267 RIBEIRO, José Silvério, op. cit., p. 175.

268

81 Maria Domitilde terá nascido em 1836, casou a 20 de Novembro de 1873, em Santa Maria, com José Faustino, natural de Campelos, e deste casamento nasceram três filhos, só uma chegou a adulto e casou, dando-lhe 5 netos269.

Manuel dos Santos terá nascido em 1848, exposto baptizado na freguesia do Maxial, casou em S. Lourenço dos Francos em 20/2/1882, com Catarina Maria, viúva, natural da Serra de El Rei, e nesta data legitimaram a filha Elvira já baptizada em 1880, tiveram uma outra filha em 1882, ambas nascidas em Ribeira de Palheiros. A Catarina já tinha pelo menos 6 filhos do anterior casamento e vivia no Casal das Quintas, próximo da Ribeira270.

Delfina Maria da Conceição, é referida em vários registos como exposta de Torres Vedras, umas como tendo sido baptizada em Stª Maria, outras no Turcifal, mas não encontrámos o seu registo de baptismo. No casamento com Francisco Henriques realizado na Moita dos Ferreiros, em 5/2/1861, tinha 17 anos, diz que era exposta, mas depois recolhida pela mãe. Ficou a viver naquela freguesia, e teve pelo menos 7 filhos271.

Salvador Martins terá nascido em 1867, filho de Maria Felícia, apresentado no Hospício da Vila, casou a 10/2/1897, em Santa Maria, com Maria Gertrudes, nascida em Casal dos Rijos, do qual nasceu um filho nesta localidade, que temos sem qualquer outro dado. O Salvador faleceu em Casais dos Rijos em 1941, viúvo desde 1926272.

A Ângela da Conceição terá nascido em 1875, morava no Casal do Carregado, Campelos, foi mãe de Rosalina em Abril de 1899, casou em Dezembro desse ano com Joaquim Fernandes da Aldeia Grande, Maxial, e não temos mais informação273.

Joana Maria que terá nascido em 1878, casou com 19 anos, a 19/10/1897, com José Antunes, natural de Campelos, viúvo de Luiza Maria, de quem tinha 4 filhos, não se conhece filhos da Maria Joana274.

Outra Joana Maria, nascida por volta de 1881, desconhecemos a data de casamento com José Francisco Antunes, natural de A dos Cunhados, viveram em Campelos, e tiveram pelo menos 5 filhos, 3 faleceram em crianças, o Raul casou e viveu no mesmo lugar, foi pai de 6 filhos, a Maria teve um filho em Campelos e casou em Castelo de Paiva275.

Romão dos Santos sabemos que era pastor, e foi pai de 2 filhos nascidos na Ribeira de Palheiros, um por volta de 1907, de uma mãe que tem pelo menos mais dois filhos gémeos com outra paternidade276.

Como em relação aos expostos de Torres Vedras só quisemos fazer uma breve

269 Ibidem. 270

A.N.T.T. Registos Paroquiais de Santa Maria do Castelo, Torres Vedras, e de Miragaia, Lourinhã. 271

A.N.T.T. Registos Paroquiais de Moita dos Ferreiros, Lourinhã.

272 A.N.T.T. Registos Paroquiais de Santa Maria do Castelo, Torres Vedras. 273 Ibidem. 274 Ibidem. 275 Ibidem. 276

82 abordagem, só encontrámos mais um baptismo de um dos expostos da base de dados, o de Benedito Aniceto, cuja ligação é com as proximidades da área do nosso estudo, com Marteleira e com Papagovas, ambos os lugares pertencentes à freguesia de Miragaia.

O Benedito foi baptizado a 30/3/1832, na Igreja de S. Tiago, tinha entrado na Roda pelas 8 horas da noite, foram padrinhos Jerónimo Pereira, Tesoureiro, e Maria Joaquina, ajudante da Roda. Não temos dúvidas sobre esta identidade porque felizmente o pároco da Carvoeira, no registo do seu casamento, em 3/2/1858 escreveu: “filho da Santa Casa da Misericórdia de Torres Vedras, baptizado na Freguesia de Santiago aos 30 de Março de 1832, consta do livro primeiro dos expostos a f. 95, casou com Violante dos Santos, natural de Almagra, Carvoeira, para onde foram residir”277. Ele já deveria trabalhar para o Marquês do Lavradio, na sua Quinta da Conceição, próximo daquele lugar, pois a filha Gertrudes nasceu nesta Quinta em Setembro de 1860, e nesta data era pastor de ovelhas. Sabemos de mais três filhos dois deles nascidos em Gibraltar, freguesia de Ponte do Rol, um em 1866 e outro em 1878, a família mudou de residência, a filha Gertrudes casou na Ponte do Rol, e teve pelo menos 3 filhos, o filho Maximiano casou na Vila da Lourinhã, e a filha Margarida casou com Francisco Dias Sarreira em Agosto de 1899, na Igreja de S. Lourenço dos Francos, ambos naturais da Ponte do Rol, mas ele morava na Marteleira, onde era lojista, aqui viveram e tiveram só dois filhos, porque o marido morreu em 1905 278.

Outra área que também poderá conter mais informação sobre os expostos são os dotes, dados em vida ou nos testamentos, deixamos um atribuído por Inácio Ferreira Campello, advogado, em Torres Vedras, no seu testamento feito em 3 de Outubro de 1854, deixou um dote para uma exposta, nos seguintes termos:

“(…)Estes meus legatários ficam obrigados a dar à Exposta Catarina, que foi criada em casa da minha vizinha Joana, viúva de Bento a quantia de cem mil réis quando ela se casar ou emancipar (…)”279

.

No Arquivo Municipal de Torres Vedras há 25 livros de Registos de Expostos, desta Vila, da de Mafra e da de Lourinhã, e muitos outros documentos de pagamentos a Amas, à espera de um estudo aprofundado, com datas limites de 1788 a 1888.

Só essa investigação poderá permitir perceber se a Roda esteve sem funcionar algum tempo, como parece ter ocorrido, pela noticia escrita por Vitor Ribeiro, em que refere que em 1865 a Junta Distrital aprovou a criação de algumas Rodas, entre elas uma em Torres Vedras280.

Há muito por investigar e estudar sobre os expostos de Torres Vedras, não sendo objectivo do nosso trabalho analisar a temática nas mais multivariadas dimensões, deixámos

277

A.N.T.T. Registos Paroquiais de Carvoeira, livro Casamentos nº 5, assento 2 de 1858, p. 21v. 278

A.N.T.T. Registos Paroquiais de Ponte do Rol e de Dois Portos, Torres Vedras, e Miragaia, Lourinhã. 279 O testamento diz que está registado no Liv. Nº 44 dos testamentos, pp. 43v-47, em 6/11/1854. 280

83 pelo menos este pequeno apontamento, na expectativa de motivar possíveis interessados em efectuar pesquisas aprofundadas.

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