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2.1 ORIGENS E HISTÓRICO RECENTE DO CONFLITO

2.1.1 La Violencia e outros meta-eventos

Pouco mais de 50 anos após a criação dos partidos – período no qual, os dois lados, por meio de acordos, se revezaram no poder – eclodiram diversas guerras, que seriam as maiores vivenciadas pelo país. Um desses conflitos ficaria conhecido como a Guerra de los

Mil Días (1899-1902) e seria responsável pela morte de, aproximadamente, cem mil pessoas20

– a mais sangrenta do século XIX (ALVES, 2005, p.18). Esse enfrentamento ocorreu inicialmente entre representantes dos dois partidos antagônicos, numa tentativa Liberal de retirar os Conservadores do poder, porém as proporções foram aumentando e assim envolvendo outros setores da sociedade, como a formação de exércitos guerrilheiros de um

19 Segundo Buzan e Hansen, são denominados meta-eventos na área da Segurança Internacional, aqueles que produzem uma mudança crítica significativa no processo histórico, isto é, “um evento constitutivo que coloca alguns pressupostos analíticos centrais em questão” (BUZAN, HANSEN, 2009, p.218).

20 Apesar do consenso quanto à brutalidade da Guerra dos Mil Dias, há controvérsias quanto ao número de mortos. Para muitos historiadores, 100 mil mortos, número aqui apresentado, seria um dado exagerado, no entanto, este é o marcador mais utilizado em documentos oficiais quanto ao conflito.

lado – sendo esses compostos por cidadãos que faziam parte de setores menos favorecidos da sociedade – e as Forças Armadas de outro.

Por conseguinte, entre outros diversos acontecimentos, no ano de 1948, um dos grandes líderes do partido liberal, Jorge Eliécer Gaitán, foi assassinado. Segundo Alessandro Visacro (2009) este é o primeiro marco na memória coletiva colombiana, pois Gaitán estava bastante associado às questões da terra, além de ter favorecido a entrada de líderes camponeses e comunistas no cenário político nacional. Seu discurso afirmava estar além dos conflitos políticos presentes até então no país, colocando-se acima das disputas oligárquicas, e, por isso, ele conseguia mobilizar uma grande parcela da sociedade. A morte de Gaitán desencadeou uma série de motins e agitações urbanas que duraram vários dias na cidade de Bogotá e sofreram forte repressão por parte dos Conservadores (ALVES, 2005, p.20). Essa ocasião reconhecida como um dos períodos mais violentos da história colombiana ficou conhecido como Bogotazo.

Os conflitos se agravaram entre os dois partidos líderes do cenário político nacional, a partir desse episódio. Desde então, o nível de violência na Colômbia segundo Alves (ROCHLIN, 2003, p.95 apud ALVES, 2005, p.20): “não apresentou mais os níveis comuns a outros Estados latino-americanos”. A elite conservadora adquiriu uma incerteza de seus atos, por medo da reação das massas, algo que gerou revolta nos líderes liberais, certos de que a morte de Gaitán havia sido planejada e executada pelos membros da oligarquia local. “Grupos liberais e comunistas organizaram milícias camponesas de autodefesa, contra as quais os conservadores lançaram mão de unidades especiais anti-guerrilheiras e assassinos mercenários.” (ALVES, 2005, p.20). Houve, portanto, um acirramento da rivalidade entre Liberais e Conservadores, chegando ao extremo que ficou conhecido como La Violencia, episódio no qual tais divergências políticas atingiram o nível de uma guerra civil. No intervalo de 1946 a 1962, a crise civil proporcionou traumas à sociedade colombiana, na forma de homicídios, assaltos, perseguições, entre outros crimes que deixaram milhares de mortos21 e marcaram fortemente a história do país (ALVES, 2005, p.20).

Nesse período, aconteceu um Golpe de Estado22, realizado pelos militares e apoiado pela elite colombiana, que elegeu o general Gustavo Rojas Pinilla para o cargo da presidência. Entretanto, o fim do seu governo foi antecipado, já que movimentos de resistência civil reivindicavam a realização de um referendo acerca dos arranjos partidários no governo.

21 “Estima-se que aproximadamente 200.000 colombianos tenham perecido durante a Violência [...].” (ALVES, 2005, p.20).

22 Mais informações sobre como se deu o Golpe que removeu o presidente Laureano Gomez do poder em: http://web.presidencia.gov.co/asiescolombia/presidentes/55.htm

Assim, o resultado apenas endossava a ideia de divisão do poder entre os dois principais partidos políticos do país, dando origem à chamada Frente Nacional (1958-1974): “Esta foi concebida como um regime político peculiar ou uma expressão político-normativa do acordo de paz entre os dois partidos – segundo o qual os partidos Liberal e Conservador ocupariam todos os espaços da vida política e dividiriam entre si a administração das instituições estatais.” (ALVES, 2005, p.22). Entre os acordos firmados, estava a rotatividade da presidência, ou seja, a alternância entre políticos liberais e conservadores no cargo maior do Estado. Além disso, do mais alto ao mais baixo, todos os cargos políticos passaram a ser divididos igualmente entre eles. Por muitos anos, esse sistema se sustentou, gerando certa estabilidade a nível institucional, porém não houve nenhuma modificação nas ações estatais relativas aos problemas sociais e exclusão política, que seguiam se agravando (ALVES, 2005, p.22).

Dessa forma, em 1964, um dos focos de guerrilha – na região de Marquetalia – surgida na época de La Violencia, ainda sobrevivia. A fim de minimizar tal resistência e evitar que influências comunistas se espalhassem para outras áreas do território, o governo apresentou-as como uma república de pretensões independentistas e ordenou que o exército atacasse incisivamente – por meio de bombardeios – a região (PÉCAUT, 2010, p.27). Antes que todo o foco de resistência fosse dizimado, a maior parte dos combatentes e suas famílias conseguiram se retirar do local. Assim, “a vitória do Exército sobre as repúblicas independentes, para as futuras FARC, constituiu o início de uma nova guerra”. (PÉCAUT, 2010, p.28).