PROGRAMA DE PÓS-GRADUÇÃO EM EDUCAÇÃO PARA A CIÊNCIA
Breila Pessoa Dias
A EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM UMA ESCOLA RURAL:
contribuições para a preservação dos recursos hídricos
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação para a Ciência, Área
de Ensino de Ciências, da UNESP – Campus
de Bauru, como requisito a obtenção do grau
de Mestre em Ensino de Ciências.
Orientadora:
Profª. Drª. Jandira Liria
Biscalquini Talamoni.
DIVISÃO TÉCNICA DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAÇÃO UNESP – Campus de Bauru
Dias, Breila Pessoa.
A educação ambiental em uma escola rural: contribuições para a preservação dos recursos hídricos / Breila Pessoa Dias, 2008.
233 f. : il.
Orientadora: Jandira Liria Biscalquini Talamoni.
Dissertação (Mestrado)– Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências, Bauru, 2008.
1. Ensino fundamental. 2. Ensino por pesquisa. 3. Pesquisa participante. 4. Água. I. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências. II. Título.
A EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM UMA ESCOLA RURAL: contribuições
para a preservação dos recursos hídricos.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação para a
Ciência da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de
Mesquita Filho”,
Campus
de Bauru, como requisito para a obtenção do título de
Mestre em Educação para a Ciência.
Banca Examinadora:
Presidente: Profa. Dra. Jandira Liria Biscalquini Talamoni
UNESP-Bauru
Membro Titular: Profa. Dra. Ana Tiyomi Obara
Universidade Estadual de Maringá
Membro Titular: Profa. Dra. Ana Maria de Andrade Caldeira
UNESP-Bauru
Suplentes:
Dedico este trabalho....
Dra Ana Maria de Andrade Caldeira e Profª. Dra. Ana Tiyomi Obara, pelas sugestões e apreciações que me permitiram melhorar a apresentação deste trabalho.
Á CAPES-CNPq pelo auxílio concedido através da bolsa de pesquisa.
À Ana Grijo e à Andressa pela paciência, disposição e disponibilidade das inúmeras informações e formalidades que se fizeram necessárias.
Aos meus queridos alunos da escola rural do município de Indaial, por terem aceito participar da pesquisa.
Aos professores, diretora e coordenadora pedagógica da escola rural do município de Indaial, pela abertura e confiança que a mim atribuíram.
Aos meus amigos Rudi e Hans, que nos acompanharam na aula de campo e, também, ao Sergio Feuser e Márcia, pelo apoio nos tempos de vivência em Indaial.
À Prefeitura Municipal de Indaial, pela confiança e disponibilização do ônibus escolar para a realização da aula de campo.
Ao Conselho do Programa de Pós-Graduação em Educação para a Ciência da Unesp, campus de Bauru, pela possibilidade de ter realizado esta pesquisa em Indaial.
Aos professores deste Programa de Pós-Graduação, pelas aulas e conhecimentos oferecidos, os quais foram de suma importância para a concretude desta pesquisa.
À minha amiga, irmã, mãe de tantos momentos, meu “princípio ativo”... Zelinda, por ter me apoiado incondicionalmente e ao meu trabalho.
Ao meu amigo e irmão Reinaldo Fiumari Junior, pelo brilho que irradia a cada dia em minha vida.
À minha irmã Dri, pelo carinho, compreensão, cumplicidade, irmandade, amizade, serenidade e credibilidade que dedica a minha pessoa.
Aos meus amigos Karina, Rodrigo, Fausto, Rômulo, Rosi e Wanderlei, Fernanda Brando, Deividi, Mariana, Nadja e Grazi e Gustavo, pelas tantas alegrias e incentivos!
À minha orientadora querida, Janda, ANJO reluzente que me guiou oferecendo-me suporte profissional e afetivo para o êxito desta pesquisa.
Aos meus pais, Paulo e Ilda, pelo amor e pelo apoio incondicional que dão à minha vida e ao meu trabalho.
Aos meus irmãos Luis e Carlos, às minhas cunhadas, Camila e Valquíria e aos meus sobrinhos querido, Felipe e Gabriel, pelo amor e zelo que têm para com a minha vida.
Enfim, a todos que contribuíram direta ou indiretamente para a realização desta pesquisa.
DIAS, Breila Pessoa. A Educação Ambiental em uma escola rural: contribuição para a preservação dos recursos hídricos. 2008. 223f. Dissertação (Mestrado em Educação para a Ciência). Faculdade de Ciências, UNESP, Bauru, 2008.
RESUMO
Esta pesquisa foi motivada pela possibilidade de oferecer aos alunos de uma sétima série do
ensino fundamental, de uma escola localizada na zona rural do município de Indaial (Santa
Catarina), a ampliação de conhecimentos sobre as questões ambientais, bem como contribuir
para o desenvolvimento, nos mesmos, de um espírito crítico e questionador voltado para os
problemas localmente identificados e relacionados ao tema água. Para tanto, foram utilizados
o ensino por pesquisa e a pesquisa participante como metodologias de ensino e de pesquisa,
respectivamente, para que, com base nos pressupostos da educação ambiental transformadora,
fosse inicialmente diagnosticada a questão ambiental priorizada pela comunidade e,
posteriormente, oferecida aos alunos a oportunidade de construírem coletivamente os
conhecimentos considerados necessários para a compreensão do problema em suas diversas
dimensões - ecológica, social, política, econômica e cultural. A pesquisa foi desenvolvida
durante quinze encontros de aproximadamente uma hora de duração, ocorridos nos horários
das aulas cedidas por alguns professores daquela instituição de ensino, no período de abril a
junho e no mês de agosto do ano de 2007. Durante estes encontros foram discutidos diferentes
aspectos relativos ao tema água e aos problemas a esta associados. Acredita-se que a
contextualização dos conhecimentos teóricos trabalhados e a articulação destes com a prática
possibilitaram àqueles alunos a ampliação de suas visões sobre a questão ambiental apontada
pela comunidade na qual estão inseridos, subsidiando-os para uma participação mais efetiva
na busca futura de possíveis soluções.
DIAS, Breila Pessoa. The Environment Education in a rural school: contribution for the preservation of water resources. 2008. 175f. Dissertação (Mestrado em Educação para a Ciência). Faculdade de Ciências, UNESP, Bauru, 2008.
ABSTRACT
This research was motivated by the possibility of offering students a seventh grade of
elementary school located in the rural municipality of Indaial (Santa Catarina State, Brazil),
the expansion of knowledge about environmental issues and contribute to the development of
a critical and questioning spirit turned to locally identified problems related to the water. For
both, were used the search for teaching and the participatory research as teaching and research
methodologies, respectively. Based on assumptions of environmental education sector,
initially was diagnosed the environmental issue prioritized by the community. Later we
offered to students the opportunity to build collectively the knowledge necessary for
understanding the various dimensions of the problem - ecological, social, political, economic
and cultural. The survey was developed for fifteen meetings, during the hours of lessons sold
by some teachers, since April 2007 to June and August 2007. During these meetings we were
discussed different aspects of the theme water and various problems associated with this. It is
believed that the context of theoretical knowledge and the articulation of these worked with
the practice allowed those students the expansion of their visions about the problem raised by
the community in which they are inserted, subsidizing them for a more effective actions to
search for solutions.
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS... i
APRESENTAÇÃO... 1
CAPÍTULO I – A EDUCAÇÃO AMBIENTAL (EA)... 11
Um Breve Histórico... 11
As várias faces da Educação Ambiental... 16
A Educação Ambiental Transformadora, Crítica e Emancipatória... 22
A Educação Ambiental Formal... 30
A Política Nacional de EA (PNEA) e a Apropriação desta pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN)... 30
Meio Ambiente: conceitos e práticas ambientais... 32
Carências e Necessidades do Ambiente Escolar na Aplicação de Projetos de EA: uma reflexão sobre a realidade... 37
A Formação de Educadores Ambientais... 42
CAPÍTULO II – EDUCAR PELA PESQUISA... 47
A Pesquisa em Sala de Aula... 49
O Professor Pesquisador... 52
O Aluno Crítico e Questionador... 55
O Encontro com a Educação Ambiental... 58
CAPÍTULO III – A CONDUÇÃO DA PESQUISA... 61
Instrumentos de Coleta de Dados... 63
A Pesquisa Participante... 68
A Intervenção... 72
CAPITULO IV – RESULTADOS E DISCUSSÃO... 81
CONSIDERAÇÕES FINAIS... 162
REFERÊNCIAS... 170
ANEXOS
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Alunos durante a apresentação na Semana do Meio Ambiente... 116
Figura 2 – Aluna representando a quantidade de água no planeta... 117
Figura 3 – Aluna representando % de água salgada e doce do planeta... 117
Figura 4 - Distribuição de água doce no planeta... 119
Figura 5 - Palestra proferida na Semana do Meio Ambiente... 119
Figura 6 – A coleta de lixo na escola – Semana do Meio Ambiente... 121
Figura 7 - Parque Nacional da Serra do Itajaí – SC... 129
Figura 8 - Região do Faxinal do Bepe... 129
Figura 9 - Parque das Nascentes... 133
Figura 10 - Entrada do Faxinal do Bepe... ... 136
Figura 11 - Chegada à nascente do rio Encano... 137
Figura 12 - Visão aproximada da nascente... 138
Figura 13 – Medida da área de preservação da nascente do rio Encano... 139
Figura 14 - Grupo de Campo: nascente do Rio Encano... 141
Figura 15 - Faxinal do Bepe: área de desmatamento... 142
Figura 16 – Estudo do mapa: localização geográfica... 142
Figura 17 - Parada para o almoço... 144
Figura 18 -
Rio Encano: água in natura... 145Figura 19 - Confecção do Painel... 150
APRESENTAÇÃO
Licenciada em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual Paulista – UNESP,
Campus de Assis, São Paulo, houve a oportunidade de me envolver com temáticas diversas
das áreas das ciências biológicas, sociais e exatas. Dentre as diferentes disciplinas cursadas,
aquelas que se referiam às questões relacionadas aos ambientes naturais como a ecologia, por
exemplo, eram as que mais despertavam os meus interesses. Talvez isto esteja associado à
minha história de vida, pois passei uma boa parte dos meus períodos de infância e
adolescência inserida no Escotismo e, portanto, participando de diversas atividades
desenvolvidas em ambientes não urbanos.
Durante a minha graduação, e mesmo após o término desta, passei alguns anos
estagiando em um centro de pesquisas localizado na cidade de Indaial, Estado de Santa
Catarina, onde são desenvolvidas atividades voltadas para a preservação de uma espécie de
primata brasileiro, o Alouatta guariba clamitans ou bugio ruivo, além de práticas de Educação
Ambiental (EA) que, assim como outras atividades propostas, também objetivavam
sensibilizar os visitantes para a necessidade de preservação dos ambientes florestais e da
fauna da Mata Atlântica.
Com a disponibilidade de tempo para conviver com as realidades deste centro de
pesquisas e da comunidade local fui observando, ao longo dos anos, os diversos problemas
ambientais que existiam e que ainda existem na região de Indaial; não só aqueles diretamente
relacionados ao bugio ruivo - como a caça esportiva e para a destinação a criadouros
clandestinos – mas a devastação da Mata Atlântica para diversos fins econômicos e outros
problemas de ordem social – culturais, históricos e políticos - vivenciados por aquela
população local. Embora com o olhar ainda muito limitado, restrito mesmo, dos meus
falta de conhecimento da população sobre as possibilidades de usufruir, de forma consciente e
mais harmoniosa, dos recursos que a natureza lhes oferecia.
O tempo de convivência com aquela realidade e a série de observações que pude
ali fazer sensibilizaram-me muito com relação àquelas questões. Decidi que se havia um
caminho a ser percorrido para contribuir para a melhoria da qualidade de vida daquelas
pessoas, e se este realmente estava associado à necessidade de (re) educação das mesmas, eu
deveria, na medida do possível, oferecer-lhes a oportunidade de ampliarem seus
conhecimentos, de trabalhar os conhecimentos considerados necessários para que pudessem
conviver de maneira mais harmoniosa com o ambiente em que estavam inseridos.
Influenciada pelas convicções de um grande amigo, conheci a EA e o Programa de
Pós-Graduação em Educação para a Ciência, ao qual me vinculei como aluna regular,
passando a dedicar-me à minha formação como educadora.
De início, custou-me muito conseguir relacionar os meus conhecimentos – até
então estritamente ecológicos - com o perfil do Programa, mas acabei encontrando um
caminho que aparentemente me permitiria aproveitar os conhecimentos adquiridos durante o
meu curso de graduação, bem como aqueles acumulados em função das experiências por mim
vivenciadas durante o meu estágio em Indaial para trabalhar na área de Educação.
À medida que cursava as diferentes disciplinas oferecidas no Programa, fui
participando das discussões de assuntos da área educacional e, cada vez mais, compreendendo
a importância do processo educativo para a formação de um cidadão que apresente atitudes
condizentes com o estabelecimento de uma nova e necessária relação com a natureza.
Também houve a oportunidade de participar do Grupo de Pesquisa em Educação
Ambiental (GPEA) e, aos poucos, fui identificando quais eram as minhas reais necessidades
com relação ao futuro desenvolvimento do meu projeto de pesquisa em Educação Ambiental.
propostas iniciais de pesquisa; fui acrescentando aos objetivos já propostos minha intenção de
ir além de simplesmente “educar o homem para respeitar a natureza”, propondo e
participando ativamente de um processo educativo que permitisse a busca de uma melhor
condição de vida deste.
O fato de ter ficado por algum tempo na região de Santa Catarina resultou em certo
apego da minha parte à região que, somado ao sentimento de respeito pela comunidade e à
observação da urgente necessidade de maior zelo com o ambiente - gerado pelos diversos
problemas ambientais que ali eu havia observado - levou - me a optar por desenvolver o meu
projeto de pesquisa em uma escola rural localizada no município de Indaial. Esta escola foi
selecionada porque eu já bem conhecia alguns dos problemas que aquela comunidade
enfrentava, mais especificamente relacionados com a disponibilidade de água.
Pensei que poderia utilizar os novos aprendizados, proporcionados pelas teorias e
práticas acadêmicas vivenciadas no Programa de Pós-Graduação, para atuar visando a
estimular a comunidade da escola a se envolver e participar do processo de busca das
mudanças que pudessem trazer alguma melhoria para as condições locais. Assim, achei que
seria coerente a realização de um trabalho que envolvesse o ensino - baseado na pesquisa de
assuntos que estivessem relacionados com a realidade na qual aquele ambiente estava inserido
- e a EA, como estratégia para que estes conhecimentos ampliados possibilitassem à
comunidade o enfrentamento dos diversos problemas com relação à água.
Tem sido muito comum falar sobre os problemas associados à água nos dias
atuais. Estamos fartos de saber que num futuro relativamente próximo a água de boa
qualidade e de fácil acesso será uma raridade (e já o é em algumas regiões do nosso planeta) e
que esta será uma realidade imutável, se a demanda por parte da população mundial continuar
crescendo e se as maneiras como este recurso tem sido explorado permanecerem inadequadas.
sobreviveríamos. No entanto, como este recurso natural é aparentemente abundante, o uso
irracional e a vasta cultura de desperdício deste, parecem ser os principais responsáveis pelo
seu comprometimento.
Apesar de todo o trabalho que tem sido feito nas escolas e pela mídia, ainda são
aparentemente poucos os que sabem - ou que reconhecem - que apenas uma parcela muito
pequena de toda a água existente no nosso planeta pode ser prontamente utilizada para o
consumo humano e considerada de fácil acesso; que esta já se encontra seriamente
comprometida devido à poluição exacerbada causada pelo homem ou que já não está
disponível em algumas regiões, em função dos regimes climáticos destas. Em conseqüência,
também tem sido crescentemente explorada uma segunda parcela da água doce presente na
Terra, aquela equivalente às águas subterrâneas.
O comprometimento da qualidade da água e, portanto, a limitação dos seus usos
múltiplos tem sido conseqüência da utilização inadequada da mesma. Atualmente, pode-se
dizer que muitos já sofrem as conseqüências de uma crise mundial de água, em função da sua
distribuição naturalmente ou socialmente desigual.
O Brasil é considerado um país privilegiado com relação à disponibilidade de
água; o fato desta ser encontrada em abundância em algumas regiões parece ser a principal
causa do equívoco dos brasileiros no sentido de acharem que estarão para sempre “bem
servidos” com relação a este recurso natural. Este é, evidentemente, um olhar diminuto para a
questão, pois, neste contexto, apenas a situação local e a disponibilidade do recurso água são
consideradas, enquanto outros problemas sérios e decorrentes do mau uso desta como, por
exemplo, os que afetam os ecossistemas florestais e os aquáticos, bem como os sociais -
associados à saúde, à qualidade de vida e bem estar humano – que são característicos de cada
Segundo a WWF (2006), o Brasil conta com quase 14% de toda a água doce
disponível no planeta e abriga a maior área úmida continental do mundo - o Pantanal - e a
mais extensa floresta alagada da Terra - a Várzea Amazônica. Apesar desta privilegiada
situação com respeito à quantidade de água, nossos recursos hídricos têm sido utilizados de
forma incorreta e irresponsável - a super-exploração e despreocupação com os mananciais, a
má distribuição e poluição das águas, o desmatamento e o desperdício comprovam a falta de
cuidado para com este bem valioso e comum a todos - colocando em risco a vida de todos os
seres vivos e afetando diretamente as diversas atividades humanas.
O comprometimento da água também está associado ao processo histórico de
ocupação do ambiente pelo homem, já que esta sempre se iniciava às margens dos rios, pois
garantia o fácil acesso àquele bem indispensável à vida. Conseqüentemente, era quase
inevitável a retirada da mata ribeirinha e a utilização do corpo hídrico como receptor de
dejetos - sem qualquer tratamento prévio – o que certamente resultava em assoreamento do
leito e comprometimento da qualidade da água, ocorrência de enchentes e redução da
biodiversidade. É preciso considerar, no entanto, que as decorrências deste processo histórico
também se devem a um outro fator importante que o tem acompanhado: a falta de
conhecimento por parte do homem com respeito às diferentes possibilidades de utilização
sustentável dos recursos hídricos.
Gradativamente, o homem vem descobrindo que o conhecimento é um dos
princípios básicos e muito importantes para a prevenção de problemas e para a busca de
soluções dos mesmos. Por muito tempo o homem tem se aproveitado dos recursos da natureza
sem ter se preocupado em conhecer a dinâmica e os limites desta, caracterizando, assim, o seu
comportamento utilitarista. Os vários problemas ambientais, hoje tão evidentes, podem
mesmo ser conseqüências da - ou terem sido agravados pela - falta de conhecimento do
Atualmente, é muito comum ouvirmos frases como: “Se soubéssemos das
conseqüências, não teríamos feito isto”. Mas será que não teríamos feito, mesmo? Parece que
somente a partir do momento em que a água de boa qualidade se tornou um fator limitante nas
nossas vidas, é que os recursos hídricos passaram a ser objeto de estudos mais aprofundados,
mais detalhados e que visavam à compreensão da sua dinâmica e à posterior atuação no
sentido de preservá-los e/ou recuperá-los. Então, foram instituídas Leis e surgiram
organizações e comitês especificamente voltados para a discussão dos assuntos relacionados á
água, no intuito de reverter o quadro alarmante que se apresenta.
Ficaram claras, assim, as necessidades de mudar as atitudes do homem com
relação às formas de uso e exploração da água - inadequada ao quadro de disponibilidade e à
manutenção da qualidade da mesma - e de melhor conhecer os sistemas hídricos para poder
cuidar destes, já que sem o conhecimento é difícil compreendermos as infinitas relações de
interdependência existentes na natureza e as várias dimensões da relação do homem com esta.
A escola, instituição considerada responsável pela educação, pela oferta de
oportunidades para que o conhecimento seja alcançado, tem o professor como o elo que se
estabelece com o aluno durante um processo que possibilitará o aprendizado sobre como
conviver com a natureza de forma sustentável, equilibrada, respeitando os seus limites e
aprendendo sobre como buscar as possíveis soluções para os problemas presentes no ambiente
em que estejam inseridos.
No Brasil, o Ministério da Educação e do Desporto (MEC) publicou em 1997 e em
1998, respectivamente, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) para as 1ª a 4ª séries
(BRASIL, 1999b) e 5ª a 8ª séries (BRASIL, 1999c), acrescentando ao currículo escolar os
Temas Transversais. Coube ao conteúdo proposto para a discussão do tema “Meio Ambiente”
a abordagem de assuntos relacionados à ecologia, às ciências naturais, bem como aos
necessário, possa conviver de forma harmoniosa com a natureza, e ainda, saiba solucionar os
eventuais problemas presentes em sua vida.
Na escola, mesmo sendo o ambiente um tema transversal, a discussão de assuntos
relativos às questões ambientais acabou sendo atribuída aos professores de Ciências,
considerados como os principais (ou únicos) responsáveis pelo desenvolvimento dos já
conhecidos projetos de EA. Assim, uma grande parcela da responsabilidade de se educar o
homem para conviver melhor neste “novo tempo” passou a ser vista como uma atribuição da
EA.
Sem dúvida, esta realmente tem sido reconhecida por diversos teóricos
(LOUREIRO, 2004 a,b,c ; GUIMARÃES, 2004; CARVALHO, 2004; REIGOTA, 1994)
como uma ferramenta indispensável para o cumprimento de uma desafiante missão: a de
mudar atitudes, comportamentos que já não respondem mais aos desafios impostos pelo
mundo em que vivemos. No entanto, é evidente que estas mudanças só acontecerão se houver
a compreensão, o entendimento, o conhecimento da complexidade do todo, ou seja, do
sistema que está sendo particularmente estudado e ainda, se houver ações coletivas e efetivas
no sentido de estabelecer uma nova relação sociedade/natureza.
Para a EA transformadora e crítica, ter entendimento do todo significa também
levar em conta e compreender as outras dimensões da questão ambiental, além da ecológica,
ou seja, as sociais, éticas, políticas, econômicas e históricas. Esta perspectiva mostra a
necessidade de um novo paradigma, que exige que as discussões sejam incorporadas em todas
as disciplinas curriculares e não presentes, apenas, nas ciências naturais.
Esta abordagem interdisciplinar é necessária, pelo fato de que no estudo de uma
questão ambiental devem ser considerados os inúmeros fatores que contribuíram para que
interdisciplinarmente é fundamental para que sejam alcançadas as reais possibilidades de
mudança.
Uma vez inserida na escola, a EA tem sido realizada por meio do desenvolvimento
de projetos ambientais que, na grande maioria das vezes, são coordenados pelos próprios
professores. Estes, por sua vez, têm se mostrado carentes de uma formação profissional que
lhes permita alcançar o êxito desejado, já que encontram dificuldades para articular os
conhecimentos teóricos disponíveis com a prática necessária para formar indivíduos com uma
nova visão de mundo, críticos e capazes de agir em prol da melhoria da qualidade de suas
vidas, do ambiente em que vivem.
A EA busca munir o ser humano de conhecimentos, sensibilizá-lo para as questões
que comprometem a qualidade de vida da comunidade na qual está inserido e fazer com que
compreenda a necessidade de atuar ativamente, de contribuir, ainda que com pequenas ações,
para melhorar a qualidade ambiental.
Na escola, em função do compromisso desta com o processo educativo, devem ser
oferecidos conhecimentos e promovidas oportunidades que possibilitem ao aluno lidar
ativamente com a realidade do ambiente em que vive, participando das discussões, das
decisões e da busca de possíveis soluções para os problemas eventualmente detectados.
Assim, foi com base nos pressupostos da EA transformadora e crítica que esta
pesquisa objetivou avaliar se o ensino por pesquisa, associado a um processo participativo -
que envolveu uma série de discussões, reflexões, decisões e ações relacionadas a uma questão
ambiental importante e presente na realidade de um grupo de alunos de sétima série do ensino
fundamental de uma escola rural do município de Indaial (SC) - contribuiria não só para a
ampliação de conhecimentos específicos, mas para o desenvolvimento de um espírito critico e
questionador especialmente voltado para as questões relativas à água, bem como a
Neste sentido, foi necessário inicialmente investigar qual era a questão ambiental
que, aparentemente, se mostrava mais importante no contexto em que estava inserida a escola.
Depois, foi necessário investigar quais eram os conhecimentos prévios dos alunos sobre os
assuntos que seriam abordados para que, partindo dos conhecimentos de senso comum,
pudéssemos trabalhar no sentido de proporcionar oportunidades para a apreensão dos
conhecimentos científicos. Também foi importante fazer a divulgação - na escola e na
comunidade, durante as festividades que ocorreram por ocasião das datas comemorativas -
dos assuntos que foram discutidos com os alunos e, também, promover a aula de campo que
lhes oportunizaria conhecer e analisar as reais condições em que se encontrava a nascente do
rio que percorre a região onde está localizada a escola.
Durante todo o processo, foi mantida a abertura suficiente para que fossem
discutidas e acatadas as eventuais propostas de mudança e as sugestões que contribuíssem
para o enriquecimento da pesquisa que teve, sempre, o propósito de ser coletiva, participativa
e voltada para os interesses diagnosticados. Com isso, algumas atividades que não haviam
sido anteriormente planejadas foram incorporadas ao trabalho, procurando atender as
propostas apresentadas pelos alunos ou por outros membros da comunidade escolar que
também se envolveram mais efetivamente no processo.
Para mostrar as fundamentações teóricas que embasaram esta pesquisa e os
resultados nela obtidos, este trabalho será apresentado em quatro capítulos. O Capitulo I
aborda o histórico da EA, as faces ou alteridades da mesma e uma discussão mais
aprofundada sobre a EA transformadora, que orientou esta pesquisa. Também discute
aspectos relativos à EA no ambiente formal, ao conceito de meio ambiente e às praticas
ambientais que vêm sendo desenvolvidas nos projetos de EA; além de uma reflexão sobre as
associadas à formação dos professores que, não tendo sido devidamente preparados para
trabalhar com a EA, raramente obtêm resultados considerados significativos.
No Capitulo II é apresentado o método do Ensino por Pesquisa, utilizado durante a
intervenção realizada na escola, com base nas propostas de Pedro Demo, Roque Moraes,
Maria do Carmo Galiazzi, entre outros. Neste contexto, também são discutidas as
características do professor pesquisador e da sua relação com os alunos, bem como o perfil
dos cidadãos que se deseja formar, ou seja, indivíduos críticos, questionadores e
participativos, que saibam utilizar o conhecimento adquirido nos seus processos de (re)
construção permanente. O capitulo é finalizado com a discussão das consonâncias existentes
entre o ensino por pesquisa e as propostas da EA transformadora, que permitiram a
articulação de ambos durante a realização desta pesquisa.
O Capitulo III apresenta a metodologia de pesquisa, com uma discussão sobre os
aspectos da pesquisa qualitativa e dos métodos de coletas de dados, com enfoque na Pesquisa
Participante que, segundo Carlos Rodrigues Brandão e Pedro Demo, se concretiza pela
necessidade de participação ativa de todos os envolvidos na pesquisa - o pesquisador e os
demais membros do grupo - e pelo estímulo constante para que haja uma participação
coletiva. Neste capítulo também são caracterizadas a escola, a comunidade, a região e é
apresentada uma descrição da intervenção que foi feita no ambiente escolar.
No Capitulo IV estão dispostos os resultados obtidos nesta pesquisa e a discussão
dos mesmos. Finalizando o texto, estão presentes as Considerações Finais e nos anexos e
apêndices estão apresentados os materiais que foram utilizados ou produzidos durante todo o
CAPÍTULO I -
A EDUCAÇÃO AMBIENTAL
UM BREVE HISTÓRICO
As décadas de 60, 70 e 80 foram marcadas por fortes impactos nas relações do homem com a natureza. Esse período fica conhecido como o momento da alienação do homem com o próprio homem e deste com a natureza. Milhares de hectares de florestas são derrubadas, bilhões investidos em armamentos, produtos tóxicos sendo usados indiscriminadamente, erosão do solo crescente em todos os países, a poluição do ar provocando doenças, mortes e comprometendo a temperatura e o clima do planeta; nos países pobres o índice de mortalidade cresce a cada dia, esgotos correm a céu aberto, a quantidade de lixo produzido é assustadora, os mananciais hídricos em estado de degradação, a fauna ameaçada e indústrias pesadas e poluidoras continuam se consolidando em escala crescente(LEÃO e SILVA, 1999 p. 23).
Se fecharmos os nossos olhos, poderemos ver nos dias de hoje, nitidamente, o
cenário apresentado acima pelos autores, pois esta é uma realidade em nossas vidas.
Este caos se iniciou nas décadas de 1950 e 1960, quando situações críticas foram
vivenciadas pelos moradores das cidades de Londres, na Inglaterra, em virtude da
contaminação do ar e de Minamata e Niigata, no Japão, quando ocorreram casos fatais de
intoxicação por mercúrio, além dos efeitos da bomba atômica (em Hiroshima) e a morte de
aves provocada pelos efeitos secundários, imprevistos, do DDT e de outros pesticidas. Todas
estas situações foram frutos de um modelo de mercado neoliberal, regido pela norma de
obtenção do maior lucro possível no menor espaço de tempo (MEDINA, 2007), numa época
em que o mercado mundial já se apresentava em ritmo acelerado de crescimento. Em vista dos
processos de industrialização, a atenção voltada para a natureza era apenas com relação à
abundância e à disponibilidade de recursos que poderiam ser explorados. A alienação do
homem, neste período da história, trouxe para o mundo catástrofes ambientais irreversíveis -
Diante de tais fatos, grupos de pessoas que se mostravam preocupadas com o
futuro do planeta e da sociedade se organizaram em manifestos contra as grandes potências
econômicas da época e contra o modo como estas se relacionavam com a natureza e
exploravam os seus recursos. Assim iniciaram-se os movimentos conservacionista, naturalista
e, também, os movimentos sociais que buscavam chamar a atenção do mundo para a crise já
instalada.
Esta era, e ainda é uma luta travada com a intenção de modificar tudo o que se
mostra nocivo com relação ao aspecto ambiental (incluindo os aspectos sociais e políticos).
Estes movimentos começaram a acontecer por todo o mundo, inclusive no Brasil, em meados
de 1968; neste último, mais fortemente a partir das décadas de 1970-1980. As preocupações
relativas ao cuidado com a natureza, ao respeito à diversidade biológica e à utilização
sustentável dos recursos naturais foram mobilizando, gradativamente, organizações
governamentais e não governamentais que se mostravam insatisfeitas com a situação criada
pelo modelo econômico mundial vigente. Estes grupos começaram a promover encontros,
discussões, com intuito de chamar a atenção do mundo para as desgraças que haveriam de
ocorrer, caso não fossem tomadas atitudes urgentes com relação ao modo de exploração da
natureza.
O primeiro grande grupo ambientalista que ficou conhecido mundialmente surgiu
em 1960, o Greenpeace. Segundo Leão e Silva (1999), este grupo foi e ainda é uma bandeira
da luta contra o capitalismo selvagem, contra a exploração irracional dos recursos naturais e o
desrespeito às diversas formas de vida. Estes e outros ambientalistas, conservacionistas e
naturalistas foram os grandes precursores das ações voltadas para a atenção - necessária e
urgente – com respeito à degradação do ambiente, ao futuro do planeta e à necessidade de
mudança de atitude do homem frente à crise ambiental. Estes movimentos pregavam a
A partir da década de 1970 surgiu, então, a primeira definição internacional de EA, adotada
pela International Union for the Conservation of Nature (IUCN), dando ênfase maior aos
aspectos ecológicos da Conservação da Biodiversidade e dos sistemas de vida (SATO, 2002).
Falava-se, inicialmente, de uma EA que objetivava o cuidado com a natureza, sob
uma perspectiva naturalista e conservacionista; da necessidade de reeducar o homem para que
este viesse a conviver de forma harmoniosa com a natureza, não comprometendo a
disponibilidade de recursos naturais às gerações futuras. O foco era conhecer o ambiente e a
forma como o homem estava se relacionando com este para, então, buscar a conservação da
natureza.
O reconhecimento internacional da EA como uma estratégia para se construir
sociedades sustentáveis data de 1975. Na primeira grande reunião mundial que ocorreu em
1972, em Estocolmo, já se incluía a EA na agenda internacional onde foi criado o Programa
Internacional de Educação Ambiental (PIEA). Num segundo encontro, em 1977, em Tbilisi,
foram estabelecidos os objetivos, princípios e estratégias para a promoção da EA (BRASIL,
2005).
A partir daí, muitos outros encontros importantes aconteceram e diversos
documentos oficiais (Carta da Terra, Relatório de Brundtland, Agenda 21, Protocolo de
Kyoto, etc) foram criados, para a implementação da EA a nível mundial e cumprimento de
leis e normas que contribuiriam para o abrandamento da crise ambiental. Durante a Rio-92 ou
ECO-92 - estabelecida em 1992, na conferência da ONU – foi produzido um documento
muito importante relativo à EA: o “Tratado de Educação Ambiental para Sociedades
Sustentáveis e Responsabilidade Global”. Este documento teve sua relevância por ter sido
criado por atores de diversas áreas do conhecimento, num evento que ocorreu paralelamente
ao da ONU, o Fórum Global ou a Conferência da Sociedade Civil. Foi neste momento que a
internalizada por outros atores da sociedade civil (CARVALHO, 1998) e que a EA passou a
assumir e incorporar características não só ecológicas, mas sociais e políticas, sendo assim
reconhecida como um processo dinâmico, em permanente construção, que objetiva a
transformação social (BRASIL, 2005).
No Brasil a EA teve seu marco na institucionalização a partir da criação da Política
Nacional de Meio Ambiente (PNMA), no ano de 1981, que destacou a necessidade da
inclusão da EA em todos os níveis de ensino e comunidades, visando a capacitar os indivíduos
para a participação ativa em defesa do meio ambiente. Mais adiante, em 1994, a Presidência
da República criou o Programa Nacional de Educação Ambiental (PRONEA), que proveu a
capacitação de gestores e educadores, o desenvolvimento de ações educativas e o
desenvolvimento de instrumentos e metodologias que contemplavam as diversas linhas de
ação da EA no nível nacional. No ano de 2002 surgiu a Política Nacional de Educação
Ambiental (PNEA), que regulamentava a EA no Brasil e buscava gerir os trabalhos
desenvolvidos em prol de uma sociedade sustentável (BRASIL, 2005). Podemos dizer que
estas foram e são concretudes conquistadas pelos ativistas, ambientalistas e pela sociedade
civil, mediante a necessidade de mudar a crise ambiental em que vivíamos e ainda vivemos.
O histórico da EA é extenso e complexo e o processo evolutivo desta foi
transformando a sua face, em função das necessidades impostas ao modo de vida humana.
Dando maior ênfase à EA brasileira, pode-se verificar que esta foi assumindo características
advindas não só dos movimentos ambientalistas, ecológicos, mas também dos movimentos
sociais, pois, no início era vista apenas como uma ferramenta indispensável para a
preservação dos ambientes naturais, da biodiversidade e dos sistemas de vida (SATO, 2002).
O olhar era voltado para o ambiente, para a natureza, para a degradação ambiental e a EA era
vista como um recurso de contemplação e veneração da natureza. Mas, as conferências de
(...) um processo de reconhecimento de valores e clarificação de conceitos, objetivando o desenvolvimento das habilidades e modificando as atitudes em relação ao meio, para entender e apreciar as inter-relações entre os seres humanos, suas culturas e seus meios biofísicos. A EA também está relacionada com a prática das tomadas de decisões e a ética que conduzem para a melhoria da qualidade de vida(SATO, 2002. p 23).
Assim, já não cabia mais à EA apenas o cuidado com a natureza, mas era
necessário também, além de reeducar o homem para a exploração sustentável dos recursos
naturais e possibilitar-lhe uma formação competente para resolver problemas comuns,
estimulá-lo a trabalhar coletivamente para alcançar seus ideais. Havia a necessidade de
trabalhar o social, o humano, o subjetivo; havia a necessidade de trabalhar a valorização do
indivíduo como um ser que possui deveres, sim, mas também direitos; direitos à educação de
qualidade e acesso ao conhecimento que lhe possibilite conquistar sua emancipação. Segundo
Loureiro (2004a), emancipação se conquista através da educação compreendida como
elemento chave para a transformação social, inspirada no diálogo, no exercício da cidadania,
no fortalecimento dos sujeitos, na compreensão do mundo conexo e integrado e na superação
das formas de domínio do capital.
Diante disto, assumindo o seu lado social, a EA passou a ter características éticas e
políticas, além das ecológicas e, a partir da década de 1980, assumiu o seu papel político na
sociedade, buscando nas teorias as responsabilidades relativas à transformação social, à
emancipação dos seres humanos.
Na área social, a EA se fortaleceu principalmente no campo pedagógico, tendo
suas raízes na educação crítica e na educação popular, defendida por Paulo Freire e outros, e
que idealiza uma prática voltada para a socialização do saber, para a formação de um sujeito
capaz de construir sua própria história de vida, que seja crítico, questionador da realidade e do
que têm sido normalmente impostas pelo sistema; alguém que não se deixe levar por mazelas
e hipocrisias do poder.
Além da preservação ambiental e da resolução de problemas afins a EA busca,
assim, a emancipação dos sujeitos, a formação de indivíduos questionadores e munidos de
conhecimentos que lhes permitam participar realmente, ativamente, expressando suas
opiniões, decidindo, buscando mudanças das características desta sociedade dominadora e
injusta que está posta, enfim, a transformação social.
Hoje, a EA assume o papel fundamental de contribuir para a melhoria da qualidade
de vida das pessoas, do mundo. Vários grupos, que compartilham os mesmos ideais no
sentido de se ter sociedades justas, trabalham para que no futuro haja qualidade de vida para
todos e mais harmonia nas relações entre o homem e a natureza. A EA é, hoje, uma realidade
que vem sendo concretizada pela luta incansável destes grupos, considerada como uma
necessidade para a transformação das atitudes de desrespeito, de alienação, de ganância e
egoísmo que têm sido praticadas em todos os espaços e contra as diferentes formas de vida
existentes no nosso planeta.
AS VÁRIAS FACES DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL (EA)
Responder à questão “O que é Educação Ambiental?” nos dias de hoje, é um tanto
desafiador. Para Layrargues (2004) a “EA é o nome que historicamente se convencionou dar
às práticas educativas relacionadas à questão ambiental” (p. 9). Segundo Reigota (1994):
De acordo com o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e
Responsabilidade Global:
A EA é um processo de aprendizagem permanente, baseado no respeito a todas as formas de vida, afirmando valores que contribuam para a transformação humana e social e para a preservação ecológica, estimulando a formação de sociedades socialmente justas e ecologicamente equilibradas, que conservam entre si a relação de interdependência e diversidade com responsabilidade individual e coletiva em níveis, local, nacional e planetário (BRASIL, 2005 p. 57).
Durante o seu processo histórico, a EA foi assumindo formas, definições e
conceitos repletos de particularidades, portanto, possui várias faces, visto que pessoas
diversas, das várias áreas do conhecimento, assumiram-na como ferramenta indispensável
para atingirem seus objetivos, sejam eles em prol de um futuro melhor ou como forma
manipulativa de poder.
Segundo Layrargues (2004), o Brasil tem desempenhado um papel importante
nesse debate e abriga uma rica discussão sobre as especificidades da educação na construção
da sustentabilidade. Enfatizando a EA no nível nacional, o autor se manifesta sobre a
existência de duas vertentes que podem ser destacadas: a primeira delas, que se consolidou no
Brasil em meados da década de 1980 e ainda está muito presente na atualidade, definiu-se
como uma “Educação Ambiental Conservadora” (EAC).
Para os partidários desta vertente da EA, falar em ambiente era pensar na
preservação do patrimônio natural e na resolução de problemas ambientais que impediam o
desenvolvimento do país. Esta EAC tinha, assim, uma forte visão comportamentalista,
tecnicista, voltada para o ensino de ecologia e para a resolução de problemas de ordem física
do ambiente(LOUREIRO, 2004a).
Neste momento da sua história, a EA assumia uma face antropocêntrica e
marcado pelo regime militar da década de 1970, quando as discussões relativas ao meio
ambiente eram regidas de forma arbitrária, levando em conta os problemas de ordem técnica e
assumindo, assim, um caráter conservador, dominador e desvinculado do todo. Era o
bem-estar do homem sobre a égide da natureza.
Ainda de acordo com este autor, no seu fazer pedagógico esta EAC passava uma
visão de mundo fragmentada, desconexa, privilegiando o ser humano sobre tudo o que está
presente na natureza. Guimarães (2004) aponta a sua definição sobre a EAC, ainda muito
freqüente nos dias de hoje:
A Educação Ambiental que denomino conservadora se alicerça nessa visão de mundo que fragmenta a realidade, simplificando e reduzindo-a, perdendo a riqueza e a diversidade da relação. Centrada na parte vela a totalidade em suas complexas relações, como na máquina fotográfica que ao focarmos em uma parte desfocamos a paisagem. Isso produz uma prática pedagógica objetivada no indivíduo (na parte) e na transformação de seu comportamento (educação individualista e comportamentalista). Essa perspectiva foca a realização da ação educativa na terminalidade da ação, compreendendo ser essa terminalidade o conhecimento retido (“educação bancária” de Paulo Freire) e o indivíduo transformado (GUIMARÃES, 2004. p 26).
Em sua prática educativa, no seu fazer pedagógico, esta vertente mostrava uma
visão ecológica, conservacionista, que tinha a preocupação de produzir práticas ambientais
que instruíssem os indivíduos para resolverem apenas problemas de cunho ecológico,
dissociando sociedade/natureza (LOUREIRO, 2004b). Não eram incluídas outras dimensões,
tais como o caráter social, político e cultural; não se objetivava a valorização do indivíduo
como um ser participativo das decisões políticas; não se englobava outros problemas de
ordem social que contribuíam para a crise ambiental. Segundo Lima (2004), este
determinismo ecológico tende a reduzir as questões ambientais a um problema estritamente
ecológico, sem incorporar as demais dimensões sociais, políticas, culturais e éticas que
Essa visão estritamente ecológica da EAC tem suas razões de ser nos
acontecimentos de ordem histórica e político institucional. Quando implantada no Brasil, a
EA foi inserida na estrutura administrativa dos órgãos públicos de meio ambiente e já trazia
consigo, da hegemonia do modelo econômico militar, uma marca ditatorial impositiva e
tecnicista. A EA foi inserida nestes departamentos porque, segundo a visão individualista
dirigida pela lógica do capital, os problemas estavam relacionados apenas à área ambiental e,
portanto, era urgente a necessidade de saná-los para garantir o desenvolvimento do mercado.
Assim, era óbvia a inserção da EA nas instituições governamentais responsáveis pelo
“cuidado” e pela gestão dos recursos naturais. Esta tomada de decisão mostra claramente a
visão antropocêntrica e uma política centralizada no poder do capital, pois, a crise ambiental
não era vista como um problema educacional, social e político, mas apenas como um
problema de ordem técnica. Neste sentido, Loureiro (2004a) afirma que:
Essa falta de percepção da EA como processo educativo, da não inclusão, desde seu reconhecimento, nas instituições educativas do governo, foi o principal problema da EA ter assumido uma face tecnicista, conservadora, descontextualizada e fragmentada (LOUREIRO, 2004a p. 81).
Neste mesmo período em que a EA era incorporada aos órgãos institucionais
nacionais de meio ambiente, paralelamente aos ambientalistas partidários da EAC, grupos de
militantes, socialistas e intelectuais das diversas áreas do conhecimento, principalmente da
área social, já promoviam encontros e debates a favor de uma EA de caráter emancipatório e
crítico. Estes encontros foram os precursores da segunda vertente da EA, que só ganhou força
a partir da década de 1990, com a criação do PRONEA. Foi então que a EA assumiu a sua
face educacional, pois este programa contava com a participação de dois ministérios, o da
Educação e o do Meio Ambiente, e alguns documentos e ações importantes foram produzidas.
Dentre as decisões tomadas então, Loureiro (op. cit.) cita a inclusão da EA no ensino formal e
ambiental como um tema transversal, articulada a todas as disciplinas educacionais de ensino
formal, bem como a Lei 9.795 de 27 de abril de 1999 - que instituiu a PNEA (Política
Nacional de Educação Ambiental) – como fatores que enfatizaram a necessidade de inclusão
da Educação na temática ambiental e do Ambiental na temática educacional.
Esta segunda vertente da EA assumiu a face que faltava na EAC, ou seja, aquela
que considera, além dos aspectos ecológicos, os sociais e políticos. Diante disso, várias
denominações foram atribuídas a este fazer educativo: Educação Ambiental Crítica;
Transformadora; Emancipatória; Ecopedagogia; Educação Popular, entre outras. Cada qual
possui suas especificidades, mas todas confluem ao acrescentarem às dimensões ecológicas,
as dimensões sociais, culturais, éticas e políticas das questões ambientais.
Layargues (2004) afirma que hoje se reconhece que para a EA ser efetiva é preciso
valorizar o substantivo presente no seu vocábulo, ou seja, a Educação (grifo meu), que antes
não era ambiental. Educar o homem para que este compreenda o mundo complexo e dinâmico
em que está inserido, onde tudo está interligado direta ou indiretamente. Para o autor, fazer da
educação uma EA, significa incluir todas as outras dimensões antes não valorizadas pela
EAC.
Tomando como exemplo a Educação Ambiental Transformadora (EAT), pode-se
considerar que esta vertente, além de tratar dos conhecimentos relativos à dinâmica dos
sistemas naturais - pois estes são fundamentais para que haja a compreensão e seja possível a
busca de solução para as alterações presentes no ambiente - transcende esta proposta e
trabalha também para que o homem esteja apto a mudar sua postura, de mero objeto do poder
para um ser emancipado, munido de conhecimento e esclarecido dos seus direitos; um homem
que saiba se relacionar com o ambiente de forma harmoniosa, respeitando os limites impostos
pela natureza, sim, mas que ao mesmo tempo seja um cidadão político, crítico, participativo,
busca “tirar a venda dos olhos” das pessoas, para que estas possam reconhecer a
complexidade presente nas questões do mundo em que vivem e o quanto o conhecimento e a
reflexão crítica são importantes para que sejam efetivadas ações no sentido de que as
mudanças, necessárias para que se construa uma sociedade justa e ecologicamente
equilibrada, possam ocorrer.
Deve ficar claro, porém, que a construção de uma sociedade ecologicamente
equilibrada também depende da valorização que é atribuída aos conteúdos das ciências
naturais, da Biologia e da Ecologia, visto que a contribuição destes é essencial para a
compreensão das alterações ambientais. Não se pode almejar uma sociedade ecologicamente
equilibrada se não houver uma atenção especial voltada para a compreensão das causas e
conseqüências dos problemas ecológicos, o que exige conhecimentos com respeito à dinâmica
e aos processos que ocorrem nos ambientes naturais para que possam ser identificadas as
formas de ação consideradas sustentáveis.
No entanto, acreditamos que os conhecimentos biológicos, por si só, não são
suficientes para garantir a compreensão do todo - que é extremamente complexo – e que,
considerando que a EA almeja que todo e qualquer ser humano seja capaz de entender e
resolver um problema e que este normalmente está imerso ou é decorrente de uma infinidade
de outras causas - cuja compreensão necessita de abordagens que envolvem outras esferas do
saber - é preciso ir além das discussões de âmbito ecológico. Para o entendimento dos efeitos
ou conseqüências de um problema é preciso conhecer suas causas e estas, muitas vezes,
provêm de um fator biológico, sim, mas biológico-social e, portanto, para entendê-las é
necessário conhecer as outras dimensões envolvidas, ou seja, as causas de ordem cultural e
política, entre outras.
Sabe-se que as ações antrópicas vêm produzindo efeitos que se refletem
indiretamente, na qualidade da vida humana e de outros seres vivos. Portanto, a articulação
dos conhecimentos biológicos, ecológicos, com os conhecimentos das ciências humanas e
sociais é que permite que um determinado problema ambiental seja realmente compreendido e
que sejam buscadas soluções para o mesmo. A EAC, sem dúvida, exerce contribuição
fundamental para a formação dos indivíduos ao disponibilizar-lhes os conhecimentos
ecológicos necessários para a compreensão das causas das alterações que ocorrem no
ambiente físico, mas deixa a desejar se não se preocupa em articulá-los com os conhecimentos
das demais áreas do saber, o que propicia ao individuo a compreensão do ambiente como um
todo.
A EDUCAÇÃO AMBIENTAL TRANSFORMADORA, CRÍTICA E EMANCIPATÓRIA.
A EA tem por princípio a transformação social para que se possa pensar, viver e sustentar um mundo melhor (GALIAZZI, 2007 p.7).
Este é um dos objetivos que a EAT se propõe a alcançar, a transformação social.
Para muitos este objetivo é um tanto utópico, mas para aqueles que acreditam na possibilidade
e almejam tais mudanças, trata-se de fazer das idéias, da teoria, uma prática responsável,
valorizando todos os aspectos que contextualizam a relação sociedade/natureza.
Como já foram comentadas, muitas atribuições têm sido designadas à EA e,
portanto, os seus diferentes adeptos trazem “achismos”, pensamentos e definições diversas
que acabam utilizando na prática de “suas educações ambientais”. Este trabalho foi embasado
na concepção da Educação Ambiental Transformadora, Crítica e Emancipatória. Esta será
doravante referenciada apenas como EAT, já que estas três qualidades representam o mesmo
ideal e que a proposta advém de teóricos que partiram de um referencial comum e seguem
No Brasil, esta vertente da EAT começou a se configurar nos anos de 1980,
embora só tenha se imposto em 1990, quando “ocorreu uma maior aproximação dos
educadores - principalmente os envolvidos com a educação popular - e das instituições
públicas de educação com os militantes dos movimentos sociais e ambientalistas, que
enfocavam a transformação societária e o questionamento radical aos padrões industriais e de
consumo consolidados no capitalismo” (LOUREIRO, 2004b p. 66).
Transformar o indivíduo e, conseqüentemente, a sociedade implica dizer que a
EAT aqui defendida deve buscar a mudança de postura dos sujeitos, considerada necessária
para que uma nova sociedade seja construída, através de uma educação que os prepare para
transcender o caráter restrito das discussões que comumente se faz sobre a degradação
ambiental. “Educar é emancipar e a emancipação é a base da transformação social”
(LOUREIRO, 2004a p. 89).
No fazer educativo a EAT, aplicada com responsabilidade e visando ao seu
objetivo, credencia votos significativos aos conhecimentos biológicos, mas incorpora em si,
além da preocupação com a gestão sustentável dos recursos naturais, a formação de sujeitos
emancipados e conscientes de seus direitos e deveres para com o ambiente em que vivem,
incluindo, é claro, o sistema econômico e político no qual estão inseridos.
Formar estes sujeitos emancipados ou (re) formá-los (grifo meu) representa um
desafio pujante. Mudança de atitudes, mudarem de vida, sair da inércia para tornar-se um
sujeito capaz de agir e de reagir, tornar-se esclarecido, crítico, político, participativo e
disposto a transformar uma realidade de vida que lhe foi imposta, é como nadar contra a
correnteza, se levarmos em conta o sistema capitalista no qual o homem está inserido. No
entanto, acredita-se que uma mudança coletiva pode permitir que o fluxo de um rio,
extremamente poluído de ganância, egoísmo e hipocrisia sejam modificados. Estes
Costumo utilizar em minhas aulas a metáfora do rio, em que o rio representa a sociedade; a sua correnteza, o paradigma dominante; o curso do rio, o processo histórico. Para mudarmos o rio (sociedade), precisamos interferir na correnteza (paradigmas) do seu curso (processo histórico). Como fazer se não quero ser carregado pela correnteza? Começar a nadar contra a correnteza ou nadar até a margem para ficar ali me segurando? Nestas duas tentativas individualizadas o esforço de resistir sozinho é muito penoso e com o cansaço, a tendência é me acomodar e me deixar levar pela correnteza. Uma terceira alternativa seria criando uma contra a correnteza, como um movimento coletivo, conjunto, de resistência e que isso poderá resultar em toda uma alteração na dinâmica hidrológica desse rio, alterando a velocidade e força do rio, transformando sua capacidade erosiva, de transporte de sedimentos, entre outros. Isso terá como conseqüência, partindo dessa nova dinâmica, a construção de um novo curso (por um processo erosivo e de sedimentação diferenciado – prática social diferenciada), transformando-o num rio diferente. Isso significa que precisamos, mergulhado nessa correnteza paradigmática, construir esse movimento coletivo conjunto, que tenha sinergia para resistir e que, nessa contraposição (luta hegemônica), busquemos alargar as brechas e contradições da estrutura dominante, fragilizando-a para, assim, interferirmos na construção de uma nova realidade (totalidade dialética)
(GUIMARÃES, 2004 p.31).
Este é um dos propósitos da EAT, ou seja, preparar o indivíduo para pensar e agir
individualmente e coletivamente, visando à “mudança do curso do rio”; e isto só será possível
através de uma educação pautada nos interesses libertários, de liberdade de escolha e de
construção própria de vida.
A EAT nada mais faz do que educar. No entanto, de um modo geral, a EA que
tem sido realizada ainda se distancia muito desta proposta, pois tem sido uma prática pautada
nas perspectivas de uma educação tradicional, tecnicista e comportamentalista. Para a vertente
transformadora, a educação deve ser pautada na construção dos conhecimentos científicos e
dos conhecimentos sociais, éticos e políticos visando à uma prática cidadã, acompanhada de
ética, de respeito à diversidade biológica, de princípios morais, de justiça social e eqüidade de
bens e valores.
Esta proposta está ancorada, dentre as perspectivas que também assumem a
também na dialética de Marx, que toma o contraditório como fonte de questionamento e
renovação, bem como na compreensão da complexidade do mundo, teorizada por Edgar
Morim e Enrique Leff. Autores como Carlos Frederico B. Loureiro, Marcos Reigota, Mauro
Guimarães, Isabel Cristina de Moura Carvalho, entre outros, também não poderiam deixar de
ser aqui citados, visto que são considerados os pilares da EAT e emancipatória no Brasil.
Estes são teóricos que propõem uma prática educativa voltada para a ideologia libertadora de
Freire; que focam, além da formação científica, a formação ética e política do sujeito, o que
faltava na EAC. Estes e outros teóricos assumiram uma educação com responsabilidade social
e política, além da ecológica, propondo um processo que valoriza o ser humano e que não
aceita a educação como um aparelho ideológico do Estado, como diz Saviani (1999) em sua
obra “Escola e Democracia”.
Neste trabalho a EA parte de referenciais teóricos que se contrapõem aos sentidos
e objetivos da EAC, seguindo pressupostos como os de Guimarães (2004), que teoriza e
idealiza a EA Crítica. Esta busca realizar uma leitura de mundo mais complexa e
instrumentalizada, para que a intervenção, como por exemplo, no ambiente escolar, se dê a
partir da compreensão que se tem do mundo complexo, dinâmico e interativo, com intuito de
transformar, mudar atitudes.
O projeto político-pedagógico de uma Educação Ambiental Crítica seria o de contribuir para uma mudança de valores e atitudes, contribuindo para a formação de um sujeito ecológico. Ou seja, um tipo de subjetividade orientada por sensibilidades solidárias com o meio social e ambiental, modelo para a formação de indivíduos e grupos sociais capazes de identificar, problematizar e agir em relação às questões socioambientais, tendo como horizonte uma ética preocupada com a justiça ambiental (CARVALHO, 2004 p.18).
A EAT idealiza a emancipação do ser no sentido de conquistar espaço próprio de
vida, justiça social e qualidade de vida. Paulo Freire, uma das referências do pensamento
como formação de sujeitos sociais emancipados, isto é, autores de sua própria história. Este
pensamento foi incorporado por todos aqueles que acreditam na possibilidade de mudança,
numa transformação que visa a um mundo justo para todos. Trabalhar com esta vertente
significa romper com a educação tecnicista, transmissora de conhecimento, na qual o aluno é
visto como objeto de trabalho para um mercado que não necessita de conhecimento, mas
apenas de treinamento.
Saviani (1999) fala da Educação tecnicista, caracterizada por um processo
educativo que é objetivo, racional, operacional e produtivo, que procura moldar o aluno ao
processo de trabalho, ao ‘jogo mercadológico’, ou seja, um processo que visa à formação de
um sujeito que, quanto mais técnico - para atender as demandas desta sociedade elitista - mais
competente e socialmente realizado será. Não cabe a esta educação formar cidadãos
esclarecidos dos seus direitos, mas apenas dos seus deveres que devem ser cumpridos sob
pena de serem rigorosamente punidos por uma “Lei” que só funciona, justamente e
brutalmente, para aqueles que não receberam uma formação acadêmica e intelectual, ou seja,
o pobre, o marginalizado, o analfabeto, o “mente vazia”, o excluído, o técnico.
A EAC traz em si certo perfil desta educação; tem belos discursos naturalistas,
mas completamente descolados de uma prática política, promovendo uma educação racional,
objetiva, fragmentada; impõe, por exemplo, que se deve jogar o lixo no lixeira, sem se
preocupar com o devido aprofundamento das discussões a respeito da questão, deixando
lacunas com relação às conseqüências da prática inadequada para a vida do cidadão; inclui,
assim, práticas descontextualizadas, pontuais, sem esclarecimentos sobre os diversos fatores
que realmente estão envolvidos num determinado problema.
Trata-se, portanto, de uma educação superficial. É como um muro sujo que recebe
uma camada de cal e que, quando vem a chuva, é lavado e mostra sua verdadeira face,
comum à EA e que condiz com a colocação feita acima sobre a camada de cal, é a velha e
conhecida prática, escolar ou não, de recolher todo o lixo do chão durante a Semana do Meio
Ambiente, período no qual, anualmente, são efetivadas diversas práticas de EA. Estas, de
certa forma, são consideradas como “um incômodo” para muitos professores e uma maravilha
para todos os alunos, pois, os professores estão fartos de ouvir e falar em EA, muitas vezes
não sabem como atingir os objetivos desta e, portanto, fazem “qualquer coisa” e “de qualquer
jeito”. Os alunos, por sua vez, acham tudo maravilhoso porque poderão sair da sala de aula.
É evidente que é bom que seja feita a coleta do lixo na escola e que esta ação surte
efeitos imediatos, mas o que ocorre é que os alunos agem assim apenas momentaneamente,
pois como não foram devidamente preparados para entender toda a problemática associada ao
lixo e, portanto, não atribuem significado algum a esta prática, espontaneamente abandonam
aquela ação considerada adequada. Só voltarão a pensar no assunto no próximo ano, na
próxima Semana do Meio Ambiente, quando novamente a comunidade escolar se envolverá
nesta mesma prática – como se tal comportamento devesse ocorrer apenas pontualmente,
como uma “homenagem” ao meio ambiente. Percebe-se, assim, que se trata apenas de uma
ação repetitiva.
Ora, se houvesse uma formação educacional que visasse ao conhecimento
necessário para que a comunidade escolar entendesse porque não se deve jogar o lixo no chão,
visto que este pode comprometer direta ou indiretamente a qualidade de vida das pessoas, esta
prática pontual deixaria de acontecer para se tornar natural e constante. Este é um dos pontos
fracos desta EAC que não explica, mas apenas promove a ação; se não há a compreensão do
problema por parte daqueles que, em maior ou menor intensidade, são responsáveis pelo
mesmo, não haverá o envolvimento destes na busca de soluções e, conseqüentemente, as
A EAT vem trazer este entendimento sobre os diversos problemas que, local e
globalmente, enfrentamos no nosso dia a dia; além da preocupação com o conhecimento,
busca preparar o indivíduo para agir, individual e coletivamente, na resolução dos problemas.
Para tanto, é necessário um trabalho educativo contextualizado. As questões ambientais já não
são mais somente “ambientais” no sentido ecológico, mas são sociais, já que são
conseqüências das ações dos sujeitos na construção de sua história e de uma sociedade
pautada na lógica do capital, responsável pela exploração destrutiva do ambiente. O homem
pratica ações alienantes, desrespeitosas, egocêntricas, mas o faz, muitas vezes, não só por
falta de conhecimento sobre a dinâmica ambiental complexa na qual está inserido, mas por
não se questionar a respeito do seu verdadeiro papel neste contexto. Acreditamos que havendo
reflexão crítica, conhecimento técnico-científico e político, entendimento e sensibilização, a
vontade de agir e o envolvimento poderão surgir de forma responsável e natural que
possibilitará as transformações necessárias.
A EA que incorpora a dimensão social em seu fazer pedagógico valoriza o
contexto, esclarecendo os problemas estruturais de nossa sociedade, os verdadeiros porquês
do atual comprometimento da qualidade de vida e dos recursos naturais, antes vistos apenas
como mercadoria, como algo externo a nós (LOUREIRO, 2004a). Assim, a EAT se propõe a
disponibilizar aos indivíduos todo e qualquer conhecimento necessário para o entendimento
dos diversos aspectos associados aos diferentes problemas ambientais, locais e/ou globais,
para que possam atuar na conquista de uma melhor qualidade de vida, associada a uma
relação harmoniosa com o ambiente.
Trabalhar sob a perspectiva transformadora, crítica e emancipatória exige a
inserção na práxis educativa de alguns conceitos até então não incorporados: coletividade,
participação, dialética e complexidade. A coletividade e a participação estão intimamente
Guimarães (2004). Individualmente não podemos mudar o paradigma dominante, mas
coletivamente isso é possível e aqui a EAT valoriza em sua práxis esta participação, esta
coletividade mediatizada pela compreensão da complexidade ambiental.
Para entender a complexidade é preciso trabalhar dialeticamente, ou seja, preparar
um indivíduo questionador, que contra-argumenta para avançar no seu conhecimento a
respeito de uma questão que está posta. Segundo Foulquié (1978), esta palavra envolve
discurso e razão, ou seja, a discussão dialogada e racional que objetiva alcançar a
compreensão de algo. Para Loureiro (2004a), “O principio da dialética é a contradição, não no
sentido pejorativo, mas de acordo com Marx, seria o de contradizer para mudar, eliminar uma
determinada situação para surgir uma outra condição” (p.113). Este autor complementa
esclarecendo que esta condição deve ser algo que venha a beneficiar um todo comum, de
transformar para melhorar um modo de vida impositivo e alcançar a igualdade social e a
equidades de bens. A dialética é fundamental para articular a teoria e a prática através da
crítica e da autocrítica, do questionamento das verdades que foram colocadas e finalizadas
como certas. A EAT parte deste princípio dialético e busca entender, especular, agir para
transformar, com base em argumentos que permitam a superação e renovação deste sistema
em que tudo e todos são considerados como objetos, como coisas.
O indivíduo contraditório, permanentemente insatisfeito com a realidade em que
está inserido, está sempre buscando a renovação e, portanto, as contradições, as críticas
podem ser usadas para que sejam buscados benefícios comuns e para a construção de novos
paradigmas que visem ao bem da humanidade.
A EA teorizada e praticada com fundamentação pautada nestes ideais de
participação, coletividade, de questionamento com conhecimento, de insatisfação e
desconforto com relação ao modo de vida, de inquietude, de valorização do todo, do