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1. INTRODUÇÃO GERAL

1.11. Vinagre

Segundo o Decreto-Lei nº 174/2007 de 8 de maio, que transpõe a Norma Europeia EN 13188:2000, entende-se por «Vinagre» o produto obtido exclusivamente pelo processo biológico de dupla fermentação, alcoólica e acética, de produtos de origem agrícola. Quanto à origem do «Vinagre de vinho», este é exclusivamente obtido do vinho pelo processo biológico de fermentação acética.

Contudo, de acordo com o Regulamento (EU) 2016/263, o ácido acético (também utilizado como aditivo alimentar E 260) quando diluído com água (4-30 %, em volume) pode ser utilizado como alimento ou ingrediente alimentar da mesma forma que os vinagres, de origem agrícola.

O vinagre é uma matriz hidroacética com 5-8% (m/v) ou mais de acidez, expressa em ácido acético, cuja elevada versatilidade tecnológica - solvente, extrativa, acidificante, hidrolizante, emuliente, desodorizante, conservante, desinfetante e/ou inoculante - viabiliza o fabrico de múltiplos produtos com adições (i.e. ingredientes não submetidos a acetificação). A matriz (vinagre-base) resulta seletivamente enriquecida, com um novo perfil de composição, de maior complexidade química e aromática e que proporciona novas sensações e/ou funcionalidades. Os produtos podem apresentar uma tónica ácida, agridoce, doce, salgada, aromatizada ou especiada, em função da matriz e das adições, sem, contudo, perder a característica acética sui generis, comum a todos os produtos vinagreiros (Laranjeira et al., 2013).

Os vinagres com adições possuem tradições milenares. Entretanto, a prática e a ciência das adições quase se perderam e hoje, a indústria recorre geralmente a aromatizações simples, de um tipo só de planta, fazendo macerar num vinagre simples

INTRODUÇÃO GERAL

(de vinho, sidra, álcool), durante um período de maturação (fase extrativa), frutos, plantas aromáticas ou suas partes, retirados antes da comercialização. Em alternativa, podem ser adicionados sumos, extratos ou aromas naturais. Contudo, em função das características pretendidas, as adições podem ser múltiplas, podendo ser faseadas ou realizadas numa única etapa em diversos pontos do processo: à saída do acetificador, no chamado “vinagre bruto” biologicamente ativo ou intercaladas em operações de acabamento ou envelhecimento (Laranjeira et al., 2013).

1.11.1.

Mecanismos da conservação ácida pelo ácido acético

O mecanismo de ação dos conservantes nos alimentos é variável; no caso do ácido acético, este actua como inibidor de diversas enzimas da célula microbiana, possuindo actividade anti-bacteriana e anti-fúngica; contudo, a sua atividade microbicida não resulta exclusivamente da ação derivada da descida do pH.

Enquanto agente de conservação, o ácido acético atua por três formas (Laranjeira, 1998):

por abaixamento do pH- a actividade inibidora do ácido acético, devida ao abaixamento de pH, dirige-se especialmente contra as bactérias, cujas principais espécies têm um crescimento óptimo na zona neutra ou ligeiramente ácida. Isto é válido para todas as bactérias patogénicas excepto as salmonelas e os clostrídios e para as bactérias não patogénicas acidúricas: lactobacilos, Leuconostoc e bactérias acéticas, pouco sensíveis ao ácido acético e podendo mesmo metabolizá-lo. Não obstante se observar que a ação microbicida da molécula de ácido acético ser maior com leveduras e bolores que com bactérias, estes microrganismos são mais ácido tolerantes e o ácido acético acaba por ter pouco efeito, menos ainda nos bolores que nas leveduras. Dado que na zona suportável ao paladar, a força antimicrobiana é pequena, combina-se a ação do ácido acético com procedimentos de conservação física, como a pasteurização ou a fritura, a refrigeração e/ou associa-se esta com a do sal comum e de aditivos conservantes;

por desnaturação das proteínas- que se manifesta a concentrações de ácido acético superiores a 0,5% (w/v): o ácido atravessa a membrana celular e

desnatura as proteínas do protoplasma. Observa-se que entre pH 6 e 5 a atividade do ácido duplica, atendendo a que a fração não ionizada é, nesta zona, cerca de sete vezes menor; contudo, só a pH inferior a 4,5 este aspeto assume um papel verdadeiramente importante, em virtude da proporção de ácido não ionizado - forma activa - ser elevada. Refira-se que alguns pratos cozinhados de carne e legumes com molhos ácidos se encontram nesta mesma situação (i.e. produtos com pH < 4,5);

por aumento da sensibilidade dos microrganismos e suas toxinas à ação do calor- este tipo de associação de vários efeitos, no caso pH-aw-calor, é um dos princípios básicos que se utiliza na conservação por tecnologia de barreiras. Os produtos conservados em/ou contendo vinagre (ou ácido acético), com pH < 4,5, não carecem de esterilização a temperaturas superiores a 100 ºC, pois neles apenas se podem desenvolver poucas bactérias termosensíveis acidúricas (Lactobacillaceae, Leuconostoc, Acetobacteriaceae), leveduras e bolores, estes produtores de esporos que são termosensíveis. Nestes produtos encontram-se por vezes elevado número de esporos de Bacillaceae, tanto mais altos quanto menores forem os cuidados de higiene fabril. Esta circunstância obriga a recomendar o rigoroso controlo do pH das conservas e semi-conservas ácidas e em caso de necessidade, o ajustar a valores inferiores a 4,5, por adição de aditivos conservantes ácidos.

1.11.2.

Ações secundárias do ácido acético e do vinagre para

Conservas

O ácido acético ou os seus sais utilizam-se em concentrações de cerca de 3% (w/v); a estas concentrações, o efeito combinado da acidificação, do poder microbicida intrínseco do ácido não ionizado e do abaixamento do aw, potenciado pela desidratação osmótica do açúcar (e do sal) que atuam em sinergia, também como humetantes, explica a estabilidade destes produtos. Este efeito depressor do aw é bastante pronunciado, já que a molécula de ácido acético é pequena e o ácido miscível com água em todas as proporções. Contudo, o gosto ácido, a agrura e o pronunciado efeito sobre o pH dos alimentos limitam a sua utilização como humetante (Laranjeira, 1998).

INTRODUÇÃO GERAL

Enquanto agente de conservação, o ácido acético também impõe certos efeitos secundários, tais como (Laranjeira, 1998):

Amolecimento- O sal comum endurece e seca os tecidos da carne ou pescado,

dando-lhes um aspecto e textura coriáceos, o ácido acético provoca o seu

amolecimento (tenrura). Contudo, o vinagre possui uma função aromatizante

mais acentuada e rica que o ácido acético sintético (grau alimentar), que justifica a preferência do consumidor pelas conservas e semi-conservas tradicionais em vinagre e a proteção especial que as mesmas gozam por parte de certos países.

Humetante- O ácido actua também como humetante, diminuindo a actividade

da água (aw), o que pode igualmente contribuir para a estabilidade microbiológica do alimento. Dois bons exemplos retirados da Moderna Cozinha são:

1. Os novos “agridoces” de humidade intermédia, feitos à base de pescado, de carne de porco ou de legumes, uma aquisição recente na culinária ocidental importada do Oriente;

2. Os condimentos picantes do tipo chutney, à base de frutas ou de legumes.

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