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CAPÍTULO 2 – Antecedentes sócio-históricos à Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora

2.4 A Vigilância em Saúde do/a Trabalhador/a

O debate da Vigilância em Saúde do/a Trabalhador/a – VISAT é anterior à instituição da Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora – PNSTT. Na verdade, considera-se um desdobramento do Sistema Único de Saúde – SUS e das ações de Vigilância em Saúde48. Todavia, consta também nesta Política, como objetivo prioritário, o

fortalecimento da VISAT.

Segundo a PNSTT, este objetivo será alcançado mediante:

a) identificação das atividades produtivas da população trabalhadora e das situações de risco à saúde dos trabalhadores no território; b) identificação das necessidades, demandas e problemas de saúde dos trabalhadores no território; c) realização da análise da situação de saúde dos trabalhadores; d) intervenção nos processos e ambientes de trabalho; e) produção de tecnologias de intervenção, de avaliação e de monitoramento das ações de VISAT; f) controle e avaliação da qualidade dos serviços e programas de saúde do trabalhador, nas instituições e empresas públicas e privadas; g) produção de protocolos, de normas técnicas e regulamentares; e h) participação dos trabalhadores e suas organizações (BRASIL, 2012).

Estas ações visam ultrapassar a dimensão assistencial que prevalecia, e ainda prevalece, nos primeiros programas de saúde do trabalhador, anteriores ao advento do Sistema Único de Saúde – SUS e precursores dos Centros de Referência em Saúde do/a Trabalhador/a

48O termo vigilância em saúde nos remete à palavra vigiar, que significa, de acordo com o Dicionário Michaelis, estar atento

a, observar atentamente, cuidar atenciosamente, espreitar, ficar de guarda, estar de sentinela, cuidar, acautelar -se, precaver-se. Disponível em:<http://michaelis.uol.com.br/busca?id=4bqam>. Acesso em: 20 de novembro de 2016. No campo da saúde, a Vigilância está relacionada às ações de promoção e atenção à saúde dos cidadãos e aos mecanismos adotados para prevenção de doenças. Conforme a Portaria n.° 1.378 de 9 de julho de 2013, que regulamenta as ações de Vigilância em Saúde, esta “[...] constitui um processo contínuo e sistemático de coleta, consolidação, análise e disseminação de dados sobre eventos relacionados à saúde, visando o planejamento e a implementação de medidas de saúde pública para a proteção da saúde da população, a prevenção e controle de riscos, agravos e doenças, bem como para a promoção da saúde”.

– CEREST, possibilitando caminhar para ações preventivas, como a intervenção nos ambientes, processos e formas de organização do trabalho, que afetam diretamente a condição de saúde da classe trabalhadora (VASCONCELLOS, et al, 2014).

Assim, os pressupostos elencados determinam a articulação da Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador – RENAST, juntamente com os Centros de Referência em Saúde do Trabalhador – CEREST, desenvolvendo atividades de intervenção e mobilização, relacionadas aos processos de trabalho e às condições em que o trabalho se realiza.

Essas conclusões são calcadas na Portaria n. 3.120, de 1° de julho de 1998, que aprova a Instrução Normativa de Vigilância em Saúde do Trabalhador no SUS, com a finalidade de definir procedimentos básicos para o desenvolvimento das ações correspondentes. Essa normativa respeita as particularidades regionais, com características culturais e populacionais específicas, mas também delimita parâmetros de atuação.

Desse modo, a Vigilância em Saúde do Trabalhador pressupõe a articulação com o modelo epidemiológico49 de pesquisa dos agravos, nos diversos níveis da relação entre o

trabalho e a saúde, agregando ao universo da avaliação e da análise, a capacidade imediata da intervenção sobre os fatores determinantes dos agravos à saúde da classe trabalhadora (BRASIL, 1998).

Ainda conforme a Instrução Normativa de Vigilância em Saúde dos Trabalhadores, a VISAT pauta-se nos seguintes princípios: a) Universalidade, compreendendo todos os trabalhadores, independentemente do vínculo empregatício e/ou do tipo de inserção no mercado de trabalho; b) Integralidade das ações, tendo em vista a atenção integral à saúde dos trabalhadores; c) Plurinstitucionalidade, no que se refere às redes e sistemas, entre diferentes instâncias; d) Controle Social, incorporando os trabalhadores e suas organizações representativas; e) Hierarquização e descentralização, considerando as ações em nível municipal, estadual e nacional do SUS; f) Interdisciplinaridade, visando contemplar todos os saberes em um espaço multiprofissional; g) Pesquisa-intervenção, que afirma a necessidade de articulação entre teoria e prática; h) Caráter transformador, caráter proponente de mudanças dos processos de trabalho a partir das análises tecnológica, ergonômica, organizacional e ambiental efetuadas por todos os envolvidos.

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De acordo com o Dicionário Michaelis, “epidemiologia é o ramo da medicina que pesquisa as diferentes epidemias, as suas causas, sua natureza, seus sintomas e formas de propagação, sua frequência, seu desenvolvimento e meios de tratamento e prevenção”. Disponível em:<http://michaelis.uol.com.br/busca?r=0&f=0&t=0&palavra=epidemiologia>. Acesso em: 20 de novembro de 2016.

Em consonância ao que fora firmado na década anterior, a Portaria GM n. 1679 de setembro de 2002, dispôs sobre a reestruturação da Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador no SUS, a ser desenvolvida de forma articulada entre os Ministérios da Saúde e as Secretarias de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Articulando a reestruturação da RENAST com as ações da VISAT, observa-se que ambas só fazem sentido se articuladas aos demais serviços da rede do SUS, orientando-os e fornecendo retaguarda em suas práticas, de forma que os agravos à saúde relacionados ao trabalho possam ser atendidos em todos os níveis de atenção do SUS, de forma integral e hierarquizada (BRASIL, 2002).

Em consonância com Vasconcellos, et al (2014), “[...] o nosso entendimento de vigilância em saúde do trabalhador é aquele que segue os seus pressupostos e culmina, necessariamente, com ações concretas de intervenção no mundo do trabalho, sempre com um caráter transformador e efetuado com a participação dos trabalhadores”. Os autores ainda ressaltam a necessidade de relacionar a prática com os dados sobre a situação da morbidade e mortalidade da população, como embasamento das ações e como meio para dialogar e alertar a população sobre sua real situação inserida no sistema de vigilância em saúde.

Ainda nesse sentido, as mudanças nas condições de trabalho geradoras de agravos ocorrem, de fato, quando os próprios trabalhadores demonstram força política e passam a exigir mecanismos de transformação do ambiente e melhores condições de trabalho, não como uma ação de responsabilização individual, mas como um processo de lutas e de disputas coletivas no espaço de correlação de forças. Nesse processo, os sindicatos e organizações representativas dos trabalhadores são parceiros indispensáveis na realização das ações de vigilância. E cabe aos CERESTs regionais e estaduais, estabelecerem alianças e laços de confiança com os diversos movimentos sociais e com representantes da classe trabalhadora, como sindicatos, conselhos, fóruns, delegacias do trabalho e hospitais.

A VISAT significa o princípio da responsabilidade múltipla das instâncias sociais envolvidas nos processos concretos construídos ou a serem construídos a partir das questões apresentadas pelos atores sociais envolvidos. A VISAT é heterogênea e complexa, envolve a sociedade e o Estado, imbricados nos desafios da reprodução social e da sustentabilidade do modo de produção existente (MACHADO, 2005).

Destarte, o campo Saúde do/a trabalhador/a necessita de intervenção consciente na contramão – dos aspectos negativos – da construção histórica da Cultura Política brasileira. Esta se constitui num dos obstáculos fundamentais para a consolidação da atenção integral à saúde e para a garantia do acesso aos direitos sociais. O caminho a ser percorrido está no

reconhecimento da capacidade organizativa e combativa da classe trabalhadora, além da conscientização da população como um todo a respeito do processo histórico-social do campo do trabalho, que está em constante transformação.

CAPÍTULO 3 – Os espaços de participação social na realidade brasileira no contexto da