• Nenhum resultado encontrado

O meu trabalho com Teatro de Rua na graduação teve sua primeira turma no segundo semestre de 2015. Até a prática analisada na elaboração desta tese trabalhei com três turmas. Ao longo do processo de doutoramento, pude participar de encontros do Grupo de trabalho Artes Cênicas na Rua da Abrace, em 2017, e da Rede Brasileira de Teatro de Rua, em 2019, os quais me propiciaram um maior contato com artistas e pesquisadores, acadêmicos e não

acadêmicos que atuam e refletem sobre os mais variados teatros de rua. Segundo Turle e Trindade:

Não se trata de apenas acrescentar novos conteúdos aos já existentes, mas, principalmente, de inserir discussões sobre outro referencial estético- pedagógico, que implica abordar temáticas específicas da vida das ruas e adotar como referência estudos realizados pelos próprios fazedores- pesquisadores. (TURLE&TRINDADE, 2016, p.98)

Procurei, ao longo dos primeiros dois capítulos, estabelecer contatos com as mais variadas referências que tratam de abordar o Teatro de Rua, com preferência clara e ideológica para autores nacionais. Com isso, espero contribuir para a discussão sobre Teatro de Rua, seja na Universidade ou nas ruas, pois o espaço para o Teatro de Rua deve ser tomado em todos os ambientes. Se na década passada se discutiu sobre Teatro de Rua e teatro na rua, me parece que, atualmente, avança um certo ruído entre práticas acadêmicas e não acadêmicas, entre artistas de rua e artistas de rua que estão nas universidades. No entanto, a discussão, ao meu entender, deve ser de como os teatros de rua irão reagir em sociedades cada vez mais brutas e hostis, com inclinações e ações reacionárias, antidemocráticas, repressivas e golpistas.

Ao estruturar a metodologia para o trabalho com a turma, avaliei os semestres anteriores para buscar, dentro dos experimentos anteriores aqui já apresentados, o que seria mantido, modificado, excluído.

Ainda em uma fase preliminar de avaliação, considerei como fundamento do trabalho e base para a metodologia a ser trabalhada a seguinte perspectiva: Coletividades; Dramaturgias; Atuação. A configuração de uma estrutura que contempla os pontos que considero fundamentais ao meu trabalho com Teatro de Rua, como artista, professor e pesquisador acadêmico. Estão contidos nos três pontos acima as seguintes especificidades: Coletividades – A roda como fundamento; Dramaturgias – Cultura popular, crítica social e apropriação do espaço; Atuação – Interação com o público, prontidão e utilização do espaço.

Como área abrangente, que perpassa vida e arte temos as coletividades, as escolhas estéticas surgem das dramaturgias. Portanto, uma área envolve todos os processos desde o grupo até a cena, enquanto a outra abarca três linhas dramatúrgicas. Penso que o treinamento acontece atrelado a pequenos processos criativos, com vínculo direto entre o pensar, treinar, criar e agir.

Defini ainda que a atuação está atrelada às duas áreas, coletividades e dramaturgia, com isso pude chegar à configuração resumida na Figura 25:

Figura 25 – Organização em blocos

Figura elaborada pelo autor.

Os encontros foram organizados em três blocos, como na Figura 25. Cada bloco envolve uma sequência de processos de criação com a turma. O propósito é que, para cada bloco relacionado a determinada linha dramatúrgica, o trabalho de atuação mobiliza três elementos: a maneira de relacionar-se com as pessoas na rua, a atenção destinada à cena e alternativas de reação em cada ambiente proposto pela dramaturgia. Procurei trabalhar a escolha do espaço de maneira gradual, de acordo com cada bloco. Escolhi, então, no bloco 1, trabalhar o frontal e a semi-arena, no bloco 2, a roda e no 3, os deslocamentos. Considero que as formas de se trabalhar o espaço se relacionam com todas as formas de teatros de rua. As escolhas utilizadas tiveram como objetivo seguir uma linha formal através dos blocos. O conteúdo programático foi assim estruturado:

PERSPECTIVA HISTÓRICA

As Artes Cênicas nas ruas através dos tempos;

Século XX: experiências revolucionárias, ditaduras e o Teatro de Rua; Grupos e processos criativos;

Teatro de Rua: Abordagens no século XXI. TREINAMENTO/PROCESSOS CRIATIVOS Elementos de atuação e criação:

PARTE 1 - Teatro de Rua e suas relações com a Cultura Popular.

O(a) ator(triz) e suas relações com o espaço de representação, o(a) ator(triz) e a relação com o público, o(a) ator(triz) e o estado de prontidão.

PARTE 2 - Teatro de Rua e suas relações com crítica social.

C u lt u ra p o p u lar - B lo co 1 • Interação • Prontidão • Espaço • Frontal, • Semi-arena, • Arena • Deslocamento C rí ti ca So ci al - B lo co 2 • Interação • Prontidão • Espaço • Frontal • Semi-arena • Arena • Deslocamento Ap ro p ri ação d o es p aço - B lo co 3 • Interação • Prontidão • Espaço • Frontal • Semi-arena • Arena • Deslocamento

O(a) ator(triz) e suas relações com o espaço de representação, o(a) ator(triz) e a relação com o público, o(a) ator(triz) e o estado de prontidão.

PARTE 3 – Teatro de Rua e relação entre espaço e criação.

O(a) ator(triz) e suas relações com o espaço de representação, o(a) ator(triz) e a relação com o público, o(a) ator(triz) e o estado de prontidão.

No calendário acadêmico, eu disporia de dezenove sábados, desses, um para realização de avaliação substitutiva, que costumo deixar como margem de segurança em relação aos imprevistos do semestre — não posso correr o risco de perder algum dia e não conseguir finalizar o trabalho completo — e um para exame final, outros três foram recesso na UFGD. Logo, sobraram treze encontros, mas retirada a aula inicial, que trata de apresentação do componente e um início da contextualização histórica dos teatros de rua, restaram doze encontros, cada um com duração de três horas39. Escolhi então trabalhar cada bloco em grupos de quatro encontros cada, o que totalizou 12 encontros. Ainda tive um dia como margem de segurança, reservado para a realização de avaliação substitutiva. A sequência foi desenvolvida conforme cronograma abaixo:

1 – Recesso (Semana de recepção de calouros e calouras) 2 – Encontro Inicial – Perspectiva histórica

3 – Bloco 1 – Cultura popular 4 – Bloco 1 – Cultura popular 5 – Recesso – Feriado de Tiradentes 6 – Bloco 1 – Cultura popular

7 – Bloco 1 – Cultura popular - Apresentação 8 – Bloco 2 – Crítica social -

9 – Bloco 2 – Crítica social

10 – Encontro cancelado – Greve dos trabalhadores do transporte rodoviário 11 – Recesso acadêmico

12 – Bloco 2 – Crítica social

13 – Bloco 2 – Crítica social – Encontro extra 14 – Bloco 2 – Crítica social - Apresentação 15 – Bloco 3 – Apropriação do espaço

39Os encontros deveriam durar quatro horas cada, porém, a linha de ônibus que atende a universidade não

disponibiliza horários para que se realizem encontros com a carga horária completa. Além disso, são várias as cidades da região atendidas pela universidade. Os ônibus que vem dessas cidades também não possibilitam que os alunos e alunas participem da aula integralmente devido aos seus horários de chegada e saída.

16 – Bloco 3 – Apropriação do espaço

17 – Bloco 3 – Apropriação do espaço - Apresentação 18 – Margem de segurança – Avaliação substitutiva 19 – Reservado para exames finais

Foi vinte e cinco o número de alunos e alunas inscritas na turma. Destes, três nunca compareceram aos encontros, dois compareceram uma vez já no meio do semestre, outros seis desistiram ao longo das aulas, alguns e algumas por conta da demora nos trâmites de bolsas para recém-ingressos, e os treze demais finalizaram o processo. A turma contou com vinte integrantes do curso de Artes Cênicas, dois de Letras, um de Engenharia Florestal, um de Química e um de Engenharia Civil. Ao final, nove alunos de Artes Cênicas e quatro de outros cursos concluíram o semestre.

Ao final de cada encontro estava previsto um período para refletir e escrever sobre as sensações do dia. Ao final de cada bloco, solicitei uma reflexão sobre o período enviada por e- mail. Como proposta formal de avaliação, dividi a nota prevista em três partes: Avaliação 1 – Relatórios de cada tópico trabalhado (3,0); Avaliação 2 – Reflexões escritas sobre cada encontro (2,0); Avaliação 3 – Participação nas atividades (5,0).

Cada bloco foi dividido inicialmente em quatro encontros, dois deles no Núcleo de Artes Cênicas da UFGD e dois em espaços públicos da cidade de Dourados. O encerramento de cada período contaria com uma pequena vivência com cenas ou intervenções, ao final três curtos processos criativos seriam experimentados nas ruas.

Para definir um fio temático condutor, nos primeiros encontros deveria ser escolhido um tema, que seria explorado em todo o semestre. O procedimento surge do conceito de temas geradores proposto por Freire (1997), aliado às práticas de Boal (1988), que extrai do cotidiano de alunos e alunas o tema de suas criações.

Os encontros foram organizados sob a seguinte sequência: Debate inicial sobre o processo e encontros anteriores Jogos de aquecimento corporal

Jogos de aquecimento vocal Jogos de coletividade Jogos de prontidão

Jogos de relação com a plateia

Escrita reflexiva sobre o dia

A organização dos encontros previa a alteração das atividades conforme necessidades surgissem ao longo do processo. Nos próximos itens, trato dos blocos e como os encontros foram realizados.