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Capítulo 3 – Revisão de literatura

3.2. Os jovens adultos – Características de grupo e riscos sexuais associados

3.2.3. Riscos para a saúde sexual dos jovens

3.2.3.2. Infeções sexualmente transmissíveis (ISTs)

3.2.3.2.1. VIH/SIDA

O Vírus da Imunodeficiência Adquirida (VIH) é um agente infecioso que após um período mais ou menos prolongado de tempo leva ao chamado Síndrome de Imunodeficiência Humana (SIDA) e eventualmente à morte do indivíduo infetado. Até ao momento, os esforços empreendidos para desenvolver uma cura ou vacina para o VIH revelaram-se infrutíferos, em grande parte devido às próprias características do vírus. Apesar de existirem atualmente medicamentos bastante eficazes para o seu tratamento e que permitem inclusive a melhoria da qualidade de vida dos indivíduos infetados pelo VIH e o aumento da esperança de vida, contínua a ser da maior importância a mudança de comportamentos de risco, de forma a diminuir o seu contágio.

A transmissão do VIH só pode ocorrer por via horizontal - sexual e sanguínea - e vertical – materno fetal. Quanto à via de transmissão sexual, as secreções sexuais de uma pessoa infetada, mesmo que aparentemente saudável, podem, com grande probabilidade, transmitir o VIH sempre que exista uma relação sexual com penetração - vaginal, anal ou oral - sem preservativo. O risco é potenciado em relações sexuais com parceiros desconhecidos, múltiplos ou ocasionais, pelo que o uso do preservativo é imprescindível. É importante ter em conta que basta uma relação sexual não protegida com uma pessoa infetada para haver possibilidade de contrair o VIH.

risco de transmissão do VIH. A principal causa de transmissão por esta via ocorre através da partilha de agulhas, seringas e outros objetos contaminados pelo VIH entre os toxicodependentes que utilizam drogas injetáveis. Embora represente menor risco, não devem ser partilhados objetos cortantes onde exista sangue de uma pessoa infetada, mesmo que esteja já seco (é o caso das lâminas de barbear, escova de dentes, piercings, instrumentos de tatuagem e de furar as orelhas e alguns utensílios de manicura). Desde 1996, em Portugal, que todo o sangue usado nas transfusões sanguíneas é previamente testado, pelo que não constitui risco.

A transmissão materno-fetal pode acontecer durante a gravidez, parto ou período de aleitamento, pelo que sempre que haja alternativas à amamentação, esta deve ser evitada. Para evitar a transmissão do VIH ao feto é aconselhado que as grávidas tomem medicamentos antirretrovirais durante a gravidez (CVEDT, 2011; UNAIDS, 2008; 2010; 2011).

Quando foram detetados os primeiros casos, o desconhecimento acerca da doença era enorme e, desde então, tem-se vindo a assistir a profundas alterações. Houve um aumento significativo do grau de conhecimento científico acerca do vírus, dos efeitos que provoca no organismo, da sua epidemiologia e dos seus principais determinantes sociais (Ayres, 2002). A introdução da terapia antirretroviral tem permitido um decréscimo do número de mortes e uma maior esperança de vida nos doentes desde os anos 90 (Mocroft et al., 2002). Contudo, assiste-se a um “paradoxo epidemiológico”, ou seja, à medida que se avança no desenvolvimento de um tratamento cada vez mais eficaz, aumentam o número de indivíduos infetados. O aumento da esperança média de vida dos doentes, e a conceção de que a SIDA deixou de ser uma doença mortal para se tornar uma doença crónica, traduz-se num maior número de indivíduos infetados com vida sexual ativa. A incapacidade que a doença implicava após o aparecimento dos primeiros casos exigia que os doentes ficassem longe da população em geral, o que não acontece hoje em dia. Isto significa que atualmente se multiplicaram as hipóteses de contacto entre indivíduos portadores do vírus e indivíduos saudáveis (Ayres, 2002).

Uma das características cruciais do VIH/SIDA, que faz dele objeto preferencial de investigação e intervenção por parte das ciências sociais e humanas, e da Psicologia em particular, é o facto de o vírus se transmitir e se prevenir através de um fator comum

que é o comportamento. Por isso, a melhor forma de combater esta pandemia passa pela prevenção e mudança de comportamentos (Dias, Matos, & Gonçalves, 2002; Matos et al., 2010a).

A necessidade de desenvolver programas ao nível da prevenção do VIH/SIDA levou a que se averiguassem os fatores de risco ao nível social, psicológico e situacional, para que desta forma a ação preventiva fosse mais eficaz.

Uma vez que a vulnerabilidade face à contração do VIH/SIDA se prende sobretudo com o comportamento e com as circunstâncias de vida dos indivíduos, há que ter em conta que os fatores sociais variam ao longo do tempo, de acordo com as fases do desenvolvimento do ciclo de vida. Acresce ainda o efeito que têm os outros significativos, família, amigos, parceiros, experiência de vida, as crenças culturais e religiosas bem como o ambiente envolvente. Quer os fatores sociais quer a qualidade e eficácia dos programas nacionais de prevenção face ao VIH/SIDA são extremamente importantes, pois não se pode esperar que um indivíduo se proteja do VIH se não possuir conhecimentos adequados sobre o mesmo, se não tiver sido educado no sentido de evitar determinados comportamentos, ou se não tiver fácil acesso aos serviços especializados onde possa obter essa mesma informação e os meios para se proteger.

Para além dos fatores sociais, é preciso ter também em conta as características individuais, apesar destas últimas serem sempre afetadas pelas anteriores, sendo impossível conceber o indivíduo fora do seu meio sociocultural que lhe vai sempre influenciar as atitudes e comportamentos.

Durante vários anos conotou-se a SIDA com determinados grupos de risco, o que teve um efeito devastador na disseminação da doença pelos outros grupos. A ideia de que só as pessoas pertencentes a determinados grupos com comportamentos considerados desviantes, designadamente homossexuais, toxicodependentes e prostitutas estariam mais vulneráveis ao contágio do VIH/SIDA levou a que rapidamente se criassem estigmas e que os indivíduos não pertencentes aos referidos grupos se percecionassem como imunes ao VIH/SIDA (Amaro, 2004; CDC, 2007). Esta perceção errada foi responsável, nos últimos anos, por um aumento do VIH/SIDA entre heterossexuais (CVEDT, 2011). Este fenómeno pode relacionar-se com a perceção de vulnerabilidade e/ou de risco que os indivíduos têm em relação ao VIH/SIDA.

A perceção de vulnerabilidade face a um determinado acontecimento, conjugada com outros fatores, nomeadamente a avaliação da severidade do mesmo ou a eficácia

colocando ou não a pessoa em risco de contrair o VIH/SIDA (Gerrard, Gibbons, & Bushman, 1996). Desta forma, percebe-se também a razão pela qual os indivíduos que se envolvem em comportamentos de riscos referirem maior probabilidade de contágio do VIH/SIDA do que os outros que não têm, pois não se percecionam como vulneráveis ao contágio.

Vários outros fatores têm sido estudados como predisponentes à infeção do VIH, tais como o consumo do álcool ou drogas que, pelo seu efeito, poderão incapacitar o juízo crítico, induzindo comportamentos de risco (Amaro, 2004).

Consequentemente, os fatores associados ao contágio do VIH/SIDA são diversos sendo, portanto também várias as áreas a trabalhar quando se procura intervir na sua prevenção.

Dados relativos ao VIH/SIDA nos jovens adultos

Segundo o relatório da UNAIDS (2011), 34 milhões de pessoas, em todo o mundo, vivem com VIH/SIDA. Em 2010, foram infetadas mundialmente 2.7 milhões de pessoas e 42% dos novos casos de infeção pelo VIH ocorreram em jovens entre os 15 e os 24 anos (UNAIDS, 2011). Em Portugal, segundo os últimos resultados disponibilizados pelo Centro de Vigilância das Doenças Sexualmente Transmissíveis (CVEDT, 2011), o número total acumulado de casos de infeção VIH/SIDA a 31 de Dezembro de 2010 era de 39347, sendo que destes, 16370 são casos de SIDA, de entre os quais 83% correspondem ao grupo de indivíduos com idades compreendidas entre os 20 e os 49 anos, e 81.1% dos indivíduos infetados pelo VIH são homens. Dado que a infecção pelo VIH, após a fase aguda, passa por um longo período assintomático ou de latência clínica, até surgirem os primeiros sintomas e evoluir para a SIDA, a maior parte destes indivíduos foi, muito provavelmente, infetada durante a adolescência ou início da idade adulta.

Da análise da distribuição de casos de SIDA, por categorias de transmissão, constata-se que a maioria dos casos está associada a indivíduos que referem o consumo de drogas por via endovenosa ou “toxicodependentes” (45.5%), seguindo-se os casos associados à transmissão por via heterossexual (37.3%) e por via homossexual masculina (12.4%). Para contrariar a ideia de que a SIDA é um problema específico de determinados grupos como os homossexuais e os toxicodependentes, a Figura 2 coloca em evidência as percentagens de diagnósticos de SIDA efetuados de 2001 até 2010 e

registados pelo CVEDT (2011) nas três categorias de transmissão: heterossexual, homo/bissexual e toxicodependentes.

Figura 2 - Evolução dos casos de SIDA em função das três principais categorias de

transmissão: heterossexual, homo/bissexual e toxicodependência. Fonte: Centro Vigilância Epidemiológica das Doenças Transmissíveis extraído de www.sida.pt

A análise da Figura 2 revela uma forte tendência de subida de diagnósticos entre os heterossexuais, uma tendência de descida entre os toxicodependentes e uma estabilização entre os homo/bissexuais. Estes dados podem ser reveladores da falta de conhecimentos que ainda persiste sobre esta temática, levando a uma baixa prevalência de práticas sexuais seguras, particularmente entre os heterossexuais. Muito trabalho estará ainda por fazer no domínio da educação e da promoção da saúde sexual.