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O QUE OS YORÙBA ENTENDEM POR FILOSOFIA

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A sabedoria é intrínseca à experiência humana, pois todos os seres humanos em sua caminhada acumulam experiências que resultam em filosofias com faces e fases das mais diversas, o que transforma a filosofia em saber onipresente e pluriversal. Não podemos afirmar uma única filosofia com conceitos restrito, cego e excludente, isto porque a filosofia tem como princípio o amor à sabedoria e por sabedoria se concebe a pluriversidade, a completude. Daí a importância do estudo da „filosofia de Òrúnmìlá-Ifá‟ como um grande projeto de libertação humana.

A filosofia de Òrúnmìlá-Ifá é praticada na África Ocidental, originária da Nigéria, pelos povos Yorùba, e também praticada pelos povos Yorùba que vivem no antigo Daomé, hoje Benin, no Togo e países circunvizinhos. Também se faz muito forte e presente em outros países onde houve o tráfico de negros escravizados e principalmente em lugares onde a língua Yorùbá é a base de ritual religioso.

O fato de a história mundial não ter considerado a existência do negro e a sua cultura não implica dizer que essa não existiu (e continua existindo) e é notório que o mundo se compõe de uma grande parcela de negros ou de povos de origem negra em todos os espaços sociais do planeta. Desta forma, conhecer um pouco mais do nascimento, do berço, da estrutura religiosa e filosófica da cultura Yorubá, com seu processo iniciático, é a primeira porta de entrada para conhecer, compreender e entender a filosofia de Òrúnmìlá-Ifá.

Portanto, para compreender e estudar essa filosofia, é necessário entender como o Yorùbá interpreta o mundo, a concepção de personalidade humana, como se forma um sacerdote para ser o reservatório de transmissão desse saber e qual a sua receptividade na comunidade. Para adentramos na filosofia de Òrúnmìlá-Ifá, é necessário também procedermos uma visão interpretativa cosmológica em que se desvendam seu espírito.

O modo de vida do Yorùbá consiste numa visão de mundo em que o ser humano está integrado e é integrante do próprio universo. Guessy, apud Diniz Oliveira (2003, p. 369-370), considera que a unidade de pensamento é uma

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característica da cultura em diferentes sociedades africanas. Isso não quer dizer que outras etnias, como, por exemplo, os Zulus, os Azandes, os Haussás tenham os mesmos conceitos ou crenças. Nesse sentido, a cultura Yorùbá comunga o conceito de unidade de pensamento, porém reserva suas diferenças, fato muito natural. Isto porque a filosofia Yorùbá tem por elemento essencial reconhecer a integração do ser humano com o universo, compreender a existência de unidade de pensamento; esta unidade tem por função ordenar a comunidade no sentido de preservar os símbolos, a linguagem, instrumentos e objetos utilizados. A integração com o universo e a unidade de pensamento formam toda a base da cultura material, aliada à riqueza espiritual, à religião, à crença, ao ritual e aos princípios éticos que orientam o indivíduo e a comunidade, compondo-se uma cultura imaterial.

Para compreender a integração com o universo na busca de unidade, é importante elucidar em que base filosófica está assentada a visão do Yorùbá e como o Yorùbá entende a filosofia. De certa forma, vamos encontrar um ponto em comum com a filosofia ocidental, qual seja, a metafísica. Isto não quer dizer que para justificar a filosofia Yorùbá tem-se a necessidade de buscar elementos na filosofia ocidental, muito pelo contrário, a intenção aqui é reforçar as bases de pensamento que têm por origem o transcendente. O que fortalece e amplia o entendimento para discussão da existência de uma filosofia Yorúbá e como os yorubanos veem o mundo. Appiah, apud Diniz Oliveira (2003, p. 371), narra:

A filosofia no ocidente tem suas origens assentadas em bases metafísicas, já que estuda as causas ou princípios primeiros. A metafísica é também vista como teologia, ao reconhecer como objeto O Ser mais elevado e perfeito, do qual provêm todos os outros seres e coisas do mundo. De um ponto de vista metafísico, consideram-se, em África, no âmbito da crença religiosa, grandes questões imutáveis, como a origem das coisas, a finalidade e o término da vida, a morte e a vitória sobre esta. Todos esses elementos aproximam a visão de mundo africana da metafísica ocidental.

Com Diniz Oliveira (2003), podemos discorrer um pouco mais sobre a visão de filosofia do Yorùbá, a qual tem por base a preservação dos valores ancestrais transmitidos oralmente, de geração em geração, em um processo dinâmico, na busca do conhecimento de si mesmo e no aprofundamento da realidade. A preservação dos valores ancestrais faz da sociedade Yorùbá hierarquizada, pois compete aos mais velhos transmitir aos mais novos os valores culturais.

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A hierarquia social Yorùbá se estende ao plano transcendente, momento de convergência e união das forças materiais e espirituais, ocorre interpenetração de dois mundos, e para o Yorùbá estes nunca foram separados. Compete ao ser humano se colocar em sintonia com as forças a ele dispostas, cabe esclarecer que tais forças não são e nem podem ser vistas de forma horizontal, mas sim de forma vertical e escalonada.

A visão filosófica do Yorùbá tem suas bases na metafísica, numa forma espiritualista-mística do universo, numa percepção intensa da vida, no que reflete e aprofunda a sensibilidade para o sagrado. O sagrado e profano não se separam, convivem no mesmo tempo. Para os Yorùba, a religião é uma vivência, uma experiência de vida e de mundo, na filosofia estão imbricados o logos racional e a abertura espiritual, e, como resultado, a convivência ético-comunitária do indivíduo consigo mesmo, com o outro e outros e a natureza. Não resta dúvida de que o princípio fundamental da filosofia de Òrúnmìlá-Ifá está centrado na vida quando se está presente no corpo e na vida pós-morte, porque o Yorùbá acredita que a morte não põe fim à vida. Para tanto ele acredita na intercomunhão do homem com a natureza humana e a natureza divina, que suscita, na imanência e transcendência, a completude.

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