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4. A PROTEÇÃO DA PRIVACIDADE DO TRABALHADOR NA VIGÊNCIA DO

4.2. A privacidade do trabalhador no ambiente de trabalho

4.2.6. Vigilância da saúde e do estado de gravidez

81 Em matéria atinente aos dados relativos ao estado de saúde e de gravidez da trabalhadora prevalecem as disposições acerca da proibição à exigência de testes e exames médicos na constância do contrato de trabalho. É que nestas situações está em causa a proteção às esferas íntima e privada dos trabalhadores. Se por um lado é inadmissível a exigência de testes e exames, bem como informações relacionadas ao estado de saúde e de gravidez do candidato a emprego, o mesmo se pode dizer em relação aos trabalhadores na vigência do contrato de trabalho.

O conhecimento de dados desta natureza pelo empregador gera um risco acrescido aos direitos fundamentais e de personalidade do trabalhador, na medida em que podem ser utilizados para fins de discriminação e assédio. No Código do Trabalho, esta tutela decorre da conjunção de diversos dispositivos, nomeadamente a proteção à exigência de dados pessoais de saúde e gravidez, no artigo 17.º, número 1, alínea b), a vedação à submissão e exigência de testes e exames médicos no artigo 19.º, e também o direito à igualdade no acesso a emprego e no trabalho do artigo 24.º, a proibição de discriminação do artigo 25.º, a proibição de assédio do artigo 29.º e o dever de informação do artigo 106.º.

Sem prejuízo de outros fatores, a frequência com que as questões relacionadas ao estado de saúde e gravidez aparecem no código revelam o cuidado do legislador em relação a estas informações. No plano comunitário, a matéria é tratada na Diretiva Diretiva 92/85/CEE, Diretiva 2007/30/CE e Diretiva 2014/27/UE.

A proteção à privacidade relativamente a informações de saúde e gravidez encontra limites, também, em matéria relativa a saúde e segurança no trabalho. Isto porque na medida em que tem grande relevância a proteção da privacidade do trabalhador, a proteção de sua saúde e segurança, e a proteção à saúde e segurança de terceiros revelam um grau de importância similar.

Neste sentido, ao tratar da proibição da exigência de informações relativas a saúde ou estado de gravidez do trabalhador, o Código do Trabalho estabelece certas condições e requisitos para que seja afastada essa proteção. O artigo 17.º, número 1, alínea b) e número 2 determina que nestes casos, é necessário o cumprimento simultâneo dos seguintes requisitos:

82 − particulares exigências inerentes à natureza da atividade profissional justifiquem a exigência de informações relativas a saúde ou estado de gravidez

− seja fornecida justificativa por escrito

− e que as informações sejam prestadas a médico, que não pode revelar o seu conteúdo, limitando-se a atestar a aptidão ou não do trabalhador para a realização da atividade

Assim, é possível que se justifique a exigência de exames médicos periódicos182

de audiometria a trabalhadores que operem máquinas pesadas e de espirometria a trabalhadores expostos a fumos, por estarem em causa a saúde do trabalhador. Justificam-se também exames médicos periódicos a pilotos de avião e testes de diagnóstico do vírus HIV a um enfermeiro instrumentista, por estar em risco a segurança e a saúde do trabalhador e de terceiros e de testes de gravidez a mulheres que trabalhem em condições altamente insalubres como as funções que as exponham a radiações não ionizantes, agentes químicos e biológicos.

De outro lado, é recomendável, em atenção ao cumprimento do dever de informação que tem o trabalhador em relação ao empregador, que o empregado comunique ao empregador, sobretudo quando orientado por médico, a existência de condições de saúde supervenientes que requeiram algum tipo de tratamento diferenciado voltado à proteção da saúde ou segurança do trabalhador ou, ainda, da saúde ou segurança de terceiros, nomeadamente a mulher que, laborando em condições insalubres, fique grávida, ou do motorista que passa a fazer uso de medicação que o impeça de conduzir veículos automotores.

Em relação ao contrato de trabalho do praticante desportivo, a natureza da prestação laboral impõe uma aproximação entre os aspectos da vida privada do trabalhador, no que diz respeito à saúde, e a vida profissional. Trata-se de uma limitação, decorrente da Lei, ao direito à reserva da intimidade da vida privada183.

De tal sorte que se verifica a constante submissão do trabalhador a testes e exames médicos, e a dietas específicas com vistas à melhora garantia da saúde do atleta,

182 MARTINEZ, Pedro Romano. Direito do trabalho... cit., p. 468.

83 embora sejam também destinados à melhora da aptidão física e incrementos de performance e rendimento.

A previsão decorre expressamente do regime jurídico do contrato de trabalho do praticante desportivo, Lei n.º 54/2017, de 14 de Julho, em suas alíneas b) e c) do artigo 11.º, alínea d) do artigo 13.º e n.º 2 do artigo 32.º. A legislação revoga a Lei n.º 28/98, que trazia previsão semelhante. Trata-se de mais uma exceção à proibição à submissão e a exigência de testes e exames médicos, fundada, sobretudo, na proteção à saúde e a segurança do empregador. Neste caso, é importante atentar para o fato de que a Lei estabelece um ônus bilateral na medida em que é dever da entidade empregadora a submissão do trabalhador a testes e exames e, ao mesmo tempo, dever do trabalhador de submeter-se a esses testes. Em virtude disto, entendemos ser dispensável o fornecimento de justificativa por escrito, nos moldes do Código do Trabalho, embora, em virtude da omissão legislativa, entendemos serem aplicáveis as regras atinentes ao sigilo quanto as informações relacionadas à saúde e a prestação destas informações ao médico184.