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Direito à saúde : políticas públicas direcionadas a sua concretização com ênfase para a medicina tecnológica

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Academic year: 2017

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NICHOLAS MACIEL MERLONE

DIREITO À SAÚDE

POLÍTICAS PÚBLICAS DIRECIONADAS A SUA CONCRETIZAÇÃO COM ÊNFASE PARA A

MEDICINA TECNOLÓGICA

(2)

DIREITO À SAÚDE

POLÍTICAS PÚBLICAS DIRECIONADAS A SUA CONCRETIZAÇÃO COM ÊNFASE PARA A

MEDICINA TECNOLÓGICA

Dissertação de Mestrado apresentada a Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) como exigência para obtenção do título de Mestre em Direito Político e Econômico.

Orientadora: Profa. Dra. Monica Herman S. Caggiano

São Paulo/SP

(3)

M565d Merlone, Nicholas Maciel

Direito à saúde : políticas públicas direcionadas a sua concretização com ênfase para a medicina tecnológica. / Nicholas Maciel Merlone – 2014.

130 f. ; 30 cm

Dissertação (Mestrado em Direito Político e Econômico) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2014.

Orientador: Monica Herman S. Caggiano

(4)

DIREITO À SAÚDE

POLÍTICAS PÚBLICAS DIRECIONADAS A SUA CONCRETIZAÇÃO COM ÊNFASE PARA A

MEDICINA TECNOLÓGICA

Dissertação de Mestrado apresentada a Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) como exigência para obtenção do título de Mestre em Direito Político e Econômico.

Conceito final:

Aprovado em ... de ...de...

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________

Profa. Dra. Monica Herman S. Caggiano - Orientadora Universidade Presbiteriana Mackenzie

_____________________________________________________

Prof. Dr. Felipe Chiarello de Souza Pinto Universidade Presbiteriana Mackenzie

_____________________________________________________

(5)

Agradeço aos meus pais, Marcel e Marilda, por todo o apoio, ao meu irmão, Christian e aos demais familiares.

À professora Monica Herman S. Caggiano, pela paciência, pelo estímulo constante na pesquisa e na aprendizagem e pela oportunidade de experiência da docência, bem como pela atenção e disponibilidade para a produção desta pesquisa.

Aos professores Eunice Aparecida de Jesus Prudente e Felipe Chiarello de Souza Pinto pelas valiosas contribuições e observações para o desenvolvimento deste estudo.

A todos os demais professores e professoras com que pude conviver e aprender durante o período do programa da pós-graduação em Direito Político e Econômico na Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).

Aos professores da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) e do Colégio Dante Alighieri pelas bases jurídica e educacional, respectivamente, que me acompanham até hoje.

A todos os funcionários e funcionárias da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) com que pude conviver durante este período e buscar apoio para as necessidades acadêmicas.

Aos amigos e às amigas que fiz ao longo dos anos e que me apoiaram neste momento, como Konstantin Gerber, Juliana Cardoso Ribeiro Bastos e Georgenor de Sousa Franco Neto, inclusive, neste período de estudo durante o Mestrado, como Ricardo Bastelli, Edson Schrot, Fernanda Massad, Adriana Marenco e Mariana Almeida, quando pudemos durante as aulas com os professores compartilhar ideias que ajudaram a construir o conhecimento.

(6)

Na cultura surgida da revolução burguesa, a racionalidade é um desses moldes ou estruturas implícitas que ordenam e submetem a criatividade.”1

Celso Furtado

"A saúde da alma, bradou ele, é a ocupação mais digna do médico."2 Machado de Assis

1 FURTADO, Celso. Criatividade e dependência na civilização industrial. Rio de Janeiro: Paz e

Terra, 1978. p. 83.

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Este trabalho foi produzido através de estudo doutrinário e pesquisa jurisprudencial, onde se investiga como problema central a efetivação do direito à saúde, por meio de políticas públicas sociais, com ênfase na medicina tecnológica. O direito à saúde deve ser estendido a todos igualitariamente e com condições dignas, por intermédio de politicas públicas sociais e econômicas, com um aspecto preventivo e assistencial, além de contar com a participação popular, num caráter democrático. Destacam-se as políticas sociais de saneamento básico e as do Sistema Único de Saúde (SUS) no contexto. Para a introdução do assunto, analisa-se a dignidade humana e sua abrangência, bem como não apenas o aspecto igualitário, mas também o caráter isonômico que deve fazer parte do direito à saúde. O primeiro capítulo examina o direito fundamental à saúde, o sistema internacional de sua proteção e o seu tratamento constitucional. O segundo capítulo estuda a democracia sanitária e a prevenção na saúde pública. O terceiro capítulo, por sua vez, pesquisa as políticas públicas na saúde brasileira. O quarto capítulo, finalmente, aborda o acesso à medicina tecnológica por meio de políticas públicas.

(8)

This work was based on a doctrinaire study and a jurisprudence research, focusing the central problem of the fulfillment of right to health through public social policies, with an emphasis on technological medicine. The right to health should be extended to all equally and with worthy conditions, through public social and economic policies with a preventive and a assistential aspect, in addition to popular participation as a democratic characteristic, with highlights on the social policies of sanitation and the Unified Health System (UHS). The subject is introduced, by analyzing the coverage of the right to health, as well as the human dignity, regarding not only to egalitarian, but also isonomic character that should be part of the right to health. The first chapter examines the fundamental right to health care, its international system of protection and its constitutional aspects. The second chapter studies the sanitary democracy and the prevention in public health. The third chapter, in turn, researches the public policy in brazilian health. The fourth chapter finally addresses the access to technological medicine through public policy.

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CAPÍTULO 1 SISTEMA DE PROTEÇÃO À SAÚDE: SISTEMA INTERNACIONAL E DIREITO

FUNDAMENTAL À SAÚDE ...11

1.1SISTEMA INTERNACIONAL DE PROTEÇÃO AO DIREITO À SAÚDE ... 11

1.1.1 Organização das Nações Unidas e o Direito à Saúde ... 11

1.1.2 Organização Mundial da Saúde e a Organização Pan-Americana da Saúde ... 14

1.1.3 Corte Interamericana de Direitos Humanos ... 15

1.2DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE:TRAJETÓRIA HISTÓRICA DO DIREITO À SAÚDE NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS ... 17

1.2.1 Carta Política de 1824 ... 20

1.2.2 Constituição de 1891 ... 23

1.2.3 Constituição de 1934 ... 26

1.2.4 Carta Política de 1937 ... 28

1.2.5 Constituição de 1946 ... 29

1.2.6 Carta Política de 1967 ... 30

1.2.7 Emenda Constitucional no 1, de 1969 ... 30

1.2.8 Constituição de 1988 ... 31

1.3SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS)–AVANÇOS E DESAFIOS ... 50

1.4TRATAMENTO JURISPRUDENCIAL -POSIÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF) ... 52

CAPÍTULO 2 DEMOCRACIA SANITÁRIA E PREVENÇÃO NA SAÚDE PÚBLICA ...60

2.1DEMOCRACIA SANITÁRIA ... 60

2.2POLÍTICAS URBANA E AMBIENTAL ... 66

2.3SANEAMENTO BÁSICO E POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS:POSIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ... 67

CAPÍTULO 3 – POLÍTICAS PÚBLICAS NA SAÚDE BRASILEIRA ...78

3.1CONCEITO DE POLÍTICAS PÚBLICAS ... 78

3.2POLÍTICAS PÚBLICAS E PLANEJAMENTO DO ESTADO ... 83

3.3DIRETRIZES PARA ANÁLISE E CONSTRUÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS ... 87

3.4CONTROLES DE POLÍTICAS PÚBLICAS ... 88

3.5CONTROLE JURISDICIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS ... 90

3.6JUDICIALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS NA SAÚDE BRASILEIRA ... 94

CAPÍTULO 4 - ACESSO À MEDICINA TECNOLÓGICA POR POLÍTICAS PÚBLICAS ... 103

4.1CIÊNCIA E TECNOLOGIA NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 ... 103

4.2INOVAÇÃO TECNOLÓGICA... 106

4.3FINANCIAMENTO DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO EM SAÚDE ... 108

4.4NOVAS TECNOLOGIAS E A INOVAÇÃO NA SAÚDE BRASILEIRA ... 111

4.5POLÍTICA NACIONAL DE CIÊNCIA,TECNOLOGIA E INOVAÇÃO EM SAÚDE... 114

4.6POLÍTICA NACIONAL DE GESTÃO DE TECNOLOGIAS EM SAÚDE ... 115

4.7LEI FEDERAL NO12.401, DE 2011: ASSISTÊNCIA TERAPÊUTICA E INCORPORAÇÃO DE TECNOLOGIA DE SAÚDE NO SUS ... 119

CONCLUSÃO ... 121

(10)

Introdução

A saúde é um direito de todos e dever do Estado, nos termos do artigo 196, da Constituição da República Federativa Brasileira de 1988. Deve ser, assim, assegurada, sem distinções, a toda população, portanto, de modo universal, por intermédio de políticas públicas estatais sociais e econômicas, de modo planejado, coordenado e articulado, não só com caráter prioritariamente preventivo e promocional, mas também secundariamente assistencial, com a participação da comunidade.

No tocante à universalidade dos direitos humanos, vale ressaltar a reflexão de

Monica Caggiano que destaca a sua importância “para preservar a dignidade e o

respeito dos seres humanos em qualquer lugar deste planeta terra.”1

Com efeito, a todos os seres humanos devem se estender os efeitos dos direitos humanos, configurando, assim, a sua universalidade, sob pena de restarem prejudicadas todas as conquistas realizadas ao longo dos anos.

Nesse panorama, por um lado, o caráter preventivo da saúde deve ser priorizado a fim de se evitar a ocorrência de doenças, como exemplo, através de políticas sociais de saneamento básico, mas, por outro lado, não se deve ignorar os aspectos tecnológicos da saúde, necessários ao bom atendimento dos pacientes.

Apenas para se ilustrar os problemas enfrentados pelo saneamento básico, segundo dados do Banco Mundial, 2,5 bilhões de pessoas pelo mundo não possuem acesso a saneamento básico.2 Ademais, conforme dados da Agência Nacional de Águas (ANA), aproximadamente 40% da população brasileira não possui acesso à coleta e ao tratamento de esgoto. Este fato traz entraves de saúde pública, dentre os quais o de contaminação da água que é consumida.3

Igualmente, apenas para demonstrar as possibilidades que a medicina tecnológica pode trazer como contribuição para a saúde, tem-se a Impressão 3D, que, embora em fase embrionária de pesquisas, no futuro, poderá ajudar a planejar

1 CAGGIANO, Monica Herman Salem. Os direitos fundamentais e sua universalização. Revista

Brasileira de Direito Constitucional, v. 4, p. 760-., 2004. p. 768.

2 The World Bank. Disponível em: <http://www.worldbank.org/>. Acesso em: 05/12/2013.

3JUNGMANN, Mariana. Coleta e tratamento de esgoto estão entre principais problemas do

gerenciamento de recursos hídricos. Agência Brasil – EBC. 25/11/2013. Disponível em: <

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cirurgias ortopédicas e a fazer diagnósticos, com uma invasividade mínima, para substituir partes danificadas do corpo.4

Destarte, a prestação de serviços públicos, como a coleta de lixos, a construção de esgotos e o atendimento médico são fundamentais para a saúde, porém não se deve desprezar a relevância da tecnologia na saúde, como a importância de aparelhos de tomografia e ressonância magnética, para que o paciente receba o tratamento médico adequado.

Atualmente, não se afigura suficiente que existam ambulatórios e médicos, sem os recursos tecnológicos necessários para se avaliar o doente, o que não exclui o exame minucioso realizado pelo médico em que realmente investiga as causas da doença em um atendimento individualizado e humano.

Na Conferência “Reflexões Acadêmicas para Superar a Miséria e a Fome”,

realizada no Ministério Público Federal (MPF), em São Paulo/SP, nos dias 5 e 6 de dezembro de 2013, Maria Paula Dallari Bucci destacou que as políticas públicas para superarem a pobreza exigem capacidade para enfrentar o problema em escala, demandando criatividade e originalidade no pensamento, além do conhecimento da técnica envolvida.

Nesse sentido, vale dizer que o aspecto social, coletivo, enfim, em escala deve ser considerado e priorizado, porém não se deve deixar de refletir o aspecto individual, subjetivo que também encontra proteção constitucional, conforme se abordará neste estudo. Nessa esteira, deve-se lembrar igualmente de Celso Furtado, que por muitos chegava a ser considerado até mesmo um romancista e não um economista, por justamente conceder espaço de realce à criatividade na investigação das causas e dos problemas do subdesenvolvimento. Acreditava, assim, que era importante pensar antes no lado social, para depois refletir como resultado sob o prisma econômico.5

Com efeito, a criatividade delimitada dentro do razoável é benéfica, na medida em que traz inovações positivas para o sistema sóciopolítico e econômico de um país, inclusive, ampliando horizontes e criando novas perspectivas, podendo

4 MISMETTI, Débora. Impressão 3D ajuda médicos a planejar cirurgias de coluna e fazer

diagnósticos. Equilíbrio e Saúde. Folha de S. Paulo. 20/10/2013. Disponível em: < http://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2013/10/1359134-impressao-3d-ajuda-medicos-a-planejar-cirurgias-de-coluna-e-fazer-diagnosticos.shtml>. Acesso em: 30/11/2013. Nota: acesso restrito a assinantes da Folha de S. Paulo.

5 FURTADO, Celso. Criatividade e Dependência. Na Civilização Industrial. Rio de Janeiro: Paz e

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contribuir para a transformação das estruturas sociais e econômicas anacrônicas que não raras vezes contribuem para a perpetuação de desigualdades em países em desenvolvimento, como o Brasil.

Por outro lado, vale dizer que ter ideias boas é mais fácil e comum do que executá-las. Mas, nem por isso deve-se desprezá-las, porque sem ideias, nem ao menos se é possível pensar em colocá-las em prática. São, assim, um essencial ponto de partida.

Nesse panorama, ainda nesse evento, Clarice Seixas Duarte ressaltou o aspecto fundamental das políticas públicas com relação à sua articulação de todo o regime jurídico que as abrange, como leis, decretos, contratos e portarias, com objetivos a se concretizarem.

Por fim, deseja-se evidenciar as palavras de Fernando Aith na Conferência em questão, que instigou a plateia lembrando que o acesso à assistência à saúde na realidade não é igualitário como prevê o ordenamento jurídico pátrio, bastando visualizar o atendimento público à saúde em grandes centros de referência de metrópoles nacionais. Ponto que merece ser comentado da reflexão do palestrante é que o foco das políticas públicas de saúde deveria ser prioritariamente a prevenção e a promoção da saúde, quando na verdade não o é, sendo a sua assistência, por exemplo, por meio da judicialização da saúde. Esta última, na visão do autor, seria uma ferramenta para a efetivação da saúde, mas não a melhor, de modo que será um dos assuntos a serem tratados nesta pesquisa.

Realmente, lugar de destaque ocupa o direito à saúde na sociedade e no país, importando ressaltar a Recomendação nº 31, de 30 de março de 2010, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ):

Recomenda aos Tribunais a adoção de medidas visando a melhor subsidiar os magistrados e demais operadores do direito, para assegurar maior eficiência na solução das demandas judiciais envolvendo a assistência à saúde. (Publicado no DJ-e nº 61/2010, em 07/04/2010, p. 4-6)

(13)

Sobre o direito à saúde, André Ramos Tavares bem reflete:

o Estado deve promover políticas sociais e econômicas destinadas a possibilitar o acesso universal igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação da saúde; Ademais, deve preocupar-se igualmente com a prevenção de doenças e outros agravos, mediante a redução dos riscos (arts. 166 e 198, II). Por fim, o tema relaciona-se diretamente com a dignidade da pessoa humana e o direito à igualdade, que pressupõem o Estado-garantidor, cujo dever é assegurar o mínimo de condições básicas para o indivíduo viver e desenvolver-se.6

A saúde, assim, pressupõe o direito à igualdade e dignidade da pessoa humana. Neste diapasão, Alexandre de Moraes argumenta:

a dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem

menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. [...] O princípio fundamental consagrado pela Constituição Federal da dignidade da pessoa humana apresenta-se em uma dupla concepção. Primeiramente, prevê um direito individual protetivo, seja em relação ao próprio Estado, seja em relação aos demais indivíduos. Em segundo lugar, estabelece verdadeiro dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes. Esse dever configura-se pela exigência do indivíduo respeitar a dignidade de seu semelhante tal qual a Constituição Federal exige que lhe respeitem a própria.7

Reflete o autor que a dignidade da pessoa humana trata-se de um mínimo invulnerável, com duplo caráter: i) individual protetivo; e ii) dever de tratamento igualitário.

Ana Paula de Barcellos, por sua vez, posiciona-se com relação ao mínimo invulnerável, nas palavras de Moraes, ou, como denomina, mínimo existencial.

A autora ressalta a importância da dignidade da pessoa humana como fundamento e fim da ordem jurídica, além de pressuposto da igualdade real dos homens e da democracia.

Nota-se nas ponderações de Barcellos que o mínimo existencial relaciona-se não só com a dimensão física do ser humano, mas também com a espiritual e intelectual, características essenciais num Estado Democrático de Direito, onde as pessoas são livres para desevolver sua personalidade humana.8

6 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 5ª. edição. São Paulo: Saraiva, 2007. p.

754.

7 MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. 9ª. edição. São Paulo: Atlas. 2011. p. 48. 8 BARCELLOS, Ana Paula de. A Eficácia Jurídica dos Princípios Constitucionais. O Princípio da

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Além disso, a saúde deve ser vista de forma ampla e estendida, como dito, a todos igualmente. Nesse sentido, Geraldo Ataliba reflete sobre o princípio da igualdade:

A igualdade é, assim, a primeira base de todos os princípios constitucionais e condiciona a própria função legislativa, que é a mais nobre, alta e ampla de quantas funções o povo, republicanamente, decidiu criar. A isonomia há de se expressar, portanto, em todas as manifestações de Estado, as quais, na sua maioria, se traduzem concretamente em atos de aplicação da lei, ou seu desdobramento. Não há ato ou forma de expressão estatal que possa escapar ou subtrair-se às exigências da igualdade.9

Percebe-se da leitura que a igualdade pode ser tida como um dos principais princípios constitucionais, condicionando todas as atividades estatais na República em que vigora, inclusive, aquelas relacionadas ao direito à saúde.

Nesse sentido, Cretella Jr. argumenta:

Preenchendo a série de requisitos prescritos, o cidadão investe-se no direito subjetivo público de exigir, tanto quanto qualquer outro cidadão, o que as leis e os regulamentos oferecem ao público administrado, segundo o que preceitua o princípio ou regra da igualdade, de geral aplicação no âmbito dos serviços públicos.

Trata-se da aplicação, no setor do serviço público, dos princípios gerais estabelecidos, na França, pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, promulgada pela Assembléia Nacional, em 03.09.1791.10

Nota-se da passagem que a população detém o direito de exigir do Estado os serviços públicos estabelecidos nas leis e nos regulamentos, conforme o princípio da igualdade. Dessarte, pode-se reivindicar o direito à saúde previsto nas espécies normativas, como na Constituição e nas leis, articulando-se a demanda com os objetivos das políticas públicas, como bem ressaltou Clarice Seixas Duarte.

Avançando nestas reflexões, pode-se afirmar que o princípio da igualdade já seria suficiente para garantir o tratamento igualitário da população, diante dos serviços públicos, como no que se refere ao direito à saúde. Porém, ampliam-se estas ideias, que são abrangidas pelo princípio da isonomia, conforme Celso Antônio Bandeira de Mello:

Há ofensa ao preceito constitucional da isonomia quando:

I – A norma singulariza atual e definitivamente um destinatário determinado, ao invés de abranger uma categoria de pessoas, ou uma pessoa futura e indeterminada.

II – A norma adota como critério discriminador, para fins de diferenciação de regimes, elemento não residente nos fatos, situações ou pessoas por tal

9 ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. 3ª. edição, atualizada por Rosolea Miranda Folgosi.

São Paulo: Malheiros, 2011. p. 159.

10 CRETELLA JR., J. Elementos de Direito Constitucional. 3ª. edição revista, atualizada e ampliada.

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modo desequiparadas. É o que ocorre quando pretende tomar o fator

“tempo” – que não descansa no objeto – como critério diferencial.

III – A norma atribui tratamentos jurídicos diferentes em atenção a fator de discrímen adotado que, entretanto, não guarda relação de pertinência lógica com a disparidade de regimes outorgados.

IV – A norma supõe relação de pertinência lógica existente em abstrato, mas o discrímen estabelecido conduz a efeitos contrapostos ou de qualquer modo dissonantes dos interesses prestigiados constitucionalmente.

V – A interpretação da norma extrai dela distinções, discrímens, desequiparações que não foram professadamente assumidos por ela de modo claro, ainda que por via implícita.11

Qualquer ofensa ao princípio da isonomia, bem caracterizada por Celso Antônio Bandeira de Mello, deve ser evitada, uma vez que se depreende que o princípio em comento aplica-se ao direito à saúde, assegurando que toda a população seja tratada igualmente, na medida de sua desigualdade, inclusive, com relação à prestação de serviços públicos nesta área, como decorrência de previsão normativa, onde se incluem políticas públicas de saneamento básico e de saúde, em caráter preventivo, prioritariamente, e assistencial.

O objetivo do estudo, assim, consiste na investigação do direito à saúde e de sua concretização por meio de políticas públicas sociais com ênfase na medicina tecnológica. Cumpre esclarecer com relação à pesquisa, que serão tratadas, em segundo plano, as políticas econômicas relativas ao assunto, embora deste não se separem e não tenham menos importância.

O direito à saúde é um direito humano fundamental para o indivíduo, já que se trata de condição essencial para a sua sobrevivência em sociedade com dignidade e igualdade, além do desenvolvimento de sua personalidade. Além disso, assume dimensão social com importância relevada para a coletividade. Por fim, em outra dimensão, tem caráter desenvolvimentista, mirando a redução das desiguadades sociais, econômicas, regionais e locais.

Em que pese a redução das desigualdades sociais e econômicas nas esferas regionais e locais, isso de modo algum exclui a importância do âmbito nacional. Nesse sentido, Hely Lopes Meirelles reflete sobre a competência das normas de direito sanitário:

A generalidade da norma não é a do conteúdo da regra, mas a da sua extensão espacial. Nada impede, portanto, que a União, ao editar normas sanitárias gerais, especifique que providências e medidas higiênicas e profiláticas especialize métodos preventivos e curativos, imponha o uso de determinados medicamentos ou substâncias medicinais, estabeleça

11 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3ª. edição.

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determinado processo de saneamento ou exija requisitos mínimos de salubridade para as edificações e demais atividades que se relacionem com a higiene e segurança das populações.12

Nota-se daí que a competência da União de editar normas gerais sobre direito sanitário é de suma importância, por causa da abrangência espacial que atinge. Desse modo, nada impede que formule leis de saneamento básico com aplicação em todo o território nacional com caráter geral, apesar de o assunto em pauta ter também interesse regional e local, tanto que, como se verá, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu sobre a prestação de serviços públicos de saneamento no sentido da gestão compartilhada entre Estados-membros e Municípios.

Luís Felipe Galeazzi Franco13, a seguir, esclarece a importância do estudo do Direito Sanitário, bem como a sua relação com o uso de tecnologia na área da saúde, quando exemplifica com o caso do pedido de uma incorporação no SUS de um avanço tecnológico por meio de uma ação civil pública, senão vejamos:

Os atos do CNJ, ao se propor que o direito sanitário esteja incluído no conteúdo dos programas dos cursos de formação, vitaliciamento e aperfeiçoamento de magistrados e, recentemente, ao recomendar a criação de varas especializadas em saúde, demonstram preocupação compreensível e relevante.

Isso porque o Judiciário deve assegurar com celeridade e efetividade na tutela ao direito à saúde daqueles que batem à sua porta sem que deixe em segundo plano a garantia de decisões mais adequadas e tecnicamente precisas, em razão da necessidade de se prestigiar capacidade gerencial, a organização do sistema e as políticas públicas de saúde existentes.

Por exemplo, ao se analisar eventual ação civil pública com pedido de incorporação de tecnologia ao SUS, devem ser considerados os distintos interesses — muitas vezes contrapostos — dos atores envolvidos no processo de avaliação e incorporação da tecnologia (centros de pesquisa, indústria farmacêutica, universidades, órgãos do governo e gestores, operadoras de planos de saúde, grupo de pacientes etc.), bem como não se desconsiderar a necessidade de uma precisa análise quanto a efetividade, a eficácia, o custo, o risco e os impactos sociais de determinada tecnologia, o que é extremamente complexo para se avaliar em um processo judicial.14

Além disso, a análise das políticas públicas na área da medicina tecnológica pode trazer avanços significativos para a sociedade. Pode-se melhorar o

12 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 17ª. edição atualizada por Eurico

Azevedo, Délcio Aleixo, José Emmanuel B. Filho. São Paulo: Malheiros, 1992. p. 126.

13 Advogado da União em exercício na Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Saúde.

14 FRANCO, Luís Felipe Galeazzi. Direito Sanitário é relevante e deve ser estudado. Consultor

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atendimento dos pacientes, assegurar-lhes mais dignidade e atender a um maior número de casos, inclusive, mais complexos, antes reservados somente para hospitais privados. Com isso, seria possível contribuir para as três dimensões citadas anteriormente, sem esquecer-se do caráter preventivo da saúde.

Como exemplo dos possíveis benefícios da medicina tecnológica, tem-se a criação do modelo de prontuário eletrônico unificado dos pacientes no Estado de São Paulo. O projeto possibilitará o acesso imediato ao histórico de atendimento em qualquer unidade do Sistema Único de Saúde (SUS) da rede estadual paulista15.Nota-se um possível avanço quanto à eficiência do atendimento, o que poderá agilizar as consultas, diminuir filas e, inclusive, amenizar o sofrimento dos pacientes, por meio da integração do SUS paulista, o que deve ser estendido para a esfera nacional.

Assinala-se o fato de a saúde se tratar de um direito humano fundamental social, localizado em diversos pontos do território constitucional - daí sua importância, por justamente ser amplamente tratado nessa esfera -, como nos artigos 6º e 196 a 200, da Constituição da República Federativa Brasileira de 1988.

Para tanto, tratar dos seus aspectos constitucionais é fundamental para embasar o estudo, de modo que este se sustente sobre sólidos alicerces, inclusive, com o histórico das conquistas relativas ao direito à saúde adquiridas ao longo dos anos pelas Constituições brasileiras, mas com especial destaque pela importância que assume na Lei Suprema vigente, como resultado de mobilizações de vários setores da sociedade.

Ademais, ressalta-se de modo geral a posição jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal (STF) no que se refere ao direito à saúde. Especificamente, estuda-se o aspecto tecnológico envolvido nesse âmbito, tido como instrumento de concretização do direito em questão. Desse modo, a pesquisa igualmente pode contribuir para o estudo de questões voltadas à medicina tecnológica, tais como a abrangência e os limites do seu conceito, além de assuntos ligados a pesquisas genéticas, sempre com o intuito de se concretizar o direito à saúde.

15 BASSETTE, Fernanda. Estado de SP cria prontuário digital com dados de 20 milhões de pacientes.

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Capítulo 1 Sistema de Proteção à Saúde: Sistema Internacional e Direito Fundamental à Saúde 16

1.1 Sistema Internacional de Proteção ao Direito à Saúde

1.1.1 Organização das Nações Unidas e o Direito à Saúde

Celso Lafer ensina que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, tendo sido adotada e proclamada pela Assembleia Geral da ONU em 10 de dezembro de 1948, fixou pela primeira vez na esfera global, o papel dos Direitos Humanos na convivência coletiva. Explica que pode ser, deste modo, considerada um evento que inaugura uma nova concepção da vida internacional, ao mirar uma comunidade internacional não somente de Estados soberanos, mas de indivíduos livres e iguais.17

Adiante o autor reflete que a Declaração de 1948 não se trata de uma soma de Declarações nacionais nem de uma ampliação em escala mundial destas Declarações. Lafer explica que ela inova ao formular, no plano universal, direitos humanos que não se encontram ao alcance de uma jurisdição nacional, uma vez que leva em conta a proteção internacional de direitos que autorizam o sujeito a ter direitos.18

Nesse sentido, destaca-se o artigo 6o da Declaração: “Toda pessoa tem o direito de ser em todos os lugares reconhecida como pessoa perante a lei”. Lafer

afirma que este artigo frisa o indispensável laço de todo o ser humano com a ordem

jurídica, que é o “núcleo duro de todo processo de positivação dos direitos humanos”.19

Por outro lado, nada impede visualizar o artigo em tela sob a perspectiva do direito à saúde. Todos devem ter em todos os lugares o direito à busca constante da saúde.

16 Parte deste capítulo é originária de modificações de nosso artigo: Saúde Pública e Poder

Econômico. R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 16, n. 61, jan.-fev.-mar. 2013. pp. 217-236.

17 LAFER, Celso. Direitos Humanos em Hannah Arendt: considerações sobre as fontes materiais da

Declaração Universal de 1948. GOZZO, Débora; BITTAR, Eduardo C. B. (Org.). Direitos Humanos Fundamentais. Doutrina, Prática e Jurisprudência. Niterói, RJ: Impetus, 2013. p. 1.

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Segundo o sítio oficial da Organização das Nações Unidas (ONU), desde que foi instituída, as Nações Unidas participa diretamente na promoção e tutela de níveis de saúde adequados em âmbito mundial. A Organização Mundial da Saúde (OMS) lidera esta luta na esfera do Sistema das Nações Unidas. A Constituição da OMS passou a vigorar em 7 de abril de 1948, que em seu artigo 69 estabelece que a OMS constitui uma agência especializada da ONU.20

Verifica-se na fonte que, primeiramente, decidiu-se que as prioridades da OMS seriam, como exemplo, a saúde de mulheres e crianças, a tuberculose, a nutrição e o saneamento ambiental.21

Porém, do mesmo modo, informa-se que nem todo o trabalho do Sistema das Nações Unidas de suporte à saúde global ocorre por meio da OMS. Vários assuntos de saúde são tratados de forma direta pela Assembleia Geral e pelo Conselho Econômico e Social, assim como por meio do trabalho do Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA) em suporte à saúde do adolescente, reprodutiva e materna e ao que se relaciona à saúde do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF).22

Ademais, elucida-se que membros do Sistema da ONU como a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados Palestinos (UNRWA), a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), o Escritório das Nações Unidas para Drogas e Crime (UNODC) e o Banco Mundial, entre outros, atuam em um papel crucial na promoção da saúde global. 23

Deve-se ressaltar que o Brasil é signatário do Protocolo de São Salvador, incorporado ao ordenamento jurídico pátrio pelo Decreto Federal no 3.321, de 30 de dezembro de 1999. O artigo 10, do Protocolo estabelece:

1. Toda pessoa tem direito à saúde, entendida como o gozo do mais alto nível de bem-estar físico, mental e social.

2. A fim de tornar efetivo o direito à saúde, os Estados Partes comprometem-se a reconhecer a saúde como bem público e, especialmente, a adotar as seguintes medidas para garantir este direito:

20 ONUbr. A ONU e a Saúde. Disponível em: <

http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-a-saude/>. Acesso em: 19/05/2014.

(21)

a. Atendimento primário de saúde, entendendo-se como tal a assistência médica essencial colocada ao alcance de todas as pessoas e famílias da comunidade;

b. Extensão dos benefícios dos serviços de saúde a todas as pessoas sujeitas à jurisdição do Estado;

c. Total imunização contra as principais doenças infecciosas;

d. Prevenção e tratamento das doenças endêmicas, profissionais e de outra natureza;

e. Educação da população sobre prevenção e tratamento dos problemas da saúde; e

f. Satisfação das necessidades de saúde dos grupos de mais alto risco e que, por sua situação de pobreza, sejam mais vulneráveis.

Além disso, o Brasil é signtário do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU, conforme o Decreto no 591, de 06 de julho de 1992, que de acordo com o artigo 12, do referido Pacto, institui:

1. Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa de desfrutar o mais elevado nível possível de saúde física e mental.

2. As medidas que os Estados Partes do presente Pacto deverão adotar com o fim de assegurar o pleno exercício desse direito incluirão as medidas que se façam necessárias para assegurar:

a) A diminuição da mortinatalidade e da mortalidade infantil, bem como o desenvolvimento é das crianças;

b) A melhoria de todos os aspectos de higiene do trabalho e do meio ambiente;

c) A prevenção e o tratamento das doenças epidêmicas, endêmicas, profissionais e outras, bem como a luta contra essas doenças;

d) A criação de condições que assegurem a todos assistência médica e serviços médicos em caso de enfermidade.

(22)

bens e políticas públicas relacionados à saúde devem possuir as seguintes características: disponibilidade, acessibilidade, aceitabilidade e qualidade.24

Segundo Aline Oliveira, a disponibilidade compreende a quantidade suficiente de serviços, como exemplo, o acesso à água tratada. Por acessibilidade, entende-se que o serviço não deva ser discriminatório, com fácil acesso à informação, acessibilidade econômica e geográfica. Por aceitabilidade, serviços que sejam de acordo com a ética médica. Por fim, por qualidade, tem-se a adequação de bens e serviços ao bom atendimento.25

1.1.2 Organização Mundial da Saúde e a Organização Pan-Americana da Saúde

Constata-se igualmente no sítio oficial da ONU que a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 1948, responsabilizou-se pela Classificação Internacional de Doenças, que virou o padrão internacional para fins clínicos e epidemiológicos. 26

Elucida-se que as intervenções da OMS abarcam todos os setores da saúde na esfera global, inclusive, a intervenção em crises e na resposta a emergências humanitárias, criando o Regulamento Sanitário Internacional. Este último os países devem seguir para identificar a doença e barrar a sua propagação, prevenindo doenças crônicas e trabalhando para atingir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) ligados à saúde.27

Adiante, expõe-se que a Organização Pan-Americana da Saúde, por sua vez, trata-se de um organismo internacional de saúde pública existente há um século, com foco em aprimorar as condições de saúde dos países das Américas.As Nações Unidas o incorpora no momento em que o órgão se torna o Escritório Regional para as Américas da Organização Mundial da Saúde. A OPAS/OMS igualmente integra os sistemas da Organização dos Estados Americanos (OEA) e da Organização das Nações Unidas (ONU).28

24 OLIVEIRA, Aline Albuquerque S. de. Direito à saúde: conteúdo, essencialidade e monitoramento.

Revista CEJ. Brasília. Ano XIV, n. 48, jan./mar. 2010.

25 Ibid. p. 94.

26

ONUbr. A ONU e a Saúde. Disponível em: < http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-a-saude/>. Acesso em: 19/05/2014.

(23)

1.1.3 Corte Interamericana de Direitos Humanos

Oliveira e Goldzveig29

introduzem observações sobre a Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Os autores explicam que o Capítulo VIII da Convenção Americana de Direitos Humanos é direcionado exclusivamente ao segundo órgão através do qual se realiza o controle sobre o cumprimento das obrigações assumidas pelos Estados-partes que ratificaram a Convenção: a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Conforme seu Estatuto, trata-se de uma instituição judiciária autônoma cuja meta é a aplicação e a interpretação da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

Lembram que a Corte foi criada pela própria Convenção Americana, em 1969, entrando em vigor em 1978. Expõem, por fim, que a Corte Interamericana de Direitos Humanos trata-se do órgão jurisdicional da Convenção Americana de Direitos Humanos que possui a função de observar as violações contra os direitos humanos na esfera do sistema interamericano.

Para contextualizar a atuação da Corte, traz-se o Caso Ximenes Lopes Vs. Brasil:

INTRODUÇÃO DA CAUSA

1. Em 1º de outubro de 2004, em conformidade com o disposto nos artigos 50 e 61 da Convenção Americana, a Comissão Interamericana de Direitos

Humanos (doravante denominada “Comissão Interamericana” ou “Comissão”) submeteu à Corte uma demanda contra a República Federativo

do Brasil (doravante denominado “Estado” ou “Brasil”), a qual se originou na

denúncia nº 12.237, recebida na Secretaria da Comissão em 22 de novembro de 1999.

2. A Comissão apresentou a demanda neste caso com o objetivo de que a Corte decidisse se o Estado era responsável pela violação dos direitos consagrados nos artigos 4 (Direito à Vida), 5 (Direito à Integridade Pessoal), 8 (Garantias Judiciais) e 25 (Proteção Judicial) da Convenção Americana, com relação à obrigação estabelecida no artigo 1.1 (Obrigação de respeitar os direitos) do mesmo instrumento, em detrimento do senhor Damião

Ximenes Lopes (doravante denominado “senhor Damião Ximenes Lopes”, “senhor Ximenes Lopes” ou “suposta vítima”), portador de deficiência

mental, pelas supostas condições desumanas e degradantes da sua hospitalização; pelos alegados golpes e ataques contra a integridade pessoal de que se alega ter sido vítima por parte dos funcionários da Casa

de Repouso Guararapes (doravante denominada “Casa de Repouso

Guararapes” ou “hospital”); por sua morte enquanto se encontrava ali

submetido a tratamento psiquiátrico; bem como pela suposta falta de

29 OLIVEIRA, Erival da Silva; GOLDZVEIG, Gustavo. Comentários à Convenção Americana de

(24)

investigação e garantias judiciais que caracterizam seu caso e o mantém na impunidade. A suposta vítima foi internada em 1º de outubro de 1999 para receber tratamento psiquiátrico na Casa de Repouso Guararapes, um centro de atendimento psiquiátrico privado, que operava no âmbito do sistema público de saúde do Brasil, chamado Sistema Único de Saúde

(doravante denominado “Sistema Único de Saúde” ou “SUS”), no Município

de Sobral, Estado do Ceará. O senhor Damião Ximenes Lopes faleceu em 4 de outubro de 1999 na Casa de Repouso Guararapes, após três dias de internação.

1. Acrescentou a Comissão que os fatos deste caso se vêem agravados pela situação de vulnerabilidade em que se encontram as pessoas portadoras de deficiência mental, bem como pela especial obrigação do Estado de oferecer proteção às pessoas que se encontram sob o cuidado de centros de saúde que integram o Sistema Único de Saúde do Estado. A Comissão, por conseguinte, solicitou à Corte que ordene ao Estado a adoção de determinadas medidas de reparação citadas na demanda e o ressarcimento das custas e gastos.30

No presente caso, a Corte decidiu:

A CORTE,

DECIDE,

Por unanimidade,

1. Admitir o reconhecimento parcial de responsabilidade internacional efetuado pelo Estado pela violação dos direitos à vida e à integridade pessoal consagrados nos artigos 4.1 e 5.1 e 5.2 da Convenção Americana, em relação com a obrigação geral de respeitar e garantir os direitos estabelecida no artigo 1.1 desse tratado, em detrimento do senhor Damião Ximenes Lopes, nos termos dos parágrafos 61 a 81 da presente Sentença.

DECLARA,

Por unanimidade, que

2. O Estado violou, em detrimento do senhor Damião Ximenes Lopes, tal como o reconheceu, os direitos à vida e à integridade pessoal consagrados nos artigos 4.1 e 5.1 e 5.2 da Convenção Americana, em relação com a obrigação geral de respeitar e garantir os direitos estabelecida no artigo 1.1 desse tratado, nos termos dos parágrafos 119 a 150 da presente Sentença.

3. O Estado violou, em detrimento das senhoras Albertina Viana Lopes e Irene Ximenes Lopes Miranda e dos senhores Francisco Leopoldino Lopes e Cosme Ximenes Lopes, familiares do senhor Damião Ximenes Lopes, o direito à integridade pessoal consagrado no artigo 5 da Convenção Americana, em relação com a obrigação geral de respeitar e garantir os direitos estabelecida no artigo 1.1 desse tratado, nos termos dos parágrafos 155 a 163 da presente Sentença.

30 CIDH. Caso Ximenes Lopes x Brasil. Sentença de 04 de julho de 2006. Disponível em: <

(25)

4. O Estado violou, em detrimento das senhoras Albertina Viana Lopes e Irene Ximenes Lopes Miranda, familiares do senhor Damião Ximenes Lopes, os direitos às garantias judiciais e à proteção judicial consagrados nos artigos 8.1 e 25.1 da Convenção Americana, em relação com a obrigação geral de respeitar e garantir os direitos estabelecida no artigo 1.1 desse tratado, nos termos dos parágrafos 170 a 206 da presente Sentença.

5. Esta Sentença constitui per se uma forma de reparação, nos termos do parágrafo 251 dessa mesma Sentença.31

Analisando o caso em tela, conclui-se que o paciente, que sofria de doença mental, sofreu maus tratos no hospital em que se encontrava internado, chegando a falecer. Como resultado, o Estado foi obrigado a reparar o dano, indenizando a família (Decreto Federal no 6.185, de 13 de agosto de 2007).

Desse modo, a Corte decidiu que o Brasil, além de indenizar moralmente e materialmente a família Ximenes, deveria investigar e identificar os culpados pela morte de Damião, bem como promover programas de formação e capacitação para profissionais da área da saúde, como médicos, psicólogos e enfermeiros, especialmente para os profissionais que lidam com o campo da saúde mental.

O ponto fundamental do caso reside no fato de que locais onde se deveriam tratar pacientes com cuidado e atenção, não raras vezes, encontram-se em péssimas condições.

1.2 Direito Fundamental à Saúde: Trajetória Histórica do Direito à Saúde nas Constituições Brasileiras

Neste tópico referente à história do direito à saúde nas Constituições Brasileiras, será realizada a revisão bibliográfica das obras de Ivo Dantas32, Manoel Gonçalves Ferreira Filho33, José Afonso da Silva34, Celso Ribeiro Bastos35, Pinto Ferreira36, Raul Machado Horta37, Boris Fausto38

, Paulo Bonavides e Paes

31 CIDH. Caso Ximenes Lopes x Brasil. Sentença de 04 de julho de 2006. Disponível em: <

http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_149_por.pdf > Acesso em: 06/06/2014.

32 DANTAS, Ivo. Direito Constitucional Comparado. Introdução. Teoria e Metodologia. 2ª. edição

Totalmente Revista, Aumentada e Atualizada. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar , 2006.

33 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 38ª. edição, revista e

atualizada. São Paulo: Saraiva, 2012.

34 DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª. edição. São Paulo: Saraiva,

2005.

35 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 22ª. edição. São Paulo: Malheiros, 2010. 36 FERREIRA, Pinto. Manual de Direito Constitucional de Acordo com a Constituição de 1988, Rio de

(26)

Andrade39

, Wagner Balera40 e Ana Paula Oriola de Raeffray41, no que pertine ao assunto, bem como à investigação dos antecedentes históricos, das principais influências ideológicas e características da estrutura política e normativa - esta última por meio de consulta à legislação de sítios oficiais e às obras em tela - do Estado brasileiro nas épocas que marcaram as Constituições Brasileiras. Para uma perspectiva do direito eleitoral na História das Constituições do Brasil, confira-se a pesquisa de Cláudio Lembo42. Acentua-se, no entanto, que o estudo histórico em comento terá ênfase nos aspectos ligados ao direito à saúde, por se tratar do tema principal deste trabalho.

Antes de se entrar na análise propriamente dita das Constituições Brasileiras, Ivo Dantas traz a relação entre Direito e História:

Todo ordenamento jurídico encontra-se condicionado ao momento histórico em que é produzido, isto porque, em última análise, representa ele os valores sociais legitimados pela sociedade à qual será aplicado, razão pela qual, com muita precisão, MÁRIO LOSANO doutrina que “todo Derecho (a

menudo inconscientemente) y es el fruto de una actividad política en la que se ha tratado de hacer prevalecer un determinado valor socioeconomico sobre otros: la victoria final se sanciona como la cristalización de ese valor

en una norma jurídica”43

Desse modo, Dantas leciona que todo ordenamento jurídico está ligado ao momento histórico em que é produzido. Em outra passagem, cabe destacar sobre a importância do estudo da história, o que Ivo Dantas reflete:

Em item intitulado O significado da teoria da história para o estudo da história, depois de afirmar que “a pergunta acerca da função da teoria da

história na aquisição de competência profissional pode ser respondida sumariamente com a afirmação de que é dela que necessitamos se quisermos aprender a ver a floresta, ao invés de perdemo-nos em uma

multidão de árvores”, indica o autor 6 (seis) pontos para a função didática de profissionalização da história, a saber:

37 HORTA, Raul Machado. Direito Constitucional. 4ª. edição, revista e atualizada. Belo Horizonte: Del

Rey, 2003.

38 FAUSTO, Boris. História do Brasil. 14ª. edição. São Paulo: Edusp, 2012.

39 BONAVIDES, Paulo. ANDRADE, Paes. História Constitucional do Brasil. 5ª. edição. Brasília: OAB

Editora, 2004.

40 BALERA, Wagner. A Seguridade Social na Constituição de 1988. São Paulo: Revista dos Tribunais,

1989.

41 RAEFFRAY, Ana Paula Oriola de. Direito da Saúde de acordo com a Constituição Federal. São

Paulo: Quartier Latin, 2005.

42 Para saber mais sobre o tema, cf. LEMBO, Cláudio. Cronologia básica do Direito Eleitoral

Brasileiro. LEMBO, Cláudio; CAGGIANO, Monica Herman S. (Coord.). O Voto nas Américas. Barueri/SP - São Paulo: Manole, Cepes, 2008.

43 DANTAS, Direito Constitucional Comparado. Introdução. Teoria e Metodologia. Op. cit. p. 31. Em

relação ao trecho de Mario Losano, citado por Ivo Dantas: “Todo Direito (muitas vezes

inconscientemente) e é o resultado de uma atividade política em que temos tentado fazer um determinado valor socioeconômico prevalecer sobre os outros: a vitória final ocorre como a

(27)

“1. A teoria da história é necessária para solucionar o problema de uma

introdução tecnicamente correta do estudo da história. Ela exerce, aqui, uma função propedêutica.

2. A teoria da história é necessária para solucionar o problema de uma combinação eficaz de disciplinas diferentes. Ela exerce, aqui, uma função de coordenação.

3. A teoria da história é necessária para solucionar o problema do subjetivismo diante da exigência de objetividade do pensamento histórico-científico. Ela exerce, aqui, uma função motivadora.

4. A teoria da história é necessária para solucionar o problema da gestão da quantidade de material de pesquisa. Ela exerce, aqui, uma função organizadora da obtenção do saber histórico.

5. A teoria da história contribui para formar a capacidade de reflexão, sem a qual não se pode solucionar o problema posto pela necessidade de conciliar, num trabalho científico de fôlego, os requisitos científicos e a economicidade do trabalho. Ela exerce, aqui, uma função de seleção e fundamentação.

6. A teoria da história é necessária para solucionar o problema de como os estudiosos poderiam levar em conta, já durante o estudo, sua futura prática profissional. Ela exerce, aqui, uma função mediadora” – conclui JÖRN RÜSEN.44

Diante da análise da relação entre Direito e História e da relevância elencada do conhecimento da história, pode-se afirmar que essa importância igualmente se aplica à investigação histórica do direito à saúde.

Conhecer a história que abrange o direito à saúde possui uma função propedêutica, na medida em que introduz o tema sob um melhor conhecimento fundamentado.

Além disso, permite conciliar duas áreas sob uma perspectiva histórica – o Direito com a Saúde -, exercendo, assim, uma função de coordenação.

Exerce igualmente uma função motivadora, quando ao estudar a história do direito à saúde, busca realizar uma análise objetiva dos fatos, em detrimento do subjetivismo.

Da mesma forma, atua com uma função organizadora da obtenção do saber histórico, uma vez que lida com diferentes fontes de conhecimento para ter acesso aos fatos, tais como livros, notícias, documentos e artigos.

Ademais, exerce uma função de seleção e aprofundamento, já que a sua análise requer reflexão.

44 RÜSEN, Jörn. Razão Histórica. Teoria da História: os Fundamentos da Ciência Histórica. Brasília:

(28)

Por fim, atua com uma função mediadora, porque poderá ser aplicada na prática profissional pelos estudiosos, ou, ao menos, servir de base para a prática.

1.2.1 Carta Política de 1824

Os antecedentes históricos da Carta Imperial do Brasil de 1824, bem como suas principais influências ideológicas e características merecem atenção neste início, como dito. As ideias liberais do fim do século XVIII e início do século XIX influenciaram o Brasil já na época de Dom João VI, cabendo lembrar a edição da Constituição de Cádiz em 1º de outubro de 1822, a constituição liberal espanhola que vigorou por um dia no Brasil. Vale mencionar que existiram movimentos armados que carregavam ideais liberais, apesar de não avançarem.

O Estado Unitário com o poder centralizado foi organizado sob a forma de uma monarquia, tendo como primeiro governante, administrador e reinante, Dom Pedro I.

Naquele tempo, as ideias liberais eram fortes e, assim, contrapunham-se a Estados absolutistas. Costumavam ocorrer dois caminhos: a) os Estados absolutistas que ruíam; e b) os Estados absolutistas que se mantinham por meio de algumas concessões à soberania popular – caso do Brasil.

Depois de ter sido criado o Conselho de Estado para elaborar o projeto da Constituição do Império, e submetê-la à apreciação das Câmaras, antes mesmo da proclamação de Independência em 1822, devido às tensões políticas da época, Dom Pedro decidiu por outorgar uma Carta Política.

A Carta Política do Império do Brasil, de 25 de março de 1824, foi fortemente influenciada pelo movimento constitucionalista europeu, bem como pelos pensamentos de Benjamin Constant, que idealizou a divisão dos poderes quadripartite: Poder Legislativo, Poder Moderador, Poder Executivo e Poder Judiciário, nos termos do artigo 10.

(29)

Os direitos políticos sofriam restrições, por serem expressos pelo voto censitário, o que limitava a capacidade eleitoral ativa da época, uma vez que só podiam votar aqueles com renda líquida anual superior a cem mil réis, mensurados pela quantidade de alqueires de mandioca que o proprietário detinha, conforme o artigo 92, inciso V.

Além disso, vale salientar que a religião oficial do Império era o catolicismo, o que tornava o Estado brasileiro confessional, mesmo permitindo o culto a outras religiões de modo restrito, em particular nos ambientes domésticos, sem exteriorizá-las em templos, nos termos do artigo 5o.

Tal como uma Constituição seguidora dos ideiais liberais, não poderia deixar de assegurar os direitos do homem, conforme prescreve o artigo 16, da Declaração de 1789.45

Contudo, havia apenas algumas medidas para garantir a saúde pública até a chegada da independência e da Carta de 1824, no Brasil.46

Em 1809, o Príncipe Regente criou a função de Provedor-mor de Saúde da Corte e Estados do Brasil, com mira a preservar o bem público e particular, que poderia ser atingido por contágio das embarcações, passageiros e mercadorias no porto do Rio de Janeiro e as outras cidades litorâneas. Seu regimento firmava as normas para a vigilância sanitária dos portos do Estado, controle de mercadorias e comestíveis, além de inspeção em matadouros e açougues públicos.47

Já em 1810, eram fixadas normas para vigilância de boticas, controle do exercício profissional, exame de cirurgiões para concessão de licença para exercer a medicina, além de exames de medicina e farmácia.48

Além disso, em 1811, foi criado um estabelecimento permanente – Junta de Instituição Vacínica – sob a direção do Intendente Geral da Polícia da Corte e do Estado do Brasil e do Físico-mor do Reino e, depois, Institutos Vacínicos em São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Em 1812, aponta ter sido criado o Laboratório Químico-prático do Rio de Janeiro, sob a inspeção do Ministro da Marinha.49

45

Declaração de 1789: “Art. 16.º A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos

nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição.”

46 RAEFFRAY, Ana Paula Oriola de. Direito da Saúde de acordo com a Constituição Federal. São

Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 138.

47 Ibid., pp. 138-139.

(30)

Verifica-se a partir da leitura do artigo 179, inciso XXIV, em seu “TITULO 8º”, “Das Disposições Geraes, e Garantias dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros.”, da Constituição do Império, o único momento em que a palavra Saúde aparece na Carta Política, em seu prisma individual, mesmo que com menos ênfase e relevância do que a atual Constituição brasileira lhe confere:

“Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte.

XXIV. Nenhum genero de trabalho, de cultura, industria, ou commercio póde ser prohibido, uma vez que não se opponha aos costumes publicos, á segurança, e saude dos Cidadãos.” (grifo nosso)

Percebe-se que, em se tratando de assunto ligado ao trabalho, a Constituição de 1824 buscava proteger essa relação com a condição de que, entre outras exigências, não se oponha à saúde dos cidadãos.

Por outro lado, a Constituição da época, além disso, em seu artigo 179, inciso XXXI, garantia a proteção social, apesar de sua concepção liberal.50

Nesse sentido, Wagner Balera reflete sobre os socorros públicos:

O constituinte coloca, pois, a proteção social como um dos direitos humanos cuja garantia é a própria Lei Maior. No contexto liberal em que se situava, a Carta Imperial já lançava pedra fundamental para a edificação da proteção social no Brasil.

Pimenta Bueno, o mais autorizado estudioso daquele Diploma assevera:

“Desde que a sociedade é fundada, a ideia de proteção é como sinônimo da

de governo em favor dos associados...”

E sublinha que esse zelo governamental: “pelo estabelecimento de caixas

econômicas, de bancos de socorro em favor das classes pobres de montepios, e outras instituições de previdência, é uma outra proteção

valiosa outorgada aos cidadãos que têm poucos recursos”.51

Vale dizer que a Saúde Pública integra atualmente a Seguridade Social, desta última fazendo parte a Previdência Social e a Assistência Social. Para que o povo possua saúde e condições dignas de vida, é necessário igualmente o amparo quando preciso da previdência e da assistência. Daí, difícil não abordá-las mesmo que tangencialmente nesta investigação, para que se possa ter uma visão mais ampla.

50“Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base

a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte.

XXXI. A Constituição tambem garante os soccorros publicos.” (grifo nosso)

51 BALERA, Wagner. A Seguridade Social na Constituição de 1988. São Paulo: Revista dos Tribunais,

(31)

Pois bem, adiante, Balera destaca o surgimento da previdência social com o advento do seguro social, complementando-se à assistência pública social que combatia a miséria e possuía um caráter ligado ao cristianismo e à caridade. Balera explica que é na República, período subsequente, que a previdência irá se estruturar melhor. 52

1.2.2 Constituição de 1891

Em 15 de novembro de 1889, ocorria no Brasil o fim da Monarquia, destituindo-se o Imperador, e, como resultado, proclamando-destituindo-se uma República Federativa. Aconteciam vários movimentos com inspiração nas ideias republicanas. Porém, não eram claramente definidas, o que existia era um sentimento forte de emancipação política. Com isso, na data mencionada, Rui Barbosa assina o Decreto no 1 e, como dito, iniciava-se um novo período histórico e político.

A Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil foi promulgada no dia 24 de fevereiro de 1891. Esta Lei Suprema sofreu fortes influências ideológicas, principalmente, dos Estados Unidos da América (EUA). Assim como este país, o Brasil adotou o Presidencialismo como sistema de governo, além da República como forma de governo e do Federalismo como forma de Estado.

No contexto, o governo rompeu com a divisão quadripartite idealizada por Benjamin Constant, adotando a divisão tripartite do Barão de Montesquieu. Desse modo, os poderes constituídos separavam suas funções em Legislativo, Executivo e Judiciário, nos termos do artigo 15. Na organização política, os Estados-membros ganharam autonomia e instalou-se o Federalismo dual.

Politicamente, o Marechal Deodoro da Fonseca foi eleito pela Constituinte como o primeiro presidente da República. Todavia, Floriano Peixoto foi eleito como vice-presidente, fazendo parte de chapa oposta. Devido a tensões políticas da época, Deodoro renunciou e Floriano assumiu o cargo político. Porém, mais uma vez, em meio a conturbações políticas, Floriano entregou a presidência a Prudente de Moraes e, com este, a oligarquia dos coronéis se firmou no poder.

(32)

O Estado Unitário e centralizado de antes cedeu espaço, assim, aos poderes regionais e locais que tinham importância para os Estados-membros. O coronelismo de fato foi um poder efetivo e real que dominou a política da época.

Com efeito, em nenhum momento na Constituição de 1891 cita-se expressamente a palavra saúde, seja em seu caráter social, seja em seu caráter subjetivo.

Em termos constitucionais, não se abordou a saúde efetivamente. Por outro lado, tratou timidamente da previdência social. Todavia, como se verá, na época houve avanços na saúde preventiva e no aparelho estatal da previdência, como resultado de medidas governamentais e legislativas.

Com relação à legislação esparsa prévia à Constituição de 1891, existiam decretos que abordavam o assunto, o que poderia levar ao seu tratamento constitucional, o que, porém, não ocorreu. Cumpre apenas citar o Decreto Federal no 221, de 26 de fevereiro de 1890, que autorizava a concessão de aposentadoria aos trabalhadores da Central do Brasil, seguido do Decreto Federal no 405 que ampliava o benefício citado para o âmbito nacional no que se refere aos ferroviários.

Quanto ao aspecto previdenciário, a Lei Maior dispôs em seu “TÍTULO IV - Dos Cidadãos Brasileiros” em sua “SEÇÃO II - Declaração de Direitos”,em seu artigo 75:

“A aposentadoria só poderá ser dada aos funcionários públicos em caso de invalidez

no serviço da Nação.”.

Enquanto isso, vale conferir o Decreto Federal no 2.449, de 1 de fevereiro de 189753.

Desse modo, os serviços de higiene passaram a ser de competência da União, tendo sido incumbidos ao Instituto Sanitário Federal e à Inspectoria Geral de Saúde dos Portos, devendo ser dirigidos e administrados por uma repartição única, chamada de Diretoria Geral de Saúde Pública, com sede na Capital Federal e subordinada ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores.

Outro ponto interessante é o que determina o artigo 3o do referido Decreto. Segundo este dispositivo, a Diretoria Geral de Saúde Pública teria anexo a ela um laboratório de bacteriologia.

53 Brasil. Decreto Federal no 2.449, de 1 de fevereiro de 1897: “Art. 1º Os serviços de hygiene a

cargo da União, actualmente incumbidos ao Instituto Sanitario Federal e á Inspectoria Geral de Saude dos Portos, passarão a ser dirigidos e executados por uma repartição unica, denominada Directoria Geral de Saude Publica, com séde na Capital Federal e dependente do Ministerio da Justiça e

(33)

Essa preocupação que levou a criação desse laboratório tem um motivo. A saúde assume papel de destaque no Brasil no período cafeeiro, como resultado do trabalho assalariado e da predominância da população no campo. Na época, doenças como coléra, tuberculose, febre amarela, varíola e lepra contaminavam o povo. Como decorrência disso, Rodrigues Alves, presidente eleito da República de 1902 a 1906, realizou grandes obras públicas, buscando sanear o Rio de Janeiro, em 1902. Enquanto isso, Osvaldo Cruz - médico sanitarista que reformou o Código Sanitário de 1920 - combateu a febre amarela urbana, em 1903. Vale dizer que as vacinas eram aplicadas somente à população do campo, ou em casos de epidemia ou calamidades públicas.

O Decreto Federal no 3.724, de 15 de Janeiro de 1919, por sua vez, surge para regulamentar as obrigações resultantes dos acidentes no trabalho, como um importante instrumento protetivo do trabalhador na época.

Em seu artigo 20, localizado no “TITULO III - DA DECLARAÇÃO DO

ACCIDENTE”, aparece a palavra Saúde quando se dispõe:

“Art. 20. Durante o tratamento, é permittido, quer ao patrão, quer ao operario, requerer a verificação do estado de saude deste ultimo, nomeando o juiz um medico para fazer o exame que se effectuará em presença do medico assistente. Si houver divergencia entre ambos sobre o estado da victima e as suas condições de capacidade para o trabalho, o juiz nomeará um outro medico para fazer o exame e no seu laudo baseará o

julgamento.” (grifo nosso)

Nota-se que o dispositivo assegura tripla proteção ao trabalhador. Após permitir que tanto este quanto seu patrão requeiram a verificação da saúde do primeiro, por meio do requerimento de um juiz, este último nomeia um médico que, para realizar o exame, devia fazê-lo na presença de outro médico, conferindo maior transparência ao procedimento. Por fim, não bastando isso, caso houvesse divergência na avaliação, o juiz nomearia um terceiro médico para o encargo.

Referências

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