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VII Implicações sociológicas

No documento Parapsicologia Hoje e Amanhã (páginas 76-78)

As proposições de Carington estabelecem teoricamente, no campo da Parapsicologia, o problema das relações metafísicas. Trata-se de um velho problema que nada tem de extraordinário, pois desde todos os tempos os homens se viram embaraçados com ele. Mas Carington tem a vantagem de colocar esse problema em termos de hipótese científica, tomando-se a palavra hipótese no seu verdadeiro sentido científico, ou seja, o de orientação

de pesquisa. Parapsicologicamente dispomos, assim, de uma possibilidade de investigar as relações sociais paranormais, que se manifestam de maneira mais evidente no campo das manifestações espiríticas e espiritóides. Por este último termo entendamos os fenômenos anímicos e fisiológicos que podem ser confundidos com manifestações psicônicas, segundo a proposição de Carington.

Mesmo, porém, que deixemos de lado esse problema das relações de entidades extrafísicas com as criaturas humanas, no sentido de uma parassociologia de natureza mediúnica, teríamos ainda pela frente o problema das implicações sociológicas das funções psi. Não podemos ignorar no contexto social a existência dessas funções e o papel que elas exercem. A Sociologia, portanto, vê-se obrigada a desbordar dos seus limites atuais ao impacto das comprovações efetuadas pela investigação parapsicológica. Imaginemos o que isso provocaria no espírito

positivo do Comte ou Spencer e compreenderemos a reação dos sociólogos atuais a uma proposição dessa espécie. Não obstante, à semelhança da Física, que avança dia a dia e inelutavelmente nos rumos da Parafísica, a Sociologia já não mais poderá ignorar os problemas levantados pela constatação da existência das funções psi.

Na vida normal as manifestações psi ocorrem numa verdadeira gama que vai do simples pressentimento até os casos de telepatia, clarividência e precognição. No plano das ocorrências patológicas, como o demonstrou Ehrenwald, essas manifestações adquirem vigorosa significação, pois tanto podem ocasionar desequilíbrios quanto, devidamente estudadas, prevenir e corrigir os estados psíquicos anormais. Carl Wickland, da Faculdade de Medicina de Chicago, publicou há tempos um curioso livro sobre o assunto. Trata-se de um relato de suas experiências na clínica psiquiátrica. Experiências de ordem espirítica, mas que nem por isso deixam de contribuir para o esclarecimento das implicações sociológicas das funções psi. Seu livro tem o título, não raro considerado sensacionalista, mas na verdade apenas explicativo de sua posição: Trinta Anos entre os Mortos.

No capítulo final desse livro diz Wickland: "Ë imprescindível que as investigações psíquicas sejam realizadas por homens de Ciência, que dela se encarreguem homens dispostos a pôr de lado todos os preconceitos, livres de qualquer prevenção, a fim de poderem sopesar todas as provas e classificar os descobrimentos que se venham a fazer". Esse trecho nos mostra que a posição de Wickland não é espirítica no sentido místico, mas na linha do esclarecimento científico do problema, por ele não apenas investigado mas sobretudo vivido.

Casos como este do psiquiatra Wickland e os de William Crookes, Charles Richet, Gustavo Geley, William Crawford e mais recentemente os de Rhine, Soal, Price, Björkheim e tantos outros mostram-nos que as funções psi, no presente como no passado, influem até mesmo nos problemas da Sociologia da Cultura. Poderíamos ainda evocar os casos clássicos de Sócrates, Plotino, Descartes, Joana D'Arc, para acentuar a importância dessa influência no processo cultural. Isso, sem contar as múltiplas ocorrências de intuições e revelações de tipo iluminista verificadas com cientistas, artistas, escritores, poetas e músicos por toda parte e em todas as épocas.

Quando falamos, pois, de uma Parassociologia podemos considerar a proposição em dois planos: no referente às implicações de psi na vida normal ou cotidiana e no referente às ocorrências paranormais, que tanto podem ser as manifestações ostensivas de faculdades extrafísicas quanto os problemas do misticismo e da psiquiatria. As investigações parapsicológicas modificam a posição desses problemas, obrigando-nos a encará-los com mais vasta compreensão. A complexidade do aqui e do agora existenciais se mostra mais

profunda e mais exigente diante dos dados dessas investigações.

Por outro lado há a considerar todo o rol de conseqüências sociais das diversas formas de manifestação das funções psi. Declarou recentemente uma ilustre psiquiatra paulista, a Dra. Maria de Lourdes Pedroso, em entrevista à imprensa, que toda a civilização ocidental, como o demonstra a sua denominação específica de "civilização cristã", provém da ocorrência de manifestações metergéticas na Palestina. Abstraindo-nos do sentido espiritual do Cristianismo e encarando-o apenas na sua significação sociológica, principalmente nos quadros da Sociologia Cultural, teremos de dar razão à psiquiatra. As funções psi, não apenas do homem que produziu a revolução cristã, mas de todos os que foram partícipes desse movimento de importância fundamental para aquilo que o padre Chardin denomina fenômeno humano, foram realmente responsáveis pela transformação do mundo.

O fenômeno humano, portanto, implica aspectos fundamentais que foram até agora negligenciados na sua avaliação científica. A negligência decorria de fatores conhecidos: de um lado a posição retrógrada do misticismo religioso impedindo o acesso ao conhecimento do paranormal; de outro lado a barreira levantada pelo ceticismo dos que pretendiam reduzir a Ciência aos objetivos materiais. A investigação parapsicológica, como bem o afirmou o Prof. Rhine, vem arrancar o pensamento atual desse dilema desesperante ao provar-lhe cientificamente a existência de um Universo extrafísico. Liberto assim do peso do objetivo, que o próprio desenvolvimento das Ciências físicas já superou, o pensamento atual está em condições de alargar as suas perspectivas no plano do subje- tivo. E é na amplitude dessas perspectivas que podemos falar das possibilidades evidentes da Parassociologia, decorrentes do avanço já realizado em todo o mundo pela investigação parapsicológica.

Alfred Still reconhece em seu livro Nas Fronteiras da Ciência e da Parapsicologia que as provas científicas da materialização de Espíritos são realmente sérias, embora não seja necessário admitirmos que se trata de Espíritos. Se a questão de rótulo é assim tão importante chamemos a essas entidades de estruturas psicônicas. A teoria de Carington poderá servir de salvo-conduto aos fantasmas de Crookes e Richet para entrarem no mundo científico das interpretações sociais. Tanto mais que na realidade social natural há muito eles já se acomodaram.

Os homens mais ilustres, dizia Kardec, são às vezes tão fúteis que se arreceiam de palavras. Não permitamos que as palavras sirvam de barreira aos que desejam tomar conhecimento das novas dimensões da Sociologia. A expressão criada por Carington agrada mais aos que se interessam pelas novidades da terminologia científica. Ao invés dos fantasmas dos mortos, que dão calafrios a muitos espíritos positivos, deixemos que as estruturas psicônicas passeiem livremente pelo mundo dos vivos, enriquecendo com seus psícons as nossas relações sociais.

No documento Parapsicologia Hoje e Amanhã (páginas 76-78)