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O setor calçadista pertence ao ramo das indústrias tradicionais, intensivas em mão de obra e tecnologicamente “dominadas pelo fornecedor”, segundo a tradicional classificação de Pavitt13. Ou seja, a

13 Pavitt propôs uma taxonomia que considera os padrões setoriais de mudança técnica e classificou os setores produtivos em três categorias: (a) dominados pelos fornecedores; (b) intensivos em produção; e (c) baseados em ciência (PAVITT, 1984).

30 dinâmica do setor depende das mudanças tecnológicas que ocorrem em outras indústrias e campos de inovação. De um lado,

[...] estão as indústrias fornecedoras, especialmente a indústria química e a indústria de bens de capital, cujos avanços tecnológicos são incorporados nos produtos fornecidos aos seus usuários;

por outro lado, a inovação em calçados é cada vez mais influenciada pelo avanço de inovações em campos como a eletrônica e os materiais que permitem a agregação de funcionalidades, de novos materiais e de novos atributos aos materiais, aos equipamentos e aos produtos finais tradicionais.

(ABDI; CGEE, 2008, p. 39).

O impacto da microeletrônica e da informática sobre o processo produtivo é maior na fase de modelagem e corte dos materiais sintéticos e do couro, porque essa é a etapa que requer maior uniformidade. Já nas etapas de costura, montagem e acabamento, processo produtivo mais fragmentado e com maior emprego de mão de obra, seu uso é menor (GUIDOLIN; COSTA; ROCHA, 2010). É essa fragmentação em etapas distintas, utilizada crescentemente a partir dos anos 90, que viabiliza seu deslocamento em níveis nacional e internacional.

O uso das tecnologias de informação e comunicação permitiu o acesso mais rápido ao mercado e às tendências da moda, o que possibilitou uma adaptação mais rápida das linhas de produtos dos fabricantes de calçados, viabilizando o encurtamento do tempo de vida da linha de modelos, dando origem a lançamentos mais frequentes (ABDI; CGEE, 2008).

A diferenciação e a ampliação do número de modelos viabilizados pelas novas tecnologias estimularam os calçadistas a buscar uma aproximação maior com o consumidor final

[...] incorporando elementos comportamentais e de conforto aos produtos. Com certeza, os investimentos das empresas da cadeia voltados para o aproveitamento das possibilidades de diferenciação do produto em termos de estilo, conforto, desempenho, entre outros atributos que são incorporados aos produtos, se intensificarão cada vez mais (ABDI; CGEE, 2008, p. 40).

Para se beneficiar, no entanto, desses avanços tecnológicos e aumentar a competitividade, a empresa precisa desenvolver capacitações em marcas próprias e em canais de comercialização e de marketing, ou seja, a capacidade de “vender” o produto ao consumidor.

Convém destacar que a questão ambiental — vista na perspectiva do desenvolvimento sustentável — vem sendo considerada um importante fator competitivo e, portanto, “[...] não pode ser desconsiderada na análise das perspectivas do setor nem do segmento de calçados” (ABDI; CGEE, 2008, p. 40).

A avaliação do padrão tecnológico levou em consideração três grupos de elementos: insumos, processos (máquinas e métodos de produção) e trabalho. Em uma escala de um a cinco, os participantes da pesquisa acreditam que o padrão tecnológico das empresas do aglomerado estudado situa-se entre dois e três. No entanto, em se tratando do segmento de calçados de maior valor agregado, onde os requisitos competitivos são maiores, o padrão eleva-se e varia entre quatro ou cinco. Esses resultados estão indicando que as empresas, sobretudo as do segmento estudado, procuram adequar-se às mudanças que ocorrem na indústria calçadista mediante a incorporação da automação em algumas etapas do processo de manufatura.

Nos últimos cinco anos, as empresas do segmento estudado investiram predominantemente na aquisição e modernização do maquinário, o que é necessário para aumentar a qualidade, diversificar e

31 diferenciar os produtos. Também foram destinados recursos a outras áreas como tecnologia e desenvolvimento de produto, adequação ao selo origem sustentável e canal direto com o consumidor, porém, esses itens receberam menos destaques nas assinalações feitas na oficina e nos questionários preenchidos pelas empresas. Isso mostra que “[...] a tradição operacional que pautou o setor por algumas décadas ainda faz eco no posicionamento estratégico das empresas. A novidade, de fato, está na série de inovações relacionadas ao mercado e aos produtos” (ZAWISLAK et al., 2014, p. 22). São essas inovações que caracterizam o segmento de calçados de alto valor agregado.

A pesquisa avaliou, ainda, as fontes de inovações das empresas, nas áreas de produto, de processo e em nível organizacional. Como um segmento tradicional da indústria, a fabricação de calçados é fortemente dependente de mão de obra, o que faz com que o treinamento de pessoal, por gerar vantagens competitivas, seja uma das principais fontes de inovação das empresas. Ao mesmo tempo, pode ser um problema em razão da falta de mão de obra qualificada para o setor.

O IBTeC e as relações com fornecedores constituem-se em importantes parceiros para o desenvolvimento e incorporação de inovações de produto e de processo. Já as mudanças organizacionais dependem da contratação de pessoal qualificado e parcerias com prestadores de serviços. Também neste último quesito parece prevalecer o padrão histórico de funcionamento do setor, centrado nas estratégias e nos recursos do processo produtivo e não na comercialização.

Quanto às formas de desenvolvimento e/ou incorporação de novas tecnologias no processo e em produtos, percebe-se, pelas respostas dos participantes da oficina, que as empresas estão preocupadas com a melhoria do processo produtivo, que seria conseguida com a incorporação de tecnologia no chão de fábrica, via aumento da qualidade dos materiais, uso do Kaizen, maquinário e grupos de qualidade. No tocante ao produto, além da preocupação com a tecnologia, as empresas buscam ampliar a produção em nichos do mercado como, por exemplo, segmentos de calçados-conforto e a introdução de melhorias do produto, tais como o uso de fechos ao invés de cadarços ou velcros para facilitar o calce.

Quanto aos gastos com P&D, os participantes da oficina concordaram com um valor em torno de 1% do faturamento anual. Esse percentual não difere muito dos observados em outros setores menos intensivos em tecnologia. Porém, a questão que se coloca é em quais áreas das empresas estão sendo alocados esses recursos, já que, no segmento de calçados de maior valor agregado, são necessários recursos crescentes nas áreas de design e inovação.

Buscou-se, na oficina de trabalho, identificar os principais gargalos que afetavam a competitividade das empresas. De acordo com o exposto pelos representantes das instituições, os problemas relacionados à cultura do segmento, à falta de engajamento e à necessidade de maior aproximação entre os agentes do aglomerado devem ser tratados em sequencia. Ou seja, “[...] uma vez trabalhada a cultura setorial, pode-se esperar um maior engajamento dos participantes e, portanto, uma maior proximidade entre eles” (ZAWISLAK et al., 2014, p. 24).

32 Com o objetivo de identificar os gargalos do setor, os participantes da oficina foram convidados a apontar os principais problemas referentes à produção, aos produtos e materiais e à filosofia do segmento; falta de informações sobre onde estão os recursos para inovação e como aplicá-los;

necessidade de desenvolver materiais alternativos ao couro sintético; e a estimular a criação de uma cultura empresarial nova que valorize o calçado feito à mão.

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